Confira
a íntegra do discurso de Lula na abertura da COP30,
em Belém
A
conferência é realizada pela primeira vez na
Amazônia
12/11/2025 – AGÊNCIA
BRASIL - Nesta segunda-feira (10), foi aberta a programação
da 30ª Conferência das Partes (COP30) da Convenção-Quadro
das Nações Unidas sobre Mudança do
Clima (UNFCCC, na sigla em inglês), em Belém.
Realizada pela primeira vez na Amazônia - bioma com
a maior biodiversidade do planeta e um regulador do clima
global -, a COP30 tem o enorme desafio de recolocar o tema
das mudanças climáticas no centro das prioridades
internacionais. O presidente Luiz Inácio Lula da
Silva foi uma das autoridades a discursar na abertura do
evento e, como líder do país anfitrião,
defendeu que a a mudança do clima já não
é uma ameaça do futuro, mas "uma tragédia
do presente" e cobrou uma ação coordenada
dos países. Confira a íntegra do discurso:
Reprodução/Bruno
Peres/ABR
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Há mais de 30 anos,
na Cúpula da Terra, os líderes do mundo se
reuniram no Rio de Janeiro para debater o desenvolvimento
e a proteção do meio ambiente.
Naquele momento, o multilateralismo
vivia seu ápice.
O mundo adentrava a chamada década das conferências,
da qual emergiram as grandes bússolas que guiaram
a humanidade ao longo dessas três décadas.
Entre elas estão o conceito de desenvolvimento sustentável
e o princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas,
legados vivos da Rio 92.
Hoje, a Convenção do Clima retorna à
sua terra natal.
Ela faz o caminho de volta
para recuperar o entusiasmo e o engajamento que embalaram
seu nascimento.
Pelas próximas duas semanas, Belém será
a capital do mundo.
Negociadores, governadores, prefeitos, parlamentares, cientistas
e organizações da sociedade civil farão
parte desse grande esforço coletivo em prol do planeta.
Trazer a COP para o coração da Amazônia
foi uma tarefa árdua, mas necessária.
A Amazônia não é uma entidade abstrata.
Quem só vê
a floresta de cima desconhece o que se passa à sua
sombra.
O bioma mais diverso da Terra é a casa de quase cinquenta
milhões de pessoas, incluindo quatrocentos povos
indígenas, dispersa por nove países em desenvolvimento
que ainda enfrentam imensos desafios sociais e econômicos.
Desafios que o Brasil luta para superar com a mesma determinação
com que contornou as adversidades logísticas inerentes
à organização de uma conferência
deste porte.
Quando vocês deixarem Belém, o povo da cidade
permanecerá com os investimentos em infraestrutura
que foram feitos para recebê-los.
E o mundo poderá,
enfim, dizer que conhece a realidade da Amazônia.
Nos dias que antecederam esta Conferência, chefes
de Estado e de Governo, ministros de Estado, representantes
de organizações internacionais e da sociedade
civil se reuniram na Cúpula de Belém pelo
Clima.
Lançamos o Fundo de Florestas Tropicais para Sempre,
um mecanismo inovador que angariou, num só dia, 5,5
bilhões de dólares em anúncios de investimento.
Adotamos compromissos coletivos
sobre:
» O manejo integrado do fogo
» O direito à posse da terra por povos indígenas
e tradicionais
» A quadruplicação da produção
de combustíveis sustentáveis
» A criação de uma coalizão sobre
mercados de carbono
» O alinhamento da ação climática
ao combate à fome e à pobreza
» E a luta contra o racismo ambiental.
A Cúpula de Belém
foi o ponto de chegada de um caminho que o Brasil convidou
a comunidade internacional a percorrer ao longo de suas
presidências do G20 e do BRICS.
A síntese dos elementos que recolhemos nessa trajetória
está contida no Chamado à Ação
que lançamos após a Cúpula a título
de contribuição aos debates na COP e além
dela.
A mudança do clima já não é
uma ameaça do futuro.
É uma tragédia do presente.
O furacão Melissa
que fustigou o Caribe e o tornado que atingiu o Estado do
Paraná, no Sul do Brasil, deixaram vítimas
fatais e um rastro de destruição.
Das secas e incêndios na África e na Europa
às enchentes na América do Sul e no Sudeste
Asiático, o aumento da temperatura global espalha
dor e sofrimento, especialmente entre as populações
mais vulneráveis.
A COP30 será a COP
da verdade.
Na era da desinformação, os obscurantistas
rejeitam não só as evidências da ciência,
mas também os progressos do multilateralismo.
Eles controlam algoritmos, semeiam o ódio e espalham
o medo.
Atacam as instituições, a ciência e
as universidades.
É momento de impor uma nova derrota aos negacionistas.
Sem o Acordo de Paris, o mundo estaria fadado a um aquecimento
catastrófico de quase cinco graus até o fim
do século.
Estamos andando na direção
certa, mas na velocidade errada.
No ritmo atual, ainda avançamos rumo a um aumento
superior a um grau e meio na temperatura global.
Romper essa barreira é um risco que não podemos
correr.
Queridos amigos e queridas amigas,
Nosso Chamado à Ação está dividido
em três partes.
Na primeira parte, faço
um apelo para que os países cumpram seus compromissos.
Isso significa:
» Formular e implementar as Contribuições
Nacionalmente Determinadas ambiciosas
» Assegurar financiamento, transferência de
tecnologia e capacitação aos países
em desenvolvimento
» E dar a devida atenção à adaptação
aos efeitos da mudança do clima
Na segunda parte, conclamo os líderes mundiais a
acelerar a ação climática.
Precisamos de mapas do caminho para que a humanidade, de
forma justa e planejada, supere a dependência dos
combustíveis fósseis, pare e reverta o desmatamento
e mobilize recursos para esses fins.
Avançar requer uma governança global mais
robusta, capaz de assegurar que palavras se traduzam em
ações.
A proposta de criação
de um Conselho do Clima, vinculado à Assembleia Geral
da ONU, é uma forma de dar a esse desafio a estatura
política que ele merece.
Na terceira parte, convoco a comunidade internacional a
colocar as pessoas no centro da agenda climática.
O aquecimento global pode empurrar milhões de pessoas
para a fome e a pobreza, fazendo retroceder décadas
de avanços.
O impacto desproporcional da mudança do clima sobre
mulheres, afrodescendentes, migrantes e grupos vulneráveis
deve ser levado em conta nas políticas de adaptação.
É fundamental reconhecer o papel dos territórios
indígenas e de comunidades tradicionais nos esforços
de mitigação.
No Brasil, mais de 13% do
território são áreas demarcadas para
os povos indígenas. Talvez ainda seja pouco.
Uma transição justa precisa contribuir para
reduzir as assimetrias entre o Norte e o Sul Global, forjadas
sobre séculos de emissões.
A emergência climática é uma crise de
desigualdade.
Ela expõe e exacerba o que já é inaceitável.
Ela aprofunda a lógica perversa que define quem é
digno de viver e quem deve morrer.
Mudar pela escolha nos dá a chance de um futuro que
não é ditado pela tragédia.
O desalento não pode extinguir as esperanças
da juventude.
Devemos a nossos filhos e netos a oportunidade de viver
em uma Terra onde seja possível sonhar.
O xamã ianomâmi
Davi Kopenawa diz que o pensamento na cidade é obscuro
e esfumaçado, obstruído pelo ronco dos carros
e pelo ruído das máquinas.
Espero que a serenidade da floresta inspire em todos nós
a clareza de pensamento necessária para ver o que
precisa ser feito.
Uma boa COP30.
Muito obrigado.
Sobre a COP 30
A COP 30 (30ª Conferência das Nações
Unidas sobre Mudanças Climáticas) realizada
em 2025, na cidade de Belém, no estado do Pará,
marca a primeira vez que o evento acontece na Amazônia.
Essa conferência reúne líderes mundiais,
cientistas, ativistas e representantes da sociedade civil
para discutir e negociar ações globais voltadas
ao combate das mudanças climáticas. O encontro
é especialmente simbólico por ocorrer em uma
região que desempenha papel crucial na regulação
do clima do planeta, já que a Floresta Amazônica
é um dos maiores sumidouros de carbono do mundo.
A realização da COP 30 no Brasil representa
uma oportunidade para o país mostrar seu compromisso
com a preservação ambiental, a transição
energética e o desenvolvimento sustentável,
além de dar voz aos povos da floresta e às
comunidades locais que vivem os impactos diretos da crise
climática.
Da Agência Brasil
Fotos: Reprodução/Bruno Peres/Agência
Brasil