Ao
encerrar Cúpula dos Povos, Cacique Raoni pede que
luta continue
Líder
indígena criticou guerras e "os que querem destruir
nossa terra"
16/11/2025 – LUCIANO
NASCIMENTO - ENVIADO ESPECIAL – Belém - A Cúpula
dos Povos, evento paralelo à 30ª Conferência
das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas
(COP30), terminou neste domingo (16), com palavras de encorajamento
do cacique Raoni Metuktire. Em uma mensagem aos participantes,
a liderança indígena lembrou que vem chamando
atenção do mundo há décadas
para a destruição do meio ambiente, das florestas
e dos modos de vida de povos originários e ancestrais.
“Há muito tempo,
eu vinha alertando sobre o problema que, hoje, nós
estamos passando, de mudanças climáticas,
de guerras”, disse Raoni.
“Mais uma vez, peço a todos que possamos dar
continuidade a essa missão de poder defender a vida
da Terra, do planeta. Eu quero que tenhamos essa continuidade
de luta, para que possamos lutar contra aqueles que querem
o mal, que querem destruir a nossa terra”, completou.
Raoni também criticou
os conflitos e guerras ao redor do mundo e cobrou mais amor
e defesa da vida. “Há muito tempo, eu venho
falando para que possamos ter respeito um com o outro e
possamos viver em paz nessa terra”, conclamou.
Após os cinco dias
de debates, mobilizações e manifestações
que marcaram Belém, a cúpula termina com um
“banquetaço”, na Praça da República,
no centro da capital paraenses, com a distribuição
de comida, feita pelas cozinhas comunitárias e celebração
cultural aberta ao público.
No ato encerramento da Cúpula
dos Povos, foi lida uma carta final, criticando o que os
participantes classificaram como “falsas soluções”
para o enfrentamento da emergência climática.
Reprodução/Tãnia
Rêgo/ABR
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“Nossa visão
de mundo está orientada pelo internacionalismo popular,
com intercâmbios de conhecimentos e saberes, que constroem
laços de solidariedade, lutas e de cooperação
entre nossos povos".
"As verdadeiras soluções
são fortalecidas por esta troca de experiências,
desenvolvidas em nossos territórios e por muitas
mãos. Temos o compromisso de estimular, convocar
e fortalecer essas construções”, diz
o documento.
O documento foi entregue
ao presidente da COP30, embaixador André Corrêa
do Lago, que prometeu apresentá-lo nas reuniões
de alto nível da COP, que serão realizadas
a partir desta segunda-feira (17).
“Não há
vida sem natureza. Não há vida sem a ética
e o trabalho de cuidado. Por isso, o feminismo é
parte central do nosso projeto político. Colocamos
o trabalho de reprodução da vida no centro,
é isso que nos diferencia radicalmente dos que querem
preservar a lógica e a dinâmica de um sistema
econômico que prioriza o lucro e a acumulação
privada de riquezas”, continua o documento.
Capitalismo e crise climática
A carta aponta o modo de produção capitalista
como causa principal da crise climática crescente
e ressalta que as comunidades periféricas são
as mais afetadas pelos eventos climáticos extremos
e o racismo ambiental.
O texto lembra que as empresas
transnacionais, a exemplo das indústrias de mineração,
energia, das armas, agronegócio e as Big Techs, são
as principais responsáveis pela catástrofe
climática.
A carta pede a demarcação
de terras indígenas e de outros povos; reforma agrária
e fomento a agroecologia; fim do uso de combustíveis
fósseis; financiamento público para uma transição
justa, com taxação das corporações,
agronegócio e dos mais ricos; e fim das guerras.
Além disso, cobra maior participação
dos povos.
“Cobramos que haja
participação e protagonismo dos povos na construção
de soluções climáticas, reconhecendo
os saberes ancestrais. A multidiversidade de culturas e
de cosmovisões, carrega sabedoria e conhecimentos
ancestrais que os Estados devem reconhecer como referências
para soluções às múltiplas crises
que assolam a humanidade e a Mãe Natureza”.
Guerras
O documento critica ainda o avanço da extrema direita,
do fascismo e das guerras ao redor do mundo e faz uma defesa
da Palestina e de seu povo. A carta cita os bombardeios
praticados pelo Estado “sionista” de Israel,
o deslocamento forçado de milhões de pessoas
e as dezenas de milhares de mortes de inocentes, a maioria
crianças, mulheres e idosos.
“Nosso repúdio
total ao genocídio praticado contra a Palestina.
Nosso apoio e abraço solidário ao povo que
bravamente resiste, e ao movimento de Boicote, Desinvestimento
e Sanções (BDS)”, diz a carta.
O texto também faz
críticas à ação militar dos
Estados Unidos, no mar do Caribe, com o pretexto de guerra
ao narcotráfico. Os integrantes da cúpula
afirmam que ações como essa têm caráter
imperialista de ameaça a povos e países da
região e da África.
"O imperialismo segue
ameaçando a soberania dos povos, criminalizando movimentos
sociais e legitimando intervenções que historicamente
serviram aos interesses privados na região. Nos solidarizamos
à resistência da Venezuela, Cuba, Haiti, Equador,
Panamá, Colômbia, El Salvador, República
Democrática do Congo, Moçambique, Nigéria,
Sudão, e com os projetos de emancipação
dos povos do Sahel, Nepal e de todo o mundo”, diz
a carta.
Participação
popular
A Cúpula dos Povos reuniu dezenas de milhares de
pessoas de movimentos sociais locais, nacionais e internacionais,
povos originários e tradicionais, camponeses/as,
indígenas, quilombolas, pescadores/as, extrativistas,
marisqueiras, trabalhadores/as da cidade, sindicalistas,
população em situação de rua,
quebradeiras de coco babaçu, povos de terreiro, mulheres,
comunidade LGBTQIAPN+, jovens, afrodescendentes, pessoas
idosas, dos povos da floresta, do campo, das periferias,
dos mares, rios, lagos e mangues.
O evento, considerado o
maior espaço de participação social
da conferência climática, começou na
última quarta-feira (12), em paralelo à COP30,
com críticas a ausência de maior participação
popular na COP30.
Para as cerca de 1,3 mil
organizações e movimentos que participaram
da cúpula, países e tomadores de decisão,
especialmente dos países ricos, têm se omitido
ou apresentado soluções absolutamente ineficientes,
colocando em risco a meta de 1,5°C do Acordo de Paris.
Na abertura, foi realizada uma “barqueata” na
orla da capital paraense, com centenas de barcos. Eles navegaram
pela Baía do Guajará em defesa da Amazônia
e dos povos tradicionais.
“Iniciamos nossa Cúpula dos Povos navegando
pelos rios da Amazônia que, com suas águas,
nutrem todo o corpo. Como o sangue, sustentam a vida e alimentam
um mar de encontros e esperanças. Reconhecemos também
a presença dos encantados e de outros seres fundamentais
na cosmovisão dos povos originários e tradicionais,
cuja força espiritual orienta caminhos, protege territórios
e inspira as lutas pela vida, pela memória e por
um mundo de bem viver”, diz a carta.
Ontem, cerca de 70 mil pessoas
participaram da Marcha Mundial pelo Clima, manifestação
que tomou as ruas de Belém com uma amostra expressiva
da diversidade cultural e social do povo amazônico.
A COP 30 (30ª Conferência
das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas)
realizada em 2025, na cidade de Belém, no estado
do Pará, marca a primeira vez que o evento acontece
na Amazônia. Essa conferência reúne líderes
mundiais, cientistas, ativistas e representantes da sociedade
civil para discutir e negociar ações globais
voltadas ao combate das mudanças climáticas.
O encontro é especialmente simbólico por ocorrer
em uma região que desempenha papel crucial na regulação
do clima do planeta, já que a Floresta Amazônica
é um dos maiores sumidouros de carbono do mundo.
A realização da COP 30 no Brasil representa
uma oportunidade para o país mostrar seu compromisso
com a preservação ambiental, a transição
energética e o desenvolvimento sustentável,
além de dar voz aos povos da floresta e às
comunidades locais que vivem os impactos diretos da crise
climática.
Da Agência Brasil
Fotos: Reprodução/Tânia Rêgo/Agência
Brasil