OPERAÇÃO DE RETIRADA DE GARIMPEIROS EM TERRAS DOS CINTA-LARGA RESULTA EM PRISÃO DE QUATRO ÍNDIOS

Panorama Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Abril de 2002

Nacoça Pio, João Cinta-Larga, Alzac Tataré e Amaral, caciques Cinta-Larga, presos desde o dia 20 de abril, foram soltos ontem à noite, (25/04) depois de passarem seis dias recolhidos à carceragem da Polícia Federal, em Porto Velho (RO). No mesmo final de semana, o garimpo dos Cinta-Larga, na Terra Indígena Roosevelt foi invadido por garimpeiros que dali haviam sido retirados. O saldo da invasão, não confirmado oficialmente, seria de 4 garimpeiros mortos e 28 feridos.

Os caciques Cinta-Larga foram presos no dia 20, em cumprimento a mandado de prisão preventiva expedido pela justiça, acusados de crimes como homicídio, favorecimento de garimpo ilegal, degradação ambiental, e ainda outros delitos como porte ilegal de armas. Todos pertencem à Terra Indígena Roosevelt, município de Espigão D´Oeste (RO), onde está instalado um garimpo de diamantes.

Fato que merece registro é que a ordem de prisão preventiva autorizada pelo juiz federal da 3ª Vara de Porto Velho, Selmar Saraiva da Silva Filho, datada de 12 de abril, incluía além dos quatro caciques que foram encarcerados, outras lideranças como o índio César Cinta-Larga,que havia sido assassinado em fevereiro.

Os caciques Pio, João, Tataré e Amaral são responsáveis pela intermediação com garimpeiros, índios, Ministério Público Federal, Polícia Federal e outros órgãos governamentais para a desintrusão daquelas terras.

Surpresa geral

A ação da Polícia Federal pegou de surpresa tanto índios quanto os procuradores da 6ª Câmara do Ministério Público Federal, responsável pelo caso, ao qual está dando prioridade absoluta.

A espinhosa missão aceita pelos caciques no começo do ano, implicava honrar um acordo feito com garimpeiros e depois rompê-lo – ou seja, administrar um duro período de transição -, além de convencer outros índios Cinta-Larga a colaborar, abandonando o garimpo. Com a entrada em cena do Ministério Público Federal e outros órgãos governamentais, a operação-retirada foi bem planejada e discutida para evitar confrontos. A prisão dos quatro caciques, em plena realização da operação, atrapalhou a estratégia montada pelo Ministério Público.

Caciques querem paralisação do garimpo

Os quatro caciques são exatamente os mesmos que lideraram a mudança de posição dos índios Cinta-Larga em relação ao garimpo. Quando perceberam ter perdido o controle das atividades no garimpo procuraram o Ministério Público Federal (MPF), no final do ano passado. Em fevereiro, eles entregaram um documento no qual pediam a paralisação do garimpo e se comprometiam a apoiar a retirada dos garimpeiros e de suas máquinas com a ajuda de todos os índios envolvidos na atividade.

Essa visita dos caciques foi precedida por um pedido de um grupo de mulheres Cinta-Larga que também queriam a paralisação das atividades do garimpo. Elas reclamavam que as relações internas, as condições de vida e o relacionamento com seus maridos e com a comunidade em geral estavam se deteriorando.

Compromisso assumido e assinado

Com o documento dos índios e o compromisso por eles assumido e assinado, procuradores do MPF foram a Cacoal (RO) e no dia 1º de março realizaram uma assembléia, na qual os índios reafirmaram seu compromisso. O MPF, então, relatou o fato ao delegado da cidade de Pimenta Bueno (RO) - que estava com o pedido de prisão preventiva das principais lideranças indígenas Cinta-Larga em mãos -, para que ele soubesse do acordo feito com os índios.

Durante a assembléia, o MPF tratou de outros assuntos como a saúde dos Cinta-Larga em função da desnutrição das crianças e alternativas de autosustentabilidade para eles foram debatidas.

Ao longo do mês de março, várias reuniões foram feitas reunindo a Funai, o Ibama, o Ministério da Justiça, a Presidência da República, a Procuradoria da República e a Secretaria de Direitos Humanos. O caso foi levado a uma reunião do Conselho dos Direitos da Pessoa Humana, a pedido do então ministro Aloísio Nunes Ferreira.

Começa a retirada

No dia 25 de março, iniciou-se a etapa de retirada dos garimpeiros, na qual mais de duas mil pessoas deixaram a área. Tudo correu normalmente até o sábado da prisão dos caciques, líderes do movimento pela paralisação do garimpo e a invasão do garimpo pelos garimpeiros retirados.

Na segunda-feira à noite (22/04) e na terça-feira, a comissão que está cuidando do caso, chamada força-tarefa, formada por procuradores de Rondônia, Mato Grosso e Brasília, a Funai, a PF, o Ibama, o Ministério do Meio Ambiente e convidados envolvidos na questão, deveria se reunir em Brasília com os caciques. Como estavam presos, o MPF reuniu-se mesmo assim e os procuradores deixaram claro que não aceitavam tais prisões, pedindo a revogação da prisão preventiva. Nada pior que essas prisões, naquele momento, para atrapalhar a estratégia que o Ministério Público vinha levando a cabo.

O MPF está estudando a hipótese de que as mortes ocorridas dentro do garimpo (em dezembro de 2001 e janeiro de 2002), pelas quais os índios foram acusados, podem ter sido causadas por brigas entre facções rivais de garimpeiros ali instalados.

Com a palavra, Pio Cinta-Larga

"Me pegaram dizendo que a gente tinha culpa. Eu tinha ido pedir para retirar os garimpeiros, mas a Federal dizia que tinha índio que queria os garimpeiros lá e nós não sabíamos", relatou Pio Cinta-Larga à reportagem do ISA, por telefone hoje de manhã. "Tínhamos combinado que íamos colaborar e por isso eles não iam prender a gente, tinha guerreiro lá no garimpo ajudando a tirar garimpeiro".

Os dias na prisão, entretanto, não abalaram a decisão dos caciques de lutar pela paralisação do garimpo. "Pretendemos continuar e cobrar mesmo do MPF e da PF para retirar os garimpeiros da área. E se meu companheiro índio não colaborar, vou denunciá-lo à polícia", avisa Pio. Ele lembrou também que como este é um ano eleitoral as coisas vão ficar difíceis. "Os políticos e candidatos vão vir em cima de nós índios".

Razões político-eleitoreiras

O temor de Pio tem razão de ser. Hoje, 26 de abril, o jornal "O Estadão do Norte", de Rondônia, publicou reportagem em seu site informando que o ex-prefeito de Ariquemes (RO), Ernandes Amorim, também ex-senador cassado, estava incitando os garimpeiros a invadir novamente o garimpo. Amorim deu declarações ao jornal admitindo ter sido ele a determinar a invasão ao garimpo no final de semana passado, que teria resultado na morte de quatro garimpeiros e em 28 feridos, informação não confirmada oficialmente. Amorim não parou por aí. Disse ao jornal frases como "terra de índio é para ser invadida" e "qualquer problema com a polícia, eu resolvo".

Na quinta-feira, Ernandes Amorim transformou a praça principal de Espigão D´Oeste em palanque, incitando os garimpeiros ali reunidos a invadir o garimpo. A população da cidade está preocupada com o que pode vir a acontecer. Teme-se uma tragédia no garimpo Cinta-Larga.

"Quatro caciques foram presos, depois soltos, mas a questão do crime organizado, que está se materializando na região, em função dos últimos acontecimentos, não foi abordada", diz a indigenista Maria Inês Hargreaves que acompanha de perto os casos envolvendo os índios Cinta-Larga.

O antropólogo João Dal Poz, da Universidade de Mato Grosso, que trabalha com os Cinta-Larga pergunta: "Que operação é essa que resultou na prisão de índios, que não retirou todos os garimpeiros da área e não prendeu nenhum peixe grande?"

 
 

Fonte: ISA – Instituto Socioambiental (www.socioambiental.org.br)
Assessoria de imprensa (Inês Zanchetta)

 
 
 
 
 
 

 

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