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RAPOSA SERRA
DO SOL: ENTIDADES EM APOIO E DEFESA DOS
DIREITOS INDÍGENAS ENVIAM CARTA À
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
Panorama
Ambiental
Brasília (DF) – Brasil
Janeiro de 2004
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Movimentos sociais,
organizações não governamentais
e religiosas encaminharam, hoje (30), carta à
Presidência da República posicionando-se
a respeito das violentas mobilizações,
organizadas no início de janeiro, por produtores
de arroz de Roraima contra a homologação
em área contínua da terra indígena
Raposa Serra do Sol.
No conteúdo do documento as oito entidades
chamam a atenção para as violências
cometidas contra os índios ao longo da história,
contestam as informações divulgadas
a respeito do número de não-índios
que vivem na terra indígena (657 e não
milhares como afirmam alguns políticos) e
reiteram sua confiança na homologação,
questionando o motivo da demora na homologação.
Além da Presidência da República,
cópias da carta foram encaminhadas ao Procurador
Geral da República, Cláudio Fontelles,
ao Presidente da Funai, Mércio Gomes, e aos
ministros da Casa Civil, José Dirceu, e da
Justiça, Marcio Thomaz Bastos.
Leia a seguir
o documento na íntegra:
Brasília, 28 de janeiro de 2004.
Exmo. Senhor
Luis Inácio Lula da Silva
Presidente da República
Brasília - DF
Senhor Presidente,
Estamos acompanhando com atenção o
desenrolar dos acontecimentos violentos desse início
de ano no estado de Roraima, comandados por uma
elite política e econômica que nunca
aceitou que os índios que lhes eram submissos
e serviam de peões em suas fazendas, pudessem
ter reconhecido seus direitos a terra. Esta mesma
elite valendo-se das relações de dependência
que criaram com um pequeno grupo de índios,
junto com eles, provocou uma série de atos
contra a homologação da terra indígena
Raposa Serra do Sol que são do Vosso conhecimento,
atos estes com ampla cobertura pela mídia
local de uma forma que enganou a população,
causou medo e xenofobia.
Sabemos que a história de libertação
de um povo normalmente é feita com muita
dor e sacrifício por causa da violência
dos dominadores e da forma ardilosa com que agem
para semear a divisão e dela tirar proveito
para manterem o domínio. Em Roraima não
tem sido diferente. Os povos Macuxi, Wapichana,
Ingaricó, Taurepang e Patamona habitantes
tradicionais da terra Raposa Serra do Sol, começaram
sua luta de libertação há aproximadamente
30 anos atrás com a certeza de que retomando
suas terras das mãos dos fazendeiros poderiam
garantir o futuro de seus povos.
Os poderosos locais, diante da luta legítima
dos índios, amparada pela Constituição
Federal, além do uso da violência,
buscaram desqualificar o trabalho dos aliados da
causa indígena, sobretudo da Igreja Católica,
FUNAI e de ONGs (normalmente não identificadas
claramente). A estes se atribui, sem o menor embasamento
na realidade, o papel de inimigos da Pátria
e do desenvolvimento do Estado. Outra arma usada
por esses setores é o da desinformação
distorcendo os dados em relação à
população não indígena
na Raposa Serra do Sol, sobre a história
do município de Uiramutã e a localização
da sede do município de Pacaraima e fazendo
terrorismo em relação a missionários
que são a favor dos direitos indígenas.
Para isso contam com a cumplicidade da maioria dos
meios de comunicação do Estado.
Levantamentos da Funai e do CIR atestam que não
existem mais do que 657 pessoas não-indígenas
na Raposa Serra do Sol e não milhares como
afirmam os políticos. O município
de Uiramutã foi criado, de má-fé,
em 1995, quando os limites da referida terra indígena
já haviam sido publicados pela FUNAI no Diário
Oficial da União. A intenção
foi criar mais um empecilho para a demarcação
da Raposa Serra do Sol. Da mesma forma, um grupo
de sete plantadores de arroz invadiu a terra indígena,
quando seus limites já eram conhecidos.
A imprensa tem divulgado que duas cidades precisariam
ser retiradas da Raposa Serra do Sol. Na verdade
nessa terra indígena só existe a sede
municipal de Uiramutã, local conhecido pelos
índios como corrutela de garimpo (ponto de
apoio ao garimpo ilegal na área), dentro
da maloca do Uiramutã. Nessa "cidade"
ou maloca (se olharmos do ponto de vista indígena)
existem apenas 27 famílias não-indígenas
compostas, sobretudo, por funcionários da
Prefeitura ou do Estado e pequenos comerciantes
responsáveis pela venda ilegal e distribuição
de bebida alcoólica aos indígenas,
com a intenção de criar divisões
entre as comunidades. Pacaraima está localizada
na terra indígena São Marcos já
homologada desde 1993.
O protesto extemporâneo nesse início
de ano, com atos de violência, pregação
à desobediência civil, fechamento de
estradas, preconceitos, discriminação
e outros atos contra a terra indígena Raposa
Serra do Sol já demarcada, foram motivados
pela crença dos opositores de que poderiam
ser revistos os limites dessa terra indígena
antes de ser homologada. Essa falsa expectativa
tem alimentado a esperança daqueles que não
medem esforços para inviabilizar os projetos
próprios de vida dos povos indígenas
em Roraima.
O Presidente da República tem dito reiteradas
vezes que não se mudam as regras de um jogo
durante a partida. Por isso temos a certeza de que
o Governo Federal procederá o mais rápido
possível, e ainda no mês de janeiro
como foi garantido pelo Ministro da Justiça,
a homologação de Raposa Serra do Sol,
nos termos da Portaria 820/98. O que não
entendemos é porque tanta demora em assinar
o decreto de homologação.
As comunidades indígenas localizadas na Raposa
Serra do Sol estão cansadas de tanto sofrimento
e espera. As comunidades, conseguiram manter a calma
diante das provocações que sofreram
nesses últimos dias, devido à promessa
do Ministro da Justiça de que o Presidente
da República finalmente assinaria o Decreto
de homologação nesse mês de
janeiro.
Agradecemos pela atenção que recebemos
do Grupo de Trabalho Interministerial que criado
por Vossa Excelência para tratar sobre a questão
fundiária de Roraima. Reiteramos o convite
para a 33ª Assembléia dos Tuxauas, a
ser realizada nos dias 6 a 10 de fevereiro de 2004,
na maloca Maturuca e solicitamos das autoridades
federais devida segurança a todas as lideranças
indígenas e convidados, participantes da
Assembléia.
Atenciosamente,
Conselho Indígena de Roraima - CIR
Diocese de Roraima
Conselho Indigenista Missionário - CIMI
Grupo de Trabalho Amazônico - GTA
Greenpeace
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST
Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil
- Conic
Comissão Pastoral da Terra - CPT
c.c. Ministro da
Justiça
c.c Ministro da Casa Civil
c.c. Procurador Geral da República
c.c Presidente da Funai
Fonte: Conselho Indigenista Missionário
(www.cimi.org.br)
Assessoria de comunicação