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MARINA SILVA
E CIRO GOMES RECEBEM PROPOSTAS PARA O DESENVOLVIMENTO
TERRITORIAL INTEGRADO E SUSTENTÁVEL
DA BR-163
Panorama
Ambiental
São Paulo (SP) Brasil
Abril de 2004
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A
ministra do Meio Ambiente e o ministro da Integração
Nacional participaram ontem (31/3) do encerramento
do encontro que reuniu desde segunda-feira (29/3)
cerca de 100 representantes de ONGs, movimentos
sociais, universidades, entre outros, na elaboração
da Carta de Santarém, documento que consolida
as propostas da sociedade civil.
Ontem (31/3), no
encerramento do encontro O Desenvolvimento que Queremos:
Ordenamento Territorial da BR-163, Baixo Amazonas,
Transamazônica e Xingu, a ministra do Meio
Ambiente (Marina Silva) e o ministro da Integração
Nacional (Ciro Gomes) receberam a Carta de Santarém
[na íntegra abaixo], que apresenta o plano
de desenvolvimento territorial integrado e sustentável
para a área de influência da BR-163.
Assinado pela Associação Terra Indígena
Xingu (ATIX), pelo Centro de Estudos, Pesquisa e
Formação de Trabalhadores do Baixo
Amazonas (CEFTBAM), pelo Fórum dos Movimentos
Sociais da BR-163, pelo Fórum Matogrossense
de Meio Ambiente e Desenvolvimento (FORMAD), pela
Federação dos Trabalhadores na Agricultura
do Estado do Pará (Fetagri), pela Fundação
Viver, Produzir e Preservar (FVPP), pelo Grupo de
Trabalho Amazônico (GTA), pelo Instituto Centro
e Vida (ICV), pelo Instituto de Pesquisa Ambiental
da Amazônia (IPAM) e pelo Instituto Socioambiental
(ISA), o documento apresenta propostas relacionadas
a infra-estrutura e serviços básicos,
ordenamento fundiário e combate à
violência, estratégias produtivas e
manejo de recursos naturais, fortalecimento social
e cultural das populações locais e
gestão ambiental, monitoramento e áreas
protegidas.
As instituições reivindicam que as
propostas do plano sejam incorporadas no planejamento
governamental e que o Grupo Interministerial da
BR-163 - formado por 15 ministérios para
coordenar a elaboração e implementação
de um plano de desenvolvimento sustentável
para a região de influência da rodovia
por meio de um decreto assinado pelo presidente
Lula no dia 15/3 -, seja um espaço permanente
de debate e de negociação envolvendo
representantes dos movimentos sociais, ONGs e instituições
de pesquisa para debater os programas e os projetos
para a região.
No fim de abril, as principais organizações
envolvidas no processo de mobilização
em prol da sustentabilidade da BR-163 realizarão
uma reunião com representantes do governo
federal em Brasília, para detalhar e discutir
as propostas da Carta de Santarém.
Carta de
Santarém
Essa carta apresenta
o resultado de debates e propostas do Plano de Desenvolvimento
Territorial Integrado e Sustentável da Região
de Influência da BR-163, que abrange 84 municípios
dos Estados do Pará e do Mato Grosso e envolve
aproximadamente 2 milhões de habitantes.
A BR-163 atravessa uma das regiões mais importantes
da Amazônia do ponto de vista da diversidade
social e biológica e das potencialidades
econômicas dos usos de seus recursos naturais.
Integram essa região trechos do Cerrado e
da Floresta Amazônica e uma Zona de Transição,
no Norte do Mato Grosso. Abrange também quatro
bacias hidrográficas (Rios Teles Pires, Tapajós,
Xingu e Araguaia) ricas em recursos naturais dos
quais dependem populações tradicionais,
agricultores familiares e mais de 30 etnias indígenas.
Essas populações geram uma economia
regional significativa baseada em diversos usos
e manejos dos recursos naturais, que ocupam mão-de-obra
e movimentam capital não contabilizado monetariamente
nas contas nacionais. A precariedade e a secundarização
de dados estatísticos sobre a representatividade
desta economia têm favorecido o discurso dos
grandes empreendedores como os únicos capazes
de dinamizar e alavancar o desenvolvimento dessa
região.
Reconhecemos a importância e reivindicamos
o asfaltamento da BR-163 e demais rodovias federais
e estaduais. No entanto, não se pode ignorar
que os métodos convencionais de construção
de grandes empreendimentos de infra-estrutura no
Brasil têm causado grandes impactos desestruturadores
das economias locais. Grande parte desses impactos
já está em pleno curso, com a intensificação
da grilagem de grandes áreas de terras públicas,
da violência e da conversão acelerada
de florestas e cerrados em monocultivos que empobrecem
as oportunidades econômicas da região.
Essas dinâmicas ocorrem de forma articulada
nos dois estados.
A ação na BR-163 exige a integração
dos governos (federal, estadual e municipal) e sociedade,
que assegure o ordenamento territorial e garanta
o devido lugar de destaque e importância para
os segmentos sociais e produtivos que fazem o uso
diversificado da base de recursos naturais dessa
região.
A gravidade dos problemas estruturais, já
existentes, associada ao projeto de asfaltamento
da BR-163 numa perspectiva reducionista, como mero
corredor de transporte para commodities agrícolas,
motivou uma ampla mobilização de organizações
representativas do movimento social (indígenas,
produtores familiares, extrativistas, entre outros),
de ONG, de órgãos governamentais e
de instituições de pesquisa, em quatro
pólos regionais, nos estados do Pará
e Mato Grosso.
A mobilização inter-regional possibilitou,
em 2003, a realização de quatro seminários,
reunindo mais de mil lideranças. Nesses encontros
deve ser destacada a elevada capacidade das organizações
e de seus representantes em formular diagnósticos
atuais, com profundo conhecimento dos problemas
existentes, disposição propositiva
e visão abrangente de políticas públicas.
Esse processo participativo produziu diagnósticos
e propostas para o estabelecimento das diretrizes
do Plano de Desenvolvimento Territorial Integrado
e Sustentável da Região de Influência
da BR-163. Os debates de quatro seminários
(Sinop-MT, Santarém-PA, Itaituba-PA e Altamira-PA)
foram sintetizados no presente Encontro consensualizando
a CARTA DE SANTARÉM, priorizando as seguintes
linhas de desenvolvimento:
1. Infra-Estrutura e Serviços Básicos
O asfaltamento da BR-163 deve ser acompanhado do
asfaltamento da Transamazônica, de rodovias
estaduais e da abertura e manutenção
de estradas vicinais. Propõe-se um sistema
viário que integre a construção
de rodovias com terminais fluviais, rodoviários
e rodofluviais projetados prioritariamente para
o fortalecimento da economia regional.
Os investimentos em infra-estrutura devem abranger,
de forma integrada, o abastecimento e a distribuição
de água tratada, a eletrificação
rural (convencional e/ou alternativa) e o saneamento
em todos dos núcleos e urbanos e rurais das
regiões incluídas neste Plano. Deve-se
incluir também, a expansão dos serviços
de correios, bancários e previdência
social, bem como expandir o financiamento de casas
populares rurais.
Na área de educação, é
necessário construir e equipar instituições
apropriadas para os ensinos fundamental e médio
(casas familiares rurais), além de fortalecer
instituições pesquisa e ensino para
darem suporte ao conhecimento científico
e tecnológico para fortalecer a economia
local. O esporte, lazer e a comunicação
comunitária também devem receber investimentos.
Para a segurança pública, é
preciso instrumentalizar as delegacias municipais
para desempenhar com mais eficiência as atividades
de combate à violência.
Na área de saúde, deve-se implementar
programa de saúde preventiva para famílias
rurais e urbanas e uma rede de atendimento à
saúde pública devidamente equipada
e adequada às demandas da região.
A implantação de laboratórios
de pesquisa e manipulação de produtos
medicinais regionais, considerando o resgate do
conhecimento popular tradicional, deve receber investimentos.
2. Ordenamento Fundiário e Combate
à Violência
O ordenamento fundiário e o combate à
violência devem ser ações prioritárias
para iniciar o processo de governabilidade e o Estado
de Direito na região. Este processo deve
ter a participação efetiva da sociedade
civil organizada e considerar as propostas existentes
no Plano de Desenvolvimento Territorial Integrado
e Sustentável da Região de Influência
da BR-163. Esta mesma definição estratégica
deve estar presente na composição
da força tarefa proposta, entre Ministério
Público Federal, Ministério Público
Estadual, Polícia Civil e Polícia
Federal, entre outros, objetivando dar condições
à ação imediata dos órgãos
públicos de execução e fiscalização,
a segurança pública da região
e ao combate à violência no meio rural.
Garantir as atuais áreas ocupadas por produtores
familiares, quilombolas, populações
tradicionais e indígenas na região.
Construir e implementar o Zoneamento Ecológico-Econômico
através de metodologias participativas, com
a inclusão de variáveis sociais e
ambientais.
Regularizar e consolidar as áreas protegidas,
tais como a PDS Anapu, as Reservas Extrativistas
Verde para Sempre, Renascer, Bacajá, Riozinho
do Anfrísio e o mosaico de Unidades de Conservação
da Terra do Meio.
Incorporar às Terras Indígenas parcelas
importantes de territórios tradicionais de
etnias que não foram contempladas nos processos
demarcatórios, bem como, promover a fiscalização
e vigilância dos seus limites, controlar as
atividades agropecuárias e extrativistas
no seu entorno e proceder as demarcações
e homologações pendentes.
3. Estratégias Produtivas e Manejo
dos Recursos Naturais
É fundamental manter e potencializar a diversificação
dos sistemas produtivos locais, agregando valor
à produção, com base em arranjos
produtivos que utilizem a biodiversidade e os recursos
florestais e pesqueiros; e implementar políticas
integradas de financiamento, legislação
diferenciada e assistência técnica,
privilegiando a inserção de pequenos
e médios empreendimentos geradores de empregos
locais duráveis.
Deve-se incentivar o manejo florestal com legislação
diferenciada para a escala da produção
familiar bem como estabelecer linhas de microcrédito
solidário como, por exemplo, a criação
de novos pólos do Programa de Desenvolvimento
Socioambiental da Produção Familiar
Rural (Proambiente) e a incorporação
de áreas alteradas/degradadas ao processo
produtivo.
4. Fortalecimentos Social e Cultural das Populações
Locais
É imprescindível dotar as populações
da região de condições indispensáveis
ao usufruto da cidadania com garantias institucionais
de funcionamento de um Estado de Direito, como condição
fundamental para o desenvolvimento ordenado da região.
A garantia dos direitos humanos exige a imediata
criação de uma força-tarefa
para investigar e punir os casos de violências
cometidas por grupos de extermínio, latifundiários,
traficantes, agentes de segurança do Pará
(Terra do Meio - Altamira, Itaituba, Santarém,
Novo Progresso, Almerim, Óbidos e Anapu)
e Mato Grosso (Lucas do Rio Verde, São Félix
do Araguaia e Querência) e a instalação
de delegacias regionais da Polícia Federal.
É necessário democratizar os meios
de comunicação, por meio de programas
de estímulo a criação e a legalizaçao
de TVs e rádios comunitárias, adequadas
à realidade amazônica. É fundamental
adequar os processos educativos, de formação
e capacitação para agricultores familiares
e populações indígenas, principalmente
no que se refere à criação
e fortalecimento de cursos acadêmicos em nível
médio e superior para profissionalizar técnicos.
Fortalecer modelos diferenciados de formação
para povos indígenas.
Destinar recursos financeiros e prestar assessoria
técnica à implementação
do Estatuto das Cidades e à elaboração
dos Planos Diretores Urbanos dos municípios
abrangidos neste Plano.
5. Gestão Ambiental, Monitoramento
e Áreas Protegidas
Garantir a proteção das Unidades de
Conservação (UCs), Terras Indígenas
(TIs) e manter corredores ecológicos entre
as diferentes áreas. Para isso, é
preciso desenvolver e incorporar no processo de
licenciamento ambiental a localização
das áreas de Reserva Legal contíguas
às UCs, TIs e Áreas de Preservação
Permanente, para que garantam conectividades ecológicas.
Deve ser incentivada a criação de
novas áreas protegidas, contemplando as diferentes
formações florestais, bem como implantar,
urgentemente, os mosaicos de unidades de conservação
da Terra do Meio, Verde para Sempre e Renascer.
É necessário também implementar
as UCs já instituídas, como a Estação
Ecológica do Rio Ronuro, a Reserva Ecológica
do Culuene, o Parque Estadual do Cristalino e o
Parque Nacional da Amazônia, utilizando divisas
naturais e criando bases administrativas locais.
Compensar o passivo ambiental dos assentamentos
de reforma agrária e propriedades privadas
onde não há Reserva Legal, conforme
previsto no Código Florestal, com a criação
de novas UCs.
A criação de uma faixa de proteção
de 10 quilômetros no entorno das Terras Indígenas,
pode ser uma solução para o ordenamento
do processo de ocupação e o controle
das atividades econômicas, de forma a minimizar
seus impactos negativos sobre as terras e populações
indígenas.
É necessário capacitar os órgãos
governamentais para implementar a gestão
participativa de políticas ambientais, bem
como criar delegacias especiais de meio ambiente.
Tendo em vista o esforço de debate e elaboração
das propostas que constituem o Plano de Desenvolvimento
Territorial Integrado e Sustentável da Região
de Influência da BR-163, as organizações
que assinam a Carta de Santarém propõem:
Que a abrangência territorial de impacto da
construção da BR-163, considere como
regiões de influência o Norte do Mato
Grosso e Oeste do Pará, incluindo as bacias
do Xingu, Araguaia, Teles Pires e Tapajós;
que as ações propostas neste Plano
sejam incorporadas pelo planejamento governamental;
que o Grupo de Trabalho Interministerial da BR-163
seja instituído como um espaço permanente
de debate e de negociação envolvendo
representantes dos movimentos sociais, ONGs e instituições
de pesquisa para debater os programas, as políticas
e os projetos para a região.
Santarém 31
de março de 2004
Associação Terra Indígena Xingu
- ATIX
Centro de Estudos, Pesquisa e Formação
de Trabalhadores do Baixo Amazonas -CEFTBAM
Federação dos Trabalhadores na Agricultura
do Estado do Pará - Fetagri
Fórum dos Movimentos Sociais da BR-163
Fórum Matogrossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento
- FORMAD
Fundação Viver, Produzir e Preservar
- FVPP
Grupo de Trabalho Amazônico - GTA
Instituto Centro e Vida - ICV
Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia
- IPAM
Instituto Socioambiental - ISA
Fonte: ISA – Instituto Socioambiental
(www.socioambiental.org.br)
Assessoria de imprensa (Cristiane Fontes)