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DISCURSOS
NO LANÇAMENTO DO PROGRAMA NACIONAL
DE FLORESTAS 2004-2007
Panorama
Ambiental
Brasília (DF) – Brasil
Fevereiro de 2004
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Íntegra
dos discursos pronunciados durante o lançamento
do novo Programa Nacional de Florestas (PNF), no
dia 5 de fevereiro, no Palácio do Planalto,
em Brasília.
Presidente
Luiz Inácio Lula da Silva
Minha querida companheira Marina, ministra do Meio
Ambiente, meus companheiros ministros, parlamentares,
meu companheiro Miro Teixeira, líder do Governo,
senhoras e senhores embaixadores acreditados junto
ao Governo brasileiro, meu companheiro Dulci, meu
companheiro Jaques Wagner, meus caros empresários,
meus caros representantes do movimento social aqui
presentes, meus amigos e minhas amigas.
A história jamais cobrou tanta coerência
da humanidade como agora no século XXI. Vivemos
uma espécie de ajuste de contas. Um marco
divisor entre o fim de uma era e o credenciamento
para um novo ciclo. A principal carta posta na mesa
questiona nossa capacidade de conciliar desenvolvimento,
justiça social e progresso com o meio ambiente.
Trata-se de um imperativo estrutural e não
uma escolha técnica. Uma questão de
sobrevivência. Um projeto de civilização
e não apenas de governo. Diferentes indicadores
atestam que a exploração inadequada
dos ecossistemas terrestres já ameaça
a capacidade de regeneração da vida
no planeta.
A natureza não deve ser encarada como um
museu de relíquias intocáveis. Mas,
definitivamente, ela não pode mais ser atropelada
por processos econômicos baseados na espoliação
humana e ambiental.
Trata-se, portanto, de construir uma nova base de
equilíbrio que se apóie na repartição
das riquezas de forma justa e sustentável.
Sem isso, fica muito difícil cultivar a semente
do futuro ela não germina em terra arrasada.
Essa repactuação do desenvolvimento
com a vida orientou o Programa Estratégico
de Fomento Florestal, para 2004-2007.
Quero ressaltar que hoje, aqui, apresentamos também
mais um canal de diálogo entre Governo e
sociedade, com a posse dos membros da Comissão
Coordenadora do Programa Nacional de Florestas o
Conaflor.
São representantes das organizações
não-governamentais, da comunidade científica,
dos trabalhadores e dos setores produtivos, além
dos integrantes do governo. A partir de agora eles
acompanharão as ações do Programa
para garantir que nossos objetivos sejam plenamente
alcançados.
O Brasil, como já foi dito, possui a segunda
maior área florestal do planeta: 550 milhões
de hectares de matas distribuídos em 60%
de nosso território. Abdicar dessa riqueza
seria renunciar à capacidade nacional de
formular um projeto de desenvolvimento sustentável.
Pior ainda: seria compactuar com a lógica
da exploração predatória, que
ocuparia o vazio deixado pela omissão pública.
O Brasil já pagou um preço elevado
por dissociar natureza e progresso: 600 mil quilômetros
quadrados da Amazônia foram derrubados; mais
de 20 mil quilômetros quadrados ainda tombam
a cada ano; a Mata Atlântica reduziu-se a
7% de sua extensão original; ecossistemas
preciosos, como a Caatinga nordestina, se enfraqueceram
sob pressão insuportável.
Para reverter essa trajetória, o Programa
Nacional de Florestas estabelece dois eixos: expansão
da nossa base florestal plantada em conjunto com
a recuperação de áreas degradadas;
e expansão da área de florestas naturais
manejadas de forma sustentável, com a proteção
dos ecossistemas de maior diversidade ecológica.
Criamos, então, linhas de crédito
com prazos adequados às condições
do setor florestal, acompanhadas de assistência
técnica, apoio à pesquisa e ao desenvolvimento
tecnológico bem como um novo marco regulatório
do manejo sustentável das florestas nativas.
A primeira meta desse programa é promover
o plantio de 2 milhões de hectares de florestas
até 2007. Nossa base florestal já
foi de 6 milhões e meio de hectares. Hoje
reúne cinco milhões, com um déficit
de produção equivalente a 200 mil
hectares por ano.
No clima brasileiro uma floresta plantada dá
corte em sete anos, dependendo da árvore
não é, Marina? Eucalipto, por exemplo.
Na Escandinávia ou no Canadá, que
lideram o mercado mundial de madeira, esse ciclo
pode demorar 40 anos. Temos apenas 2% desse mercado
enquanto a Finlândia, por exemplo, cujo território
equivale à metade de Minas Gerais, tem 8%
dele.
Expandir a atividade florestal brasileira não
é apenas um bom negócio. Trata-se
de uma oportunidade para criar um cinturão
verde sustentável, que proteja a mata nativa
e gere inclusão social. Para isso, é
necessário expandir plantios certificados
com selo verde internacional, que hoje representam
apenas 20% dos projetos existentes.
Queremos ainda incorporar ao crescimento do setor
um forte segmento de agricultura familiar, permitindo
que o pequeno agricultor possa se tornar também
um produtor florestal. É exatamente isso
o que pretende esse programa. Projetos empresariais
vão assegurar 60% do plantio previsto até
2007. Os outros 40% ficarão a cargo de 100
mil pequenos produtores.
Plantar florestas é investir no futuro. Quando
elas forem colhidas, teremos 400 milhões
de metros cúbicos de madeira e mais de 15
bilhões de dólares em produtos de
base florestal. Meus amigos e minhas amigas, 45%
da Amazônia pertencem ao Estado brasileiro.
E 83% dela têm níveis pluviométricos
incompatíveis com atividades que promovam
a retirada da mata e o desnudamento do solo. Nos
anos 80, o pioneirismo ambiental de Chico Mendes
provou que era possível gerar trabalho e
renda com a floresta em pé. Hoje, a ciência
e o mercado convergem nessa direção.
Dezesseis anos após o seu assassinato, tenho
orgulho de anunciar que o Estado brasileiro decidiu
transformar o sonho de Chico Mendes em uma política
nacional de manejo sustentável de florestas.
Essa é justamente a segunda meta do nosso
Programa: agregar 15 milhões de hectares
de florestas públicas ou privadas a essa
atividade para gerar 100 mil ocupações
produtivas e incorporar 30 mil famílias à
terra sendo 20 mil em assentamentos florestais da
reforma agrária.
A exploração certificada ajudará
o Brasil a preservar espécies nativas, como
o mogno, que desde outubro passado dispõe
de regras de manejo e rastreamento para coibir o
comércio ilegal. Ano passado, por exemplo,
com a venda do mogno apreendido, foi possível
investir mais de 4 milhões de reais em um
fundo que está beneficiando a população
da região de Altamira com projetos de geração
de empregos e proteção à natureza.
Nos próximos quatro anos vamos aplicar os
mesmos princípios à extração
seletiva e criteriosa de 40 milhões de metros
cúbicos de tora e produtos da floresta. O
conjunto deve gerar uma receita de 2 bilhões
de dólares até 2007.
Finalmente, nosso programa prevê um esforço
para reverter o mais criminoso dos desperdícios:
o desmatamento que se transforma exclusivamente
em devastação e abandono. Um terço
das derrubadas feitas na Amazônia criaram
apenas desertos na floresta sem nenhum aproveitamento.
Mas não só lá. Outros ecossistemas
brasileiros, como a Caatinga, também exibem
enormes cicatrizes.
No Nordeste, mais de 30% da matriz energética
ainda depende da extração de lenha.
Feita sem critérios e sem reposição,
ela avança por áreas de reserva legal
e corredores fluviais, onde se concentram as maiores
taxas da biodiversidade regional.
Nosso projeto para a Caatinga vai investir 12 milhões
de reais em 160 municípios do semi-árido
nordestino e do Norte de Minas Gerais, em projetos
de recuperação de mata nativa, corredores
ecológicos produtivos e reflorestamento em
especial nas bordas do São Francisco.
Essa mesma preocupação orientará
a aplicação de outros 10 milhões
de reais em investimentos na recuperação
de nascentes, através do Fundo Nacional do
Meio Ambiente. E mais 15 milhões de reais
na recuperação de 20 mil hectares
de matas ciliares em todo o País, através
do Programa Piloto de Proteção às
Florestas Tropicais.
Meus companheiros
e minhas companheiras
Para associar a exploração florestal
brasileira a essa dinâmica estamos alocando
créditos de 1 bilhão e 800 milhões
de reais até 2007, através do BNDES,
PRONAF-Flora e PROP-Flora, Banco do Nordeste e Basa.
Adicionalmente, mais 150 milhões de reais
serão investidos em capacitação,
assistência técnica, pesquisa e desenvolvimento
tecnológico.
O desenvolvimento justo e sustentável é
o caminho que nos permitirá construir um
século XXI melhor para todos. É por
ele que a humanidade poderá viver dignamente
e a Terra persistirá com toda a sua riqueza
e diversidade naturais. Portanto, quero desejar
aos membros do Conaflor boa sorte e um bom trabalho
nessa missão de preservar e ampliar as nossas
florestas.
Eu quero dizer aos empresários que, com a
criação do Conaflor, a Marina coloca
em prática um discurso e uma prática
nova no Brasil. A companheira Marina disse, logo
no início do Governo, que não queria
ser a ministra que passasse para a História
como uma pessoa que só sabia dizer não
ou dizer que não podia. Ela queria passar
para a História como a ministra que, ao invés
de dizer não, discutisse como fazer o melhor
possível para que a gente pudesse lidar com
os ecossistemas, com a biodiversidade, sem que isso
pudesse causar prejuízo às futuras
gerações. E é isso que ela
fez, com muita paciência, nem sempre compreendida.
Mas uma coisa fica clara neste evento de hoje: nós
provamos que, quando há diálogo, quando
há disposição do Governo e
da sociedade para sentar em torno de uma mesa e
conversar, os resultados normalmente são
melhores e para todos.
Nós tivemos uma primeira conversa com os
empresários do setor de florestamento em
março do ano passado. E eu senti, naquela
reunião, como sentiu a Marina, o ministro
Roberto Rodrigues e o ministro Furlan, que os empresários
que estavam sentados àquela mesa também
se interessavam por uma política de floresta
que pudesse levar em conta a manutenção
do nosso ecossistema, da nossa biodiversidade. E
que, ao mesmo tempo, a gente poderia fazer a política
correta, até porque, se não fizermos,
teremos problemas na nossa relação
com o mundo lá fora, que está cada
vez mais exigente.
Eu senti, naquela primeira reunião que fiz
com os empresários, que nós não
teríamos problemas e nem enfrentamento se
fôssemos capazes de produzir uma boa política
para utilizar a floresta como forma de produzir
empregos e geração de riqueza para
o nosso povo. Hoje, isso está consagrado,
aqui, pelo discurso do Ministério do Meio
Ambiente, pelo discurso dos empresários e
pelo discurso da nossa companheira que falou em
nome do movimento social. Só lembrando que
não tenho como fazer o Senado andar mais
rápido que o seu próprio tempo. Mas
eu acho que vai mais rápido do que foi no
passado.
Por último, quero dizer a vocês que
estamos vivendo um momento da humanidade em que
não perderemos nada se fizermos as coisas
corretas. Se não ganharmos 1 milhão
como a gente quer ganhar este ano, poderemos ganhá-lo
no ano que vem, pois precisamos de um tempo adequado
para discutir bem cada coisa que iremos fazer, para
não permitir que aconteça, daqui para
a frente, o que estamos vendo, hoje, no Brasil.
Ontem, fui a dois estados brasileiros na verdade,
a três, porque indo a Petrolina, tenho que
ir a Juazeiro. Portanto, fui a Pernambuco, à
Bahia e fui ao estado do Piauí. E, vamos
ser francos: grande parte das enchentes no Brasil
ocorrem, primeiro, pela quantidade das chuvas, que
estão caindo mais do que deviam. Nós
temos cidades no Nordeste onde, nos últimos
dez anos, chovia, em média, 50 milímetros
no mês de janeiro. Agora, choveu 400, 500,
300, 280 milímetros. Portanto, não
existe poder ainda e é bom que seja assim
para a humanidade controlar a força da natureza.
Segundo: além da quantidade de água,
que é demais, há um pouco de irresponsabilidade
histórica no nosso país. Eu visitei
lugares onde as pessoas moram praticamente num buraco.
E é certo que, com qualquer chuva um pouco
mais forte, aquilo vai encher de água, como
as enchentes de São Paulo, mesmo que se possa
construir tudo que for possível construir
em São Paulo. A verdade é que, de
forma inadequada, as pessoas pobres vão para
a beira de córregos ou para as encostas de
morros, porque não têm para onde ir.
Num passado não muito longínquo, pessoas
que não tinham consciência ganharam
dinheiro vendendo loteamentos em áreas que
não podiam ser loteadas. São muitos
os culpados. Confesso a vocês que fico com
pena dos prefeitos em épocas de chuva, porque,
quando dá um trovão, já fica
todo mundo preocupado, porque sabe que há
lugares que vão encher São Paulo,
Rio de Janeiro, Minas Gerais, Belo Horizonte, Belém,
Rio Branco porque as pessoas estão ocupando
lugares inadequados e, normalmente, são a
parte mais pobre da população.
O que estamos fazendo aqui, hoje, é um sinal
para a sociedade brasileira. Não custa nada
a gente fazer as coisas corretamente, não
custa nada a gente discutir um dia a mais, não
custa nada a gente pensar naqueles que virão
depois de nós e lembrar que temos responsabilidade
porque alguns fomos nós que pusemos no mundo
e, portanto, temos que cuidar deles com muito carinho.
Quero desejar a vocês, que foram empossados
hoje, que já se reuniram ontem, toda a sorte
do mundo. Quero dizer para vocês que vale
a pena, muitas vezes, a gente não tomar uma
decisão precipitada num determinado momento
e esperar um outro momento até que a gente
consiga ouvir alguém mais inteligente, alguém
com mais bom senso. E vale a pena, em cada passo
que a gente der, saber que passo estamos dando,
quem a gente vai beneficiar e quem a gente vai prejudicar,
porque, certamente, não queremos dar passos
para prejudicar ninguém.
Meus parabéns, companheira Marina, meus parabéns,
Capobianco, meus parabéns, empresários
e representantes da sociedade. Que Deus os ajude
a continuarem se aperfeiçoando cada vez mais.
Muito obrigado.
Ministra
do Meio Ambiente, Marina Silva
Com aproximadamente 65% do nosso território
coberto por florestas, o Brasil é por natureza
um país Florestal. Entretanto, durante grande
parte de nossa história as políticas
públicas (na era colonial, no império
e na república) travaram uma luta contra
a floresta. O resultado foi uma perda significativa
do nosso patrimônio florestal como ilustra
a saga da mata atlântica reduzida a 7% de
sua cobertura original. Esse descaso trouxe prejuízos
não apenas ambientais, mas representou perda
de renda e emprego para milhares de brasileiros
da zona rural.
A floresta é uma fonte renovável de
bens e serviços para todos nós. Cada
brasileiro convive diariamente com os produtos da
floresta desde a madeira usada nos móveis,
passando pelos frutos, óleos, fármacos
até o papel. A floresta também presta
um serviço ainda não remunerado, porém
essencial no equilíbrio do clima, na proteção
das nossas bacias hidrográficas, na contenção
dos efeitos, (muitas vezes trágicos) das
enchentes. Finalmente, as florestas brasileiras
têm o papel fundamental de abrigar a maior
biodiversidade do planeta de valor social, econômico
e cultural incalculável e de importância
vital para o futuro da humanidade.
Eu gostaria de aproveitar esse momento para fazer
um breve balanço de ações realizadas
pelo Governo do Presidente Lula na área florestal.
Inicialmente tivemos que fazer um inventário
dos problemas existentes. Por exemplo, a gravíssima
situação do mogno: grandes estoques
de mogno apreendidos pelo Ibama apodrecendo nas
margens do rio Xingu no sul do Pará e ausência
de regras para garantir o uso sustentável
e a conservação da espécie.
Com apoio decisivo do Ministério Público
Federal e da articulação com o Ministério
da Agricultura e Pecuária, através
da Embrapa e várias organizações
sociais, o mogno confiscado foi destinado para a
criação de um fundo cuja finalidade
é apoiar projetos de uso sustentável
na região de Altamira, Pará. Esse
fundo no valor de R$ 4,7 milhões está
sendo administrado pela organização
social FASE, em parceria com mais de 120 organizações
comunitárias daquela região. Além
disso, estabelecemos as novas regras para o manejo
sustentável e conservação do
mogno.
O setor florestal é essencialmente uma área
transversal. Por isso, enfatizamos as políticas
públicas tais como crédito, reforma
agrária, infra-estrutura e ordenamento fundiário
que têm impacto decisivo na área florestal.
Em parceria com os Ministérios da Integração
Nacional e Desenvolvimento Agrário e o Banco
da Amazônia, definimos uma nova política
de crédito para a Amazônia que prioriza
pela primeira vez as atividades florestais. Temos
o prazer de anunciar que já para o exercício
de 2004 o Banco da Amazônia alocou R$ 140
milhões, quase triplicando os recursos destinados
em 2002, para financiar manejo florestal sustentável
e atividades extrativistas na região.
A transversalidade da política florestal
colheu frutos também na política de
reforma agrária. Em parceria com Ministro
do Desenvolvimento Agrário, através
do Incra, estabelecemos um novo modelo de reforma
agrária para a Amazônia voltada para
o uso florestal sustentável, ao invés
dos assentamentos unicamente agrícolas do
passado. Esses primeiros assentamentos florestais
já estão sendo criados na Amazônia.
Tivemos avanços importantes na promoção
do manejo florestal como, por exemplo, a criação
do Centro Nacional de Apoio ao Manejo Florestal
(Cenaflor) e no fortalecimento da assistência
técnica. Além disso, o Ibama vem trabalhando
para reduzir a burocracia e simplificar as normas
para o manejo e o reflorestamento. Por outro lado,
decidimos tornar ainda mais rigorosa a fiscalização
contra operações florestais ilegais
em todo o País. Esse esforço tem tido
a parceria fundamental do Ministérios da
Justiça (através da polícia
federal), Ministério da Defesa, Governos
estaduais e várias organizações
sociais.
Com o setor de florestas plantadas, um segmento
que é referência mundial por sua excelência
tecnológica, definimos um plano de metas
que incorpora as lições do passado,
e estabelece a ampliação da base plantada
apenas nas áreas desmatadas, ao mesmo tempo
em que prioriza a inserção dos pequenos
produtores e a recuperação das áreas
degradadas com espécies nativas.
Por último, temos a satisfação
de anunciar a criação do Conaflor,
a Comissão Coordenadora do Programa Nacional
de Florestas, expressando o compromisso do Governo
Lula com o controle social. O Conaflor irá
propor e avaliar as medidas para que possam ser
cumpridos os princípios e as diretrizes das
políticas públicas para o setor florestal.
A composição dessa Comissão
é ampla e inclui representantes dos governos
federal e estaduais, comunidade científica,
trabalhadores, ambientalistas e setor produtivo.
Instituto
Socioambiental, Adriana Ramos
A criação dessa Comissão, senhor
presidente, deveria, em nossa opinião, representar
a histórica inserção da questão
florestal entre as prioridades da ação
de governo. Em cinco séculos, esse país
não soube reconhecer e valorizar seu recurso
florestal, de maneira a aproveitar e distribuir
seus benefícios. A perda do patrimônio
florestal, devida à sua conversão
para outros usos, atingiu em 2002 seu nível
maior. Tal perda nunca foi contabilizada como passivo
nas estatísticas que apresentam determinados
resultados de expansão de atividades agrícolas
e pecuárias.
Senhor. Presidente, nas últimas semanas algumas
regiões do País, e notadamente o estado
de São Paulo, estão passando por uma
situação peculiar e paradoxal: por
um lado, seus reservatórios de água
estão no mais baixo nível da história,
o que vai impor um racionamento de água sem
precedentes já a partir de março,
com óbvios impactos na produção
econômica e na saúde das famílias
mais pobres. Estudos recentes do projeto LBA - Experimento
de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera - comprovam
que a redução das chuvas em São
Paulo no período crítico (outubro-dezembro)
tem relação direta com o desmatamento
na Amazônia meridional. Por outro lado, a
falta de capacidade de retenção das
chuvas atuais por parte dos solos e a erosão
das encostas (todos fenômenos devidos ao desmatamento
local) gerou nas últimas 4 semanas mais de
100 mortes e perdas econômicas incalculáveis
nas regiões Sudeste e Nordeste como um todo.
A perda de cobertura florestal traz, em suma, um
legado que o país não quer e não
deve enfrentar. O senhor conhece suficientemente
o que significa para os mais pobres enfrentar a
escassez de água, e temos certeza de que
não vai permitir que novos brasileiros venham
a sofrer, no bolso e no corpo, pelos efeitos do
desmatamento.
Hoje, entretanto, é possível criar
as condições, por meio de uma ação
integrada de controle, ordenamento e fomento, para
gerar em diversas regiões do país
uma economia de base florestal sustentável.
Esta pressupõe um elevado grau de coordenação
entre sociedade e governo e dentro do próprio
governo, pois está baseada em sinergias estratégicas.
É urgente unir esforços entre os setores
privado, público e o chamado terceiro setor
para a adoção deste modelo. Fatores
críticos, como demanda de certos mercados
domésticos e internacionais por produtos
e serviços sustentáveis, estão
do nosso lado.
De acordo com o seminário Certificação
Florestal na Amazônia: avanços e oportunidades
realizado em Belém em junho de 2003 com a
presença da senhora Ministra do Meio Ambiente
Marina Silva e do Ministro da Integração
Nacional Ciro Gomes, uma economia com base em práticas
de manejo sustentável pode apenas na Amazônia
- gerar 500 mil empregos formais - diretos e indiretos
- no período do PPA 2004-2007, utilizando
apenas fundos já existentes para a região,
com efeitos importantes sobre o consumo regional
e a poupança. O senhor tem uma oportunidade
histórica a respeito, privilegiando um modelo
que usa a floresta em detrimento de outro que visa
meramente substituí-la. Ao fazer isso, é
preciso priorizar - e defender o espaço -
da produção familiar e do extrativismo,
que fixam as pessoas no campo. A Comissão
criada hoje pode ajudar o senhor a fazer isso com
a devida transparência, participação
e efetividade.
Temos certeza também de que o Senhor não
abriu mão de concretizar seu compromisso
assumido em novembro na primeira Conferência
Nacional de Meio Ambiente, a respeito de "aprovar
no Congresso Nacional a lei da Mata Atlântica".
Para tanto, está claro que é preciso
ainda de um esforço adicional de sua parte,
para dar o último e decisivo passo após
uma longa e demorada jornada de mais de uma década.
No esforço para firmar o Brasil como potência
florestal, o senhor terá as entidades da
sociedade civil como aliadas: e o papel de um aliado
confiável é também o de alertar
sobre o risco de comprometer o patrimônio,
sem o qual não há política
possível. Essa é a diferença
entre o Brasil e a maioria dos países que
hoje não têm mais essa opção.
Como bem resumiu o antropólogo Eduardo Viveiros
de Castro: "devastamos mais da metade de nosso
país acreditando que era preciso deixar a
natureza para entrar na história; pois eis
agora que esta última, com sua costumeira
predileção pela ironia, exige-nos
como passaporte justamente a natureza".
Bom trabalho a todos.
Fonte: Ministério do Meio
Ambiente (www.mma.gov.br)
Assessoria de imprensa