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FUNASA INVOCA
SOBERANIA NACIONAL E ROMPE PARCERIA COM
A URIHI-SAÚDE YANOMAMI
Panorama
Ambiental
Brasília (DF) – Brasil
Junho de 2004
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Após uma
transição de quatro meses, a Fundação
Nacional de Saúde (Funasa) manteve a decisão
de afastar a ONG brasileira URIHI- Saúde
Yanomami da assistência médica direta
ao povo Yanomami que ela exercia com sucesso desde
o fim de 1999. O motivo da decisão alegado
pela Funasa é que o atendimento à
saúde aos povos indígenas constituiria
uma questão de soberania nacional. O órgão
do Ministério da Saúde decidiu então
reservar-se a gestão direta e exclusiva do
atendimento à saúde na Terra Indígena
Yanomami, deixando à URIHI apenas tarefas
secundárias de administração
(como a contratação de funcionários)
e retirando-lhe o exercício de atendimento
no campo no qual a ONG, constituída de médicos
e antropólogos especialistas nas questões
yanomami, demonstrou uma reconhecida competência
durante estes últimos cinco anos.
Em entrevista concedida à revista Época,
edição de 31 de maio último,
o diretor do Departamento de Saúde Indígena
da Funasa, Lenildo Morais, afirmou, de modo inusitado,
que deixar a saúde indígena sob a
responsabilidade de uma organização
não-governamental equivaleria a "terceirizar
as Forças Armadas". Admitiu, no entanto,
que não faz qualquer ressalva ao trabalho
técnico e administrativo da Urihi. "Eles
trabalham muito bem e ficamos tristes que não
houve acerto".
Mas, apesar de reconhecer a importância do
trabalho da ONG, Morais recorreu a um argumento
extemporâneo e anacrônico, muito usado
pelos antigos regimes militares, e que agora a Funasa
ressuscita para desmontar um serviço de saúde
indígena descentralizado exemplar que, nos
últimos cinco anos, impediu que mais vidas
yanomami fossem ceifadas pela malária, pela
desnutrição e por várias outras
moléstias levadas à Terra Indígena
no bojo da invasão garimpeira dos anos 80
e 90. Com seu eficiente trabalho em campo, a URIHI
reduziu em quase 100% os casos de malária
e 65% os óbitos por desnutrição
em 53% da população Yanomami, que
hoje soma no Brasil cerca de 14 mil indivíduos.
Para isso, a organização contava com
uma equipe de 110 agentes de saúde e chegou
a formar 33 microscopistas yanomami no período
de sua atuação. A população
yanomami, antes quase dizimada pelos garimpeiros,
registrou, nestes últimos anos, um crescimento
de quase 4% ao ano.
A URIHI conseguiu ainda inovar no tratamento da
tuberculose em área indígena, evitando
que os índios saíssem de suas aldeias
para Boa Vista, onde deveriam ficar em média
até seis meses, provocando grandes transtornos
aos pacientes e suas famílias, além
de desgastes psicológicos pela longa interrupção
das atividades econômicas e sociais tradicionais.
O acompanhamento em campo dava-se com a presença
constante de profissionais de saúde que garantiam
que os pacientes com tuberculose concluíssem
rigorosamente o tratamento. Para isso, a equipe
de saúde contava com um equipamento portátil
de raio X, permitindo que os diagnósticos
fosse realizados em qualquer lugar e a qualquer
momento.
O coordenador da Urihi, o médico Cláudio
Esteves, também em entrevista àquele
mesmo número da Época, afirmou que,
há cinco anos atrás, a organização
foi convidada pelo Ministério da Saúde
a atuar na Terra Indígena Yanomami, diante
do notório fracasso da Funasa (então
FNS) na gestão direta do Distrito Sanitário
Yanomami de 1991 a 1998, "numa situação
de caos sanitário e escândalo internacional"
permanentes. E acrescentou: "Agora querem voltar
ao que não deu certo antes". Segundo
ele, o modelo proposto pela Funasa reduz a parceria
a mera transferência de tarefas administrativas.
"Não queremos ser um departamento-laranja
da Funasa", afirmou Cláudio Esteves.
A decisão da Funasa provocou forte indignação
em Davi Kopenawa, um dos líderes dos Yanomami.
Este afirmou que, se a situação anterior
de elevada mortalidade entre os índios, vier
a ocorrer novamente por falta de assistência
médica adequada, denunciará o governo
atual nos fóruns internacionais. Davi está
entre os poucos brasileiros agraciados com o prêmio
Global 500 concedido pela Organização
das Nações Unidas, em reconhecimento
por sua luta em defesa do povo Yanomami.
A integra da matéria da revista Época
pode ser consultada no site da CCPY: www.proyanomami.org.br/frame1/noticia.asp?id=3203
Apresentamos abaixo a íntegra do comunicado
divulgado pela Urihi-Saúde Yanomami, em que
reafirma os motivos do fim da parceria que
mantinha com a Fundação Nacional de
Saúde:
Comunicado
A URIHI- Saúde Yanomami comunica oficialmente
que, após cinco anos de trabalho bem sucedido
no atendimento a cerca de 50 % da população
Yanomami do Brasil, estará encerrando o seu
programa de assistência e de educação
em saúde na Terra Indígena Yanomami
a partir do próximo dia 30 de junho 2004,
em função das novas diretrizes para
a atenção à saúde das
populações indígenas adotadas
pela Fundação Nacional de Saúde/Ministério
da Saúde(FUNASA/MS), através da Portaria
70 de janeiro de 2004.
A caótica experiência histórica
de gestão direta do Distrito Sanitário
Yanomami (DSY) pela FUNASA (então FNS) de
1991 a 1998, bem como a exacerbação
do ambiente político antiindígena
no estado de Roraima - já analisados em comunicados
anteriores (16/2/04 e 27/2/04)[1] - fundamentaram
a posição da URIHI em não aceitar
as condições impostas hoje pelo governo
para a continuidade da parceria com a URIHI em meras
"ações complementares".
Finalmente, no dia 12 de maio último, o Secretário
Executivo da FUNASA, Sr. Lenildo Morais e o assessor
do DESAI, Dr. Marcos Pellegrini, transmitiram oficialmente
à URIHI a decisão da FUNASA de assumira
assistência direta no DSY a partir do dia
01 de julho de 2004. Desde então, num prazo
de tempo mínimo, a URIHI está efetuando,
junto à chefia do DSY/FUNASA-RR, o repasse
das informações de campo, do modelo
operacional, dos materiais de consumo e equipamentos
adquiridos através dos convênios FUNASA-URIHI
(1999-2004).
Esta repentina interrupção do modelo
de atendimento bem sucedido da URIHI provocou profunda
perplexidade e preocupação entre as
lideranças Yanomami presentes na última
reunião do Conselho Distrital do DSY nos
24 e 25 de maio último. Nesta ocasião
a URIHI manifestou publicamente a sua intenção
de buscar financiamentos independentes para garantir
a continuidade da formação de agentes
Yanomami de saúde e de continuar participando
do controle social do DSY como organização
de apoio aos Yanomami.
Boa Vista/RR, 07
de junho de 2004
URIHI- Saúde Yanomami
Nota:
[1] Ver , respectivamente:
www.proyanomami.org.br/frame1/noticia.asp?id=3001
e www.proyanomami.org.br/frame1/noticia.asp?id=3023
Fonte: Comissão Pro-Yanomami
(www.proyanomami.org.br)
Assessoria de imprensa