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A QUESTÃO
INDÍGENA É ÉTICA
Panorama
Ambiental
São Paulo (SP) - Brasil
Abril de 2004
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A afirmação
partiu da antropóloga Carmem Junqueira durante
o evento Respeito aos direitos indígenas
é bom e nós gostamos! que ocorreu
ontem (12/4)no Memorial da América Latina.
A mesa-redonda, que iniciou o debate, teve como
foco a demarcação das terras indígenas
e fez um balanço histórico da situação
dos índios desde a promulgação
da Constituição de 1998. Depois, foi
inaugurada a Exposição Panará,
depois da volta dos índios gigante. O evento
foi organizado pelo Memorial e pelo Instituto Socioambiental.
Diante das mais de 120 pessoas que lotaram o auditório
do Pavilhão da Criatividade, em São
Paulo, incluindo quatro índios Panará,
que em seguida participaram da abertura de uma exposição
fotográfica contando sua história,
Carmem Junqueira se disse constrangida de estar
ali fazendo o mesmo discurso que fazia na década
de 1960, 1970. “Fiquei espantada. É um retrocesso
enorme em termos de políticas públicas”,
disse a antropóloga. Antes dela, o diretor
de assuntos fundiários da Fundação
Nacional do Índio (Funai), Artur Nobre Mendes,
expressava sua preocupação com a pressão
que os índios e a Funai vêm recebendo
especialmente no caso da Raposa-Serra do Sol, em
Roraima, a última grande pendência
das terras demarcadas, mas não homologadas.
A Procuradora da República, Elisabeth Peinado,
admitiu o desconhecimento que o Judiciário
tem da questão indígena, reduzindo-a
a uma questão fundiária, agrária.
“Temos lutado muito para que as decisões
antropológicas sejam entendidas e também
para conscientizar o Poder Judiciário”, afirmou
a procuradora. A advogada indígena, Joênia
Wapichana, que representa o Conselho Indígena
de Roraima (CIR), lembrou que os direitos assegurados
pela Constituição estão sendo
desrespeitados e que a Constituição
deve ser cumprida. “Chega de violência. Que
o governo termine o processo que iniciou em Roraima”.
Joênia esteve no último dia 29 de março
em Washington, EUA, onde denunciou o Estado brasileiro
por desrespeito aos direitos indígenas junto
à Comissão de Direitos Humanos da
Organização dos Estados Americanos
(OEA).
Para Carmem Junqueira, que é integrante do
Conselho Indigenista da Funai, a demarcação
das terras indígenas é uma reparação
histórica. “É preciso honrar o elevado
princípio ético de dar aos índios
suas terras. A questão dos índios
é ética”, ressaltou. Márcio
Santilli, um dos diretores do ISA, relatou os fatos
preocupantes que estavam ocorrendo havia duas semanas
em relação à homologação
da Raposa-Serra do Sol. Ele se referia à
apresentação do relatório do
deputado Lindberg Farias (PT/RJ). Santilli chamou-o
de “Relatório Sharon” – por querer criar
fronteiras onde elas não existem - e disse
que o deputado Lindberg havia se aliado aos setores
mais retrógrados da direita no país.
Ao propor o corte de pedaços da terra indígena
demarcada, o relatório deixou de fora 32
aldeias indígenas cujos habitantes não
terão direito à terra, fadados a viver
como sem-terra.
O público dirigiu várias perguntas
aos participantes da mesa, que contou com o secretário
geral do ISA, Sergio Leitão, como moderador.
Em resposta a uma delas, o diretor da Funai, Artur
Nobre Mendes, explicou que foram os políticos
de Roraima que deram essa dimensão à
homologação da Raposa-Serra do Sol.
Eles se opõem com base na hipótese
de que a homologação não atrairá
investimentos para o Estado. “Mas Roraima tem 5
milhões de hectares para serem explorados,
para atrair investimentos”, relembrou. Ao responder
a uma pergunta sobre a questão da segurança
nacional que vem sendo levantada por vários
setores como empecilho à homologação
da Raposa-Serra do Sol, Artur afirmou ser essa uma
falsa questão, porque boa parte das fronteiras
brasileiras encontram-se em terras indígenas
já homologadas.
O processo de demarcação de terras
é longo, complicado, leva anos e quando chega
ao Presidente da República o processo está
pronto. “O que nos causa espanto é que se
discuta a revisão de limites de terras indígenas
que já foram demarcadas”, afirmou Santilli.
“Os adversários da homologação,
que já tinham desistido de tentar impedi-la
voltaram a se articular e estão pressionando
o Presidente e os ministros”.
Fonte: ISA – Instituto Socioambiental
(www.socioambiental.org.br)
Inês Zanchetta