 |
ABA ENVIA
CARTA A LULA EM DEFESA DA HOMOLOGAÇÃO
CONTÍNUA DA TI RAPOSA SERRA DO SOL
Panorama
Ambiental
São Paulo (SP) - Brasil
Abril de 2004
|
 |
O
documento foi enviado ontem (12/4) pela Associação
Brasileira de Antropologia ao presidente que, durante
reunião no começo da noite com sete
ministros e os presidentes da Funai e do Incra,
estabeleceu um prazo de 15 dias para que seja apresentada
uma "solução definitiva"
para a homologação da terra indígena
de 1,67 milhão de hectares no noroeste de
Roraima.
A Associação
Brasileira de Antropologia (ABA) manifestou-se,
mais uma vez, em defesa da homologação
contínua da Terra Indígena Raposa
Serra do Sol (RR), em carta enviada ontem ao presidente
Lula [ leia na íntegra abaixo].
"É com base no acúmulo de conhecimentos,
ao longo de mais de duas décadas atuando
em processos de identificação de terras
indígenas e de quilombos, que cremos, em
vista dos estudos antropológicos idôneos
que informam a demarcação já
realizada da área Raposa-Serra do Sol, que
a solução de uma demarcação
contínua não apenas fará justiça
aos direitos que arduamente vêm sendo reivindicados
pelos Macuxi, Wapichana, Ingarikó, Taurepang,
Patamona, vítimas de toda sorte de violência
na região, mas também porá
fim a um foco de tensões que a demora na
homologação só tem levado a
incrementar. Entendemos que os brasileiros indígenas
ocupantes da região são dela os verdadeiros
guardiões. Não duvidamos de que V.
Excia. optará pelos signos de um desenvolvimento
sustentável, adequado ao meio-ambiente da
região, emblema de um novo Brasil, onde o
Estado não mais sustentará elites
improdutivas através de múltiplos
incentivos financeiros", ressalta o documento,
assinado pelo presidente da ABA, Gustavo Lins Ribeiro.
Também ontem Lula esteve reunido no início
da noite com os ministros José Dirceu (Casa
Civil), Aldo Rebelo (Articulação Política),
Luiz Dulci (Secretaria Geral da Presidência),
Márcio Thomaz Bastos (Justiça), José
Viegas Filho (Defesa), Miguel Rossetto (Desenvolvimento
Agrário) e Marina Silva (Meio Ambiente) e
os presidentes da Fundação Nacional
do Índio (Funai), Mércio Gomes, e
do Instituto Nacional de Colonização
e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart,
para discutir a homologação da TI
Raposa Serra do Sol. O presidente estabeleceu um
prazo de 15 dias para que seja apresentada pelo
governo uma "solução definitiva"
para o caso.
Diante do impasse do governo Lula em relação
à Raposa Serra do Sol, pronta para ser homologada
desde o fim do governo FHC, diversas manifestações
antiindígenas e extemporâneas ao processo
demarcatório de Terras Indígenas têm
surgido, como a criação em fevereiro
deste ano de uma comissão externa na Câmara
dos Deputados para "avaliar a demarcação
da terra indígena", cujo relato, que
propõe que sejam excluídos da área
a ser homologada 12 mil hectares de terras griladas
por arrozeiros; Uiramutã, base de apoio do
garimpo transformada em município, ainda
sub júdice, em 1997; e uma faixa de terra
de 15 quilômetros ao longo da faixa de fronteira
com a Venezuela e Guiana, deverá ser votado
amanhã (14/4).
A votação será acompanhada
por dezenas de lideranças indígenas
que se mobilizam em Brasília nesta semana,
promovendo diversas manifestações
até a próxima segunda-feira [Dia do
Índio], como uma vigília em frente
ao Palácio do Planalto a partir de hoje.
Carta da
ABA ao presidente Lula
Brasília,
12 de abril de 2004
Ofício nº 52/ABA/PRES
Exmo Sr.
Luiz Inácio Lula da Silva
Presidente da República Federativa do Brasil
Palácio do Planalto
Brasília - DF
Sr. Presidente.
A Associação
Brasileira de Antropologia vem expressar junto a
V. Excia., de conformidade com a posição
de um conjunto de entidades das sociedades civil
e política brasileiras, sua posição
de defesa da homologação da demarcação
da Terra Indígena Raposa Serra do Sol em
área contínua, com ações
de retirada de ocupantes não-índios
e da sede do município de Uiramutã
de seu perímetro, conforme estabelecido na
portaria ministerial nº 820/98, consoante a
defesa da legalidade e dos princípios de
um Estado de Direito como consagrados na Constituição
de 1988.
Ao longo de seus 50 anos de existência, nossa
associação, a mais antiga sociedade
científica na área das ciências
sociais no Brasil, e uma das três maiores
associações antropológicas
no mundo, esteve engajada em numerosas causas sociais,
de acordo com o imperativo de responsabilidade moral
e ética que impele o antropólogo à
defesa dos grupos socialmente minoritários
com que trabalha. Não nos faltaram momentos
para demonstrar esse compromisso, em tempos de regime
ditatorial ou na democracia. Nosso fazer profissional,
nosso compromisso moral e ético têm
nos colocado diante da situação de
agirmos fundamentando as bases da ação
de Estado no reconhecimento dos direitos indígenas
aos territórios que tradicionalmente ocupam,
seja sob a forma de relatórios originados
no trabalho de identificação dessas
terras, seja sob a forma de laudos periciais para
fins judiciais.
É com base no acúmulo de conhecimentos,
ao longo de mais de duas décadas atuando
em processos de identificação de terras
indígenas e de quilombos, que cremos, em
vista dos estudos antropológicos idôneos
que informam a demarcação já
realizada da área Raposa-Serra do Sol, que
a solução de uma demarcação
contínua não apenas fará justiça
aos direitos que arduamente vêm sendo reivindicados
pelos Macuxi, Wapichana, Ingarikó, Taurepang,
Patamona, vítimas de toda sorte de violência
na região, mas também porá
fim a um foco de tensões que a demora na
homologação só tem levado a
incrementar. Entendemos que os brasileiros indígenas
ocupantes da região são dela os verdadeiros
guardiões. Não duvidamos de que V.
Excia. optará pelos signos de um desenvolvimento
sustentável, adequado ao meio-ambiente da
região, emblema de um novo Brasil, onde o
Estado não mais sustentará elites
improdutivas através de múltiplos
incentivos financeiros.
Nesse ato que será, de certo, um divisor
de águas na ação indigenista
governamental em sua gestão, esperamos ver
que a intensa campanha mantida até agora
por forças sociais freqüentemente marcadas
pelo racismo, pelo desejo de manutenção
de privilégios que têm assegurado as
desigualdades sociais, pelo desconhecimento do Estado
de Direito em nosso país e do caráter
pluriétnico da nação brasileira,
encontrará finalmente resposta à altura
e digna da proposta de governo de V. Excia.
Na certeza de que V. Excia. homologará de
forma contínua a Terra Indígena Raposa
Serra do Sol, a ABA coloca-se à disposição
para contribuir na direção do pleno
reconhecimento dos direitos indígenas no
Brasil.
Atenciosamente,
Gustavo Lins Ribeiro
Presidente
Cc.: Vice-Presidente da República - José
Alencar Gomes da Silva
Ministro da Articulação Política
- José Aldo Rebelo Figueiredo
Ministro Chefe da Casa Civil - José Dirceu
de Oliveira e Silva
Ministro da Justiça - Márcio Thomaz
Bastos
Fonte: ISA – Instituto Socioambiental
(www.socioambiental.org.br)
Assessoria de imprensa (Cristiane Fontes)