REGULARIZAÇÃO DE TERRAS DE QUILOMBOS É TEMA DE CAMPANHA NACIONAL

Panorama Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Agosto de 2004

Reunidos em São Paulo, representantes de comunidades quilombolas e outras organizações da sociedade civil se unem para que sejam regularizados cerca de 1.100 territórios identificados como sendo de quilombos.

A campanha deflagrada oficialmente na semana passada começou com um programa de capacitação para as lideranças da Coordenação Nacional das Comunidades de Quilombos – Conaq –, realizado no Instituto Pólis (SP) entre os dias 16 e 19 de agosto. As próximas etapas serão: capacitações regionais, previstas inicialmente para Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Alcântara; ações de caráter jurídico e atividades que terão lugar durante o Fórum Social Mundial, no início do próximo ano em Porto Alegre. O movimento em caráter nacional é promovido pelo Centro pelo Direito á Moradia contra Despejos (Cohre), Conaq, e Associação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas do Maranhão (Aconeruq), com apoio do Servicio Latinoamericano y Asiatico de Vivienda Popular (Selavip) e da Fundação Ford do Brasil. Dados da Universidade Nacional de Brasília, da Fundação Cultural Palmares e do Projeto Vida de Negro, estimam que sejam 1.098 territórios identificados, espalhados por quase todo o território brasileiro (as eceções são Rondônia, Roraima, Acre, Amazonas e Distrito Federal). Destes, apenas 29 estão titulados.
Com o mote Justiça Social é regularização dos territórios de quilombos o movimento pretende fortalecer e consolidar a posse dessas terras, consideradas territórios étnicos, e impedir deslocamentos forçados como os que ocorreram em Alcântara (MA) na década de 1980, quando da construção do Centro de Lançamentos de Alcântara (CLA) e outros que estão previstos para acontecer por conta da ampliação do CLA.
Quer garantir também que os quilombolas tenham acesso a financiamento público para programas de agricultura familiar, de saneamento básico, educação e cultura, saúde e moradia. Os primeiros passos, no sentido de mobilizar a sociedade civil para a questão, se iniciaram na segunda quinzena de julho, em campanha virtual contra a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) proposta pelo Partido da Frente Liberal (PFL) perante o Supremo Tribunal Federal (STF)para anular o Decreto nº 4.778/03 - marco jurídico que sustenta toda a política federal de titulação de terras de quilombos.

Direito Constitucional

A Constituição de 1988 assegurou aos remanescentes das comunidades de quilombos o direito às suas terras, explicitados no artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) e o direito à manutenção de sua cultura. Já o artigo 215 estabelece que o Estado deve proteger as manifestações culturais e formas de expressão de diferentes grupos formadores da sociedade brasileira. Essas comunidades, que se constituem em territórios étnicos, foram formadas a partir do século XVII pela fuga de negros africanos, contra a escravidão a que eram submetidos pelos colonizadores. Se autodeterminam como comunidades negras rurais de Quilombos que preservam costumes, tradições, condições sociais, culturais e econômicas específicas que os distinguem de outros setores da sociedade brasileira.

O caso de Alcântara

Se as terras tivessem sido regularizadas, 500 famílias de comunidades quilombolas de Alcântara (MA), não estariam vivendo o pesadelo que ora vivem, por conta da reforma e ampliação que será feita no Centro de Lançamentos. Em 1980, um decreto estadual desapropriou 52 mil hectares de área para a construção do centro, deslocando 312 famílias quilombolas. Desastrosa experiência. Algumas delas foram para a cidade e outras para agrovilas no interior. Antes, perto do mar, combinavam a agricultura com a pesca. Distantes do litoral, lutam para não morrer de fome. “Essas famílias tiveram seu estilo de vida modificado. Houve uma fragmentação social e até o cemitério foi destruído. Todos os valores sociais e culturais foram fragmentados”, diz Jô Brandão, presidente da Aconeruq e integrante da Conaq. “Embora Alcântara seja prioridade para o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) é o caso mais complexo. Não há política pública voltada para lá”.
Para a presidente da Aconeruq não houve avanços do ponto de vista governamental. “Fica o pânico. As famílias não sabem quando serão deslocadas e em função disso não sabem o que podem plantar para comer”. Ela conta que os advogados que representam o Centro de Lançamentos de Alcântara têm procurado as famílias que moram no entorno oferecendo indenização pela benfeitorias que promoveram nas terras. Mesmo tendo sido orientados pela coordenação do movimento a não recebê-la, muitos terminam convencidos pelos advogados. Enquanto isso, a Casa Civil está em fase final de avaliação de uma portaria que cria um grupo executivo interministerial para articular, viabilizar e acompanhar as ações necessárias ao desenvolvimento sustentável do município de Alcântara.
De acordo com nota distribuída pelo Cohre, “a proposta de portaria sequer menciona a expressão ‘quilombos’ em seu detalhamento em quatro artigos. Além disso, considera o município de Alcântara como ‘área de interesse estratégico por abrigar o Centro de Lançamentos de Alcântara, componente do Programa Nacional de Atividades Espaciais’, desconsiderando totalmente a sua condição de território étnico”. Ainda segundo a nota do Cohre, a proposta de portaria prevê que as ações a serem desenvolvidas no município "deverão ser compatíveis com o Plano de Desenvolvimento Sustentável, constante do Diagnóstico Participativo do município de Alcântara, coordenado pela Agência Espacial Brasileira". Entretanto, de acordo com o Cohre, o diagnóstico participativo mencionado não foi elaborado nem aprovado com a participação das comunidades de quilombos ou suas entidades representativas, as quais representam cerca de 70% da população do município.
A ameaça que paira sobre todas comunidades que vivem no entorno do Centro de Lançamentos gerou um manifesto de organizações da sociedade civil pedindo respeito aos direitos humanos. Clique aqui para ler.

A campanha nacional

O objetivo é provocar o debate da sociedade em torno de comunidades que estão em risco de serem deslocadas de seus territórios tradicionais e pressionar o governo a efetivar as medidas previstas na Constituição para regularizar as terras de quilombos. Mais que isso. “Expõe o Brasil a uma situação de lesão de Direitos Humanos que o Estado tem de reparar”, diz Jô.
Para Ronaldo dos Santos, da Associação das Comunidades Quilombolas do Estado do Rio de Janeiro, e pertencente ao Quilombo Campinho da Independência, no município de Paraty (RJ), um dos 29 em todo o Brasil com a situação fundiária regularizada, a campanha quer sensibilizar o Estado, o terceiro setor e outras organizações da sociedade civil e fortalecer os quilombolas na luta pela regularização de seus territórios.

Principais bandeiras do movimento de quilombos

:: A disponibilização de recursos técnicos, legais, financeiros e orçamentários pelo governo federal, governos estaduais e municipais para a concretização da titulação dos territórios de quilombos e o acesso à políticas públicas de inclusão social (saneamento básico, agricultura familiar, educação e cultura, saúde e moradia).

:: A agilização dos processos de titulação de seus territórios, priorizando-se a solução dos conflitos fundiários que ameaçam a permanência das comunidades nas suas terras: construção de barragens; projetos de desenvolvimento como o Centro de Lançamentos de Alcântara; expansão da fronteira agrícola de monocultura; a exploração de recursos naturais; sobreposição a reservas ambientais; grilagens; intrusões.

:: Permanência dos Quilombos nos territórios ocupados, com segurança na posse, assegurando-lhes o direito de não serem trasladados ou reassentados sem seu consentimento e consulta.

:: Participação das comunidades em todos os espaços públicos de discussão e definição de políticas, planos e programas que visem a promoção e concretização de seus direitos econômicos, sociais e culturais.

Fonte: ISA – Instituto Socioambiental (www.socioambiental.org.br)
Assessoria de imprensa (Inês Zanchetta)

 
 
 
 

 

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