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PECUARISTAS
QUEREM APAGAR A IMAGEM DE ‘VILÕES’
DA AMAZÔNIA
Panorama
Ambiental
Brasília (DF) – Brasil
Março de 2004
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Os agricultores consideram
viáveis as metas do plano de ação
que o governo anuncia esta semana para conter o
desmatamento na Amazônia. De acordo com o
presidente da Comissão de Meio Ambiente da
Confederação Nacional da Agricultura
(CNA), Assuero Veronez, o aproveitamento intensivo
de áreas já desmatadas, buscando o
uso delas para aumentar a produtividade, é
importante do ponto de vista da ocupação
e para diminuir a pressão sobre a floresta.
“É uma política há muito tempo
esperada pelos produtores, mas isso não basta”.
Além de membro da CNA, Veronez é pecuarista
na Amazônia. Foi para o Acre há 20
anos e se dedicou à criação
de gado da raça nelore. Está lá
até hoje. Em entrevista à Agência
Brasil, ele critica a ausência de uma política
de ocupação na Amazônia. Fala
sobre o retorno social da pecuária, que na
região tem se mostrado uma atividade altamente
rentável. Veronez defende a revisão
do Código Florestal e cobra medidas que tirem
alguns grupos da ilegalidade. Ele critica a falta
de relacionamento com o Ministério do Meio
Ambiente e condena quem chama os pecuaristas de
bandidos.
Agência
Brasil - Estudo do Banco Mundial mostra
que o crescimento do rebanho bovino na Amazônia
se deu em parte às custas do desmatamento.
Hoje, a atividade agropecuária é vista
como a vilã do processo de desflorestamento
na região, não apenas pelo fato de
queimar para criar pastagem, mas porque os pecuaristas
ao abrirem estradas estimulam o surgimento de outras
atividades como a extração ilegal
de madeira, grilagem, entre outras. Como os agricultores
podem trabalhar na região sem destruir o
meio ambiente?
Assuero Veronez
- O Brasil não pode abdicar de explorar produtivamente
as suas áreas vocacionadas. A Amazônia
sabidamente tem áreas extremamente vocacionadas
para agricultura e pecuária que hoje demonstram
a capacidade produtiva e viabilidade econômica,
pela tecnologia que foi desenvolvida e pela produtividade
e competitividade que apresenta. Precisamos aproveitar
racionalmente ainda que tenhamos que ter uma política
cuidadosa de preservação das áreas
importantes do ponto de vista da biodiversidade,
dos sítios ecológicos, das áreas
indígenas e ocupadas pelas populações
tradicionais. Temos que ter as políticas
voltadas para os setores de acordo com as vocações
estabelecidas para cada região.
ABr
- O governo tem apertado a fiscalização,
tem exigido licenças para desmatar e isso
é uma iniciativa para coibir o desmatamento.
Como o senhor acredita que seja possível
traze para a legalidade atividades que são
desenvolvidas sem o cumprimento da lei, como a extração
ilegal de madeira e o desmatamento sem autorização?
Assuero
- A indefinição fundiária na
Amazônia está permitindo que se crie
uma situação de ilegalidade. A questão
ambiental também é nova e hoje é
um desafio a ser resolvido. O governo tem se mostrado
incompetente para definir os espaços territoriais
na Amazônia: onde se pode introduzir as atividades
produtivas e os espaços que devem ser preservados,
por meio das unidades de conservação.
O governo tenta agir por intermédio só
de uma política de fiscalização,
de comando e controle que ainda é a velha
política que se pratica. O próprio
governo já identificou que é ineficaz
do ponto de vista da preservação da
Amazônia, mas não consegue estabelecer
novas políticas para mudar o modelo de desenvolvimento
da região. Essa indefinição
de uma política ambiental conseqüente,
racional para a Amazônia, é que tem
gerado esse imenso conflito e que tem permitido
a divulgação desse catastrofismo,
quando, na verdade, a Amazônia no meu modo
de ver é indestrutível. Ela será
preservada em pelos menos 80% pelo resto dos tempos
porque é inadmissível acreditar que
tenhamos um processo de desmatamento em níveis
elevadíssimo na Amazônia, principalmente
na calhas do Rio Amazonas, que á uma área
imprópria para fazer agricultura e também
pelos espaços que foram preservados. A Amazônia
tem 24% do seu território pertence à
iniciativa privada, e o restante são áreas
públicas. Então, o grande problema
não está nas áreas privadas,
aonde se pratica agricultura, onde se está
desmatando. O grande problema é do governo,
que é o grande latifundiário da área
e que tem 76% da Amazônia.
ABr
- O estudo mostra que a pecuária ocupa 80%
das terras convertidas na Amazônia e ao mesmo
tempo apresenta baixas taxas de retorno social.
É possível fazer uma comparação?
Assuero
- Nós temos hoje na Amazônia a carne
mais barata do país. Aqui no Acre, há
20 anos quando cheguei, se fazia fila às
3 horas da manhã para tentar comprar um quilo
de carne. E hoje exportamos 70% da produção,
temos a carne de excelente qualidade, nos tornamos
zona livre de aftosa agora e temos um excedente
para consumo interno a preços muito baratos.
Agora, a pecuária como geradora de emprego
é a maior atividade que nós temos.
Não tem nenhuma atividade na Amazônia
que gere mais emprego do que a pecuária.
É o que dá retorno social mais importante.
O extrativismo sempre foi cruel com aqueles que
a praticam, obrigando o produtor a morar dentro
da floresta, longe dos recursos que a sociedade
desfruta, longe da energia, da saúde, educação,
acho que isso não é um modelo ideal
de desenvolvimento humano. Se analisarmos o IDH
(Índice de Desenvolvimento Humano) dos últimos
dez anos publicado pela ONU, veremos que os estados
que fizeram a opção ambientalista,
como o Acre, o Amapá e o Amazonas, são
os que tiveram a maior queda no seu IDH. E os estados
que tiveram a opção desenvolvimentista
pela agropecuária, que foram o Pará,
o Mato Grosso e Rondônia foram os que mais
cresceram no seu IDH. Isso é um indicativo
claro de que as atividades econômicas que
são desenvolvidas na Amazônia têm
trazido um retorno social importante.
ABr
- O governo pretende dar incentivos econômicos
para promover empreendimentos e projetos sustentáveis
nas áreas agropecuárias e na recuperação
das áreas degradadas. O senhor, como pecuarista,
teria interesse em se beneficiar desse incentivo?
Assuero
- Tudo isso que se propaga para a Amazônia,
de mudança de paradigma, de introdução
de modelo sustentável baseado no manejo,
no extrativismo, no ecoturismo são pura teoria,
nada disso foi implantado como política pública.
Não se vê uma demanda por investimento
privado nessas áreas; não atrai investimento.
Ainda são atividades experimentais, que dependem
de estrutura adequada de viabilização
de mercados para esses produtos, de escala de produção
que é fundamental para competir, de tecnologias
próprias para cultivo e exploração.
Essas políticas são bonitas e sedutoras,
mas são utópicas.
ABr
- A agropecuária na Amazônia é
uma realidade. Portanto, o governo e os setores
produtivos devem adotar um ponto de convergência.
Para os produtores, qual é o entrave ou quais
são as dificuldades para produzir sem prejudicar
o meio ambiente?
Assuero
- O primeiro ponto é que precisamos sair
da ilegalidade resolvendo o passivo ambiental na
Amazônia. O governo tem que definir rapidamente
a questão do Código Florestal eliminado
a barreira dos 80% de limitação dentro
da propriedade porque isso é uma questão
de princípio, é uma limitação
exagerada. Não podemos aceitar a não
ser com indenização. É preciso
voltar aos 50% exploráveis de cada propriedade
e tentar legalizar tudo o que foi praticado na Amazônia
até hoje e que não foi culpa dos pecuaristas,
nós não somos os bandidos que foram
para a Amazônia. Isso é culpa da ausência
de governo, do poder público na região.
Hoje, o governo é um estimulador de conflito
com a questão trabalhista, indígena
e fundiária. É preciso que o governo
realmente resolva essa questão por meio de
uma ampla negociação com os setores
envolvidos, definindo as áreas para fazer
pecuária. A ação governamental
precisa ser mais rápida e efetiva, e não
essa discussão infindável que não
tem trazido soluções. A legislação
hoje só tem servido para empurrar as pessoas
para a ilegalidade, porque elas precisam sobreviver.
ABr
- Objetivamente quais são os pontos na legislação
que precisam ser alterados, além da revisão
do Código Florestal que o senhor mencionou?
Assuero
- Acho que a questão da reserva legal tem
que ser solucionada de maneira eficaz, sem muito
constrangimento e sem dificuldades que não
se possa transpor. Sugeri à ministra Marina
Silva que criasse um mecanismo de compensação
de reserva legal para todo o país. Ou seja,
o produtor de qualquer lugar do país, que
não tem mais a sua reserva legal, poderia
compensar sua área de reserva legal na Amazônia,
principalmente em áreas públicas.
Estaríamos viabilizando recursos para dotar
essas áreas públicas, unidades de
conservação, de infra-estrutura para
exploração de turismo ou mesmo de
preservação dessas áreas que
estão abandonadas. Criaríamos um mecanismo
de transferência de recursos de regiões
mais desenvolvidas para uma região pobre,
mas quem tem patrimônio ecológico.
Isso seria uma forma de resolver um passivo não
só da Amazônia. No país todo
pecuaristas estão sendo execrados, quando
na verdade eles foram para a Amazônia para
viver e ajudar o Brasil a desenvolver. Há
um certo distanciamento hoje do Ministério
do Meio Ambiente da representação
dos produtores. As medidas são tomadas à
revelia dos produtores. Constantemente somos surpreendidos
com mais medidas no sentido da restrição
e da punição. Não queremos
isso; queremos ser parceiros do governo na busca
de soluções adequadas que contemplem
os interesses dos produtores do governo e da sociedade.
A Amazônia é imensa, tem espaço
para todas as atividades. É só querer
resolver, buscando soluções de bom
senso, e não radicalizadas como vemos hoje.
Fonte: Radiobras (www.radiobras.gov.br)
Amazônia ORG (www.amazonia.org.br)
Assessoria de imprensa (Cristina Guimarães)