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RESERVA
ROOSEVELT: A TRAGÉDIA MAIS DO QUE
ANUNCIADA NA ÁREA DOS ÍNDIOS
CINTA-LARGA
Panorama
Ambiental
São Paulo (SP) - Brasil
Abril de 2004
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A morte de
29 pessoas no interior do garimpo ilegal da Terra
Indígena Roosevelt(RO), provavelmente atacados
pelos índios em defesa de suas terras, agrava
a crise na região e provoca reações
do ministro da Justiça, do presidente da
Funai e do governador de Rondônia.
Os últimos
acontecimentos na Terra Indígena Roosevelt,
em Espigão D' Oeste (RO), que resultaram
na morte de 29 pessoas, trouxe às primeiras
páginas dos jornais um conflito que se arrasta
há alguns anos naquela região envolvendo
índios Cinta-Larga e garimpeiros. O presidente
da Fundação Nacional do Índio
(Funai), Mércio Gomes Pereira, declarou que
os índios estavam defendendo suas terras
dos invasores. O ministro da Justiça, Márcio
Thomaz Bastos, relembrou a presença ilegal
dos garimpeiros nas terras dos índios. O
Secretário Especial dos Direitos Humanos,
Nilmário Miranda, reconheceu a ilegalidade
mas condenou os assassinatos. O governador de Rondônia,
Ivo Cassol, comparou o episódio à
questão das invasões do Movimento
dos Sem-Terra, que são ilegais, mas os fazendeiros
não os matam. Nunca é demais repetir
que mineração em terra indígena
é ilegal.
Por trás dessa tragédia há
outros interesses, como o do contrabando de diamantes,
por exemplo. Desde o assassinato de Carlito Cinta-Larga,
em dezembro de 2001 - ainda não resolvido
- a situação de tensão na região
se intensificou. Ao longo de 2002, foram feitas
tentativas no sentido de expulsar os garimpeiros.
Houve promessas do governo FHC por meio do então
Secretário de Direitos Humanos, Paulo Sergio
Pinheiro, do Ministério da Justiça
e da Funai, no sentido de dar apoio às ações
de desintrusão dos garimpeiros. Uma comitiva
incluindo autoridades governamentais e representantes
do Ministério Público Federal foram
à área. Finalmente, no final de 2002,
o governo criou um grupo-tarefa para implementar
um plano emergencial junto aos Cinta-Larga.
Em 2003, com a posse do novo governo, a Fundação
Nacional do Índio (Funai), sob nova direção,
designou o assessor especial da presidência,
Walter Blós, para coordenar o grupo-tarefa.
Blós fica sediado na administração
da Funai em Cacoal (RO). De janeiro a agosto do
ano passado, o garimpo ficou fechado e os garimpeiros
foram expulsos. Entretanto, em outubro, o conflito
veio a tona, quando cerca de 100 garimpeiros ameaçaram
invadir o garimpo novamemente. Naquele momento,
superestimava-se o número de garimpeiros
- seriam mil -, com a ajuda da imprensa local, para
intimidar os índios. Barreiras nos acessos
ao garimpo, então, foram reforçadas
e outras criadas. Blós pediu ajuda à
Polícia Federal do município de Pimenta
Bueno (RO). Guerreiros, os Cinta-Larga reafirmavam
sua disposição de não permitir
mais invasões.
Na época, o antropólogo João
Dal Poz, da Universidade Federal de Mato Grosso,
que trabalha com os Cinta-Larga, alertava em entrevista
à reportagem do ISA: "Hoje são
100 garimpeiros, mas se houver uma brecha, em 24
horas podem se tornar mil, dez mil, porque há
muita gente nas cidades sem nada para fazer."
A indigenista Maria Inês Hargreaves avisava:
"É um crime de genocídio que
está em curso por conta da violência
da exploração econômica em cima
do garimpo de diamantes."
O resultado do descaso das autoridades para com
a mineração ilegal nas terras dos
índios Cinta-Larga aí está:
de 1999 para cá são dezenas de mortes
e emboscadas com baixas tanto para os índios
quanto para os garimpeiros. O confronto ocorrido
no início do mês de abril é
conseqüência da tensão latente
entre os dois grupos, fartamente denunciada e divulgada
em foros nacionais e internacionais. Em junho de
2003, o Relatório sobre Direitos Humanos
Econômicos Sociais e Culturais (DhESC) relatava
entre outros, o caso Cinta-Larga. No final de setembro,
o relator titular para o Direito Humano ao Meio
Ambiente, Jean Pierre Leroy, preocupado, enviou
carta ao ministro da Justiça, Márcio
Thomaz Bastos, solicitando providências diante
do agravamento do quadro e da iminência de
um conflito armado entre Cinta-Larga e garimpeiros.
Uma campanha em defesa do Povo Cinta-Larga foi iniciada
em 22 de outubro do ano passado e continua no ar
até hoje. Em novembro, Jean-Pierre voltou
à área, acompanhado da Subprocuradora
Geral da República, Dra. Ela Wiecko Volkmer
e fez um relatório que enviou ao governo
com as recomendações e os alertas
quanto a gravidade da situação.
A história dos Cinta-Larga é marcada
por confrontos desde os anos 1920, quando suas áreas
começaram a ser invadidas pelos brancos.
Primeiro, foram borracheiros, seringueiros e depois
vieram os madeireiros, que praticamente arrasaram
com a floresta para retirar madeira nobre. Em 1999,
com a descoberta da jazida de diamantes na Reserva
Roosevelt, considerada uma das maiores do Brasil,
chegaram os garimpeiros. Com os madeireiros, eles
deixam atrás de si um rastro de destruição
e degradação ambiental, de tráfico
de drogas, alcoolismo, prostituição
e desagregação das tradições
culturais e das próprias comunidades.
Onde vivem
os Cinta-Larga
São aproximadamente1300
índios (eram cerca de 5 mil em 1968), dispersos
em 34 aldeias nas TIs Roosevelt, Parque Aripuanã,
Aripuanã e Serra Morena, localizadas na fronteira
de Mato Grosso com Rondônia.
Cronologia
de mortes e tragédias
1963 - Uma aldeia
Cinta-Larga, na beira do Rio Aripuanã é
atacada por seringalistas da Companhia Andrade e
Junqueira. É o chamado Massacre do Paralelo
11. Por conta disso, o Estado Brasileiro é
denunciado pela primeira vez internacionalmente
por violação aos direitos indígenas.
1969- A recém-criada
Fundação Nacional do Índio
faz contato com os Cinta-Larga. 1999- Descoberta
a jazida de diamantes na TI Roosevelt
2000- Garimpeiros
invadem as terras dos Cinta-Larga em busca de diamantes.
Dez. 2001/2002- Índios Cinta-Larga são
assassinados: Carlito Cinta-Larga (19/12/2001) e
César Cinta-Larga (abril de 2002).
Março de 2002-
Começa a desintrusão no garimpo.
Abril de 2002 - Quatro caciques Cinta-Larga (Nacoça
Pio, João Cinta-Larga, Alzac Tataré
e Amaral) são presos pela Polícia
Federal. Garimpeiros invadem novamente o garimpo.
Janeiro a agosto
de 2003- Efetiva-se a desintrusão do garimpo.
Junho de 2003 - Relatório
sobre Direitos Humanos Econômicos Sociais
e Culturais (DhESC) denuncia o caso do povo Cinta-Larga.
Outubro de 2003-
Garimpeiros ameaçam invadir a área.
Comissão Parlamentar de Direitos Humanos
visita aldeia Roosevelt. Índios se queixam
do assédio e da violência a ques estão
expostos e dizem que irão resistir contra
as invasões.
Novembro de 2003-
O Relator Nacional para o Direito Humano ao Meio
Ambiente, Jean-Pierre Leroy, vai à área
acompanhado da Subprocuradora Geral da República,
Dra. Ella Volkmer. Na volta faz um relatório
e envia ao governo alertando para a gravidade da
situação dos Cinta-Larga.
Abril de 2004- 29
garimpeiros são encontrados mortos na floresta,
na região do garimpo.
Fonte: ISA – Instituto Socioambiental
(www.socioambiental.org.br)
Assessoria de imprensa (Inês Zanchetta)