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DECRETO TRAZ BENEFÍCIOS
NO COMBATE À BIOPIRATARIA, MAS NÃO
ATUA SOBRE CONTROLE DE PATENTES
Panorama
Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Junho de 2005
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29/06/2005 Decreto
publicado no começo do mês, que regulamenta
o artigo 30 da Medida Provisória nº
2186-16/2001, disciplina sanções às
condutas e atividades lesivas ao patrimônio
genético ou ao conhecimento tradicional associado,
avança no sistema de gestão do patrimônio
genético, mas deixa em aberto o controle
sobre patentes.
O Decreto nº 5459/05, publicado no Diário
Oficial da União, de 8 de Junho, e retificado
na edição de 21 de junho, regulamenta
o artigo da MP nº 2186-16, que disciplina sanções,
penas e multas para quem cometer práticas
ilícitas contra o patrimônio genético
brasileiro e os conhecimentos tradicionais associados.
O decreto representa um importante avanço
para o estabelecimento de um sistema integrado de
fiscalização e controle da gestão
do patrimônio genético do País,
bem como dos conhecimentos tradicionais de povos
indígenas e locais. O principal ganho do
decreto é o de possibilitar que as autoridades
competentes exerçam poder de polícia
e autuem os indivíduos ou grupos que cometerem
infrações contra o patrimônio
genético ou contra o conhecimento tradicional
associado.
Apesar de conter pontos positivos, o decreto não
dá ênfase a mecanismos de controle
sobre pedidos de propriedade intelectual - especialmente
patentes - principal etapa na qual a biopirataria
deve ser combatida.
Biopirataria
A apropriação
por monopólio de elementos da sociobiodiversidade
ganhou o nome de biopirataria, e se consuma geralmente
através da concessão de patentes a
indústrias ou empresas de biotecnologia –
principalmente dos setores farmacêuticos,
de cosméticos e da agricultura - sobre processos
ou produtos derivados de acesso desregrado a recursos
genéticos e/ou conhecimentos tradicionais.
Uma vez que os resultados de pesquisas científicas
passam a ter potencial econômico de mercado,
surge a perspectiva de patentes sobre o processo
ou a informação pesquisada. É
a partir desse momento que a ameaça de biopirataria
surge - e é sobre esta etapa que o controle
do Estado deve se centrar.
Como existe uma zona cinzenta crescente entre a
atividade de pesquisa acadêmica e a de desenvolvimento
tecnológico, é preciso ter clareza
de onde enfatizar o controle do Estado para, por
um lado, evitar o engessamento da atividade acadêmica
e, por outro, permitir um controle eficaz da biopirataria.
Por isso, o estabelecimento de políticas
efetivas de combate à biopirataria deve enfatizar
o controle sobre pedidos de patentes no campo da
biotecnologia, que significam a última etapa
do processo de pesquisa e desenvolvimento, e que
permitem a privatização por monopólio
daquele processo ou produto.
Controle
sobre pedidos de patentes
Uma vez que a produção
científica é apropriada pelo mercado,
geralmente conhecimentos sobre atributos e funções
de plantas e animais são privatizados por
meio de patentes. Essas patentes se tornam instrumentos
de concentração econômica nas
mãos de seus detentores, em detrimento do
direito de uso regular e tradicional desses recursos
biológicos pela população em
geral. A perspectiva de concentração
econômica da biopirataria e de perda de soberania
do país sobre seus recursos genéticos
ensejou a necessidade de controle por parte do Estado
sobre essas atividades.
Nesse sentido, o decreto acerta e avança
ao estabelecer sanções como a suspensão
ou cancelamento de patentes, registro ou licença,
mas não detalha como e quando essas sanções
– fundamentais para o controle da biopirataria –
se darão. Considerar, como faz o decreto,
a reivindicação de direito de propriedade
industrial como uma agravante da multa também
é uma medida interessante, mas tampouco impede
que a patente seja de fato concedida, o que torna
a briga por seu cancelamento mais custosa e demorada.
Neste ponto, o decreto falha ao não criar
sanções que coibam o depósito
de patentes irregulares, isto é, patentes
que não declaram origem do patrimônio
genético ou do conhecimento tradicional utilizado,
da forma como está explicitado no artigo
31 da mesma MP.
Fiscalização
O decreto limita
a responsabilidade da fiscalização
aos agentes públicos do Ibama e do Comando
da Marinha do Ministério da Defesa (para
fiscalização da plataforma continental
e águas jurisdicionais brasileira). Embora
estabeleça a possibilidade de convênios
com os órgãos ambientais estaduais
e municipais integrantes do Sistema Nacional de
Meio Ambiente - Sisnama, para descentralizar as
atividades, o decreto deveria conferir atribuições
específicas ao INPI – Instituto Nacional
da Propriedade Intelectual -, para os casos onde
a infração esteja relacionada a depósito
de patentes irregulares.
Neste sentido, a MP 2.186-16/01 já obriga
o INPI a exigir do interessado na patente que informe,
em seu pedido, a origem do material ou do conhecimento
tradicional acessado, bem como o cumprimento da
MP (por meio de autorização do Conselho
de Gestão do Patrimônio Genético
- CGEN). Embora esse dispositivo seja auto-aplicável,
o decreto poderia ter mencionado expressamente a
responsabilidade do INPI – que tem se recusado reiteradamente
a verificar e garantir o cumprimento do artigo 31
da MP - na aplicação das sanções
de suspensão e cancelamento de patentes,
nos casos de não cumprimento da legislação.
Ao não fazê-lo, mantém o assunto
na generalidade e impede avanços mais concretos.
Fonte: ISA – Instituto Socioambiental
(www.socioambiental.org.br)
Assessoria de imprensa (Fernando Mathias e Henry
Novion)