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KARAJÁ DE ARUANÃ
RESGATAM SEU TERRITÓRIO E ORGULHO
Panorama
Ambiental
Brasília (DF) – Brasil
Outubro de 2005
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04/10/2005 - Depois
de longas décadas, os índios Karajá
da aldeia Buridina voltaram a viver livres, como
eram em um passado distante. Espremidos em um pequeno
pedaço de terra, dentro da cidade de Aruanã
(GO), eles reocuparam seu território sagrado,
que foi expropriado pelas frentes de expansão
ao longo dos anos. Com a recuperação
de suas terras, agora os índios estão
em processo acelerado de revitalização
da língua e da rica cultura Karajá,
quase perdidas após o convívio forçado
com os não-índios.
Esse processo só
foi possível graças à Funai,
por meio da sua Administração Regional
em Goiânia (Aer-Goiânia), e ao Ministério
Público Federal, que deu garantias para que
os índios pudessem ser reconduzidos à
Terra Indígena Karajá de Aruanã
III, onde foi criada uma aldeia nos moldes tradicionais
do povo.
Historicamente a
região sempre foi território dos Karajá.
Eles, juntamente com os Javaé, fixaram-se
em Goiás no início do século
passado, quando passaram a viver em aldeias. De
acordo com o ex-cacique Arumane, “não tinha
nenhum branco na região; só tinha
índio”. A pressão exercida sobre eles
fez com que muitos abandonassem o local, principalmente
os Javaé, que foram morar na Ilha do Bananal/TO.
Era preciso, porém,
ficar e resistir para mostrar que aquela era uma
terra do povo Karajá. Alguns ficaram; a população
cresceu e o espaço a que estavam confinados
ficou pequeno. A partir de 1994, os Karajá
começaram uma luta pela sobrevivência
física e cultural, que passava pela recuperação
do território. Com a retomada de Aricá
(Karajá de Aruanã III), os índios
da Aldeia Buridina, inclusive alguns que tinham
ido para a Ilha do Bananal/TO, já estão
retornando à área.
A recuperação
de Aricá, ou Aruanã III, enfrentou
muitas resistências. Em agosto de 2004, por
exemplo, políticos locais organizaram uma
manifestação contra os índios
Karajá da Aldeia Buridina (Karajá
de Aruanã I), em oposição ao
direito dos índios de exercerem o usufruto
das três glebas (Karajá de Aruanã
I, II e III), demarcadas em meados do ano 2000 por
decreto do Presidente da República.
A prefeita arregimentou
a população local para uma passeata
contra a demarcação e reocupação
da área. Quando soube da manifestação,
o administrador da Aer-Goiânia, Edson Beiriz,
foi à cidade para fazer um trabalho de conscientização
junto à população. Os moradores
antigos da cidade, que conhecem os índios
há muito tempo, não participaram da
passeata e ficaram a favor dos índios. Mas
antes que os ânimos serenassem, a Sede do
Posto Indígena teve suas dependências
invadidas e roubadas por duas vezes e os funcionários
foram ameaçados.
A principal resistência
encontrada pelos índios, no entanto, foi
de um ocupante de má-fé. Quando a
terra foi demarcada, ele ainda não era proprietário
e, mesmo sabendo que era uma terra indígena,
comprou a terra de terceiros. Dizendo-se coronel
aposentado, recusava-se a sair e não permitia
sequer que a equipe da Funai promovesse a avaliação
das benfeitorias existentes em sua posse.
Conforme o então
chefe do Posto Indígena Aruanã, Zeilto
da Mata, o “coronel” espalhava na cidade que se
os índios entrassem na área, morreriam:
“O ‘coronel’ disse que tinha vindo do Mato Grosso,
onde tinha terra, e que já havia matado índios
Xavante naquela região. Em Aruanã,
ele faria a mesma coisa, pois quem já matou
cem, trinta a mais não seria problema”.
Raul, cacique da
Aldeia Buridina, afirmou que a chegada do não-índio
em Aruanã trouxe muito prejuízo: “Os
índios perderam a terra, a cultura, e até
mesmo o cemitério foi tomado”.
Reocupar a área
sempre foi o maior sonho dos índios de Aruanã,
pois com a terra de volta eles teriam peixe e lugar
para plantar e coletar material para confecção
de artesanato. O cacique Raul Karajá é
o mais entusiasmado: “Todo mundo ficou animado com
a retomada da nossa terra. Agora que a terra é
só nossa, vou trazer outras famílias
lá da Ilha do Bananal. Muitas já retornaram
e somam hoje 186 índios”.
Mas não basta
recuperar a terra, é preciso fazer o resgate
cultural. A proximidade com a sociedade envolvente,
o isolamento na Ilha do Bananal e a falta de espaço
fizeram com que os Karajá de Buridina perdessem
muito de sua cultura. Uma das maneiras que o administrador
da Funai encontrou para acelerar o resgate cultural
dos índios foi levá-los à Ilha
do Bananal para as festividades promovidas pela
comunidade local.
“Com certeza”, afirmou
Edson Beiriz, “isso vai facilitar o resgate das
tradições, da cultura, da confecção
dos artesanatos tradicionais e, principalmente,
a recuperação do idioma tradicional”.
No entanto, a completa
fixação dos índios na área
só foi possível porque a Funai, por
meio da Aer-Goiânia, propiciou as condições
mínimas de sobrevivência da comunidade.
Além dos recursos previstos para a construção
da aldeia, foram disponibilizados também
os recursos necessários à implantação
de projetos de subsistência. Entre eles, as
plantações de arroz, milho, mandioca
e de vários tipos de árvores frutíferas.
“Nós implantamos
na Área I, que fica dentro da Cidade de Aruanã,
um Museu Karajá, administrado pelos próprios
índios”, diz Edson. Esses projetos, segundo
o administrador, vão incentivar os índios
a recuperarem a auto-estima. Sem espaço para
plantar, eles eram obrigados a trabalhar como peão,
mestre-de-obras, e até mesmo mendigar comida.
Somente em época de temporada podiam comercializar
alguns peixes e poucos artesanatos.
Com Aruanã
III desimpedida, os índios agora têm
espaço para viverem de forma digna. Os índios
têm atividades dentro da própria área,
uma dieta alimentar reforçada e nova perspectiva
de vida. A aldeia Buridina, na Terra Indígena
Karajá de Aruanã I, apesar do formato
nos moldes indígenas, tem uma estrutura montada
para hospedar turistas que queiram visitar a comunidade.
A intenção dos índios é,
futuramente, usá-la como projeto de turismo,
em que os visitantes tenham alojamento e possam
ser conduzidos até a aldeia tradicional,
Aricá. A alternativa também será
uma das formas de subsistência do grupo.
Ainda como parte
desse esforço da Funai, foi improvisada a
construção de um curral e uma casa-de-farinha.
Era necessário que os índios começassem
a desenvolver a prática da pecuária
e também pudessem se beneficiar da mandioca.
Esses projetos permitirão condições
futuras de comercialização da produção
excedente, gerando renda para a comunidade.
Para Edson Beiriz,
a Funai materializou um sonho daquele grupo de retornar
às suas terras tradicionais, dando condições
dignas e indispensáveis para viver como povo
diferenciado. “Estamos cumprindo o nosso papel institucional
e, ao mesmo tempo, saldando uma divida histórica
da nossa sociedade para com os Karajá, que
agora lutam pela tão necessária soberania”,
afirmou o administrador.
Para os índios,
a reocupação da Terra Indígena
Karajá de Aruanã III (Aricá)
foi uma possibilidade de recuperar a cultura. Narúbia
Karajá, professora de informática
na aldeia, reforça esse pensamento: “Com
certeza, a retomada das terras foi muito importante.
O pessoal estava sufocado. Agora, as lideranças
se esforçam para a recuperar a língua.
É difícil, mas todos já estão
sendo conscientizados dessa importância”.
Hawakati, ex-cacique
e uma das mais expressivas lideranças da
Aldeia Buridina afirma o pensamento de toda a comunidade:
“Aricá [área III] foi muito importantes
para os índios, porque a área era
tradicionalmente de pesca, caça, coleta de
frutos e material para artesanato. A comunidade
indígena de Aruanã poderá voltar
a viver como Karajá”.
Fonte: Funai – Fundação
nacional do Índio (www.funai.gov.br)
Assessoria de imprensa (Mário Moura - CGAE)