ÍNDIOS DESPEJADOS ESPERAM QUE ELEIÇÕES SIRVAM PARA SOCIEDADE RECONHECER SEUS DIREITOS

Panorama Ambiental
Brasília (DF) – Brasil
Setembro de 2006

20 de Setembro de 2006 - Spensy Pimentel - Enviado Especial - Antonio João (MS) - Índios Guarani-Kaiowá despejados da área Nhanderu Marangatu em 2005 esperam que eleitos em outubro reconheçam seus direitos.

Antonio João (MS) - No dia 15 de dezembro do ano passado, mais de 500 cidadãos brasileiros foram expulsos, por ordem da Justiça, da terra que pertence a eles há gerações imemoriais, segundo atestam laudos científicos, inúmeros documentos históricos e o reconhecimento do próprio governo brasileiro, firmado pelo presidente da República em março de 2005.

Dezenas de índios Guarani Kaiowá que reivindicam a área Nhanderu Marangatu, a 6 quilômteros da cidade de Antonio João (MS), tiveram os documentos queimados durante o despejo. Eles contam que os fazendeiros mandaram incendiar as casas construídas logo depois da homologação das terras.

Mesmo assim, são muitos os índios que apresentam prontamente os títulos de eleitor à equipe de reportagem.“A gente vota porque quer que o direito seja igual para o índio e para o branco“, diz Sebastião Pedro, uma das lideranças da área.

“Se o meu próximo da cidade tem um radinho, eu quero ter também. Dizem que não posso porque o radinho não é da cultura indígena. Pra nós, isso é uma desculpa muito grande dos políticos para continuar sem fazer nada pela gente.”

Sebastião acredita que há uma visão equivocada por parte dos brancos sobre a “cultura indígena”.

“A gente conserva a tradição, mas também pode mudar, é só fazer um trabalho devagarinho, com cuidado. Antigamente, quando chegavam pra dar vacina, patrício corria pra dentro do mato. Ninguém nem ia no médico. Agora, com o agente de saúde conversando, o pessoal vai entendendo as coisas.”

Como agente da Fundação Nacional de Saúde, Sebastião tem por dever de ofício visitar as famílias, acompanhando a evolução saúde das pessoas em cada residência. Por sugestão de uma enfermeira com quem trabalha, passou a ouvir com especial atenção o que as pessoas de que trata lhe dizem: “Não é só pensar na doença. Tem que ouvir, dar atenção. Às vezes, a pessoa tem um problema em casa.”

Entre os Kaiowá, saber ouvir e responder com as palavras corretas, que animam e dão forças para continuar vivendo, é a atividade tradicional dos xamãs, os nhanderu (algo como “pai de todos”, ou “nosso pai”, em guarani). Uma tarefa muito parecida com a que Sebastião exerce hoje.

Ele conta que, uma semana antes do despejo, foi visitar uma senhora de 56 anos que reclamava de dores. E ela lhe disse na ocasião: Sebastião, essa dor que eu sinto não é tanto de doença. É mais de preocupação. Eu sei que eles vão despejar a gente, e eu não quero estar aqui pra ver isso.

“Isso foi numa quarta-feira. No sábado, ela se enforcou. Na outra semana foi o despejo”, lembra o agente de saúde.

Desde os anos 80, os suicídios vêm ocorrendo de forma crescente entre os Guarani Kaiowá de Mato Grosso do Sul. Nos últimos anos, foram registrados cerca de 50 a 60 por ano, numa população de cerca de 38 mil pessoas. “A maioria não entende, fala que o índio se mata porque quer. Mas não é isso, não. O problema é a preocupação.”

Sebastião mora no Campestre, pequeno vilarejo ao lado de Nhanderu, onde ficam a escola e o posto de saúde utilizados pelos indígenas da região. Ali perto, 23 anos atrás, foi morto o líder guarani Marçal de Souza.

Ano passado, na semana do Natal, outro jovem morador de Nhanderu, Dorvalino Rocha, foi morto, deixando uma viúva e seis filhos. Os índios acusam seguranças contratados por fazendeiros pelo crime.

Conversando conosco no quintal de sua casa, Sebastião aponta para a estrutura feita de varas de bambu trançadas, logo ao lado: “Parece que a gente vive como porco no chiqueiro. Um dia chega alguém, pega a gente, leva e mata”.

Até que a Justiça decida quem tem a razão sobre a posse dos 9,3 mil hectares de Nhanderu, os índios ocupam uma faixa de 28 hectares, vizinha à área original.

Perto dali, o agente de saúde conta que a Funasa montou, desde o início de agosto, uma casa para recuperação de crianças indígenas desnutridas. Como os fazendeiros, durante o despejo, também destruíram as roças que haviam sido plantadas no início das chuvas ano passado, dezenas de famílias estão passando fome este ano.

Os cadastros dos programas públicos de cestas básicas não estão atualizados. “O pessoal vai plantar agora. Até colher, o sofrimento é grande.”

Os índios de Nhanderu Marangatu vão às urnas em 1º de outubro, mas não sabem bem o que esperar dos novos ocupantes do Executivo e Legislativo.

Já dos responsáveis pelo Judiciário, especialmente ministros do Supremo Tribunal Federal, eles querem o julgamento rápido da ação movida pelos fazendeiros da região, que têm títulos de propriedade dados pelo governo do estado, nos anos 50.

Na época, não havia política para reconhecimento das terras indígenas tradicionais e a orientação do governo brasileiro era ocupar a faixa de fronteira como Paraguai para garantir a soberania sobre o território.

“A gente fica confuso. Antes achava que era só pedir pro governo reconhecer nosso direito, agora vem isso. Já não sei mais em quem confiar”, diz a professora Leia Aquino, mulher de Sebastião, outra liderança de Nhanderu Marangatu.
Foto: Valter Campanato/ABr

     

 
 

Fonte: Agência Brasil - Radiobras (www.radiobras.gov.br)
Ascom

 
 
 
 
 
 

 

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