DECRETO CONTRA DESMATAMENTO: OUTDOOR AMBIENTAL?

Panorama Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Janeiro de 2008

07 de Janeiro de 2008 - Entre agosto de 2000 e agosto de 2005, a área total de desmatamento na Amazônia foi equivalente a metade da superfície do Estado de São Paulo

Brasília (DF), Brasil — Analisamos o decreto assinado pelo governo em dezembro com medidas para combater a retomada do desmatamento na Amazônia. Há pontos interessantes, mas a pergunta que não quer calar é: é pra valer?

O governo estabeleceu, no final do ano passado, uma série de novas medidas para combater a retomada do desmatamento na Amazônia por meio do decreto 6.321, assinado em 21 de dezembro pelo presidente Lula e a ministra Marina Silva, do Meio Ambiente.

Em verdade, o mérito do decreto está em tentar reunir, num texto só, exigências que se encontravam dispersas pela legislação brasileira, surpreendendo, como diz Caetano Veloso, por revelar o que sempre pode ter “estado oculto, quando terá sido o óbvio”. A grande incógnita é saber se, por conta disso, haverá fôlego para fazer a lei se transformar em realidade.

O decreto responde a algumas das inquietações e recomendações do Greenpeace e demais entidades que discutem há anos o problema ambiental e fundiário na Amazônia. Como por exemplo a importância do cadastramento e do licenciamento ambiental dos imóveis rurais, para se alcançar níveis mínimos de governança na região e estruturar medidas permanentes para zerar o desmatamento. Muitas dessas medidas foram incluídas na proposta do Pacto pelo Fim do Desmatamento na Amazônia, lançado em outubro de 2007.

No entanto, não se pode deixar de verificar que o governo só se mexeu quando o leão do desmatamento já estava rugindo em alto e bom som.

Além disso, o decreto não parece contar com o apoio irrestrito do governo como um todo, já que o Ministério do Meio Ambiente (MMA) foi o único a abraçá-lo de forma inequívoca. Até as pedras da Esplanada dos Ministérios em Brasília sabem que quando um ministro não assina um decreto, significa que ele não tem nada a ver com o assunto ou que as entranhas da sua pasta dificilmente deglutirão as obrigações estabelecidas na velocidade necessária a uma ação eficaz e coordenada de governo.

O decreto levou em consideração várias recomendações feitas durante a Oficina sobre Licenciamento Ambiental Rural, realizada em outubro passado em Brasília e organizada pelo Greenpeace, Casa Civil da Presidência da República e MMA, no âmbito do processo de implantação da Moratória da Soja. As principais recomendações da Oficina inseridas no decreto são:

• Integração da base de dados geográfica dos imóveis rurais nos processos de licenciamento ambiental e regularização fundiária;
• Transformação do cadastramento ambiental dos imóveis rurais em um instrumento de planejamento de políticas públicas;
• Priorização da implantação do cadastramento nos municípios situados na Amazônia que têm, além da pressão por desmatamento, histórico de colonização induzida;
• Que o Sistema de Licenciamento Ambiental da Propriedade Rural seja utilizado pelos Bancos e Fundos de Investimento e Fomento como critério para liberação de créditos e incentivos.

Desafios cruciais

Há no entanto interrogações cruciais no decreto como o desafio que o MMA terá para fazer virar realidade as multas que serão aplicadas. Pouco mais de 2% do total de multas aplicadas pelo MMA anualmente são efetivamente executadas. Se isso não mudar, de pouco adiantará inventar novas leis. Ocorre que os primeiros sinais de 2008 neste assunto não são muito alvissareiros. Por exemplo, o governo já anuncia, por meio do relator do orçamento no Congresso Nacional, Deputado José Pimentel (PT/CE), que o MMA não receberá recursos adicionais em 2008. Sem dinheiro novo, como mudar o desempenho acima comentado e como fazer cumprir as disposições do Decreto?

O decreto também não deixa claro como se fará cumprir a proibição do financiamento daqueles que agridem o meio ambiente. Se o texto do decreto não for incorporado pelas resoluções e instruções do Conselho Monetário Nacional (CMN) e do Banco Central, que orientam o funcionamento do nosso sistema financeiro brasileiro, ele dificilmente chegará até a mesa dos gerentes de bancos em toda a Amazônia. Foi por isso que o Greenpeace e as organizações que integram o Grupo de Trabalho de Florestas, do Fórum Brasileiro de Organizações e Movimentos Sociais (FBOMS), pediram, quando estiveram, em 2006, em audiência com o presidente Lula e as ministras Dilma Rousseff (Gabinete Civil) e Marina Silva, que este assunto fosse regulamentado pelo CMN.

Resta torcer e rezar para que o governo não esteja erguendo mais um outdoor para apenas anunciar suas boas intenções, prática à qual sempre recorrem os governantes quando se deparam com o assunto insolúvel da vez.

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Íntegra do decreto No. 6.321 e seus principais destaques07 de Janeiro de 2008Imprimir Enviar Brasília (DF), Brasil — Íntegra e principais destaques do decreto Nº 6.321, assinado pelo presidente Lula e pela ministra Marina Silva (Meio Ambiente) em 21 de dezembro de 2007.

• O MMA, com o auxílio do INPE, organizará a lista dos municípios amazônicos com as maiores pressões por desmatamento, onde serão priorizada a aplicação dos instrumentos de controle e gestão nas áreas das políticas agrária, agrícola e ambiental;
• Nos municípios constantes da lista elaborada pelo MMA, os imóveis rurais ali situados poderão ter que atualizar os seus cadastros juntos ao INCRA, nos termos da Lei 5.868, de 12/12/72;
• Essa atualização cadastral, tal como já é exigido pela Lei 10.267, de 28/08/2001, além dos aspectos estritamente fundiários, deverá abranger a parte relativa à preservação, conservação e proteção dos recursos naturais dos imóveis;
• O governo, no exercício da sua competência fiscalizadora, cadastral ou ambiental poderá fazer a identificação da localização de um imóvel rural, definindo as coordenadas geográficas do seu perímetro;
• Os imóveis rurais constantes da lista elaborada pelo MMA só receberão autorização para desmatar quando estiverem com os seus limites georreferenciados, conforme exige a Lei 10.267 já citada;
• Quem não fizer a atualização cadastral do seu imóvel fica com o seu cadastro bloqueado no Sistema Nacional de Cadastro Rural, criado pelo Lei 5.868, também já citada, o que impede o acesso ao financiamento de atividades agrícolas;
• As agências oficiais federais de crédito não aprovarão crédito de qualquer espécie para quem desobedeça embargo de atividade agropecuária ou florestal realizada em imóvel rural de forma irregular, bem como para quem compre produtos de origem animal ou vegetal oriundos desse imóvel, o que já está previsto pela Lei 6.938, de 31/08/81 e pelo Decreto 3.179, de 21/09/99;
Organização e divulgação pelo IBAMA de lista com os dados do imóvel rural e do seu proprietário, onde ocorreu a infração ambiental.

Abaixo, a íntegra do decreto:

Dispõe sobre ações relativas à prevenção, monitoramento e controle de desmatamento no Bioma Amazônia, bem como altera e acresce dispositivos ao Decreto no 3.179, de 21 de setembro de 1999, que dispõe sobre a especificação das sanções aplicáveis às condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto nos arts. 2o, incisos II e IX, 4o, inciso II, da Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981, no art. 14, alínea “a”, da Lei no 4.771, de 15 de setembro de 1965, no art. 2o, § 3o, da Lei no 5.868, de 12 de dezembro de 1972, no art. 46, inciso I, alínea “c”, da Lei no 4.504, de 30 de novembro de 1964, e no Capítulo VI da Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998,

DECRETA:

Art. 1o Este Decreto estabelece, no Bioma Amazônia, ações relativas à proteção de áreas ameaçadas de degradação e à racionalização do uso do solo, de forma a prevenir, monitorar e controlar o desmatamento ilegal.

Art. 2o Para os fins do disposto no art. 1o, o Ministério do Meio Ambiente editará anualmente portaria com lista de Municípios situados no Bioma Amazônia, cuja identificação das áreas será realizada a partir da dinâmica histórica de desmatamento verificada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais - INPE, com base nos seguintes critérios:

I - área total de floresta desmatada;

II - área total de floresta desmatada nos últimos três anos; e

III - aumento da taxa de desmatamento em pelo menos três, dos últimos cinco anos.

Art. 3o Os imóveis rurais, a qualquer título, situados nos Municípios constantes da lista mencionada no art. 2o, poderão ser objeto de atualização cadastral junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA para atender ao disposto no § 3o do art. 2o da Lei no 5.868, de 12 dezembro de 1972.

§ 1o O objetivo precípuo da atualização cadastral é reunir dados e informações para monitorar, de forma preventiva, a ocorrência de novos desmatamentos ilegais, bem como promover a integração de elementos de controle e gestão compartilhada entre as políticas agrária, agrícola e ambiental.

§ 2o Os prazos e especificações técnicas referentes à execução da atualização do cadastro mencionado no caput serão definidas em instrução normativa do INCRA.

§ 3o Os dados cadastrais atualizados serão compartilhados pelo INCRA com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA e com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - Instituto Chico Mendes, como forma de promover a integração das políticas estatais de que trata o § 1o.

§ 4o Os documentos expedidos pelo INCRA, para fins da atualização cadastral referida no caput, não geram efeitos jurídicos para a comprovação de domínio ou de regularidade de reserva legal.

Art. 4o O INCRA poderá exigir, como parte integrante dos documentos comprobatórios da localização geográfica a que se refere o art. 46, inciso I, alínea “c”, da Lei no 4.504, de 30 de novembro de 1964, planta contendo o conjunto das coordenadas geográficas que definem os vértices do perímetro do imóvel rural situado nos Municípios que serão identificados na forma do art. 2o.

§ 1o O INCRA estabelecerá, em instrução normativa, os critérios técnicos para a execução do estabelecido no caput.

§ 2o O IBAMA publicará e atualizará periodicamente lista positiva de imóveis rurais com cobertura florestal monitorada pelo Poder Público, conforme disposto no caput.

Art. 5o Sem prejuízo do que dispõe os arts. 3o e 4o, o Poder Público poderá, no exercício de sua competência fiscalizadora cadastral ou ambiental, ingressar no imóvel sob fiscalização para identificar sua precisa localização geográfica, podendo, de ofício, conferir em campo as coordenadas geográficas que definem os vértices do perímetro do imóvel.

Parágrafo único. Serão considerados atos atentatórios à fiscalização qualquer iniciativa que frustre o estabelecido no caput.

Art. 6o Tendo em vista o disposto no art. 14, alínea “a”, da Lei no 4.771, de 15 de setembro de 1965, as autorizações para novos desmatamentos em extensão superior a cinco hectares por ano nos imóveis com área superior a quatro módulos fiscais, situados nos Municípios da lista do art. 2o, somente serão emitidas para os imóveis que possuam a certificação do georreferenciamento expedida pelo INCRA.

Art. 7o Os imóveis rurais objeto do recadastramento de que trata o art. 3o, cujos detentores não procederem à atualização cadastral, terão seus respectivos cadastros inibidos no Sistema Nacional de Cadastro Rural - SNCR, até a sua regularização.

§ 1o Os Certificados de Cadastro de Imóveis Rurais já emitidos para os imóveis referidos no caput serão cancelados.

§ 2o A concessão de novos certificados ficará condicionada à regularidade cadastral.

Art. 8o A restrição para a emissão de autorização para novos desmatamentos de que trata o art. 6o não será aplicada nos seguintes casos:

I - atividades de segurança nacional e proteção sanitária;

II - obras essenciais de infra-estrutura destinadas aos serviços públicos de transporte, saneamento e energia;

III - atividades de pesquisa e extração de substâncias minerais, outorgadas pela autoridade competente e com a devida licença ambiental;

IV - pesquisa arqueológica; e

V - atividades imprescindíveis à proteção da integridade da vegetação nativa, tais como prevenção, combate e controle do fogo, controle da erosão, erradicação de invasoras e proteção de plantios com espécies nativas, de acordo com o estabelecido pelo órgão ambiental competente.

Parágrafo único. As atividades descritas nos incisos deste artigo não serão afetadas pelo disposto no art. 7o.

Art. 9o A União promoverá, sob a coordenação do INCRA, no prazo de dois anos, prorrogável por mais um ano, sem qualquer ônus aos detentores, o georreferenciamento dos imóveis rurais de até quatro módulos fiscais objetos de atualização cadastral de que trata este Decreto.

Art. 10. As instituições oficiais federais de crédito poderão criar linha de crédito especial para o georreferenciamento de imóveis rurais para fins do recadastramento rural tratado neste Decreto.

Art. 11. As agências oficiais federais de crédito não aprovarão crédito de qualquer espécie para:

I - atividade agropecuária ou florestal realizada em imóvel rural que descumpra embargo de atividade nos termos dos §§ 11 e 12 do art. 2o do Decreto no 3.179, de 21 de setembro de 1999; e

II - serviço ou atividade comercial ou industrial de empreendimento que incorra na infração prevista no art. 39-A do Decreto no 3.179, de 1999.

Art. 12. O art. 2o do Decreto no 3.179, de 1999, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 2o .......................................................................

§ 11. No caso de desmatamento ou queimada florestal irregulares de vegetação natural, o agente autuante embargará a prática de atividades econômicas sobre a área danificada, excetuadas as de subsistência, e executará o georreferenciamento da área embargada para fins de monitoramento, cujos dados deverão constar do respectivo auto de infração.

....................................................................................

§ 13. O descumprimento, total ou parcial, do embargo referido nos §§ 11 e 12 deste artigo será punido com:

I - a suspensão da atividade que originou a infração e da venda de produtos ou subprodutos criados ou produzidos na área objeto do embargo infringido;

II - o cancelamento de respectivos cadastros, registros, licenças, permissões ou autorizações de funcionamento da atividade econômica junto aos órgãos ambientais, fiscais e sanitários;

III - multa cujo valor será o dobro do correspondente ao aplicado para o desmatamento da área objeto do embargo; e

IV - divulgação dos dados do imóvel rural e do respectivo titular em lista mantida pelo IBAMA, resguardados os dados protegidos por legislação específica.” (NR)

Art. 13. O Decreto no 3.179, de 1999, passa a vigorar acrescido dos seguintes artigos:

“Art. 39-A. Incorre nas mesmas penas aplicáveis aos infratores do disposto nos arts. 25, 28 e 39 deste Decreto a pessoa física ou jurídica que adquirir, intermediar, transportar ou comercializar produto ou subproduto de origem animal ou vegetal produzido sobre área objeto do embargo lavrado nos termos do § 11 do art. 2o deste Decreto.” (NR)

“Art. 53-A. Obstar ou dificultar a ação do Poder Público, ou de terceiro por ele encarregado, de georreferenciamento de imóveis rurais para fins de fiscalização de desmatamento:

Multa de R$ 100,00 (cem reais) a R$ 300,00 (trezentos reais) por hectare do imóvel.” (NR)

Art. 14. O Ministério do Meio Ambiente editará e atualizará periodicamente lista de Municípios com desmatamento monitorado e sob controle, desde que o Município, cumulativamente, cumpra os seguintes requisitos:

I - possua oitenta por cento de seu território, excetuadas as unidades de conservação de domínio público e terras indígenas homologadas, com imóveis rurais devidamente monitorados na forma e de acordo com critérios técnicos fixados em instrução normativa específica do INCRA, nos termos do art. 4o deste Decreto; e

II - mantenha taxa de desmatamento anual abaixo do limite estabelecido em portaria do Ministério do Meio Ambiente.

§ 1o A União priorizará em seus planos, programas e projetos voltados à Região Amazônica os Municípios constantes da lista referida neste artigo para fins de incentivos econômicos e fiscais, visando a produção florestal, agroextrativista e agropecuária sustentáveis.

§ 2o Qualquer Município situado no Bioma Amazônia poderá integrar a lista referida no caput.

Art. 15. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 21 de dezembro de 2007; 186o da Independência e 119o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Marina Silva

 
 

Fonte: Greenpeace-Brasil
Assessoria de imprensa

 
 
 
 

 

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