DIREITOS TERRITORIAIS QUILOMBOLAS ESTÃO AMEAÇADOS

Panorama Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Maio de 2008

13/05/2008 As organizações abaixo-assinadas alertam, em nota divulgada ao público em 6 de maio, para o risco de retrocesso na garantia dos direitos territoriais das comunidades quilombolas. O governo federal justifica a proposta de alteração para evitar a suspensão ou anulação do decreto que regulamenta o processo de reconhecimento dos territórios quilombolas.

Garantidos pela Instrução Normativa 20/2005 do Instituto NAcional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), os direitos territoriais quilombolas vêm sendo questionados e ameaçados de serem alterados com a edição de nova instrução normativa - em substituição à IN 20 - para estabelecer os procedimentos de identificação e titulação de tais territórios. A justificativa do governo federal para a alteração é evitar que iniciativas em curso, no Judiciário no Congresso Nacional, suspendam ou anulem o Decreto nº4.887/2003 que regulamentou o processo administrativo de reconhecimento dos direitos territoriais previstos no Art. 68 do ADCT da Constituição Federal. Leia o texto na íntegra.

PELA GARANTIA DOS DIREITOS DAS COMUNIDADES REMANESCENTES DE QUILOMBOS

As entidades abaixo assinadas vêm a público alertar para o risco de retrocesso na garantia dos direitos das comunidades quilombolas. Após serem alvo de intensos ataques veiculados pela imprensa que questionou a legitimidade de seus direitos e sua luta, os/as quilombolas correm o risco de terem seus direitos territoriais cerceados por meio da aprovação de nova instrução normativa que altera o texto da Instrução Normativa 20/2005 do Incra, que estabelece o procedimento administrativo para identificação e titulação dos territórios quilombolas.

A justificativa dada pelo governo para a modificação da instrução vigente baseia-se na necessidade de evitar que iniciativas em curso, junto ao Judiciário e ao Congresso Nacional, suspendam ou anulem o Decreto 4.887/2003 que regulamentou o processo administrativo de reconhecimento dos direitos territoriais previstos no Art. 68 do ADCT da Constituição Federal.

A proposta de nova instrução elaborada pelo governo regride em relação ao estabelecido na IN Incra 20/2005 quanto às concepções sobre identidade quilombola e conceito de território, aos mecanismos para concertação de interesses de Estado e à solução de conflitos que se sobreponham aos territórios quilombolas, à efetividade e celeridade processuais para obtenção do título de propriedade.

Discordamos que a solução para enfrentar as ameaças em curso seja retroceder na garantia de direitos por meio da alteração da instrução normativa do Incra. Na defesa das normas vigentes, temos recentes decisões do Judiciário que reconhecem a auto-aplicabilidade do artigo 68 do ADCT da Constituição Federal e a constitucionalidade do Decreto 4.887/2003.

Preocupado em cumprir a determinação de consulta prévia estabelecida pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Povos Indígenas e Tribais, o governo federal convocou uma consulta aos quilombolas entre os dias 15 a 17 de abril, em Luziânia, Goiás, para discutir a nova norma.

Mesmo discordando do conteúdo proposto para a nova instrução e do procedimento pouco democrático de sua elaboração que não envolveu a sociedade, os quilombolas por meio da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) aceitaram participar de consulta. Cerca de 250 quilombolas e 12 assessorias participaram do encontro, reafirmando o caráter deliberativo do evento e apresentando propostas concretas para a nova instrução normativa.

Ressaltamos que a Convenção 169 da OIT determina no seu Art. 6º(2) que: "a consulta deverá ser efetuadas com boa fé e de maneira apropriada às circunstâncias, com o objetivo de se chegar a um acordo e conseguir o consentimento acerca das medidas propostas". No entanto, foram poucos os dispositivos consensuados entre governo e quilombolas.

A maioria das propostas de alteração da atual IN Incra 20/2005 sugeridas pelo governo não obtiveram o consentimento dos quilombolas. Por outro lado, as mais importantes propostas dos quilombolas não foram acatadas tais como: a não obrigatoriedade da certidão da Fundação Cultural Palmares para início do processo de titulação e a adequação dos quesitos do relatório destinado a identificar o território a ser titulado.

De acordo com o governo, as propostas de alteração não consensuadas na consulta, serão analisadas pessoalmente pelo Presidente da República e os Ministros das pastas afins. Neste sentido, as organizações abaixo assinadas vêm a público reivindicar que as propostas apresentadas pelos quilombolas sejam realmente consideradas, e mais, aprovadas pelo governo federal.

A não observância, pelo governo brasileiro, dos requisitos de validade da consulta estabelecidos pela Convenção 169 da OIT – chegar a um acordo e conseguir o consentimento acerca das medidas propostas – colocará em risco a validade da própria consulta bem como dos resultados que objetivava produzir.

Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (ABONG)
Associação de Proteção ao Meio Ambiente de Cianorte/Paraná
Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia (AATR -Ba)
Associação Nacional de Ação Indigenista (ANAÍ)
Centro de Cultura Luiz Freire
Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES)
Centro de Cultura Luiz Freire
Centro de Cultura Negra do Maranhão (CCN-MA)
Centro de Educação Popular do Instituto Sedes Sapientiae (CEPIS)
Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará (CEDENPA)
Centro de Estudos Bíblicos no Rio Grande do Sul (CEBI-RS)
Centro pelo Direito à Moradia contra Despejos (COHRE)
Centro pela Justiça e Direito Internacional (CEJIL)
Comissão Pastoral da Terra (CPT)
Comissão Pastoral da Terra - Regional Maranhão
Comissão Pastoral da Terra Norte Minas
Comissão Pró-Índio de São Paulo (CPI-SP)
Conselho Nacional de Iyálórisás, Egbomys e Ekedys Negras
Coordenação Continental do Grito dos Excluídos/as
Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB)
Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE)
Educafro
Dignitatis
Instituto Socioambiental (ISA)
Instituto de Assessoria as Comunidades Remanescentes de Quilombo (IACOREQ)
Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc)
Instituto Terramar
Justiça Global
Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE)
Fórum em Defesa da Zona Costeira do Ceará
Fórum Estadual de Mulheres Negras/RJ
Fórum de Mulheres Negras do Estado de São Paulo
Grupo Ação, Mobilização e Desenvolvimento - ABAKÊ
Grupo de Estudos Rurais e Urbanos/PPGCS/UFMA
Grupo de Trabalho Amazônico (GTA)
Grupo de Trabalho sobre Regularização de Territórios Quilombolas em Minas Gerais
GT Combate ao Racismo Ambiental
GT Ambiente AGB-Rio e AGB- Niterói /Associação dos Geógrafos Brasileiros RJ
Koinonia Presença Ecumênica e Serviço
Movimento Negro Unificado - Seção do Rio Grande do Sul
Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)
Observatório Negro-Recife/PE
ORIASHÉ - Sociedade Brasileira de Cultura e Arte Negra/SP
Organização Consciência Negra do Maranhão (CNEGRA)
Rede de Integração Verde
Rede Social de Justiça e Direitos Humanos
Relatoria Nacional para o Direito Humano ao Meio Ambiente
Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo
Sociedade Maranhense de Direitos Humanos
Terra de Direitos

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Comunidades indígenas requerem ao STF ser parte em Ação Popular

14/05/2008 -Petição requerendo a inclusão de comunidades indígenas como partes na Ação Popular 3388, que pede a anulação da portaria que declara de posse permanente Terra Indígena Raposa-Serra do Sol, foi entregue no STF. Proposta por advogados do ISA e do Conselho Indígena de Roraima (CIR), visa assegurar que as comunidades indígenas diretamente afetadas pela decisão sejam ouvidas sobre a validade da demarcação.

A petição, protocolada por advogadas do ISA e do CIR, visa ao ingresso de comunidades indígenas na Ação Popular 3388, movida pelo senador Augusto Botelho (PDT/RR), contra a Portaria 534/05, do ministro da Justiça, que declara a terra Raposa-Serra do Sol como indígena, para manter o reconhecimento oficial concluído com a homologação em abril de 2005.

De acordo com Joênia Wapichana, assessora jurídica do CIR, as comunidades indígenas querem entrar na ação para fortalecer o posicionamento das comunidades e rebater as argumentações que questionam a legalidade do reconhecimento formal da TI. "É clara a legitimidade da comunidade em entrar na ação porque, se a portaria for alterada, o prejuízo é diretamente nosso". Entre os argumentos apresentados no texto está a defesa dos direitos dos povos: "Não causamos prejuízo ao desenvolvimento econômico do estado nem risco à soberania ou à integridade do território nacional. Nós questionamos a própria ação popular que, na realidade, discrimina, é preconceituosa, absurda e inconstitucional ao tentar tirar dos indígenas a identidade brasileira de cidadãos roraimenses". A advogada disse que está preocupada com os rumos do processo e quer garantir espaço no julgamento para fazer a sustentação oral em nome das comunidades indígenas.

A advogada Ana Paula Caldeira Souto Maior, do Programa de Política e Direito Socioambiental do ISA, explica que o apoio do instituto se deve à importância de ser mantida judicialmente a demarcação. "O ISA considera fundamental que as comunidades indígenas entrem na ação para defender esse processo demarcatório do qual participaram ativamentee também, para reorientar a discussão sobre o desenvolvimento do estado. Roraima precisa levar em consideração a contribuição da população indígena. Metade da população rural do estado é indígena e ocupa proporcionalmente medtade do território. O desenvolvimento tem de ser pesnado a partir desta realidade".

Após a suspensão da operação de desintrusão na TI, representantes das comunidades indígenas tentam, em Brasília, convencer as autoridades sobre a legalidade da demarcação.

Audiências Públicas

Na quarta-feira, no Congresso Nacional, duas audiências públicas trataram do tema. Nas comissões de Relações Exteriores e de Defesa Nacional; e da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional, da Câmara, a conversa sobre a retirada de não-índios da reserva indígena Raposa-Serra do Sol contou com a participação do ministro da Justiça, Tarso Genro, e do governador de Roraima, José de Anchieta Júnior.

Nessa audiência, presidida pelo deputado Marcondes Gadelha, Anchieta Júnior apresentou o mapa do estado, afirmando que, por conta da quantidade de Unidades de Conservação, Terras Indígenas e áreas alagadas, a governança seria sobre apenas 10% do território. Declarou que há riquezas minerais localizadas em TIs e que essas áreas, próximas de fronteiras, seriam estratégicas para o Brasil. O governador disse que estava defendendo os interesses de brasileiros e que a questão não se resumia ao conflito entre índios e não-índios, mas a uma demarcação equivocada da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol, retirando de Roraima o controle sobre quase dois milhões de hectares.

A advogada do ISA, Carolina Pinheiro, participou da audiência. Ela relata que, sobre a operação Upatakón 3, o governador disse que esteve com os policiais federais antes de seu início e "que não sentiu segurança na postura dos policiais federais". Quando os policiais afirmaram que suas operações vinham sendo muito tranqüilas, o governador teria respondido que eles estavam acostumados a lidar com traficantes, bandidos que "estendem as mãos para serem algemadas". No caso da Raposa-Serra do Sol ele avisou ao delegado que encontrariam "pessoas que preferem morrer a sair de lá". Diante disso, o governador concluiu ter "salvado vidas" ao mover a ação judicial que resultou na suspensão da operação. "Índios iriam morrer, mas muitos policiais federais também morreriam", disse.

Anchieta afirmou ainda que não estava defendendo ali meia dúzia de empresários, mas muitos outros não-índios preocupados com sua condição nas TIs, como no caso de não-índios casados com índios. "Estou defendendo também 80% das comunidades indígenas que, com certeza, não concordam com a demarcação”.

Tarso Genro começou sua exposição com a leitura do artigo 231 da CF/88, que assegura os direitos territoriais indígenas. Frisou o parágrafo 3º, que versa sobre a possibilidade de aproveitamento dos recursos hídricos: ”os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, e ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei”.

O ministro afirmou que a demarcação de Terras Indígenas segue o que está na Constituição e que demarcações contíguas a terras de outros países não impedem a instalação da Polícia Federal nas fronteiras do Brasil, já que as TIs são de propriedade da União e o presidente da República é o chefe das Forças Armadas brasileiras. “Se não querem aceitar a demarcação da Raposa-Serra do Sol, que seguiu toda a legislação infra e constitucional, há que se mudar a Constituição. Um território se constitui por sua forma de ocupação, e os territórios indígenas se formam pela tradicionalidade de sua ocupação. Não se pode pensar que lavouras são mais eficientes que as terras indígenas, pois os direitos territoriais indígenas estão assegurados constitucionalmente".

Acrescentou que haveria um conflito de legitimidade entre pessoas que produzem na área e os índios, cujas terras são legitimadas pela Constituição. Dessa forma, “se alguém têm títulos de propriedade na área da RSS são os indígenas, que têm direitos assegurados pela Constituição e não os fazendeiros com títulos precários”. “Acredito que a maioria dos ocupantes de terras da União seja de boa fé, contudo, quem tem direito às terras são os povos originários".

O ministro afirmou que a operação Upatakón 3 foi ato inserido em um processo de diálogo com os ocupantes de terras da União por mais de três anos. “Os ocupantes se dividem em dois grupos: um que resiste de forma pacífica, legítima. Outro de forma violenta, terrorista e ilegal. Excessos verbais compõem a natureza de qualquer democracia. Outra coisa é atacar indígenas, ocupantes legais da terra”.

Para demonstrar que não há conflito entre a proteção da soberania nacional e a demarcação de terras indígenas, o ministro anunciou, mais uma vez, o plano de ocupação das fronteiras pelas Forças Armadas, já apresentado ao presidente da República. Outra medida normativa que o governo já havia realizado antes da operação refere-se ao projeto de lei do Estatuto dos Estrangeiros, que “indica o caminho para a criação de um estatuto específico para a presença de ONGs na Amazônia brasileira”.

Genro concluiu dizendo que a União cumprirá a decisão do STF, ressaltando que o caso da Raposa Serra do Sol não diz mesmo respeito apenas à demarcação de uma terra. “A depender da decisão do STF, terá que ser promovida a extinção de todas as demarcações de terras indígenas no Brasil, com todos os conflitos que daí advierem”.

Mais cedo, no Senado, foi realizada audiência que discutiu aspectos jurídicos, antropológicos, econômicos e políticos da TI. Segundo Joênia, ficou clara a importância de garantir a demarcação em área contínua: ”O STF tem de fazer valer os direitos constitucionais. Se não fizer, será violação aos direitos humanos. A Raposa não é um território vazio, como tentam “vender”. Há projetos de desenvolvimento sustentável, criação de gado, escolas. Precisamos avançar nesse processo”.

 
 

Fonte: ISA – Instituto Socioambiental
Assessoria de imprensa

 
 
 
 

 

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