O corpo de
Bartolomeu Moraes da Silva ou "Brasília",
como era chamado, foi encontrado no domingo, 21/07,
em Altamira (PA). Considerado um dos principais
líderes na luta contra a violenta pressão
de madeireiros e fazendeiros sobre pequenos produtores
rurais do sul do Pará, sua morte ocorre um
ano depois do assassinato de Dema, outra importante
liderança local.
Um telefonema anônimo informou a polícia
sobre o local do crime, às margens da rodovia
Cuiabá-Santarém (BR-163), próximo
à fronteira com o Mato Grosso. O corpo de
Bartolomeu apresentava sinais de tortura, estrangulamento
e fraturas nas pernas e estava perfurado com doze
tiros. O tenente da polícia militar, Márcio
Abudi, informou que já foram presos dois
suspeitos e que apesar de não terem confessado
o crime, apontaram envolvimento de dois madeireiros,
conhecidos como Polaco e Periquito. As lideranças
locais são unânimes ao afirmar que
o incidente é resultado da ocupação
violenta daquela região.
Brasília tinha 47 anos, era natural de Serra
Talhada (PE), e nos últimos anos dirigia
a delegacia do Sindicato dos Trabalhadores Rurais
de Altamira, no distrito de Castelo dos Sonhos,
além de ser suplente do vereador José
Adelson da Silva. Um dos coordenadores da Federação
dos Trabalhadores na Agricultura no Pará
(Fetagri-PA), Juraci Dias da Costa, explica que
"Brasília", como outros líderes,
sofria uma série de ameaças por denunciar
o esquema de grilagem de terras na região
e a pressão de madeireiros e fazendeiros
sobre os pequenos produtores.
Panorama da região
O sul do Pará tem sido
um pólo de atração de trabalhadores
rurais, por meio de projetos de colonização
e de reforma agrária. A definição
das áreas de assentamento em Altamira cabe
ao escritório do Instituto Nacional de Colonização
e Reforma Agrária (Incra) no município
de Itaituba, que é acusado pela consultora
da Fetagri-PA e assessora de projetos do Ministério
do Meio Ambiente, Raimunda Monteiro, de seguir interesses
de madereiros e grandes fazendeiros. "No primeiro
ano o pequeno produtor é assentado numa área
isolada, sem infra-estrutura ou assistência
do governo, e permite a entrada de madeireiros para
limpar o local. No segundo ano, faz uma roça
de subsistência e no terceiro, como o solo
ácido não produz mais nada, vende
a terra para algum fazendeiro por não mais
que 200 reais."
A região também é foco de grilagem
e de conflitos com trabalhadores sem-terra, que
acabam sendo atacados por ocuparem áreas
apropriadas ilegalmente por fazendeiros. Ao longo
da rodovia Cuiabá-Santarém está
instalada ainda a indústria madeireira, em
busca de espécies altamente valiosas como
o mogno. Só para lembrar, Castelo dos Sonhos
é uma das portas de entrada para a área
conhecida como Terra do Meio, região do Pará
que ainda concentra quantidade expressiva de espécies
madeireiras comerciais.
Reivindicações
Aterrorizados com o crime, representantes
das entidades sociais de Altamira distribuíram
hoje, 23/07, uma nota pública exigindo que
a polícia federal atue no caso, já
que faltam condições às polícias
civil e militar. A nota pede ainda: o envio ao local
do crime de uma perícia especializada para
colher provas; que todo o processo seja acompanhado
por entidades de defesa dos direitos humanos e dos
trabalhadores rurais; e que nas áreas onde
houver assassinato de trabalhadores, seja suspensa
a destinação de terras públicas
para fazendeiros. Ao final, as entidades recordam
que em 30 anos houve 715 assassinatos dessa natureza
no Pará. O último deles aconteceu
no ano passado, em 23/08, quando o líder
conhecido como Dema foi assassinado a tiros em sua
residência. O caso, que tem sido acompanhado
pelo Ministério Público Federal, ainda
não foi solucionado.
Até o fechamento dessa notícia, não
havia hora e local marcados para o enterro de Bartolomeu
da Silva, que deverá acontecer ainda hoje.
Para saber mais informações e apoiar
a manifestação das entidades de Altamira,
entre em contato com a Fundação Viver
Produzir e Preservar, pelo email fvpp@bol.com.br.
Confira na íntegra a nota
pública divulgada por entidades sociais de
Altamira.
Nota Pública de entidades
sociais de Altamira sobre o assassinato do líder
sindical Bartolomeu Morais da Silva
Altamira, 22 de julho de 2002
Líder Sindical foi assassinado com 12 tiros,
sofreu tortura e estrangulamento tendo suas pernas
quebradas
O Sindicalista e líder político do
PT senhor Bartolomeu Morais da Silva, conhecido
por "Brasília" foi brutalmente
assassinado no último domingo, dia 21 do
corrente mês, o corpo foi encontrado às
margens da rodovia Santarém-Cuiabá
nas proximidades do distrito de Castelo dos Sonhos,
local onde o sindicalista residia e atuava como
delegado sindical representando o sindicato dos
Trabalhadores Rurais de Altamira e também
primeiro suplente de vereador pelo PT no município.
Desde 1997 que o Sindicato dos Trabalhadores Rurais
de Altamira vem pressionando o INCRA e o Governo
do Estado no sentido de resolver os graves conflitos
fundiários na Região de Castelo dos
Sonhos, Distrito de Altamira, próximo à
divisa com Estado de Mato Grosso, na Rodovia Cuiabá
Santarém. O conflito está acontecendo
entre pequenos posseiros e Fazendeiros que vem de
outras regiões do país e demarcam
enormes áreas de terra, denominando-se donos
passando então a ameaçar os pequenos
agricultores que ocupam essas áreas. O STR
de Altamira fundou então uma Delegacia Sindical
naquele Distrito, visando organizar aquelas famílias,
considerando o abandono que a região enfrenta
por parte do poder público, para isso foi
eleito como delegado sindical o agricultor, Bartolomeu
Morais da Silva, apelidado de BRASÍLIA, solteiro,
47 anos, nascido em Serra Talhada no Pernambuco,
filho de João Romualdo da Silva e Antonia
Moraes da Silva. O sindicalista, cumprindo seu papel,
esteve em Brasília - DF e Belém, ocasião
em que fez diversas denúncias das graves
ameaças que estavam sofrendo os agricultores
daquela região, objetivando um fim para esses
conflitos solicitou providências para coibir
a violência que vem sendo cometida por parte
de fazendeiros e seus pistoleiros, com a conivência
da polícia, de Castelo dos Sonhos e Novo
Progresso. Alguns fatos demonstram a gravidade dos
conflitos:
* No início de junho do corrente ano, um
grupo de policiais militares procedentes de Novo
Progresso, comandados pelo sargento Francisco Pereira
Borges, prendeu, sem nenhuma explicação
contundente, 19 (dezenove) trabalhadores rurais,
alguns eram posseiros da gleba Gorotire Mesmo não
tendo sido nada comprovado contra essas pessoas,
as mesmas passaram trinta e cinco dias presos.
* No dia 26 de abril de 2002 a juíza, HELOÍSA
HELENA DA SILVA GATO, da Comarca de Novo Progresso
concedeu liminar de manutenção de
posse em favor, de Nilton Albuquerque de Barros
e mais oito empresários para gleba Gorotire
denominada fazenda "Beeg Vale", uma área
ocupada por várias famílias. Nessa
ocasião o pretenso dono acompanhado de diversos
pistoleiros fortemente armados, foram para a área
fazer a desocupação à força
mas foram surpreendidos pelos posseiros que prenderam
suas armas e as entregaram a polícia, a qual
não tomou qualquer atitude contra esse fato
de escandaloso abuso de poder.
Essas denúncias, como diversas outras anteriores
foram encaminhadas por Bartolomeu Moraes da Silva,
ao Dr. Paulo Sette Câmara, Ministério
Público Federal e a Ouvidoria Nacional do
INCRA. Nessas denúncias o sindicalista declarou
estar sendo ameaçado pelo trabalho que fazia
e solicitou providências para solucionar os
conflitos.
Nós, das entidades abaixo assinado, repudiamos
mais este crime, cometido claramente com fins políticos,
de fazer calar mais uma liderança sindical
dos Agricultores Familiares e responsabilizamos
publicamente as autoridades conforme nominamos abaixo,
pelo seu descaso com os crimes cometidos contra
os direitos humanos, relembramos aqui o assassinato
de Ademir Federicci "Dema", também
sindicalista dessa região, que completará
1 ano sem que a justiça tome qualquer providência
para elucidar o crime e prender os mandantes. Exigimos
que o Governo do Pará coloque um fim na impunidade
vergonhosa que tem marcado esse Estado.
* Responsabilizamos o Governo do Estado do Pará,
que mesmo ciente das ameaças e dos desmandos
cometidos pela própria polícia militar
daquele distrito e da polícia civil, não
tomou qualquer providência;
* Ao Poder Judiciário, na pessoa de alguns
juízes por concederem mandado e liminares
de Manutenção de posse baseados em
documentos sem qualquer valor legal a fazendeiros
que demarcam ilegalmente grandes áreas, sem
levar em conta as famílias que ocupam estas
áreas há vários anos.
* Ao INCRA, que mesmo tendo total conhecimento destes
conflitos, pouco tem feito no sentido de garantir
a terra a quem quer trabalhar. Aliás, tem
contribuído para acirrar os conflitos ao
conceder declarações de ocupação
de grandes áreas a fazendeiros para fins
especulativos.
EXIGIMOS:
* QUE A POLÍCIA FEDERAL ATUE NO CASO POIS
TEMOS A CRER QUE AS POLÍCIAS CIVIL E MILITAR
NÃO DISPÕEM DE CONDIÇÕES
PARA CONDUZIR O CASO.
* QUE SE ENVIE IMEDIATAMENTE AO LOCAL ONDE O CORPO
ENCONTRA-SE UM GRUPO DA POLÍCIA CIENTÍFICA
PARA COLHER PROVAS NECESSÁRIAS DANDO CONDIÇÕES
PARA ELUCIDAÇÃO DO CRIME.
* QUE O PROCESSO SEJA ACOMPANHADO POR ENTIDADES
DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS E DOS TRABALHADORES
RURAIS.
* QUE NAS ÁREAS ONDE HOUVER ASSASSINATO DE
TRABALHADORES RURAIS E SUAS LIDERANÇAS, SEJA
SUSPENSO QUALQUER PROCESSO DE DESTINAÇÃO
DE TERRAS PÚBLICAS PARA FAZENDEIROS.
Por fim recordamos que esse assassinato soma-se
aos 715 dessa natureza já cometidos no estado
do Pará nos últimos 30 anos.
Federação dos Trabalhadores
na agricultura do Estado do Pará - FETAGRI
Fundação Viver Produzir e Preservar
- FVPP
Comissão Pastoral da Terra - PT XINGU
Comissão Pastoral da Terra da Igreja Metodista
Movimento pelo Desenvolvimento da Transamazônica
e Xingu - MDTX.
Conselho Indigenista Missionário - CIMI
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Altamira
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Vitória
do Xingu
Movimento de Mulheres Trabalhadoras de Altamira
- Campo e Cidade
Grupo de Trabalho Amazônico - GTA
Partido dos Trabalhadores - PT Diretório
Municipal de Altamira