Mário Dzuru’rã,
mais conhecido como ‘Juruna’, foi o primeiro e único
índio a chegar ao Congresso Nacional. Eleito
deputado federal (1983-1986) pelo PDT (Partido Democrático
Trabalhista) de Leonel Brizola, tornou-se famoso
e popular. Se de um lado era aclamado por suas investidas
na defesa dos direitos indígenas, de outro
foi motivo de chacotas e preconceito.
Vítima de uma diabetes crônica, Juruna
morreu ontem (17/07) no hospital Santa Lúcia,
em Brasília, onde estava internado, por conta
de complicações da doença.
Vindo da aldeia Namunkurá, situada em Barra
do Garças, na área indígena
São Marcos (MT), foi precursor e representante
máximo de um estilo de política indígena
vigente no Brasil, no qual os índios ingressam
nas estruturas da sociedade dos brancos, investem
no domínio de seus códigos culturais
e procuram reverter umas e outros em seu favor.
O xavante apareceu na cena política brasileira
na década de 1970, quando passou a transitar
por Brasília em busca de melhorias para seu
povo e logo engajou-se no nascente movimento indígena
no Brasil, que viria a projetar, igualmente, figuras
como Álvaro Tukano, Aílton Krenak,
Davi Yanomami e Marcos Terena. Juruna ficou conhecido
por levar consigo um gravador, recurso que utilizava
para registrar declarações de não-índios
e cobrar coerência entre falas e ações
de personalidades políticas brasileiras.
Em 1980, enfrentou a proibição do
governo que o impedia, como índio, a viajar
ao exterior. Filiado ao PDT, candidatou-se à
Câmara Federal em 1982, elegendo-se pelo Rio
de Janeiro, com mais de 30 mil votos.
Deputado do partido de Leonel Brizola e do antropólogo
Darcy Ribeiro, Juruna prenunciou um amplo movimento
de ingresso de índios na política
institucional-partidária do país.
Até hoje, entretanto, permanece sendo o único
índio a ter chegado ao parlamento federal
brasileiro.
Em sua trajetória acumulam-se aspectos variados.
Aclamado como exemplo de sucesso e representante
do movimento indígena nas esferas do poder
federal, também foi motivo de chacota e objeto
de preconceito, com seu gravador sempre em punho
e seu português compreensivelmente falho.
Ocupando posição propícia para
encabeçar lutas indígenas e indigenistas
mais amplas que as relativas à sua própria
etnia, sofreu, muitas vezes, críticas destes
mesmos setores e de outras parcelas do povo Xavante.
Às vezes atrelado às formas clientelistas
e fisiológicas de se fazer política
no Brasil, exemplificadas, sobretudo, pelas negociações
envolvendo cargos e favores no interior da Funai
(Fundação Nacional do Índio),
também foi um notório e importante
defensor dos direitos indígenas.
Encerrada a legislatura de 1983-1986, Juruna não
conseguiu se reeleger. Em 1994, transferiu seu domicílio
eleitoral para o Distrito Federal mas teve nova
candidatura fracassada. Com dificuldades de locomoção,
o ex-deputado e líder indígena, que
andava de cadeira de rodas nos últimos tempos,
estava morando em Guará, cidade-satélite
de Brasília. Era apoiado financeiramente
pelo PDT e recebia uma pensão vitalícia
da União. Sua residência no Distrito
Federal era um exemplo de um processo cada vez mais
visível na realidade indígena brasileira:
a constituição de bases de apoio e
hospedagem para familiares e outros índios
dispostos a morar, em caráter temporário
ou mais permanente, em meios urbanos.
Se Juruna faz parte da recente história política
brasileira, quem deve estar mais abatido com sua
morte são, decerto, jovens lideranças
indígenas, não apenas xavantes, que
tinham nele um foco de inspiração
e referência.