Formação
de mosaicos de Unidades de Conservação
(UCs), condução de planos de manejo,
gestão compartilhada com organizações
da sociedade civil de interesse público (OSCIPs)
são alguns dos itens abordados pelo decreto,
que integra o pacote ambiental lançado por
FHC na semana passada.
Fruto de um workshop realizado
pela Secretaria de Biodiversidade e Florestas do
Ministério de Meio Ambiente e pelo Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (Ibama) em fevereiro de 2001,
com a participação de dezenas de representantes
de órgãos públicos, cientistas
e ONGs, cujo resultado foi aprovado posteriormente
pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama),
o Decreto 4.340, de 22/08/2002, traz algumas inovações
interessantes que merecem ser destacadas.
Mosaicos de Unidades de Conservação
(UCs)
O mosaico de Unidades de Conservação
(UCs) regulamentado pelo Decreto é uma importante
e inovadora fórmula de gestão de áreas
protegidas, em que regiões abrangidas por
mais de uma UC poderão estabelecer, por ato
do Ministério de Meio Ambiente, mecanismos
de gestão integrada do território.
Esse modelo de gestão territorial permitirá
maior integração e soma de esforços
na fiscalização, na definição
dos usos nas áreas de fronteira das UCs,
no monitoramento e avaliação dos planos
de manejo, no fomento a pesquisa científica
e na alocação de recursos entre as
Unidades de Conservação vizinhas ou
mesmo sobrepostas. Os mosaicos disporão de
um conselho consultivo formado pelos diretores das
UCs, por representantes de órgãos
públicos locais, estaduais e, quando couber,
federais, além de representantes da sociedade
civil. Cabe ainda ao conselho do mosaico manifestar-se
sobre as propostas de solução para
a sobreposição de Unidades de Conservação.
Planos de Manejo
O Plano de Manejo estabelece as
regras de gestão e as possibilidades de usos
das UCs. Os órgãos que integram o
SNUC deverão estabelecer roteiros metodológicos
específicos para cada categoria de UC, prevendo
diretrizes para os diagnósticos, zoneamentos,
programas de manejo, prazos para avaliação,
revisão e implementação. Os
planos de manejo deverão estar disponíveis
na sede da respectiva Unidade de Conservação
e no centro de documentação do órgão
do SNUC responsável pela UC.
Conselhos das Ucs
Os conselhos das Unidades de Conservação
são, nos termos da Lei 9.985/2000, consultivos
ou deliberativos, conforme a categoria de UC. O
decreto determina que a composição
dos conselhos deverá ser sempre que possível
paritária entre órgãos públicos
e a representação da sociedade civil.
Os conselhos serão compostos por órgãos
públicos das diferentes esferas (municipal,
estadual e federal) e de áreas afetas à
conservação, tais como pesquisa científica,
educação, defesa nacional, cultura,
turismo, paisagem, povos indígenas e assentamentos
humanos. A representação da sociedade
civil será composta por organizações
ambientalistas com comprovada atuação
na região, população residente
no interior ou no entorno da UC, representantes
dos setores privados atuantes na região e,
quando houver, membros de comitês de bacia.
No caso de UC municipal, o Conselho Municipal de
Meio Ambiente poderá assumir o papel de conselho
da UC, desde que respeitados os critérios
de diversidade e de paridade estabelecidos pelo
decreto.
Dentre as inúmeras competências relacionadas
ao monitoramento, à gestão e à
integração da UC com a sociedade local
e o seu entorno atribuídas aos conselhos,
destaca-se a competência para manifestar-se
sobre obra ou atividade potencialmente causadora
de impacto na Unidade de Conservação,
em sua zona de amortecimento (entorno), mosaicos
e corredores ecológicos. Antes do decreto
essa atribuição era de responsabilidade
única do órgão gestor da UC.
Gestão Compartilhada com
OSCIP
Poderão gerir Unidades
de Conservação, mediante a celebração
de termo de parceria com os órgãos
executores do SNUC - nos moldes da Lei 9.790/99
- organizações da sociedade civil
de interesse público (OSCIPs) que tenham
por finalidade a proteção ao ambiente
ou promoção do desenvolvimento sustentável
e que comprove a realização dessas
atividades na região abrangida pela UC ou
no bioma por ela protegido.
O edital para seleção das organizações
interessadas será publicado com, no mínimo,
60 dias de antecedência no Diário Oficial
e em jornal de grande circulação local.
A aprovação da organização
será feita pelo conselho deliberativo ou,
no caso de conselho consultivo, pelo órgão
público responsável pela UC. A OSCIP
que integrar o conselho da UC não poderá
participar da licitação para gestão
da Unidade de Conservação.
O decreto não define a abrangência
da gestão da Unidade de Conservação
a ser delegada às OSCIPs, ou seja, o limite
entre as atribuições que poderão
ser terceirizadas e aquelas que permanecerão
sob a responsabilidade do órgão público
executor do SNUC.
Compensações ambientais
A compensação para
as Unidades de Conservação prevista
pela lei do SNUC é de, no mínimo,
0,5% do custo total dos empreendimentos potencialmente
causadores de impactos ambientais sob licenciamento
ambiental. Este percentual pode ser acrescido conforme
o grau dos impactos previstos. Os órgãos
licenciadores criarão câmaras de compensação
ambiental composto (tão somente) por representantes
do órgão para analisar e propor a
aplicação da compensação.
O decreto não prevê qual o papel do
conselho na definição do montante
da compensação e da definição
da destinação dos recursos. A aplicação
dos recursos deverá seguir a seguinte ordem
de prioridade:
I - regularização fundiária
e demarcação das terras;
II - elaboração, implantação
e revisão dos planos de manejo;
III - aquisição de bens e serviços
necessários à implantação
da unidade;
IV - desenvolvimento de estudos necessários
à criação de novas unidades
de conservação;
V - desenvolvimento de pesquisas na unidade de conservação
já existente.
A regularização de empreendimentos
implantados sem licença ambiental antes da
edição do decreto deverá ser
feita em 12 meses. Este dispositivo não se
aplica a todos os casos de empreendimentos sem licença
ambiental, mas somente quando houver potencial impacto
em Unidades de Conservação para efeito
de identificação de medidas mitigadoras
e compensatórias que deverão ser aplicadas
e destinadas às unidades afetadas.
Este dispositivo do decreto (art. 34) não
se sobrepõe ao dispositivo constitucional
que proíbe qualquer tipo de atividade que
possa prejudicar os atributos que justificaram a
criação da Unidade de Conservação,
sendo, portanto, obrigação do órgão
ambiental competente paralisar qualquer atividade
sem licença ambiental que possa causar danos
ambientais em áreas protegidas, a despeito
do prazo estabelecido pelo decreto para a regularização
da atividade.
Populações Tradicionais
em Ucs
O decreto estabelece uma série
de prazos para os atos administrativos necessários
à solução de pendências
fundiárias que envolvam populações
tradicionais no interior de Unidades de Conservação
de proteção integral - parques naturais,
reservas biológicas e estações
ecológicas.
O órgão fundiário competente
terá prazo de seis meses para apresentar
um plano de trabalho para o reassentamento das populações.
Este plano deverá conter a definição
de datas e condições para o reassentamento.
Enquanto o plano de reassentamento não é
concebido e implantado, deverão ser estabelecidos
termos de compromisso com as condições
de permanência da população
na UC, respeitando as atividades de subsistência
destas e seus modos tradicionais de vida. O reassentamento
deverá se dar em áreas que mantenham
as mesmas condições socioambientais
e somente poderá ocorrer com a concordância
das populações, mediante indenização.
Nas hipóteses de UCs já criadas, o
prazo para a celebração do termo de
compromisso entre população e órgão
ambiental é de dois anos da publicação
do decreto. Para as novas UCs o prazo é de
um ano, contado a partir da publicação
de sua criação.
Regulamentação específica
para cada categoria de UC
Embora tenham sido bastante discutidas
propostas para regulamentação específica
de cada categoria de Unidade de Conservação,
o Decreto 4.340/02 prevê que cada categoria
será regulamentada em ato próprio
a partir de proposta do Ministério de Meio
Ambiente.
Regulamentada a matéria, o desafio maior
agora reside na implementação e no
funcionamento dos conselhos gestores das UCs que,
se operados transparentemente e sem as mazelas do
clientelismo e do patrimonialismo muitas vezes reinante
na gestão de áreas públicas,
poderão criar sinergias positivas para a
gestão compartilhada das áreas protegidas
e sua inserção no meio socioeconômico
local. Outro desafio histórico na questão
das áreas protegidas que pode ser enfrentado
com a implementação dos conselhos
gestores é a cobrança por destinação
concreta de recursos para a efetiva implementação
das Unidades de Conservação, boa parte
delas existentes ainda somente em decretos, leis
e similares, mas ainda por serem efetivamente implementadas.