Cientistas acreditam que mogno
estará comercialmente extinto na Amazônia
brasileira no prazo de uma geração
se medidas concretas de proteção não
forem adotadas imediatamente. Não seria um
fato inédito. Por sua beleza, resistência
e facilidade de ser trabalhada, duas espécies
de mogno - Swietenia mahogany e S. humilis - foram
exaustivamentes exploradas pelos colonizadores europeus
no México e América Central por quase
500 anos. Resultado: as espécies foram tão
dizimadas que hoje são consideradas comercialmente
extintas e estão sob proteção
rigorosa da Convenção Internacional
sobre Espécies Ameaçadas de Extinção
(CITES), listadas no Anexo I.
A indústria madeireira voltou-se, então,
para a espécie Swietenia macrophylla, King,
conhecida como mogno ou aguano no Brasil, mara na
Bolívia, caoba no restante do continente,
mahogany nos países de língua inglesa
e acajou na França.
O mogno começou a ser explorado em grande
escala na Amazônia brasileira na década
de 60 e se intensificou nas décadas seguintes.
Segundo estimativas do Instituto do Homem e Meio
Ambiente da Amazônia (Imazon), 4 milhões
de metros cúbicos de mogno serrado foram
exportados entre 1971 e 2001 - a imensa maioria
(75%) para os Estados Unidos e Inglaterra. Outros
1,7 milhão teriam sido vendidos aqui mesmo
no Brasil. Num cálculo rápido, isso
significa cerca de 10 milhões de metros cúbicos
de madeira em tora ou mais de 2 milhões de
árvores de mogno abatidas pela sanha das
moto-serras. Porém, a real intensidade da
exploração do mogno provavelmente
jamais será conhecida em função
da grande ilegalidade no setor madeireiro.
Os altos valores e os grandes lucros envolvidos
na exploração do mogno explicam as
razões de tanta destruição.
Mais valiosa madeira tropical das Américas,
o metro cúbico de mogno serrado vale, em
média, entre US$1.200 e US$1.400 (ou seja,
entre R$ 3.200 e R$ 3.900) no mercado internacional.
Não é à toa que o produto é
conhecido como "ouro verde". Porém,
o que fica na região explorada é infinitamente
menos: o Greenpeace tem cópias de "contratos"
que mostram que madeireiros pagam R$ 25 o metro
cúbico de mogno retirado ilegalmente de áreas
indígenas. Uma árvore de mogno, com
cerca de 5 metros cúbicos e mais de 200 anos
de idade, sai por R$ 125 no sul do Pará e
norte do Mato Grosso. Após a industrialização,
a árvore, reduzida a 3 metros cúbicos
de madeira serrada, é vendida pelos portos
de Belém (PA), Paranaguá (PR) e S.
Francisco do Sul (SC) por valores que chegam a mais
de R$ 10 mil. Esse volume de madeira permite a produção
de 12 a 15 mesas e cadeiras de mogno. Uma única
dessas sofisticadas mesas é vendida na prestigiosa
rede de lojas Harrods, de Londres, por US$ 8.500.
Ou seja, quem ganha com a destruição
do mogno e da floresta são poucas empresas
estrangeiras e seus agentes no Brasil.
A enorme margem de lucro só encontra similar
no comércio de drogas como a cocaína
e explica a esteira de violência, corrupção,
trabalho escravo, invasão de terras indígenas
e reservas ambientais, sonegação de
impostos, evasão de divisas e desrespeito
aos direitos humanos associado ao mogno.
As conseqüências diretas da superexploração
ultrapassam a ameaça ao próprio mogno
para afetar grandes áreas da mais bela e
antiga floresta do planeta. Como o mogno nasce de
forma muito esparsa na Amazônia, a localização
das árvores a serem abatidas é, muitas
vezes, feita por avião. Atrás do mogno,
o madeireiro abre estradas de centenas de quilômetros
na mata, sem qualquer planejamento ou estudo de
topografia ou hidrologia.
Além do impacto que causam à floresta,
essas estradas funcionam como veias abertas à
destruição: abandonadas pelo madeireiro
após a extração do mogno e
de outras espécies de valor, elas são
utilizadas por fazendeiros e colonos para a ocupação
e limpeza de novas áreas para gado ou plantio.
No início da década de 90, já
haviam sido abertos mais de 3 mil km de estradas
ilegais no sul do Pará. Recentemente, flagramos
a abertura de uma nova estrada de mais de 500 km
numa das últimas áreas relativamente
intactas do Pará. O "dono" da estrada
é um dos chamados "Reis do Mogno".
O mogno comercialmente viável estava originalmente
concentrado no sul do Pará e Acre, atingindo
também parte dos estados de Rondônia,
Amazonas e Mato Grosso. É uma região
de cerca de 800 mil km2 de florestas de terra firme
que coincide com o chamado "arco de desmatamento".
Nela, existe uma grande concentração
de terras indígenas e áreas de alto
valor de conservação ecológica.
À medida que o mogno desaparece nas áreas
exploradas pelos madeireiros, eles passam a invadir
áreas protegidas. Conflitos, roubo, mortes
e sonegação são comuns na história
da exploração do mogno, que hoje é
controlado por uma verdadeira máfia.
Funcionando como "abre-portas" para a
Floresta, o mogno tem um papel fundamental na destruição
da Amazônia. Na esteira da invasão
da floresta, a Amazônia já perdeu 15%
de sua cobertura florestal. Uma área do tamanho
da França foi desmatada nos últimos
30 anos.