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MINISTÉRIO
DO MEIO AMBIENTE RECEBEU
RELATÓRIO SOBRE O NOVO PPA E A AMAZÔNIA
Panorama Ambiental
Brasília (DF) – Brasil
Agosto de 2003
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O ministério
do Meio Ambiente recebeu, nesta sexta-feira (1º/08),
relatório do Grupo de Assessoria Internacional
(IAG) do PPG7 sobre O PPA 2004-2007 na Amazônia
- Novas tendências e investimentos em infra-estrutura.
O relatório é resultado de visitas
a locais na Amazônia Brasileira onde está
prevista a construção de grandes obras
de infra-estrutura. Além disso, foram realizadas
entrevistas com membros do Ministério do
Meio Ambiente, com governadores de Amazonas, Rondônia
e Pará, com representantes da Suframa, Incra,
Basa, ADA, BNDES, Ibama, Eletronorte, Termonorte,
Petrobras, Ministério do Planejamento e sociedade
civil, entre outros. Confira a íntegra do
relatório abaixo.
O trabalho do IAG foi centrado em quatro possíveis
empreendimentos na Amazônia: usina hidrelétrica
de Belo Monte; pavimentação do trecho
paraense da BR-163 (Cuiabá-Santarém);
poliduto Urucu-Porto Velho; e as hidrelétricas
do Rio Madeira e hidrovias do sistema Alto Madeira-Guaporé-Beni.
Outras obras do atual PPA ou em discussão
para o próximo Plano também foram
avaliadas.
Para Roberto Smeraldi, presidente do IAG, todas
essas obras devem ser reavaliadas, pois, quando
foram decididas, não se levou em conta uma
série de aspectos, indo desde a viabilidade
econômica em conjunto com outros empreendimentos
até os verdadeiros impactos sociais e ambientais.
Segundo ele, o novo PPA não pode repetir
erros do passado, como o simples fomento à
abertura de novas áreas na Amazônia.
"Um grave problema constatado é o de
que a mera expectativa pela construção
de determinado empreendimento é suficiente
para a abertura de novas fronteiras na região,
trazendo degradação ambiental e crise
social", disse. Esse fato, conforme Smeraldi,
pode acabar contribuindo para uma elevação
ainda maior nos índices de desmatamento na
região. Além disso, conforme o presidente
do IAG, as principais obras consideradas para o
PPA 2004-2007 deixam de incorporar aspectos críticos
para uma análise eficiente de aspectos econômicos,
sociais, ambientais e de uso da terra. Ele recomenda
uma reformulação urgente dos processos
de tomada de decisão, "internalizando
custos ambientais e sociais".
Para a secretária de Coordenação
da Amazônia do Ministério do Meio Ambiente,
Mary Allegretti, o relatório do IAG é
muito importante, pois foi elaborado por um grupo
independente com alta capacidade técnica,
reforçando as posições do Ministério
frente ao conjunto do Governo. "Um material
como esse ratifica a necessidade do cuidado com
as obras de infra-estrutura no país. Ainda
há tempo para que o relatório influencia
o novo PPA", salientou.
O relatório do IAG será apresentado
à ministra Marina Silva e, posteriormente,
ao Grupo Interministerial. O IAG reúne especialistas
nas áreas de ciências humanas, sociais,
econômicas e biológicas para assessorar
a elaboração e execução
de projetos do PPG7.
GRILAGEM
De acordo com o relatório,
a questão da grilagem na Amazônia merece
destaque como "grande tarefa nacional",
e precisa de uma ação conjunta e coordenada
de diversos órgãos do Governo Federal.
Questões como regularização
fundiária e ordenamento territorial seriam
pré- obrigatórias para a realização
sustentável de qualquer obra de infra-estrutura.
"Na situação atual, temos mecanismos
impulsionando a grilagem de terras. Temos um problema
estrutural, de legislação, no setor
fundiário, e isso incentiva a apropriação
de terras públicas, a abertura de estradas
ilegais, a degradação ambiental",
disse Smeraldi.
A grilagem também pode ser estimulada com
o asfaltamento da BR-163, disse Bertha Becker, membro
do IAG e pesquisadora da Universidade Federal do
Rio de Janeiro. Para ela, o asfaltamento desvinculado
de um projeto socioambiental trará apenas
mais desmatamento e ampliação das
áreas para plantio de soja. "O momento
é de criticar mas também de inovar
nas soluções, com parcerias e soma
de esforços", disse.
FUNDO AMAZÔNICO
O presidente do IAG sugeriu ainda o estudo, ainda
no segundo semestre de 2003, da viabilidade de um
"pedágio amazônico", algo
semelhante ao Fundo Permanente do Alasca, nos Estados
Unidos. "A idéia é gerar fundos
de sustentabilidade para compensar a Amazônia,
seus habitantes e as gerações futuras
por empreendimentos que beneficiem agentes externos
e façam uso dos recursos naturais da região",
explicou Smeraldi.
Relatório
da XIX Reunião do Grupo de Assessoria Internacional
(IAG)
O PPA 2004-2007 na
Amazônia: novas tendências e investimentos
em infraestrutura
Brasília,
21 de julho a 1º de agosto de 2003
1. Introdução
O Grupo de Assessoria Internacional (IAG) do Programa
Piloto para a Proteção das Florestas
Tropicais do Brasil (a seguir, Programa) se reuniu
de 21 de julho a 1 de agosto de 2003, com o objetivo
de redigir um relatório sobre "O PPA
2004-2007 na Amazônia: novas tendências
e investimentos em infraestrutura".
Para tanto, o IAG se dividiu em dois subgrupos,
com missões na Amazônia Oriental (Belém,
Altamira, Santarém, Itaituba, Moraes Almeida
e Novo Progresso, no Pará, com sobrevôos
na região da BR-163) e na Amazônia
Ocidental (Manaus e Lábrea, no Amazonas,
Porto Velho em Rondônia, além de sobrevôos
nas regiões de Extrema e Alto Madeira em
Rondônia e vários municípios
do Sul do Amazonas). O IAG ouviu representantes
da Secretaria Geral da Presidência da República,
MMA, MIN, MME, MPO, INCRA, IBAMA, BASA, ADA, SUFRAMA,
Eletrobras, Eletronorte, Furnas, Petrobras, governos
estaduais de Pará, Amazonas e Rondônia,
prefeituras de Itaituba e Novo Progresso, Ministério
Público Federal do Amazonas, Fórum
de Energia de Rondônia, Comissão Pastoral
da Terra/AM, Prelazia de Lábrea, GTA, RMA,
CNS, COIAB, MDTX, FAEPA, Cargill, Termonorte/El
Paso, Companhia Colonizadora Imobiliária.
2. Destaques
* A mera perspectiva de instalação
de grandes obras de infraestrutura é suficiente
para gerar fenômenos de abertura de novas
fronteiras. A presença e atuação
do Estado nas regiões objeto das frentes,
cujo elemento comum é a ocupação
da terra e grilagem, é irrisória.
Tal fenômeno de ocupação desordenada
gera também intenso desmatamento, que parece
destinado a aumentar ao longo dos próximos
anos, agravando as tendências já registradas
em 2002 e atingindo novas regiões, como o
sul do Amazonas.
* A retomada de obras de infra-estrutura não
pode levar a repetir os erros da época em
que o Estado fomentava a abertura de fronteiras
na Amazônia. No entanto, é isso o que
se verifica, pelo menos por enquanto. As populações
tradicionais e os agricultores familiares são
os elementos mais vulneráveis nesse processo.
As novas frentes estimuladas pela abertura de obras,
por outro lado, parecem contar com peso econômico
e político muito maior do que no passado.
* As principais grandes obras consideradas para
o PPA 2004-2007 deixam de incorporar aspectos críticos
para avaliar sua eficiência econômica,
social, ambiental e de uso da terra, tanto nas áreas
de impacto direto quanto nas atividades por elas
induzidas. É urgente reformular os processos
de tomada de decisão a respeito, internalizando
adicionalmente os custos ambientais e sociais.
* A questão da grilagem na Amazônia
merece um destaque de grande tarefa nacional e precisa
de ação coordenada de diversos órgãos
de governo. Regularização fundiária
e ordenamento territorial se constituem em pré-condições
obrigatórias para a realização
sustentável de qualquer grande obra de infraestrutura.
* O Programa Amazônia Sustentável (PAS),
em elaboração no âmbito do PPA,
deveria ter a natureza de plano, de forma a orientar
ações e investimentos setoriais nos
seus cinco eixos estratégicos. Na forma de
programa individual do PPA, falta qualquer garantia
de efetividade a partir da ausência de recursos
específicos para a implementação
das ações relevantes, que incluem
a infraestrutura adequada para o desenvolvimento
regional.
* A incorporação do Programa Piloto
no PAS deveria representar uma maneira de dar escala
às experiências inovadoras bem sucedidas
dos últimos anos, e para tanto precisa de
adequados recursos e capacidade estruturante. Por
outro lado, é fundamental, no atual quadro
de novas fronteiras, fortalecer a segunda fase do
Programa em sua dimensão piloto aplicada
a novos temas críticos para a região.
* É fundamental perseguir, no âmbito
do objetivo de novo padrão de financiamento
do PAS, a geração de fundos sustentáveis
para compensar a região e seus habitantes,
incluindo as futuras gerações, pelos
impactos de obras e investimentos que beneficiam
atores externos à mesma. O IAG sugere um
pedágio amazônico, baseado em royalties
e como já experimentado com sucesso no exterior.
3. Os Principais
Projetos Visitados
O IAG enfocou suas visitas de campo principalmente
em quatro grandes obras na Amazônia (três
já presentes no Plano Plurianual - PPA atual)
em relação às quais foi registrada
significativa pressão de grupos de interesse
para sua inserção no PPA 2004-2007.
Usina Hidrelétrica de Belo Monte
A usina seria realizada na Volta Grande do Rio Xingu,
com produção máxima estimada
de 11 mil MW durante a cheia e aproximadamente metade
disso na época de estiagem. A obra é
proposta pela Eletronorte, faz parte do PPA 2000-2003
e está sendo considerada para o PPA 2004-2007.
A área alagada seria de aproximadamente 400
km2, atingindo diretamente 3 mil famílias
e, indiretamente, mais de 200 mil, além de
afetar algumas terras indígenas. O licenciamento
da obra está no momento suspenso pela Justiça
Federal. Há uma forte oposição
dos movimentos sociais da região. Há
preocupação local inclusive em relação
aos possíveis desdobramentos de usinas complementares
para o melhor aproveitamento da capacidade da usina,
retomando eventualmente o antigo projeto Xingu que
foi bloqueado nos anos 80.
Pavimentação do trecho paraense da
BR-163 (Cuiabá-Santarém)
Trata-se da pavimentação de 784 km
da rodovia BR-163, entre a divisa de Mato Grosso
e Rurópolis, além de 32 km da rodovia
Transamazônica (BR-230) entre Mirirituba e
o entroncamento com a 163. A obra está prevista
no PPA 2000-2003 e aparece entre as prováveis
prioridades do PPA 2004-2007, sendo defendida principalmente
pelo governo de Mato Grosso e pelos grupos privados
ligados ao escoamento da soja. Recentemente um grupo
de empresários da Zona Franca de Manaus,
articulados pelo governador do Amazonas, anunciou
sua participação no consórcio,
com o objetivo de baratear o frete de Manaus para
o sul e como alternativa mais viável ao asfaltamento
da BR-319 (que por outro lado continua formalmente
entre as prioridades do governo do Amazonas). A
obra tem principalmente impactos de desmatamento
e ocupação desordenada ao longo de
seu traçado.
Poliduto Urucu - Porto Velho
A obra - proposta pela Petrobras, em parceria com
a empresa norteamericana El Paso - consta do PPA
2000-2003, porém não chegou sequer
a ser licenciada. Sua licença prévia
foi suspensa em abril de 2003 pela Justiça
Federal, atendendo ação civil pública
do MPF do Amazonas, por graves irregularidades no
EIA-RIMA. Mesmo assim, está sendo novamente
considerada para o PPA 2004-2007. O duto, que cortaria
520 km de florestas nas regiões mais preservadas
da bacia do Purus e em proximidade de populações
indígenas - algumas não contatadas
- visa abastecer com gás natural a usina
termoelétrica de Porto Velho, da própria
El Paso. A obra pode acelerar e estimular o avanço
de um processo de intensa ocupação
e invasão no sul do Amazonas e é questionada
por razões de ordem econômica e ambiental.
Hidrelétricas do Rio Madeira e Hidrovias
do Sistema Alto Madeira-Guaporé-Beni
A obra está sendo cogitada para o PPA 2004-2007
e foi proposta por um consórcio Furnas-Odebrecht
em fevereiro de 2003. Ainda não foram completados
os estudos de inventário e nem sequer iniciado
o estudo de viabilidade. Trata-se de duas barragens
(Santo Antônio e Jirau) a montante de Porto
Velho, alagando uma área de aproximadamente
250 km2 de terra firme e mais 250 km2 de várzeas,
de acordo com o documento de projeto da empresa.
A obra teria também o objetivo de viabilizar
a navegação do Madeira e sua conexão
com os rios Beni e Guaporé, assim estimulando
- sempre de acordo com a empresa - a produção
de 25 milhões de toneladas/ano de soja apenas
no Brasil, o que equivale a aproximadamente 80 mil
km2 de área de expansão da agricultura
mecanizada.
Outras obras do PPA atual e/ou em discussão
para o próximo PPA foram objeto de visitas
e entrevistas por parte do IAG, como as rodovias
Humaitá-Lábrea e Manaus-Porto Velho,
o linhão de interligação de
Rondônia com Mato Grosso, o linhão
Santarém-Manaus e o Centro de Biotecnologia
da Amazônia (CBA) em Manaus.
4. O Impacto da Infraestrutura
Anunciada
A implantação de infraestrutura é
um componente crucial do projeto nacional do novo
governo, evidente no PPA e vital para todos os atores.
No âmbito nacional é essencial para
reduzir o custo Brasil, enquanto na Amazônia
vicinais e energia são imprescindíveis
às populações regionais e à
integração continental.
A infraestrutura portanto pode abrir novas oportunidades
econômicas para a população.
Mas o sucesso dessa possibilidade depende de uma
série de políticas e medidas integradas
que levem em conta as lições do passado
e a complexidade atual da região, bem como
o rigor de sua execução, capazes de
transformar os eixos e a energia em instrumentos
de ordenamento do território em vez que de
predação. Conforme registra o documento
base do Amazônia Sustentável (PAS),
"não são...as obras de infra-estrutura,
a priori, que contribuem para a degradação
ambiental e os conflitos sociais na região,
mas o fato de terem sido [...] executadas sem cuidadosa
análise, sem debate com a sociedade regional
e sem contemplar ações de ordenamento,
prevenção e mitigação
dos efeitos perversos...".
Isso parece se repetir, num ciclo de expectativa,
especulação, expulsão e extrusão.
A transversalidade de políticas e práticas
não está ocorrendo nas frentes de
expansão da Amazônia, onde se observa
uma retomada e aceleração na apropriação
de terras públicas, na degradação
das florestas por ação de madeireiros
e na expansão da pecuária para amansar
o solo antes da expansão da soja. Os governos
estaduais, mesmo os que assumem prioridades de desenvolvimento
sustentável, parecem assistir passivamente
à ocupação, quando não
a incentivam abertamente, mesmo sem ter recursos
e capacidade para organiza-la. A questão
que se coloca, mais uma vez, é como compatibilizar
a expansão da infraestrutura com o uso sustentável
dos recursos naturais e o bem estar das populações
regionais.
Em todos os locais visitados, o IAG observou que
o mero anúncio de obras cuja realização
não está garantida - nem em termo
de recursos, nem em termos de licenciamento - é
suficiente para desencadear ou exacerbar tendências
de ocupação do território e
de grilagem. Em muitos casos o fator tempo representa
um agravante: obras para os quais se mantêm
vivas, ao longo de muitos anos, expectativas de
realização acabam alterando profundamente
(mesmo sem ter sido sequer iniciadas) o quadro social
e fundiário dentro de sua região de
abrangência. Sobra nesses casos para o estado
(e portanto para o contribuinte) o ônus de
arcar com os prejuízos e passivos.
5. Condicionantes
para a Eficiência dos Empreendimentos
Na lógica exposta acima, é necessário
entender qual é a eficiência econômica,
social, ambiental e de uso do solo das atividades
propostas e daquelas induzidas pelas obras de infraestrutura.
O IAG apurou que a lógica econômica
que embasa as principais propostas de obras de infraestrutura
carece de elementos estratégicos e/ou da
internalização de custos significativos
a serem enfrentados pelo Poder Público em
decorrência das mesmas.
No caso da geração hidroelétrica
de Belo Monte, a questão-chave que deveria
ser respondida e resolvida antes de qualquer decisão
sobre a obra reside na renegociação,
em 2004, dos contratos de fornecimento de energia
com as empresas eletrointensivas do alumínio.
Nas atuais condições, a conta para
o contribuinte é enorme, com subsídios
de aproximadamente dois terços do preço
(na faixa de US$ 30 por KW), que não geram
emprego nem renda na região. O fornecimento
de energia por preço de mercado pode alterar
completamente o futuro dos empreendimentos do alumínio
e afetar em consequência disso a própria
demanda de energia.
No caso do poliduto de Urucu - Porto Velho, a situação
do abastecimento energético de Rondônia
é um exemplo que reflete a falta de coordenação
e a interferência de interesses específicos
(locais, nacionais e até mesmo internacionais)
no planejamento energético da Amazônia.
O estado continua na precariedade e na dependência
de uma central termoelétrica movida a diesel,
da empresa Termonorte, subsidiária da norteamericana
El Paso. O contribuinte, por meio de um contrato
assinado pela Eletronorte e que sua própria
direção atual considera lesivo aos
interesses públicos, paga o subsídio
para fornecer o combustível à Termonorte,
dona da planta, e ainda está vinculado a
adquirir 85% de sua capacidade de geração.
Por outro lado, o linhão que integraria Porto
Velho à rede nacional, previsto no PPA 2000-2003,
não foi realizado (continuam faltando apenas
300 km ligando Ji-Paraná a Vilhena). Esta
obra, relativamente simples, barata e sem impactos
significativos, resolveria não apenas os
problemas energéticos de Rondônia mas
representaria uma economia expressiva para o contribuinte.
Isso não atende aos interesses da Termonorte/El
Paso, de alguns políticos locais, dos produtores
de PCHs do Estado e da própria Eletronorte
(a não ser, neste último caso, que
seu contrato com a Termonorte seja renegociado).
Em decorrência, o IAG registrou com preocupação
o fato que a ligação pelo linhão
pode vir a não ser priorizada no novo PPA.
Os efeitos do referido impasse vão muito
além da problemática local, pois o
linhão tornaria definitivamente obsoleta
a proposta do poliduto Urucu - Porto Velho, com
seus problemas ambientais e custos associados. Cabe
observar que o EIA-RIMA da Gaspetro sobre o poliduto
nem sequer apresenta um levantamento da situação
fundiária ao longo de seu traçado.
A própria Petrobras confirmou ao IAG a tendência
constante à ocupação das áreas
de abrangência de seus dutos e o fato que
a empresa não pode resolver questões
que cabem a outros órgãos da administração
pública.
No caso das usinas hidroelétricas do Rio
Madeira (e da hidrovia interligando Guaporé
e Beni) o projeto está em fase ainda inicial
e não há dados que permitam avaliar
o mesmo do ponto de vista econômico. Em geral,
é necessário observar que na região
andina boliviana e peruana, a distância relativamente
pequena das fronteiras com o Brasil, existem condições
de geração hidroelétrica, em
função de um desnível muito
maior, muito mais favoráveis que nas planícies
amazônicas. Isso implica menores custos econômicos
e ambientais. O objetivo de promover a integração
econômica e política sulamericana,
que está entre os pressupostos do projeto
do Rio Madeira, pode também ser atingido
com projetos conjuntos de aproveitamento do potencial
hidroelétrico das regiões andinas.
É necessário, de qualquer forma, alertar
sobre questões críticas do ponto de
vista ambiental e social do projeto. Produzir 25
milhões de toneladas/ano adicionais de soja
na região do Guaporé (apenas do lado
brasileiro) e extremo oeste de Mato Grosso significa
utilizar aproximadamente 80 mil km2 de terras para
agricultura mecanizada nesta região. Isso
pode acontecer ou por meio de desmatamento ilegal
(pois legalmente isso implicaria propriedades privadas
agregando mais de 400 mil km2, ou seja maiores do
que a região em si) e/ou de expulsão
de agricultores familiares e populações
tradicionais. Vale também observar que a
maioria desta região é considerada
pelo Zoneamento de Rondônia como destinada
a extrativismo vegetal, manejo e unidades de conservação.
O projeto precisa portanto ser compatibilizado com
o documento base para o PPA 2004-2007, onde se afirma
que "a biodiversidade e a valorização
da diversidade cultural das populações
a esta associada ...é uma oportunidade de
desenvolver novas economias" e que "projetos
intensivos no uso da biodiversidade brasileira....[constituem
uma] importante fonte de geração de
emprego e renda para uma parcela significativa da
população". Sendo o Brasil um
dos mais importantes países megadiversos,
é necessário evitar de desenvolver
uma economia baseada exclusivamente em commodities
que podem ser geradas somente com a conversão
e degradação irreversível dos
recursos naturais. A diversidade cultural do País
abriga inclusive múltiplos conhecimentos
sobre o uso de tais recursos.
A esse respeito cabe comentar sobre uma das iniciativas
mais promissoras do PPA em vigor, em termos de sustentabilidade
social e ambiental no uso e na preservação
dos recursos naturais da região Amazônica,
isto é o PROBEM. Isso hoje se resume ao Centro
de Biotecnologia da Amazônia (CBA), recém
construído. Na visita à SUFRAMA ficou
evidente a preocupação pelo futuro
do CBA. A SUFRAMA reconhece não ter capacidade,
sozinha, para transformar o que é hoje apenas
um grande edifício numa iniciativa econômica
baseada na biodiversidade da região. Falta,
entre outras coisas, definir um contexto legal viável
para os investidores e para remuneração
dos direitos intelectuais das comunidades.
Registra-se hoje uma expressiva ineficiência
nos procedimentos para tomada de decisão
nas obras de infraestrutura. A Amazônia, a
par de sua grande extensão, não é
mais a mesma dos anos sessenta, apresentando hoje
grande diversidade social, que deve ser considerada
na tomada de decisão. Melhor eficiência
nas decisões depende assim de estudos que
envolvam as dimensões econômica, ambiental,
de uso da terra, política e também
a dimensão social. As demandas de sociedades
sub-regionais organizadas, com critérios
e potencial claros para ação, são
hoje elemento crucial para a tomada de decisão
no conflito entre interesse nacional e direito regional.
Em outras palavras, a sociedade local é hoje
fator de viabilização, ou não,
de obras planejadas a partir de fora da região.
Um exemplo claro disso é o caso da sub-região
da Transamazônica, onde a sociedade organizada
tem argumentos sólidos para resistir à
construção de Belo Monte, considerada
absolutamente prescindível para o modelo
de desenvolvimento que procura implementar.
Conforme defendido acima, é necessário
levar em consideração também
as questões de eficiência nas atividades
induzidas pelos empreendimentos antes mesmo de sua
concretização. A pecuária,
segundo estudo recentemente encomendado pelo Banco
Mundial, está se tornando mais viável
mesmo sem incentivos fiscais e, por isso, continua
se expandindo à custa do desmatamento de
novas áreas de florestas. Mais recentemente,
a expansão da produção de soja
parece ter essa mesma característica.
Entretanto, as atividades agropecuárias na
Amazônia se beneficiam de ganhos indiretos
oriundos das precárias condições
fundiárias na região, da grilagem
das terras públicas, do uso irregular da
mão de obra e do contínuo processo
de abertura de novas áreas de florestas por
grandes empresários, posseiros e pequenos
agricultores que prepararam o caminho para o investimento
que se segue.
O uso da terra mais típico, nas proximidades
de rodovias, hidrelétricas e hidrovias tem
sido e continua a ser a exploração
florestal predatória e a agropecuária.
Por exemplo, ao longo da BR-163, com a recente construção
do terminal de grãos da Cargill em Santarém,
está sendo verificado um grande interesse
pela produção intensiva de grãos,
principalmente de soja, em uma área já
antropizada de aproximadamente 500.000 hectares
entre Santarém e Belterra, adjacente à
Floresta Nacional do Tapajós, com implicações
ainda difíceis de serem previstas.
A questão que cabe levantar é quem
serão os principais beneficiários
desse novo processo produtivo, em função
da fragilidade da agricultura familiar, a principal
atividade da grande maioria da população
local. Os produtores familiares, por serem pioneiros,
deveriam ser os principais beneficiários
do processo de desenvolvimento dessas regiões
de fronteira, mas na realidade tendem a ser os mais
sacrificados, o que pode ser claramente verificado
no município de Itaituba, que já vem
sendo influenciado diretamente pela perspectiva
do asfaltamento da rodovia Santarém-Cuiabá,
pela construção de um porto em Miritituba
pelo Grupo Maggi e pelo terminal de Santarém.
À fragilidade técnico-econômica
e social dos agricultores familiares se adiciona
a pressão pela compra de suas terras, geralmente
sem título e, por isso, suscetíveis
à pressão de compradores mais poderosos,
geralmente produtores de grãos. O fenômeno
já pode ser verificado na região da
BR-163, próximo à FLONA Tapajós.
Aqui os produtores familiares poderão se
tornar sem-terra ou bóia fria, o que já
é visível nos arredores de Itaituba.
Para uma modernização significativa
dos sistemas produtivos não faltam recursos
financeiros. O Fundo Constitucional do Norte (FNO)
tem canalizado bilhões de reais à
região - porém com pouco impacto positivo.
A este respeito verifica-se, como novo alento, o
esforço de encontrar alternativas e de inserir-se
no PAS demonstrado pela nova diretoria do Banco
da Amazônia (BASA). De modo geral, pode ser
afirmado que a agricultura familiar, como outros
pequenos e micro empreendedores, precisa de um acesso
rápido e confiável a serviços
bancários, tanto do lado do crédito
como do depósito e transferências bancárias.
A eficiência do setor produtivo agropecuário
e florestal nas novas fronteiras não é
compatível com as diretrizes do novo PPA
e com os eixos do PAS. Do ponto de vista do ordenamento
territorial, os municípios carecem de zoneamento
e de regularização de suas terras;
quanto à gestão ambiental, os órgãos
de meio ambiente estão praticamente ausentes
da região; em termos de produção
sustentável com tecnologia avançada,
observa-se que a base tecnológica dos sistemas
produtivos é frágil - principalmente
da agricultura familiar - e a pesquisa e assistência
técnica quase ausentes; na perspectiva da
inclusão social, finalmente, as populações
locais não têm acesso a educação
e saúde, pois tais investimentos não
são planejados e orçados conjuntamente
com as obras de infraestrutura.
Recomendações
* Priorizar a renegociação dos contratos
(eletrointensivas, térmicas de Rondônia
e Amazonas) lesivos dos interesses públicos
e reorientar o planejamento energético com
base prioritária nos interesses do desenvolvimento
regional e da universalização do acesso
na região, com destaque para a população
rural e de acordo com as diretrizes do PAS.
* Priorizar a implementação do último
trecho do linhão de interligação
de Rondônia a Mato Grosso e à rede
nacional.
* Recalcular o fluxo de caixa dos grandes empreendimentos
internalizando os custos relacionados com a presença
coordenada e contínua do Estado, o fornecimento
de serviços sociais eficientes para as populações
que se deslocam para as áreas de sua abrangência
e os serviços necessários para a eficiência
das atividades de uso da terra das populações
afetadas e daquelas que ali se instalam.
* Internalizar, no balanço financeiro de
cada empreendimento, os custos ambientais do seu
impacto sobre os serviços ambientais prestados
pelos ecossistemas afetados e pelas populações
tradicionais.
* Realizar com urgência ordenamento territorial
e regularização fundiária prévios,
e obviamente incluir obrigatoriamente nos EIA-RIMA
o levantamento e adequada análise da questão
fundiária.
* Incorporar como fator de tomada de decisão
inicial a variável da eventual resistência
da opinião pública local organizada
a uma determinada obra.
* Realizar os estudos de viabilidade para as usinas
do Rio Madeira levando em consideração
os pontos acima e também, em especial, a
necessidade de respeitar o zoneamento do Estado
na região do Guaporé, a legislação
ambiental existente e a conservação
da biodiversidade.
* Evitar priorizar no âmbito do PPA obras
que carreguem passivos legais e que estejam embargadas
por decisão judicial.
* Garantir a presença da pesquisa tecnológica
e assistência técnica nas frentes de
desenvolvimento para suporte das atividades agropecuárias
e florestais, principalmente para a agricultura
familiar.
6. O Desafio Maior:
a Questão Fundiária
Em todas suas visitas, o IAG registrou a gravidade
da situação fundiária e a expansão
da grilagem, antecipando a realização
de infraestrutura. A situação observada
aponta para a necessidade de tratar conjuntamente
a questão da terra, na escala do ordenamento
territorial e da regularização fundiária,
sob o risco de ações isoladas prejudicarem
umas às outras. Se ordenamento e regularização
são demandas generalizadas, as situações
de apropriação da terra e desordem
territorial são bastante diversas. Coloca-se,
assim, a questão de critérios e condições
que desestimulem a grilagem e o afluxo em busca
de novas apropriações.
Via de regra, a grilagem se realiza para além
de alguns quilômetros das estradas cuja beira
é composta por pioneiros. Há, assim,
a exigência de estratégias complementares
para enfrentar regularização da terra
e ordenamento territorial. Para ambas, contudo,
tendo em vista a escassez de recursos dos órgãos
públicos, é necessária uma
ação vigorosa de um conjunto de instituições,
em forma de força-tarefa, nos moldes da recente
e bem sucedida Operação Lábrea
promovida pelo IBAMA/AM.
O Programa acumulou experiência valiosa na
demarcação participativa de terras
indígenas. Na sua segunda fase poderiam ser
aplicadas e modificadas essas experiências
para unidades de conservação como
parques, florestas nacionais etc., como importante
instrumento preventivo a ser definido conjuntamente
com o planejamento da obra infraestrutural.
Para qualquer regularização fundiária
o cadastro de terras é essencial. Trata-se
de uma preocupação do INCRA que merece
apoio específico no âmbito do eixo
de ordenamento territorial do PAS e possivelmente
na própria segunda fase do Programa. Por
se tratar de uma área altamente conflitiva,
é preciso criar um amplo consenso e garantir
recursos suficientes, de forma a não provocar
frustrações e conflitos adicionais.
Vastas áreas alteradas foram degradadas ao
ponto de serem abandonadas. A reabilitação
destas áreas permitiria uma redução
da pressão sobre as florestas. Cabe explorar
novos modelos de uso extensivo destas áreas
usando, como exemplo, concessões agropecuárias
similares ao princípio de concessões
florestais, onde o Estado forneça a terra
com certas benfeitorias (água, cercas, estradas,
energia, capacitação), exigindo observação
das regras socio-ambientais de uso sustentável,
e a empresa agropecuarista explore a área,
pagando pelo uso e não tendo que imobilizar
seu capital na terra.
Recomendações
* Priorizar a implementação do Cadastro
Nacional de Imóveis Rurais (CNIR) e das atividades
de arrecadação, por parte do INCRA,
das terras griladas.
* Realizar regularização fundiária,
somente no caso em que as terras apropriadas não
impliquem a expulsão de pequenos produtores.
* Realizar, com base na recomendação
anterior, a regularização na Transamazônica
e até mesmo na Cuiabá-Santarém,
onde o povoamento se deu respectivamente por colonização
oficial e por posse pioneira de produtores rurais.
* Evitar, pela mesma razão, a regularização
de "compra" de pequenas posses na BR 163,
como no caso das madeireiras, bem como das terras
griladas no Sul do estado do Amazonas, que em alguns
casos expulsam as populações ribeirinhas.
* Preservar os direitos das populações
tradicionais (índios, ribeirinhos, extrativistas)
e não sancionar situações de
fato decorrentes de violência e usurpação.
* Estabelecer um marco zero para a regularização,
a partir do qual esclarecer e garantir, com meios
claros e duradouros do ponto de vista normativo,
que novas posses não serão regularizadas.
Em alguns casos será possível estabelecer
condicionantes adicionais como a proibição
de alienação por 20-30 anos e/ou o
uso sustentável dos recursos naturais.
* Assegurar, no caso da BR-163 e de seu povoamento
ao longo da estrada, além da parceria IBAMA/INCRA
ou IBAMA/ITERPA, a cooperação do Exército
na regularização das terras, tendo
em vista a larga experiência que este tem
na logística da região amazônica.
* Construir, no caso da apropriação
virtual das terras para além do povoamento
à beira da estrada, um pool mais poderoso,
incorporando, além das instituições
citadas, o SIPAM e a cooperação internacional,
que já demonstrou efetividade no apoio ao
Brasil para o cumprimento do mandato constitucional
de demarcação de terras indígenas.
Também deverão ser utilizados os recursos
de programas como o ARPA, pois referido pool deverá
também demarcar Cus, terras indígenas
e realizar uma fiscalização poderosa
nas áreas mais agredidas.
* Regulamentar no Congresso, e implementar rapidamente,
um sistema de concessão de terras públicas,
tanto para florestas (FLONAS e florestas estaduais
de produção) quanto para pecuária
(áreas alteradas e arrecadadas de volta como
efeito das operações anti-grilagem).
* Estabelecer, utilizando a base legal descrita
no ponto anterior, sistemas e mosáicos de
áreas de concessão em regiões
críticas e próximas de eixos infraestruturais.
7. O Amazônia
Sustentável e o Programa Piloto
A formulação do Programa Amazônia
Sustentável (PAS), a partir da assinatura
de seu documento-base pelo Presidente da República
e os governadores da Região Norte, em maio,
sinalizou à sociedade a possível retomada
de uma política de desenvolvimento regional.
A possível evolução do PAS
em programa individual do PPA, sob a coordenação
de MIN e MMA, pode limitar o potencial da iniciativa,
reduzindo sua função de plano, orientadora
de políticas e programas. Falta também,
até o momento, qualquer perspectiva clara
sobre a disponibilização de recursos
adequados para a implementação de
seus cinco eixos, assim como a determinação
de que os programas prioritários e absorvedores
de recursos significativos do PPA sejam pautados
por suas diretrizes.
Neste quadro precisa ser analisada a atual proposta
governamental para transformar o Programa Piloto
em um dos instrumentos de implementação
do PAS. Não há dúvida - conforme
lembrado pelo IAG em vários relatórios
- que o Programa carece de incorporação
nas políticas públicas e que portanto,
em tese, sua adoção na forma de instrumento
de um programa do PPA poderia representar uma positiva
inovação estratégica e uma
valorização e ampliação
de suas experiências piloto setoriais. O PAS
deveria representar a efetiva apropriação
do Programa pelo governo brasileiro, há anos
perseguida e, ao estabelecer cinco eixos temáticos
condizentes com a realidade regional e com o PPA,
um dos quais referentes à infraestrutura,
abre forçosamente o caminho para a transversalidade
e a negociação.
A mudança e a falta de clareza da orientação
governamental, contudo, está gerando uma
perplexidade geral, inclusive entre os doadores,
sob a qual jaz a preocupação básica
do risco de perdas irreparáveis do sentido
maior do Programa: o marco histórico que
representou na conquista de uma política
sócio-ambiental para a Amazônia, associada
à força do apoio multilateral dos
países doadores, experiência única
no planeta na escala em que vem sendo implementada.
Por outro lado, cabe indagar se e como o PAS terá
recurso e prioridade suficiente para poder usar
o Programa como instrumento e principalmente dar
a escala adequada para seus projetos bem sucedidos.
Há a necessidade também de esclarecer
como serão resolvidas as diferentes abrangências
territoriais (Amazônia Legal no caso do Programa
Piloto, Região Norte mais Tocantins no caso
do PAS), com destaque para as regiões do
Norte e do Noroeste de Mato Grosso. A questão
territorial obviamente diz respeito também
aos demais instrumentos do PAS, tais como o BASA,
objeto de um termo de cooperação assinado
conjuntamente ao PAS e que prevê um redesenho
de suas atribuições. Finalmente, incorporar
o Programa no PAS implica uma mudança no
que se refere aos projetos e sub-programas na Mata
Atlântica, que fica assim fora da segunda
fase do Programa.
Há hoje uma retomada do avanço significativo
de fronteiras internas em diversas regiões
da Amazônia e uma mudança em relação
aos padrões de ocupação do
território e consolidação do
povoamento que pareciam se firmar ao longo da década
anterior, com relativa estabilização
das taxas de desmatamento. Isso requer novamente,
assim como no começo dos anos 90, a experimentação
de abordagens pioneiras e inovadoras aptas para
enfrentar esta nova realidade, com destaque para
temas que até o momento não ganharam
espaço e prioridade no Programa Piloto, tais
como (i) as questões fundiárias, (ii)
assistência técnica para a agricultura
familiar, (iii) novas modalidades de assentamento
agro-extrativista, (iv) infraestrutura adequada
às necessidades produtivas e comerciais da
pequena produção, (v) implementação
de um sistema efetivo de concessões florestais,
(vi) remuneração por serviços
ambientais, (vii) recursos genéticos, (viii)
conhecimentos tradicionais, etc. Paradoxalmente,
atividades prioritárias como a implementação
efetiva e a manutenção do Cadastro
Nacional de Imóveis Rurais (CNIR) - que se
constituem em verdadeiras pré-condições
para a implementação de qualquer grande
projeto de infra-estrutura - enfrentam dificuldade
para receber a devida priorização
de recursos no âmbito do PPA.
Referidas atividades precisam de definição
melhor, de testes de viabilidade, de adequação
de metodologia, de acertos institucionais transversais,
em suma trazem de volta a necessidade de uma função
piloto e de um laboratório de experimentação
semelhante ao que o Programa representou nos últimos
anos. Interlocutores e parceiros novos poderiam
contribuir para tais enfoques piloto, com uma diversidade
de atores que inclui instituições
federais como o MDA/INCRA, alguns governos estaduais,
ONGs e parte do setor privado, como no caso de um
segmento significativo do setor florestal, que se
reuniu em junho de 2003 em Belém para cobrar
do governo apoio às políticas de certificação
e viabilização do manejo sustentável
em terras públicas.
Idealmente, o PAS poderia representar uma forma
de complementar ou, no médio prazo, substituir
a cooperação internacional com recursos
significativos para estruturar as experiências
já amadurecidas no Programa. Mesmo assumindo
que ele tenha esta capacidade - o que não
está de forma alguma assegurado - terá
de ser abastecido e enriquecido por novas experiências
piloto sobre os citados temas, estratégicos
para enfrentar as novas dinâmicas de fronteira
em evolução e do desmatamento.
Recomendações
* Concentrar a segunda fase do Programa na região
amazônica, mas negociar, definir e anunciar
contextualmente procedimentos para garantir a prossecução
das atividades do programa na Mata Atlântica
sob outro acerto institucional.
* Garantir que o PAS seja reconhecido como um plano
no âmbito do PPA e não meramente como
um programa individual, de forma a garantir a efetiva
transversalidade de suas diretrizes, a consistência
da ação governamental na região
e o efetivo uso dos recursos dos programas setoriais
para a implementação de seus eixos
estratégicos, inclusive dando assim escala
às experiências bem sucedidas do Programa.
* Esclarecer, por parte do governo brasileiro, algumas
questões críticas para os atores cruciais
do Programa (sociedade civil, doadores e Banco Mundial),
tais como o prazo de encerramento da fase de transição
em que se encontra o Programa, as formas de integrar
as experiências inovadoras nos eixos temáticos
e de assegurar - nos projetos do PAS - as prioridades
sócio-ambientais do Programa e finalmente
como superar as questões críticas
associadas à implantação da
grande infraestrutura na região.
* Assegurar a prosseguimento e fortalecimento do
Programa Piloto como componente de experimentação
do PAS, com novos temas cruciais a serem abordados
em sua segunda fase.
8. Geração
de Recursos para os Programas Norteados pelo PAS
A proposta inicial do PAS prioriza a questão
de um "novo padrão de financiamento",
porém até o momento enfocou apenas
como alocar recursos e não como gerar recursos
adicionais de forma também sustentável.
As diretrizes do PPA tratam de promover benefícios
locais e reduzir as assimetrias regionais, porém
não existem propostas concretas nesta direção
do ponto de vista de assegurar fontes novas de recursos
para a região. É hoje preciso buscar
soluções inovadoras, menos onerosas
e mais sustentáveis. A região amazônica
oferece uma oportunidade ideal para novas soluções
de financiamento. Por isso o IAG sugere a introdução
de um mecanismo de pedágio amazônico
com finalidades compensatórias para as atividades
que geram benefícios fora da região
impactando os ecossistemas e populações
amazônicas.
É possível aproveitar as lições
aprendidas por outras nações que enfrentaram
situações semelhantes para gerar recursos
direcionados especificamente para a implementação
do PAS. Existem casos no continente africano, no
Sudeste asiático e no Canadá, mas
o exemplo mais relevante é a experiência
do Alaska Permanent Fund Corporation-APFC (www.apfc.org),
que foi fundado nos fins dos anos 60 para compensar
os impactos sócio-ambientais do avanço
da fronteira petrolífera nos frágeis,
porém ricos, ecossistemas da fronteira norte
do Alaska. A natureza permanente e o caráter
compensatório do APFC contribuíram
para criar um órgão para-governamental
que se tornou hoje o maior organismo de poupança
do povo do Estado.
O fundo acumula hoje um capital líquido permanente
de aproximadamente US$ 25 bilhões, está
entre os cem maiores fundos de investimento do mundo,
financia a maior parte do orçamento estadual
e ainda distribui um dividendo anual de aproximadamente
US$ 2 mil para cada residente do Estado. Como na
região amazônica, a corrida para as
novas riquezas vislumbradas pela abertura da fronteira
petrolífera no Alaska geraram processos de
imigração desordenada. A população
do Estado cresceu de 300 mil em 1968, quando o petróleo
foi descoberto, para 2,2 milhões de pessoas
hoje. O Fundo assegurou uma transição
harmoniosa e sustentável no processo do desenvolvimento
da fronteira petrolífera e, como instrumento
de poupança, permite que as futuras gerações
sejam remuneradas pelo uso de seus recursos naturais.
Esta poupança é baseada no recolhimento
de royalties compensatórios provenientes
das atividades petrolíferas. O fundo é
governado por um Conselho que inclui representantes
do setor público, mas a atividade de investimento
foi confiada a uma equipe de doze administradores
financeiros ou bancos de investimento privado da
elite financeira internacional.
Recomendações
* Realizar um estudo do AMA para adaptar devidamente
a solução financeira bem sucedida
do Fundo do Alaska para as especificidades sócio-ambientais
da Amazônia, com royalties a serem pagos pelos
empreendimentos de transporte, energia, mineração,
agropecuária, madeira, etc., que se beneficiam
de atividades com impacto na região.
* Realizar gestões perante os ministérios
relevantes para criar as condições
de estabelecimento deste fundo ao longo do período
de abrangência do próximo PPA.
9. Assuntos do IAG
O IAG realizou sua XIX Reunião com uma equipe
reduzida, de apenas sete pessoas, pois não
houve reposição por parte da Comissão
de Coordenação Conjunta (CCC) dos
integrantes que deixaram o grupo em dezembro de
2002. Espera-se que isso aconteça em tempo
para a próxima reunião, marcada para
os dias 10-14 de dezembro de 2003 e com enfoque
específico sobre o Programa Piloto. Desta
forma, a sucessiva substituição de
três integrantes do grupo iria acontecer após
a reunião temática de julho de 2004.
O IAG se coloca à disposição
das instituições relevantes de governo
para fornecer separadamente subsídios oriundos
de suas visitas que não constem deste relatório,
em particular sobre os detalhes de fatos constatados
localmente e orientações estratégicas
tais como a constituição do fundo
de compensação. Isso se aplica tanto
ao processo do grupo interministerial sobre desmatamento
quanto àquele de preparação
do PAS.
Recomendação
* Nomear os três integrantes para completar
o orgânico do IAG em tempo para a reunião
de dezembro de 2003.
Brasília, 1 de agosto de 2003
Membros do IAG
Bertha Becker
Manuela Carneiro da Cunha
John Forgach
Manfred Niekisch
Manfred Nitsch
Adílson Serrão (Vice-Presidente)
Roberto Smeraldi (Presidente)
Lista de siglas
ARPA Áreas protegidas da Amazônia
ADA Agência de Desenvolvimento da Amazônia
AMA Projeto Análise e Monitoramento da Amazônia
APFC Alaska Permanent Fund Corporation
BASA Banco da Amazônia SA
CBA Centro de Biotecnologia da Amazônia
CCC Comissão de Coordenação
Conjunta
CNIR Cadastro nacional de Imóveis Rurais
CNS Conselho Nacional dos Seringueiros
COIAB Coordenação Indígena
da Amazônia Brasileira
EIA Estudo de Impacto Ambiental
FAEPA Federação da Agricultura do
Estado do Pará
FLONA Floresta Nacional
FNO Fundo Constitucional do Norte
GTA Grupo de Trabalho da Amazônia
IAG International Advisory Group - Grupo Consultivo
Internacional
IBAMA Inst. Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis
INCRA Instituto Nacional de Colonização
e Reforma Agrária
ITERPA Instituto de Terras do Pará
MDA Ministério de Desenvolvimento Agrário
MDTX Movimento Defesa da Transamazônica e
Xingu
MIN Ministério da Integração
Nacional
MMA Ministério do Meio Ambiente
MME Ministério de Minas e Energias
MPF Ministério Público Federal
MPO Ministério do Planejamento e Orçamento
ONG Organização não-governamental
PAS Programa Amazônia Sustentável
PCH Pequena Central Hidroelétrica
PPA Plano Plurianual
RIMA Relatório de Impacto Ambiental
RMA Rede Mata Atlântica
SIPAM Sistema de Proteção da Amazônia
SUFRAMA Superintendência da Zona Franca de
Manaus
UC Unidade de Conservação
Fonte: Ministério do Meio
Ambiente (www.mma.gov.br)
Assessoria de Imprensa