Panorama
 
 
 

GREENPEACE PROPÕE “DESMATAMENTO ZERO” E ALERTA:
2003 SERÁ PIOR QUE 2002

Panorama Ambiental
Manaus (AM) – Brasil
Julho de 2003


O desmatamento da Amazônia em 2003 deverá ser ainda maior do que os inaceitáveis 25,5 mil km2 estimados pelo governo para o período agosto/2001-agosto/2002 - que já representam um aumento de 40% na área destruída em apenas um ano. A taxa de 2002, agora divulgada, está bem acima da média anual (21.130 km2) da época mais trágica da Amazônia - os anos 70 e 80, conhecidos como “décadas da devastação” (1).
“Se a sanha das motoserras e tratores derrubaram o equivalente a 5,1 milhões de campos de futebol em 2002, a opinião pública deve se preparar: nossas observações de campo e análise de dados mostram que

vem aí um novo recorde de destruição para matar os brasileiros de vergonha”, disse o coordenador da campanha da Amazônia do Greenpeace, Paulo Adário. “Independente das medidas a serem adotadas pelo governo Lula para reverter os números de desmatamento daqui para a frente, a destruição já foi feita e a próxima taxa anual (2002-03) deve mostrar uma goleada das forças que se dedicam à devastação da Amazônia. Só há uma saída: o governo deve adotar o ´Desmatamento Zero´ - um programa que, a exemplo do ´Fome Zero´, se destine a resolver o problema a longo prazo”.
Parte da explicação para o aumento surpreendente está na ampliação da área plantada na região, no boom do gado, da soja e do arroz que crescem sem controle em direção ao coração da Amazônia. Também pesa a desvalorização do Real no início de 2001, a maior competitividade da madeira abatida impunemente na região, a inexistência de crédito para manejo sustentável dos recursos florestais e a crônica incapacidade de implementação por parte de órgãos governamentais fragilizados por anos de sucateamento orçamentário.
Segundo o Greenpeace, o problema fugiu do chamado “Arco do Desmatamento” - que vai do Leste e sul do Pará em direção oeste, passando por Mato Grosso, Rondônia e Acre -, impulsionado por um consórcio madeira-pastagem-produção de grãos para exportação (2). Não se trata mais de pequenas frentes de desmate provocadas por colonos que se instalam em áreas remotas, mas grandes áreas de florestas sendo removidas em regiões até então distantes do fenômeno de expansão da fronteira agrícola. Grandes desmatamentos e frentes de grilagem de terras públicas estão ocorrendo em Apuí, Lábrea, Boca do Acre, Novo Aripuanã e Rodovia do Estanho, no Amazonas, estado até então bastante preservado.
Em Apuí, num trecho conhecido como “180”, um único grileiro disse ao Greenpeace que vai “ganhar US$ 1 milhão” vendendo terras na área para fazendeiros vindos do Mato Grosso. Em Lábrea e Boca do Acre, no sul do Amazonas, mais de 15 mil hectares ao longo do “Ramal dos Baianos” foram desmatados entre fins do ano passado e primeiro semestre deste ano, antes que o Ibama chegasse à área.
Fortes desmatamentos estão ocorrendo também na margem esquerda do Rio Amazonas, ao longo da estrada que sai de Oriximiná em direção a Prainha, passando por Óbidos, Alenquer e Monte Alegre, no Pará. Lá, soja e madeira fazem a festa. O mesmo ocorre no entorno dos assentamentos do Incra Moju 1, 2 e 3, entre Santarém e Uruará, e no sudeste da chamada “Terra do Meio”, localizada entre os rios Xingu e Tapajós. O ataque dos predadores à região se dá também pelo oeste, vindo de Novo Progresso, pólo madeireiro às margens da rodovia Cuiabá-Santarém (BR-163). A rodovia, que deverá ser asfaltada durante o atual governo, virou rota de migração de plantadores de soja e arroz financiados pela extração de madeira farta e de fácil “legalização”. No mês de junho de 2003, a parte sul da rodovia, em Mato Grosso, concentrou a maioria dos focos de queimadas identificada pela Embrapa. Em Santarém, segundo maior porto de exportação de madeira do Pará, a multinacional Cargill inaugurou um porto graneleiro para escoar a soja. Produtores do sul invadiram a cidade nos últimos seis meses e compram toda a terra disponível. A euforia da soja já está afetando os igarapés que formam o lago da turística localidade de Alter do Chão, segundo lideranças locais. Tudo isso sem qualquer zoneamento ou controle, ou mesmo estudos para identificação das reais potencialidades econômicas da região.
“Os números mostram claramente que o governo federal tem sido incapaz de deter o desmatamento na Amazônia”, afirma Adário. ´É preciso uma mudança radical de concepção do modelo econômico adequado à região, que não pode ser deixado à mercê das forças de mercado, com sua visão predatória e imediatista. O governo federal não pode se eximir: tem de assumir o comando do processo, via indução, planejamento e controle, e não apenas assistir a festivais.”
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, dona de um enorme cacife ambiental, tem insistido na tecla de que seu ministério, sozinho, pode fazer pouco para reverter o processo em curso. Marina Silva diz que as questões ambientais precisam ser incorporadas ao planejamento dos demais ministérios. Se o governo como um todo não assumir a proposta de Marina e transformar a proteção da Amazônia numa prioridade nacional, Lula poderá repetir seu antecessor.
Durante os oito anos de governo Fernando Henrique, foram desmatados 157 mil km2 de floresta - um quarto do desmatamento total da Amazônia desde a chegada dos portugueses em 1500. Seu ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho, também ciente da fraqueza estrutural do MMA, procurou produzir uma “Agenda Positiva” para a Amazônia, trabalhando em conjunto com ONGs, adotando medidas contra o desmatamento, canalizando recursos internacionais para programas de desenvolvimento sustentável, combate a queimadas e áreas de proteção. Essas medidas, no entanto, não atingiram as verdadeiras causas econômicas e sociais da destruição da Amazônia, tais como a ausência do poder público em muitas regiões, a expansão da agricultura e da pecuária de larga escala em terras baratas, a grilagem de áreas públicas, a concentração de poder econômico e político em poucas mãos, a violência impune, o avanço descontrolado da exploração ilegal de madeira justificado ideologicamente por uma visão “desbravadora”, a injustiça social, a ausência de uma reforma agrária real nas outras regiões do país que contivesse o fluxo contínuo de novos colonos, os assentamentos do Incra em áreas de floresta, as invasões estimuladas ou espontâneas etc.
Além da imensa perda de biodiversidade e da ameaça a povos e culturas tradicionais, o desmatamento afeta o ciclo das águas e adiciona, segundo o Ipam (Instituto de Pesquisa da Amazônia), 200 milhões de toneladas de carbono à atmosfera anualmente, transformando o Brasil num dos 10 maiores vilões responsáveis pelo aquecimento global.
Estudos científicos já provaram que grande parte dos solos da região são impróprios para a agropecuária. A riqueza da Amazônia está na floresta em pé. O futuro da região depende da adoção, pelo país, de um novo modelo de desenvolvimento baseado na implantação de uma rede de áreas protegidas e da sustentabilidade ambiental e uso responsável dos recursos naturais.
“As medidas precisam quebrar a associação perversa entre exploração madeireira e expansão da fronteira agrícola, principalmente para monocultura de soja e pecuária”, completou Adário. “Permitir a continuidade do desmatamento significa condenar a Amazônia ao atraso econômico, à crise social e ao desastre ambiental”.
Em 2001, o Greenpeace já havia proposto a adoção de um programa nacional de combate ao desmatamento com o objetivo de reduzir a zero a perda de cobertura florestal em 10 anos, ao mesmo tempo em que amplia emprego e renda através de um modelo de desenvolvimento responsável. O programa precisa contar com o apoio financeiro da comunidade internacional e inclui a criação de uma força-tarefa interministerial, com a participação de entidades representativas da sociedade civil e dos setores produtivos, para deter o avanço do desmatamento.

Ele inclui:

- Fortalecimento dos mecanismos de controle de desmatamento;
- Expansão dos programas governamentais de combate às queimadas;
- Fortalecimento das instituições encarregadas da proteção ambiental como IBAMA e Secretarias Estaduais de Meio Ambiente;
- Implementação dos compromissos nacionais e internacionais assumidos em 1992 no âmbito da Convenção da Biodiversidade (CBD) (3);
- Barrar qualquer mudança no Código Florestal que signifique aumento das áreas legalmente autorizadas para desmatamento (4);
- Implementação das unidades de conservação já aprovadas mas que até hoje não saíram do papel;
- Implementação de áreas de uso sustentável - tais como Flonas e reservas extrativistas consorciadas com áreas de proteção absoluta (parques e reservas biológicas) - como “zonas tampão”. Tais zonas devem ser criadas prioritariamente nas áreas críticas, para conter as frentes de expansão do desmatamento e da exploração madeireira ilegal;
- Destinação das áreas griladas na região amazônica (que, de acordo com dados das CPI da Grilagem chegam à 100 milhões de hectares, ou 20% da Amazônia Legal) prioritariamente para a criação de áreas de proteção;
- Demarcação de todas as terras indígenas;
- Apoio à criação e manutenção de RPPNs - reservas privadas do patrimônio natural nas áreas de reserva legal;
- Recuperação e uso das áreas degradadas, que somam cerca de 22% do total desmatado;
- O adensamento das atividades agropecuárias em áreas já desmatadas aliada ao aumento da eficiência tecnológica (inclusive na indústria madeireira, que hoje tem índice de perda de 70%);
- Adoção de mecanismos fiscais que penalizem a madeira proveniente de desmatamento e beneficiem exclusivamente a produção de madeira através de manejo florestal sustentável e passível de certificação pelo FSC (5). Isso implica investimento na modernização do parque industrial madeireiro não predatório e apoio institucional e financeiro à projetos de manejo florestal comunitário;
- A adoção, pelas entidades de crédito e fomento ao desenvolvimento da Amazônia, da política anunciada pelo presidente do Banco da Amazônia (Basa), Mâncio Lima, de que não vai financiar projetos que envolvam a conversão da cobertura florestal em desmatamento a partir de agora (6);
- A atração de investimentos para atividades de baixo impacto ambiental - tais como ecoturismo, fármacos naturais, manejo sustentável dos vários produtos não madeireiros (fibras, raízes, óleos, frutos etc);
- Apoio financeiro e capacitação técnica às populações das reservas extrativistas, assegurando mercado para seus produtos;
- Redirecionamento do programa nacional de reforma agrária para áreas já desmatadas.

“Conter a destruição das florestas se tornou uma prioridade mundial, e não apenas um problema brasileiro”, concluiu Adário. “Restam hoje, em todo o planeta, apenas 22% da cobertura original de florestas primárias (ou florestas antigas). Cerca de 45% das florestas tropicais, que cobriam originalmente 14 milhões de km quadrados (1,4 bilhão de hectares), desapareceram nas últimas décadas. No caso da Amazônia Brasileira, o desmatamento da região, que até 1970 era de apenas 1%, saltou para quase 16% em 2002. É preciso interromper o processo antes que a Amazônia vire uma nova Mata Atlântica, hoje reduzida a apenas 7% de sua dimensão original.”

Notas:

(1) O satélite TM-Landsat, utilizado pelo INPE, respeitável instituto que monitora o desmatamento no Brasil, não consegue captar o desmatamento em áreas menores que 6,25 hectares, deixando de fora o impacto provocado por milhões de pequenos posseiros. Além disso, os dados não incluem o corte seletivo, resultante da atuação de milhares de madeireiros que operam na Amazônia e tampouco o desmatamento provocado por grandes incêndios florestais, como o de Roraima em 1998. Mas é assustador o fato de que os novos dados do INPE representam apenas uma projeção: os números reais devem ser ainda maiores.
(2) Isso apenas confirma uma tendência: o desmatamento está cada vez mais diretamente ligado ao modelo exportador e a conversão de novas áreas para o “agribusiness”. Em 2003, as exportações de carne bovina brasileira devem crescer 7,7% em tonelagem, com relação a 2002, segundo a Conab. No caso da soja, que é 70% exportada, a produção brasileira de grãos pulou de 38,4 milhões de toneladas (safra 2000/200) para estimadas 47,6 milhões de toneladas na safra 2002/2003. As exportações de farelo de soja pularam de 10 para 13 milhões de toneladas. Nos dois casos, pesa a influência do “mal da vaca louca”, doença ligada ao consumo de proteína animal pelos rebanhos europeus, que atingiu o auge em 2001. As exportações de madeira do Pará aumentaram 8,92% no primeiro trimestre de 2003. Ou seja, o consumo internacional tem cada vez mais responsabilidade na destruição da Amazônia.
(3) Ao sediar a Rio-92 e participar da elaboração dos textos que resultaram na Convenção de Biodiversidade (CBD), o Brasil assumiu o compromisso de redução das taxas de desmatamento e de implementar medidas de conservação e uso sustentável. Entre os compromissos assumidos na Rio-92 constam: proteger as florestas, estabelecer mecanismos para financiar atividades sustentáveis na área florestal, conservar a biodiversidade florestal, garantir que haja retorno dos benefícios da exploração sustentável para as populações regionais e garantir a sobrevivência das populações indígenas. A próxima reunião da CBD acontecerá em Kuala Lumpur, na Malásia, em fevereiro de 2004.
(4) Desde o final de 1999, a bancada ruralista do Congresso Nacional - representada pelo deputado federal Moacir Micheletto (PMDB-PR) e pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA) - vem articulando a aprovação de um projeto de lei que altera o novo Código Florestal brasileiro. Se aprovado, o projeto do deputado paranaense permitira - entre outras coisas - o desmatamento de até 80% da área de propriedades localizadas no Cerrado e de até 50% de propriedades na Amazônia. Além de permitir a ampliação legal do desmatamento, o projeto reduz e, em alguns casos, elimina as Áreas de Preservação Permanente - responsáveis pela preservação e conservação dos recursos hídricos.
(5) O FSC, sigla em inglês do Conselho de Manejo Florestal (Forest Stewardship Council), é o único sistema de certificação independente integrado por representantes de empresas madeireiras, organizações ambientalistas e do setor social. Mundialmente reconhecido, o FSC é o único sistema que atende a rígidos padrões ecológicos internacionais, incorporando de forma equilibrada os interesses de grupos sociais, econômicos e ambientais. A certificação é, atualmente, a melhor forma de atestar que o manejo de florestas nativas ou de plantações é realizado de maneira eficaz, ambientalmente adequada, transparente e economicamente viável. O selo FSC - também conhecido como selo verde - assegura transparência em todo o processo - desde a extração da madeira na floresta, passando pelo processamento na indústria até chegar ao consumidor final.
(6) Internacionalmente, o Banco Mundial está liderando uma proposta de que os 10 maiores bancos não devem financiar projetos em países em desenvolvimento que tragam prejuízos ambientais embutidos. Entre aqueles que concordam com o novo código de conduta para linha de crédito, conhecido como “Princípios do Equador”, estão o Citibank, o Credit Suisse e o ABN AMRO. A proposta está de acordo com o anúncio feito recentemente pela Comissão Européia de que irá pressionar as instituições bancárias a serem mais cuidadosas no financiamento de companhias envolvidas com práticas ilegais de exploração dos recursos florestais. Os europeus têm expressado crescente preocupação com tais atividades, que não apenas destróem os últimos remanescentes florestais do planeta como também custam bilhões de dólares em evasão de divisas e contribuem com violentos conflitos nos países em desenvolvimento, como África e a América Latina.

Fonte: Greenpeace (www.greenpeace.org.br)
Assessoria de imprensa

 
 
 
 

 

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