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ÍNDIOS
DENI COMEMORAM NA AMAZÔNIA
A DEMARCAÇÃO DE SUAS TERRAS
Panorama Ambiental
Aldeia Boiador, Terra Deni (AM) – Brasil
Agosto de 2003
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A Conquista
de um povo por seus direitos
O grupo indígena
Deni celebrou hoje, com cantos e danças tradicionais,
a conclusão da demarcação de
sua terra, depois de 18 anos de espera. A cerimônia,
organizada pelos patarahu (caciques) Deni, aconteceu
na aldeia Boiador, às margens do rio Xeruã,
afluente do rio Juruá, no sudoeste do estado
do Amazonas. Integrantes do Greenpeace, do Cimi
e da Opan (1), que ajudaram os Deni a lutar por
seu território, além de autoridades,
convidados especiais e jornalistas de vários
países participaram da festa.
Com a demarcação da terra Deni, um
corredor "etno-ambiental" de mais de 3,6
milhões de hectares de floresta amazônica
será formado, ligando oito terras indígenas.
Este corredor, ainda não cientificamente
estudado, vai assegurar o uso exclusivo dos recursos
da floresta por uma população estimada
em mais de 2,4 mil indivíduos, além
de um grupo ainda não contatado, os Hi-marimã
(2).
A demarcação de terras indígenas
tem se demonstrado uma forma eficiente de proteção
à floresta amazônica, ameaçada
por milhares de madeireiros que, em sua maioria,
operam de forma ilegal e predatória; por
queimadas; pelo avanço da fronteira agrícola
e pecuária, e por grandes obras que abrem
o coração da floresta à devastação.
Imagens de satélite da Amazônia Legal
revelam que o desmatamento crescente não
cruza as fronteiras de territórios tradicionalmente
usados pelos povos indígenas. O desmatamento
anual estimado para o período agosto/2001-
agosto/2002, por exemplo, alcançou o alarmante
índice de 25.460 km2, a segunda maior taxa
da história, mas poupou as terras indígenas
(3).
"A demarcação da terra Deni é
um passo histórico para todos aqueles que
lutam para reverter a tendência de destruição
das Florestas Antigas do planeta, através
do trabalho com as comunidades tradicionais, do
estabelecimento de áreas protegidas e pelo
cumprimento das legislações nacionais",
disse Nilo D`Avila, da campanha Amazônia do
Greenpeace. "Depois de quatro anos de trabalho
com os Deni pela conquista de seu direito à
terra, estamos convencidos de que a preservação
da biodiversidade da Amazônia, tão
ameaçada por interesses econômicos
e por um padrão de consumo insustentável,
só estará garantida se for feita em
parceria com os povos que têm na floresta
a sua casa".
Desde 1999, o Greenpeace desenvolve campanha pela
demarcação da terra Deni, uma área
de 1,53 milhão de hectares localizada na
planície entre os rios Purus e Juruá.
Na época, o Greenpeace investigava a compra
de 313 mil hectares de floresta pela gigante madeireira
da Malásia, WTK, que pretendia explorar madeira
na região para produzir compensados destinados
à exportação. A WTK tem um
triste histórico de desrespeito à
legislação e aos direitos das populações
tradicionais dos países onde atua. Durante
a investigação de campo, o Greenpeace
descobriu que mais da metade das terras compradas
pela WTK - 150 mil hectares - se sobrepunha à
terra Deni.
Os Deni aguardavam a demarcação de
sua terra desde 1985 e não acreditavam mais
em soluções oficiais. Alertados sobre
a presença da WTK, eles pediram ajuda ao
Greenpeace para proteger seu território tradicional.
A primeira iniciativa foi tentar acelerar os trâmites
do processo oficial de identificação
da terra para que a demarcação fosse
realizada até 2001. O não-cumprimento
dos prazos e acordos fez com que os Deni decidissem
autodemarcar sua terra. Os líderes Deni novamente
pediram ajuda ao Greenpeace.
"Nós nunca deixaremos nossa terra",
disse Kubuvi Deni, um dos líderes. "Nós
dependemos da floresta para sobreviver. Precisamos
caçar e pescar para nos alimentar e, para
isso, nós precisamos de nossa terra".
A partir da determinação dos Deni,
o Greenpeace entrou em contato com o Cimi e a Opan
- duas organizações com grande experiência
no trabalho com povos indígenas na Amazônia
- para, juntos, formular um projeto que capacitasse
os próprios índios a delimitar os
limites tradicionais de sua terra e, assim, comandar
o processo demarcatório. Para Ivar Busatto,
da Opan, "o fato de o Greenpeace ter nos chamado
para uma luta maior em defesa dos direitos Deni
foi extremamente importante".
Em 2001, uma equipe multidisciplinar trabalhou diretamente
com líderes Deni de todas as oito aldeias
e os Deni aprenderam a manusear instrumentos desconhecidos
para eles, como teodolitos, bússolas e GPS,
adquirindo uma idéia muito clara das fronteiras
de seu território. Ao mesmo tempo, o Greenpeace
realizou uma campanha de pressão junto ao
mercado internacional da WTK, incluindo a invasão
de navios transportando compensados nos portos de
chegada. As ações resultaram no fechamento
do mercado inglês - o principal consumidor
dos compensados produzidos pela WTK na Amazônia.
Acuada, a empresa capitulou e declarou formalmente
que não iria explorar a área sobreposta
à terra Deni e que não recorreria
à Justiça contra o processo de demarcação.
Em setembro de 2001, os Deni iniciaram a autodemarcação
de seu território. Eles contaram com a ajuda
do Greenpeace, que mandou para a região 13
voluntários e um helicóptero para
apoiar o trabalho. Por mais de um mês, o grupo
trabalhou duro, enfrentando os rigores da floresta,
até que o Ministério da Justiça
ordenou que a autodemarcação fosse
interrompida e que as ONGs saíssem da área.
Os Deni se recusaram a parar. Depois de muita negociação,
os esforços foram recompensados: em outubro
de 2001, o então ministro da Justiça,
José Gregori, assinou a Portaria Demarcatória,
garantindo reconhecimento constitucional dos direitos
Deni sobre sua terra. Em maio de 2003, a demarcação
oficial finalmente começou, sendo concluída
agora. (4)
"A luta dos Deni pela demarcação
de seu território é um exemplo da
determinação de um povo indígena
que resolveu tomar o destino nas próprias
mãos", disse Paulo Adário, coordenador
da campanha da Amazônia do Greenpeace. "É
um testemunho vivo da luta em defesa da manutenção
dos recursos amazônicos nas mãos de
quem melhor os sabe proteger: as populações
tradicionais que vivem na floresta. É algo
que merece ser celebrado, depois de 18 anos de longa
espera e muita batalha".
Saiba mais
sobre os Deni e o dia-a-dia da expedição
do Greenpeace:
www.greenpeace.org.br/deni
Notas:
(1) Cimi: Conselho Indígena Missionário
(www.cimi.org.br); Opan: Operação
Amazônia Nativa (www.opan.org.br) - duas organizações
com grande experiência no trabalho com populações
indígenas na Amazônia brasileira.
(2) Os Hi-marimã
permanecem sem contato com não-índios.
Sua população é estimada em
menos de 200 indivíduos.
(3) Segundo dados
do Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (INPE),
a destruição em apenas um ano da Floresta
Amazônica eqüivaleu a 5,1 milhões
de campos de futebol e representa um aumento de
40% em relação ao período anterior.
(4) A empresa Setag,
contratada pela Funai e responsável pela
demarcação física do território,
iniciou seu trabalho na floresta em maio de 2003.
O processo incluiu a abertura de trilhas visíveis
na floresta e a colocação de marcos
e placas para identificar a terra indígena.
A demarcação foi financiada com recursos
do PPG7 (programa piloto dos países ricos
para a proteção da Amazônia)
e do governo brasileiro.
Fonte: Greenpeace (www.greenpeace.org.br)
Assessoria de imprensa