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VEJA O DISCURSO DE POSSE
DO NOVO PRESIDENTE DO IBAMA, MARCUS BARROS
Panorama
Ambiental
Brasília (DF) - Brasil
Janeiro de 2003
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"Vejo nessa plenária
uma representação, uma base, que faz
com que diminua meu confessado medo de dirigir uma
instituição dessa importância
e desse peso estratégico para o nosso país.
Confesso que tenho medo. Mas, ao mesmo tempo, que
tenho coragem. Vejo aqui amigos do peito. Amigos antigos.
Isso me dá um respaldo enorme. Vejo minha mulher
Isane, meus filhos, a direção do Instituto
Nacional de Pesquisas da Amazônia, deputados
do meu estado, o ex-diretor do instituto que agora
deixo, amigos da universidade da Amazônia onde
fui reitor e que hoje tem uma importância enorme
aqui em Brasília. Vejo ex- professores, o ex-ministro
Sardenberg (Ciência e Tecnologia) que me deu
posse do Inpa há nove meses e por quem tenho
enorme admiração pela competência
e pelo que tem feito pelo Brasil. Hoje embaixador
na ONU, ele nos dá o prazer de estar aqui.
Vejo colegas do Inpa que não fazem parte direção
do órgão e meus companheiros - o professor
Stainer e sua equipe que muito me apoiou quando dirigi
o Instituto - até agora. Para eles, em particular,
peço desculpas por não poder ter concluído
o meu mandato. Eles que me ajudaram a construir através
de um processo muito difícil de busca, a forma
a meu ver extremamente justa para dirigir uma instituição
como o glorioso Instituto Nacional de Pesquisas da
Amazônia. Vejo tantos amigos do peito que não
via há algum tempo: o presidente do PSB, Serafim
Coelho, outro diretor do Inpa, Seixas Lourenço.
Enfim, essa platéia representa o instrumento
que me tira o medo, o instrumento que me impulsiona,
como a presença dos servidores desse instituto,
a razão de ser, decididamente a massa que gera
o progresso, o conhecimento técnico, que fortalece
o Ibama.
Me emociono muito, me encho de alegria, porque assisti
nesse mesmo auditório um brilhante discurso
da nossa ministra que falava do alto da sua humildade
da sua origem. E eis que ela vai buscar também
nos rincões dos seringais da Amazônia
a minha pessoa para essa nobre missão.
Os Barroso migraram do nordeste para outro vale. Enquanto
ela (a ministra Marina Silva) estava no vale do Purus,
nós estávamos no vale do Juruá.
O primeiro rio, o primeiro afluente que sai do Acre
quando o Juruá passa por Cruzeiro do Sul, o
primeiro rio quando o Juruá entra à
direita na Amazônia, tem um nome muito bonito,
poético - Riozinho da Liberdade. Lá
dentro os Barroso migraram há muitos anos de
algumas regiões do Ceará e se instalaram
no Riozinho da Liberdade. Isso é muito significativo.
A palavra liberdade tem um peso enorme na minha geração.
Minha família vem exatamente daí, das
dificuldades, das agruras de sobrevivência no
Juruá, que poucas pessoas conhecem tão
bem como nossa ministra do Meio Ambiente.
Dar um salto do Juruá até essa sala,
ver uma platéia extremamente ilustre, cheia
de esperança, o Brasil querendo renovar, apontando
concretamente para a renovação. É
dessas esperanças - dificilmente conquistadas
em vinte e dois anos de lutas e preconceitos, que
fala o nosso novo governo. Dar esse salto lá
da Amazônia para cá deixa o medo um pouco
afastado e nos enche de orgulho, um orgulho de extrema
responsabilidade. Responsabilidade, como diz a ministra
de "dar um friozinho na barriga'. É exatamente
isso que se sente quando a tensão aumenta.
Mas é uma responsabilidade orgulhosa.
Uma mulher que partejei há alguns anos, ao
final do parto com seu filho na mão, perguntei-lhe:
"Doeu muito?" Ela disse: "É
uma dor aliviada". Então, é mais
ou menos o que eu sinto nesse momento. Um certo alívio
e uma certa segurança que vai se assenhoreando
à medida que vejo a imensa responsabilidade
mas, apoiando-a, a base de sustentação
que nos suportará na administração
do Lula, na administração da Marina,
na nossa administração. Às vezes
quebro o protocolo sem querer. Não consigo
chamar de ministra uma companheira que sofreu tanto
conosco na Amazônia. Às vezes cometo
o deslize de chamar a ministra simplesmente Marina,
não levem isso em consideração.
Estou aqui na perspectiva de servir o Brasil com a
seriedade que marca a minha pessoa. A ética
foi o que nós sempre perseguimos. A ética
do coletivo. Essa reunião de minha apresentação
(posse) já está no currículo.
Vou lhes dizer outras coisas extra- curriculares para
que os senhores e as senhoras entendam e conheçam
melhor o novo presidente do Ibama, na perspectiva
de cada vez mais confiarem e nos ajudar a atingir
a grande meta que é cuidar do meio ambiente
para que o futuro comum das nossas gerações
seja um fato concreto.
Sou também um médico. Minha formação
superior foi na Universidade Federal da Amazônia,
a qual dirigi. A síntese do que faço,
para que me entendam bem: sou um médico formado
há trinta anos que nunca atendi um doente do
bolso do qual tivesse saído meus proventos.
Nunca recebi um tostão pelo atendimento profissional.
Estudei doenças tropicais, com opção
especial pelos palperizados, empobrecidos, e excluídos.
Disso me orgulho. Sou um homem público. Vivi
dentro dos hospitais públicos, dentro dos laboratórios
públicos, coerência que mantenho na perspectiva
do bem comum. Ser um dos fundadores do nosso partido
(PT) na Amazônia apontava única e exclusivamente
na direção do bem comum, de minorar
o sofrimento dos excluídos. Quando a ministra
nos chamou para essa tarefa (presidente do Ibama)
quero lhes confessar - foi uma surpresa enorme. Tive
dificuldade de me desvencilhar da antiga atividade
de cuidar dos doentes e de lecionar na universidade
- sempre na perspectiva de melhorar a saúde
e o meio ambiente. Tive dificuldade de me descolar
do meu Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia.
Tenho certeza que como o Ibama será, o Inpa
é muito importante para o Brasil. É
do Inpa que sai a ciência e a tecnologia "self"-
própria da Amazônia. O Inpa é
o organismo que luta pela segurança nacional,
através do domínio do saber da ciência
e da tecnologia. Chegando aqui vejo a interface que
vai surgir, que vai se aprofundar entre o Inpa e as
outras instituições de pesquisa, como
o Inpe - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais,
que passei a conhecer melhor, e esse instituto (o
Ibama).
A preservação do meio ambiente sofre
uma dicotomia. Temos que buscar cada vez mais uma
base popular chamada de controle social para fiscalizar
todos os ecossistemas brasileiros. Um aparelho de
estado, por maior que cresça, por maior que
seja competente, por maior riqueza que tenha das interpretações
das imagens de satélite não é
capaz, sozinho, de cobrir essa área imensa
que vai dos banhados do Rio Grande do Sul, ao lavrado
de Roraima, das formações vulcânicas
de Fernando de Noronha, ao Pantanal. Isso é
muito difícil. Se não houver parceria
social respaldando essa tal fiscalização
- nome que não gosto, se não houver
controle social na atenção ao meio ambiente,
a missão não se cumpre, estou seguro
disso.
Já na chegada vejo isso com clareza. Como diz
a ministra: "se não houver cooperação"...
E vou mais longe, até a palavra "conluio"
- que hoje os técnicos chamam de transversalidade,
eu me arrisco. Se não houver isso (conluio/transversalidade)
entre nossos ministérios, essas ações
não terão conseqüência. A
ministra aponta, ainda, para as ações
pró- ativas no desenvolvimento sustentável.
Se não houver atividade integrada entre todos
nós - nós, servidores, nós, autoridades,
nós, Brasil, nós, os excluídos
- onde precisamos manter a interface com o projeto
Fome Zero pela razão direta entre fome e degradação
ambiental, se não estivermos juntos nessa associação,
será difícil cumprir nossa tarefa magna
- a de cuidar do meio ambiente.
Então, estou aqui despido, ainda com a dor
de sair do Inpa. Mas pronto como um soldado - como
todos os senhores e as senhoras, para melhorar inclusive,
do ponto de vista real, a imagem do Brasil no exterior.
Do ponto de vista geral e numa política integrada,
para melhorar através dos cuidados com o meio
ambiente as condições de vida das populações
das regiões chamadas de "áreas
quentes" da Amazônia e do semi-árido
- as áreas mais problemáticas. Esse
cuidado é sensibilizar essas populações
para que entendam que o meio ambiente é o espaço
físico geográfico de onde elas tiram
e devem tirar, assim como todos nós, a própria
sobrevivência e a própria dignidade.
O desenvolvimento brasileiro está à
frente quando nós colocamos a variável
água. Está à frente do mundo,
do ponto de vista estratégico.
Então, a responsabilidade tem toda essa dimensão.
Não quero ser leviano - chegar aqui e ocupar
um cargo, apenas um cargo. O nosso presidente Lula
não é assim. O governo tem que ser de
todos, não de alguns através da ocupação
de cargos públicos que servem apenas como instrumentos
para recuperar a ética e a dignidade. Estou
aqui e me tocou muito quando nossa ministra, na sua
posse, homenageou um poeta (Thiago de Mello) através
do qual ela elogia muito a Amazônia - amigo
que nasceu e mora na Amazônia, no estado do
Amazonas - sou um pouco bairrista. "Vida Verdadeira"
- um de seus poemas que gosto muito, é emblemático.
É um poema imenso, que não vou declamar.
Apenas enfatizar uma pequena parte que marca muito
esse meu sentimento ético em relação
aos senhores:
- "Pois aqui está minha vida pronta para
ser usada. Vida que não se guarda nem se esquiva
assustada. Vida sempre a serviço da vida".
A colocação do Ibama de fiscalizar profundamente
significa correr risco de vida. Isso nós não
temos. A minha vida não se guarda, ela não
se esquiva assustada. Ela vai para as campanhas esgotadas,
como o nosso governo - não gosto de dizer governo
Lula, digo nosso governo. Nosso governo aponta que
uma das estratégias é o consenso através
da negociação e da conversação.
No Ibama, só depois de alcançarmos esse
exaustivo consenso - com todos, os empresários
também, é que aplicaremos a lei. E quando
aplicarmos a lei será como foi escrita - dura,
multando forte quem intencionalmente destruiu o meio
ambiente. Não abriremos mão disso, de
jeito algum. Repito: antes, porém, buscaremos
o consenso, à exaustão. Quem vai tocar
tudo isso serão as senhoras e os senhores do
Ibama, da máquina administrativa. Nós,
servidores, nós, do Ibama, sofremos muito,
queremos mais conquistas. Tenho consciência
das dificuldades e das coisas que precisam ser suplantadas
para facilitarmos nossa vida na busca dos nossos objetivos.
Tenho dificuldade de entender um plano de carreira
onde todos são iguais - quem entra, agora,
é igual a quem sai. Isso não é
um fator estimulante. Então, cabe a nós,
quando digo nós é profundamente nós.
Significa nós, administradores do Ibama. Significa
associação dos servidores do Ibama.
Significa as forças vivas, organizadas em grupos
de servidores que tanto lutam. Significa o que o Rômulo
Mello (ex-presidente do Ibama e servidor de carreira)
fez com todos na perspectiva de melhorar as condições
de trabalho. Eu não serei insensível
a essas lutas por melhores condições
de vida.
Por outro lado, se eu estivesse na posição
dos senhores e das senhoras também ficaria
apreensivo com uma pessoa que chega de fora. Considero
isso natural. Mas, não tenham medo. De mim
os senhores e as senhoras não verão
injustiças, preconceito, essas coisas todas
que sofremos no processo. Eu não vim do berço
da iniqüidade, da perseguição,
da tortura mental.
Quando digo nós, digo que nós vamos
governar juntos porque nosso governo é fruto
de 52 milhões de brasileiros que nos autorizaram
a governar a partir da nossa liderança maior,
de nosso programa de governo. Essa é a nau
que vai nos levar ao sucesso. Eu creio nisso e fico
mais crente, mais seguro, mais comprometido. Então,
cito outra vez o poeta Thiago de Mello. Talvez esse
fragmento de poema explique essa palavra feia, transversalidade:
... "À sombra dos igapós, com cheiro
de marirana, tambaqui do alguidar, um dia a gente
vai se encontrar." Muito obrigado."
Fonte: Ibama (www.ibama.gov.br)
Assessoria de imprensa
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