O ISA, a propósito
das comemorações dos seus dez anos
em 2004, está lançando um mote que
pretende mobilizar esforços de múltiplos
colaboradores e instituições dos
mais diversos setores da sociedade para fazer
um balanço prospectivo dos rumos do desenvolvimento
no país e gerar um movimento, através
de um ciclo de eventos que vai aterrissar no SESC
Pompéia, em São Paulo, em 2004.
Haverá uma exposição principal
organizada por ambientes (Amazônia, Pantanal,
Cerrado, Caatinga, Mata Atlântica...), e
uma extensa programação de seminários,
debates, lançamentos, mostras e apresentações
culturais. Leia o editorial que explica o significado
do mote Amansa Brasil.
Convite a uma
colaboração
O Instituto Socioambiental
(ISA), a propósito da comemoração
dos seus dez anos em 2004, vem convidar toda a
sociedade brasileira a refletir sobre si mesma
e sobre o estado de sua casa - que é o
nosso país, o pedaço que nos coube
do planeta. Entendemos que é imperativo
repensar os caminhos pelos quais vamos enveredando
na ânsia de encontrar uma solução
para as gigantescas dificuldades econômicas
e sociais em que estamos mergulhados. Esses caminhos
nos conduzem a uma forte aceleração
do ritmo, já perigosamente rápido,
de destruição irreversível
de um dos componentes básicos de nossa
identidade como nação: nossa diversidade
socioambiental. Diante disso, pensamos que é
urgente decidir, agora, que vida desejamos para
nós e, sobretudo, para nossos filhos, qual
país queremos deixar para eles. Estamos
convictos de que é urgente, não
"parar para pensar", mas pensar para
não parar; é urgente começar
a pensar bem para não parar de vez.
O Brasil é grande, mas o mundo é
pequeno. A Terra não vai nada bem, neste
começo de século. Há hoje
uma insustentabilidade aguda dos padrões
globais de produção, distribuição
e consumo da energia necessária à
vida humana. Nosso país é um dos
poucos que ainda têm viabilidade do ponto
de vista de sua base de recursos. O Brasil ostenta
uma das populações histórica
e culturalmente mais diversificadas do mundo:
220 povos indígenas, uma imensidão
de descendentes de africanos, de imigrantes europeus
e asiáticos, de árabes, de judeus;
são caiçaras, caboclos ribeirinhos,
camponeses extrativistas, pequenos fazendeiros,
colonos; em suma, gentes rurais e urbanas das
mais diferentes origens étnicas e culturais,
habitando uma variedade de formações
naturais — cerrado, pantanal, caatinga, campos
e os mais de 3,5 milhões de quilômetros
quadrados de florestas tropicais, na Amazônia
e na Mata Atlântica — que, por sua vez,
abrigam a mais rica biodiversidade do planeta.
Sociodiversidade e biodiversidade deveriam ser
nossos principais trunfos em um mundo em acelerado
processo de globalização. Mas eis-nos
aqui, ainda e sempre, teimando em serrar o galho
em que estamos sentados, com uma política
de comércio exterior e sustentação
da dívida que vem aplicando um modelo de
desenvolvimento ecologicamente predatório,
economicamente concentrador, socialmente empobrecedor
e culturalmente alienante. Devastamos mais da
metade de nosso país acreditando que era
preciso deixar a natureza para entrar na história;
pois eis agora que esta última, com sua
costumeira predileção pela ironia,
exige-nos como passaporte justamente a natureza.
Hoje, nós do ISA ainda temos que advertir
que “socioambiental” se escreve junto; mas esperamos
ver o dia em que esta palavra seja considerada
um pleonasmo: se é social, só pode
ser ambiental. Pois não existe uma “dimensão
ambiental” do crescimento econômico, do
desenvolvimento social, do progresso em geral:
ambiente é o nome da coisa toda, do problema
inteiro. O ambiente não é uma atração
turística, um detalhe pitoresco, uma alegoria
de carnaval. Ambiente não existe só
aos domingos, nem é luxo de rico. Ambiente
é uma questão de saúde pública
e de justiça social, não só
para os que vivem hoje, mas para as gerações
futuras. Uma questão de economia, enfim,
no sentido próprio e nobre do conceito.
Ambiente, recordemos, é apenas uma outra
palavra para condições de existência.
O equívoco de se separar social de ambiental
se torna ainda mais grave quando se imagina —
como se imagina tão frequentemente — que
só podemos nos desenvolver pagando algum
preço ambiental, isto é, estragando
alguma coisa. Isso não é verdade.
Não se faz omelete sem quebrar os ovos,
diz-se — pode ser, mas também não
se faz omelete quebrando todos os ovos e matando
as galinhas. Ou o desenvolvimento é sustentável,
ou não é desenvolvimento. O “preço”
que temos de pagar é o de melhorar o ambiente,
aprender a evoluir em sintonia com ele, pois não
há verdadeiro avanço da civilização
que não seja ao mesmo tempo um melhoramento
das condições ambientais propícias
a nossa espécie.
Em suma, é preciso fazer uma revisão
drástica do paradigma do crescimento indefinido
e a qualquer custo, que continua guiando nossos
planos econômicos e nossos sonhos de grandeza
nacional. Por isso o mote deste manifesto: Amansa
Brasil. Apegados a uma concepção
linear e cumulativa de história, herdeira
de um pensamento europeu velho de séculos,
ainda não acordamos para a constatação
de que a miséria, a fome e a injustiça
não são o fruto do caráter
ainda parcial e incompleto da marcha do progresso,
mas seus produtos necessários, que continuarão
crescendo mais e mais enquanto a marcha prosseguir
no rumo em que vai. A saída não
pode ser por aí, e cabe a nós achar
outra. Pois o futuro nos desafia a uma nova síntese:
a sustentabilidade socioambiental. Esse é
o espetáculo que queremos mostrar para
nossos filhos.
Fonte: ISA - Instituto
Socioambiental (www.socioambiental.org.br)
Assessoria de imprensa