 |
LANÇADO
O RELATÓRIO BRASILEIRO SOBRE
DIREITOS HUMANOS ECONÔMICOS SOCIAIS
E CULTURAIS
Panorama Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Junho de 2003
|
 |
Com recomendações
em seis áreas diferentes - Alimentação,
Água e Terra Rural, Educação,
Meio Ambiente, Moradia Adequada, Saúde e
Trabalho - o documento foi divulgado ontem (11/06)
durante a 8ª. Conferência Nacional de
Direitos Humanos, na Câmara dos Deputados,
em Brasília.
O relatório
é resultado da primeira fase do Projeto Relatores
Nacionais em Direitos Humanos Econômicos Sociais
e Culturais (DhESC), uma iniciativa da Plataforma
DhESC Brasil, com o apoio e a parceria do programa
de Voluntários das Nações Unidas
e da Secretaria Especial de Direitos Humanos do
Ministério da Justiça. O projeto foi
motivado pela constatação de que,
apesar de possuir uma legislação considerada
avançada na matéria, o Brasil apresenta
um quadro grave de violação dos direitos
humanos, sem dispor de mecanismos de monitoramento
do respeito a esses direitos.
Os seis relatores nacionais em DhESCs foram nomeados
em outubro do ano passado, com o objetivo de avaliar
anualmente a capacidade do país de cumprir
com suas obrigações na área
de direitos humanos, no que se refere à Constituição
Federal, ao Programa Nacional de Direitos Humanos
e aos tratados internacionais ratificados pelo Brasil.
As missões de investigação
tiveram início em novembro de 2002 e resultaram
em relatórios temáticos apresentados
às Nações Unidas em abril e
à sociedade civil brasileira em maio de 2003,
num evento que antecedeu a Conferência Nacional
de Direitos Humanos.
Os pontos centrais do relatório são
os estudos de caso realizados pelos relatores e
as recomendações advindas do acompanhamento
desses eventos. “Além de apurar denúncias
e fazer recomendações, o objetivo
do projeto é demonstrar que não só
os direitos civis, mas também os DhESCs são
exigíveis do Poder Judiciário”, afirma
Jaime Bevenuto, coordenador geral do Projeto Relatores
Nacionais em DhESCs. O primeiro passo nessa direção
foi o protocolo de intenções firmado
na tarde de hoje com o Ministério Público
Federal, que visa dar encaminhamento às denúncias
apuradas pelos relatores nacionais, seja de forma
política, seja pela via judiciária.
“É importante que o Poder Judiciário
crie uma cultura de trabalhar com casos relacionados
aos DhESCs”, ressaltou Bevenuto.
Essa primeira fase da iniciativa ainda não
contou com tempo ou recursos financeiros suficientes
para que todos os casos denunciados fossem investigados
in loco. Porém, Bevenuto afirma que a Comissão
de Direitos Humanos da ONU tem demonstrado grande
interesse em reforçar o apoio político
e financeiro ao projeto, o que ampliaria a abrangência
de suas atividades.
Meio Ambiente
O Relatório
Brasileiro para os DhESC afirma que o direito ao
meio ambiente está diretamente associado
ao direito a um desenvolvimento sustentável,
o que significa possibilitar “uma vida digna para
todos, em especial para as populações
pobres dos países 'em desenvolvimento', com
acesso aos serviços essenciais, e um padrão
de consumo que preserve a possibilidade da humanidade
futura garantir as suas necessidades”. Isso tudo
aliado a uma exploração sustentável
dos recursos naturais.
Para a área de meio ambiente o relator titular
é Jean Pierre Leroy, coordenador de meio
ambiente e desenvolvimento da Federação
de Órgão para a Assistência
Social e Educacional (Fase), e seu assessor é
Daniel Ribeiro Silvestre, bacharel em Direito pela
Universidade de São Paulo. “O que foi possível
constatar é que todos os modelos de degradação
ambiental seguem uma lógica comum: os prejuízos
ao meio ambiente são acompanhados de seqüelas
graves entre as populações sem condições”,
afirmou Silvestre. “É fundamental que os
órgãos públicos ouçam
de fato as demandas locais e valorizem as alternativas
propostas.”
Dos seis casos selecionados para a primeira fase
de trabalhos da relatoria de meio ambiente, apenas
a região do sul do Pará pôde
ser visitada, devido à falta de tempo e de
recursos financeiros.
Sul do Pará
Grilagem de terras,
exploração predatória da madeira
e projeto de hidroelétrica de Belo Monte
foi o único caso a ser visitado in loco pela
relatoria, que passou quinze dias na região
da Amazônia Oriental formada pela Terra do
Meio, Cuiabá-Santarém, Transamazônica
(Anapu-Rurópolis), Xingu/Porto de Moz, no
Pará. Esse eixo é marcado por problemas
graves de grilagem de terras, violência generalizada
e denúncias de corrupção contra
diversas instâncias do poder público.
A primeira recomendação para se modificar
a situação no sul do Pará é
incisiva: basta à violência. Para isso,
é urgente a presença efetiva dos órgãos
federais – Incra, Ibama, a Polícia Federal
e a Justiça Federal -, bem como acabar com
as acusações de corrupção
e de favorecimento das classes dominantes dirigidas
ao Instituto Nacional de Colonização
e Reforma Agrária (Incra) e ao Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (Ibama). Além disso, o
relatório prega o desarmamento dos empregados
de madeireiras e fazendeiros e que as polícias
civil e militar tenham recursos suficientes para
que não sejam refém do poder político
e econômico local. Estabelecer a independência
da justiça também é essencial.
A regularização fundiária foi
considerada uma prioridade absoluta, sendo necessária
uma atuação incisiva do poder público
no sentido de acabar com o quadro de grilagem na
região, bem como da atividade madereira irregular.
No que se refere a áreas protegidas, destacam-se
as propostas de criação das reservas
extrativistas Verde para Sempre, em Porto de Moz,
e Anapú, no município de mesmo nome;
a homologação da Terra Indígena
Kuruaya e a demarcação da Terra Indígena
Xipaya. O relatório propõe também
discussões participativas sobre a criação
de outras reservas e/ou formas alternativas de assentamento
das comunidades da região e, ainda, o apoio
do governo federal na valorização
do agroextrativismo e da agricultura familiar sustentável,
dando atenção inclusive para propostas
de desenvolvimento sustentável como base
para a discussão do próximo Plano
Plurianual (PPA).
Finalmente, no que se refere ao projeto do complexo
de usinas hidrelétricas de Belo Monte, o
relatório entende que deve ser submetido
a estudos mais amplos e que outras alternativas
de geração de energia devem ser priorizadas.
Outras denúncias
ambientais
Impactos dos projetos
de construção de barragens hidroelétricas
e da sua construção sobre a população
atingida é um dos casos abordados pela relatoria
de Meio Ambiente. Seu estudo foi motivado pelos
fortes impactos socioambientais que a construção
de barragens acarreta para as populações
atingidas, principalmente no que diz respeito à
transferência forçada desses grupos
para outras áreas. Como recomendações
contra essa situação, destacam-se
a adoção de iniciativas alternativas
para o aumento da geração de energia
no país; a exclusão da construção
de barragens e da hidrovia no Rio Araguaia; que
os Estudos de Impacto Ambiental e Relatórios
de Impacto sobre o Meio Ambiente (EIA-Rima) sejam
dissociados das empresas interessadas pelas barragens;
e que esse tipo de estudo leve mais em conta a eqüidade
socioambiental. Finalmente, o relatório propõe
que a Fundação Palmares, atual responsável
pela questão fundiária quilombola,
faça convênio com o Incra para regularização
das terras de quilombolas, comunidades freqüentemente
atingidas pela construção de barragens.
Conheça a campanha Água sem Barragens
nas Bacias Amazônicas.
Povos indígenas: os Cinta-Larga – Noroeste
de Mato Grosso e Sul de Rondônia. O caso foi
denunciado à relatoria do Meio Ambiente pelo
Instituto Socioambiental, que por diversas vezes
noticiou a situação de invasão
de área indígena, expropriação
forçada dos recursos naturais, degradação
ambiental, violência descontrolada e corrupção
nas terras dos Cinta Larga. Diversas ações
foram propostas pela Funai, pelo Ministério
Público Federal, pelo Ibama, por organizações
e por particulares, mas a apuração
e a coleta de provas são insuficientes e
ou são prejudicadas por laudos periciais
de baixa qualidade. Diversos processos acabam sendo
arquivados sem nunca terem sido julgados, muitas
sentenças nunca foram cumpridas e outras
tantas são proteladas desnecessariamente.
O relatório afirma que “em linhas gerais,
as instituições federais e estaduais
carecem de meios e recursos necessários para
a execução das ações
repressivas e a assistência recomendada. A
Funai, o Ibama e a Polícia Federal não
dispõem de excedentes orçamentários
para operações abrangentes e prolongadas,
bem como lhes faltam recursos humanos e equipamentos
suficientes.”
Para saber sobre os Cinta Larga clique aqui.
Monocultura de árvores. Nas décadas
de 80/90, o governo federal deu fortes incentivos
para o desenvolvimento da agroindústria da
celulose – responsável pela substituição
de áreas relativamente preservadas de Cerrado
e Mata Atlântica por plantações
de florestas homogêneas - às custas
de pequenos produtores rurais e populações
tradicionais presentes nas suas áreas de
expansão. A relatoria de Meio Ambiente recomenda
que seja limitado o tamanho da propriedade e da
extensão das plantações de
árvores; que essas plantações
se façam em áreas de terras degradadas,
distantes da produção familiar; e
que sejam cobradas royalties dessas empresas agro-industriais
destinadas a programas socioambientais junto às
comunidades atingidas. Leia mais sobre a polêmica
em torno das florestas plantadas.
Poluição industrial foi outro tema
abordado pela relatoria de Meio Ambiente. Diversas
denúncias compõem esse caso, que teve
mais um caráter de acompanhamento do que
de estudo e elaboração de recomendações.
Recebeu destaque o caso da Rhodia, que negligenciou
normas e práticas de segurança e higiene
do trabalho para seus operários em uma fábrica
construída na década de 60, em Cubatão,
para produção de solventes clorados,
classificados como Poluentes Orgânicos Persistentes
(POPs). Além disso, o relatório afirma
que “a empresa implantou uma política deliberada
de descarte clandestino de seus resíduos
tóxicos, inicialmente dentro de seus limites
e adjacências para depois voltar-se rumo ao
litoral sul do Estado de São Paulo”. A etapa
mais recente do caso foi um inquérito instaurado
pelo Ministério Público Federal, motivado
por argumentos do Movimento Metropolitano Contra
o Lixo Tóxico da Rhodia, para investigar
se as medidas tomadas ao longo dos anos no caso
foram adequadas e suficientes em seus diversos aspectos.
Litoral. Pescadores ameaçados, é o
último caso apontado e tem como foco a ameaça
sofrida por pescadores tradicionais de todo o litoral
do Brasil e mais acentuadamente os do nordeste,
pela ação do turismo e da carcinicultura
(viveiros de camarão). O relatório
propõe que os programas e projetos turísticos
públicos sejam discutidos democraticamente;
que envolvam as populações locais,
favorecendo pequenos empreendimentos familiares
e assegurando a manutenção da população
local no seu ambiente de vida; que haja políticas
públicas, programas e projetos voltados para
a aumento da renda dos pescadores artesanais, levando
em conta os serviços ambientais que prestam;
que o Serviço de Patrimônio da União
desenvolva um programa de titulação
das terras das comunidades tradicionais do litoral;
e que a Fundação Cultural Palmares
faça um convênio com o Incra para a
titulação das terras de quilombos,
e que o instrumento da desapropriação
possa ser usado para tal.
Para conferir a íntegra do Relatório
Brasileiro sobre DhESC, contendo as denúncias
e recomendações para o Meio Ambiente;
Alimentação, Água e Terra Rural;
à Educação; à Moradia
Adequada; à Saúde e o ao Trabalho,
acesse o site do Instituto Sócio Ambiental.
Fonte: Instituto Sócio Ambiental
(www.socioambiental.org.br)
Marcos Pereira Rufino