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'MÉDICO DO MEIO
AMBIENTE',
ENTREVISTA COM O NOVO PRESIDENTE DO IBAMA
Panorama
Ambiental
Brasília (DF) - Brasil
Janeiro de 2003
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Um pedido de desculpas formal e uma satisfação.
Esse foi o tom do encontro entre o atual presidente
do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e
Recursos Naturais Renováveis (Ibama),
Marcus Barros, e funcionários do Instituto
Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).
Cercado de verde, na cantina do Inpa, o médico
explicou por que trocou o Amazonas pelo Brasil.
"Sou um representante do Amazonas e do
Inpa em instância nacional. Deixo aqui
um pouco de mim e levo muito de vocês."
Disposto a esclarecer por que, após
lutar tanto para alcançar a diretoria
do Inpa, passando, inclusive por dois comitês
analisadores, decidiu aceitar o convite de
dirigir o Ibama, Marcus falou durante duas
horas. Contou histórias e relatou o
intenso assédio que sofreu durante
todo o processo político no ano passado.
Isso incluiu, de acordo com ele, a recusa
a dezenas de convites, entre eles o de ser
candidato ao Governo do Amazonas.
Rendido pela paixão ao PT, partido
do qual foi fundador no Amazonas, Marcus Barros
não conseguiu negar o pedido de Luiz
Inácio Lula da Silva para assumir o
Ibama, onde foi empossado no último
dia 3. Na entrevista a seguir o médico
fala dos desafios de ser o único amazonense
no governo Lula e de como foi deixar o Inpa.
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A CRÍTICA
- Por que deixar o Inpa, se esse também era
um sonho antigo?
MARCUS BARROS - Foi muito difícil, analisei
isso durante todo o final do ano. Mas aí
pensei: depois de 22 anos esperando para ver um
trabalhador na presidência do Brasil eu irei
entregar tudo e dizer 'toma que o filho é
teu'. Não podia dizer 'se vira aí
cara'. É o presidente da República
que convida o pesquisador para trabalhar cuidando
do meio ambiente do Brasil inteiro. Eu confesso
que tenho medo, mas eu tenho coragem também.
E só aceitei o desafio porque fui convidado
por um companheiro e um amigo particular. Fazendo
um trocadilho, digo que é preciso cuidar
do meio ambiente para que os pesquisadores do Inpa
tenham o que pesquisar (brinca).
AC - O Inpa sai do
seu eixo de atenção com tantos desafios
no Ibama?
MB - Não. Há convênios entre
o Inpa e o Ibama. O Inpa, por exemplo, depende do
Ibama para entrar em algumas áreas de pesquisa
e coletar amostras. Isso não quer dizer uma
carta branca para o Inpa, a legislação
existente será cumprida. Mas nós pretendemos
firmar mais convênios e não apenas
com o Inpa, mas também com o Museu Emílio
Göeldi, a Sociedade Civil Mamirauá,
o Jardim Botânico e todas as instituições
de pesquisa do Brasil que lidam com a questão
ambiental. Eu não saio do Inpa para dirigir
o Banco do Brasil, tenho uma relação
com a questão ambiental.
AC - O senhor é
o único amazonense no governo Lula. Isso
aumenta suas responsabilidades?
MB - Eu vinha pensando no avião e só
aí vi que eu era o único amazonense
no Governo Federal. Aumenta minha responsabilidade
e me compromete mais. Espero que tenham mais amazonenses
no governo para dividir isso.
AC - O senhor assume
um Ibama com um número de funcionários
menor que o necessário para fiscalizar os
ecossistemas do País e com um orçamento
de somente R$ 600 milhões para 2003. Como
contornar isso?
MB - Temos que ter a humildade de não imaginar
que com 1,3 mil fiscais vamos fiscalizar o Brasil
inteiro. Nós estamos pedindo mais 2 mil fiscais,
já contratamos 610 e queremos atingir a meta
o mais rápido possível. De fato, o
aparelho de Estado para a dimensão do problema
é desproporcional. Mas aí tem um projeto
que faz parte do Programa do Governo do Lula. Sem
participação popular na área
de fiscalização e o controle macrossocial
não é possível fiscalizar.
AC - Qualquer projeto
macrossocial e a participação popular
seriam de médio a longo prazo. E, atualmente,
o Ibama no Amazonas trabalha com barcos precários
e um número reduzido de fiscais. Como o senhor
pretende solucionar isso a curto prazo?
MB - No Amazonas a fiscalização já
começou. Há três equipes em
campo. A fiscalização é prioritária
e nós temos que direcionar recursos para
essa área. Mas no Amazonas a questão
não é tão grave. No Sul do
Pará o problema é muito mais grave.
Tem aí a participação das organizações
não-governamentais que é um fato.
Elas nos ajudam com a informação,
a fiscalização e a denúncia.
E nós devemos estar abertos para essas parcerias.
Em medicina a gente não pode dizer que vai
erradicar, por exemplo, a malária. Nós
vamos controlar. Se eu disser que a nossa administração
vai acabar com os ilícitos em quatro anos
eu estarei sendo leviano.
AC - E como será
combatida a corrupção dentro do Ibama
denunciada ao longo do ano passado?
MB - "Se você consegue a fiscalização
nesse nível que eu falei e foca nas áreas
de ações ilícitas é
possível controlar. E se você pega
uma guia de liberação de um licenciamento
que leva um ano para ser liberada e mergulha na
burocracia se tem vários pontos de fragilidade.
Agora, se pega isso e coloca no sistema on line,
onde eu interligo na origem do interesse do empresário
e, de lá, à Procuradoria Jurídica
e a liberação fica a cargo do presidente
do Ibama, resolve o problema em 95% e aí
já há uma contribuição
para melhorar o sistema.
AC - Quais são
as prioridades do Ibama nesse primeiro semestre?
MB - "O Sul do Pará, o Norte do Mato
Grosso, Rondônia de Ariquemes a Vilhena, a
Mata Atlântica. O combate ao incêndio
por meio do PrevFogo e do Proarco, que é
uma coisa que nos preocupa. Atualmente, há
18 focos no País e pode piorar, porque o
El Niño está aí. E em Roraima
começa a ficar seco e isso já vai
diminuir meu sono, mas nós temos toda uma
estruturação para combater incêndios
e com recursos para mobilizar equipes. Eu tenho
também muita preocupação com
a Mata Atlântica porque restam apenas 7% do
ecossistema e não dá para derrubar
uma árvore. E a gente precisa ter atividades
de manejo e de replantio, porque nós precisamos
replantar a Mata Atlântica. E aí vem
a parceria com institutos como o Inpa, que produziram
conhecimentos importantes na recuperação
de áreas degradadas.
AC - Marcus Barros
agora é uma espécie de médico
do meio ambiente?
MB - É, acho que é isso mesmo. Vou
cuidar do meio ambiente como cuido dos meus pacientes
com Aids, com atenção e esperança.
Sabemos que é uma tarefa difícil,
mas estamos sempre buscando alternativas para uma
vida melhor, com esperança e muita luta.
Com o meio ambiente deve ser assim. Não vou
desistir.
Entrevista exclusiva concedida à Loredana
Kotinski, do jornal "A Crítica"
- de Manaus / AM, de 10.01.03.
Fonte: Ibama/A Crítica (www.ibama.gov.br)
Loredana Kotinski