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GTA DIVULGA
CARTA DE ALERTA CONTRA DEVASTAÇÃO
NA
AMAZÔNIA E EM DEFESA DAS COMUNIDADES
DA FLORESTA
Panorama Ambiental
Brasília (DF) – Brasil
Outubro de 2003
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A Rede Grupo de
Trabalho Amazônico (GTA) reafirma no texto
divulgado no último dia 10/10 a necessidade
de desenvolvimento justo e sustentável na
Amazônia como base de políticas públicas
para a região em todos os níveis,
exigindo ações imediatas em defesa
dos povos da floresta e de suas lideranças.
Leia abaixo o documento
na íntegra.
Carta aberta sobre
a Amazônia brasileira
Reunido em Brasília
de 6 a 10 de outubro de 2003, o Conselho Deliberativo
da Rede GTA (Grupo de Trabalho Amazônico),
com cinqüenta representantes de 512 entidades
de diversos segmentos socioambientais da Amazônia,
vem alertar o governo e a sociedade brasileira para
a necessidade de medidas urgentes diante dos conflitos
que ameaçam a maior floresta tropical do
mundo e as populações tradicionais
e indígenas daquela região. A Rede
GTA surgiu no âmbito da Cúpula das
Nações Unidas para o Meio Ambiente
e Desenvolvimento (Rio 92), para defender a importância
das comunidades da floresta no desenvolvimento sustentável
da região, e funciona com 16 coordenações
regionais distribuídas pelos nove estados
amazônicos. Reúne entidades de pescadores,
de agricultores familiares, de seringueiros, de
povos indígenas, de quilombolas, de ribeirinhos,
de quebradeiras de coco abaçu, ambientalistas,
de assessoria técnica, pesquisa e direitos
humanos. Nos últimos dez anos, enquanto os
grandes projetos de infra-estrutura continuavam
o padrão predatório, centenas de iniciativas
comunitárias criavam um novo modelo de desenvolvimento
amazônico baseado no manejo sustentável
de recursos naturais e na gestão participativa
de políticas públicas. Em alguns casos,
esse modelo foi assumido por diversos setores públicos,
criando novas maneiras de pensar e agir em conjunto
com a floresta e suas comunidades. No entanto todo
esse processo não está sendo levado
em consideração por muitos dos atuais
dirigentes federais, estaduais e municipais e isso
tem gerado o crescimento da violência no campo,
a partir das ações de quadrilhas organizadas
de invasores de terras públicas. A ausência
do Estado e a impunidade têm proporcionado
o desmatamento ilegal, a expulsão de comunidades,
a morte de lideranças indígenas tradicionais
e de agricultores familiares, a invasão de
áreas já protegidas por lei e o incentivo
ao latifúndio, com o favorecimento de grupos
que depredam a Amazônia. Ressaltamos o empenho
lúcido de setores como é caso exemplar
da ministra Marina Silva. Diante dessa situação,
a Rede GTA denuncia a inviabilidade de um modelo
embasado apenas na proteção de algumas
áreas com a devastação do restante
do território amazônico. E reafirma
a necessidade do desenvolvimento justo e sustentável
como eixo para as políticas públicas
em todos os níveis, exigindo ações
imediatas em defesa das comunidades da floresta
e de suas lideranças, principalmente no que
se refere a: 1. Implementação de grandes
projetos de infra-estrutura na Amazônia que
estimulem o latifúndio, a expulsão
de comunidades, a perda da biodiversidade, a especulação
de terras. Como são exemplos preocupantes
os projetos dos gasodutos Urucu-Coari, Urucu-Porto
Velho e Urucu-Manaus, as hidrovias nos rios Madeira
e Araguaia-Tocantins, as barragens hidroelétricas
do Complexo Madeira, de Belo Monte e dos rios Araguaia
e Tocantins. As rodovias como a Cuiabá-Santarém,
Manaus-Porto Velho, Rio Branco-Cruzeiro Sul. Diante
desses riscos, a Rede GTA propõe uma moratória
a grandes projetos propostos pelo governo até
a realização e apresentação
de estudos de impacto ambiental e social qualificado
com a participação do Ministério
Público Federal e da sociedade civil organizada.
2. A falta de ordenamento fundiário efetivo
tem contribuído para o aumento de conflitos
e violência no campo. Isso envolve atentados
e ameaças a funcionários públicos,
principalmente do Ministério do Meio Ambiente,
do Ministério do Desenvolvimento Agrário
e da Fundação Nacional do Índio.
O recente caso ocorrido com a diretora do Fundo
Nacional de Meio Ambiente, Raimunda Monteiro, em
Guarantã do Norte (MT), apenas expõe
com mais veemência uma situação
que já acumula mortes de muitas lideranças
comunitárias. Em face disso, a Rede GTA reivindica
do governo federal um processo aberto, participativo
e mais efetivo na criação e implementação
de unidades de conservação e dos assentamentos.
Esperamos não repetir o modo pouco participativo
de criação do Parque Nacional do Tumucumaque
e também que o Incra não promova assentamentos
no entorno de áreas protegidas. Reivindicamos
ainda a realização e o cumprimento
do zoneamento socioeconômico e ecológico
para todos os estados da Amazônia. 3. Estruturação
institucional do governo federal, do ponto de vista
das comunidades da floresta, ainda desarticulada
e tendendo a repetir erros de governos passados.
Uma evidência desse alerta é a contradição
entre políticas propostas no Plano Plurianual
2004-2007 e o Plano Amazônia Sustentável,
ainda em discussão. Também os riscos
da reedição da Superintendência
de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e o
sucateamento de organismos como Incra, Ibama e Funai.
Neste aspecto, a Rede GTA propõe: - definição
da política indigenista que oriente a reestruturação
da Funai, com abertura de concurso público,
qualificação de recursos humanos e
orçamento compatível; - a criação
de uma diretoria no Ibama e na Polícia Federal,
especializadas nas relações com as
populações tradicionais, com recursos
humanos, equipamentos e orçamentos próprios;
- o cancelamento, por parte do Incra, dos protocolos
prévios de grandes áreas, onde o desmatamento
começa antes de quaisquer autorizações
ambientais ou de posse regularizada; - a integração
dos ministérios, para que trabalhem de forma
cooperativa e não conflitiva, consolidando
uma política federal unificada para a Amazônia;
- a revisão do Plano Plurianual, com garantias
de participação da sociedade civil
em todo o processo; - a garantia de diálogo
permanente entre governos federal, estaduais e municipais
e a sociedade civil organizada, para formulação
e realização dos programas e ações
governamentais. - o reconhecimento do Plano Amazônia
Sustentável como norteador do Plano Plurianual
para a região. 4. Expansão de atividades
econômicas impactantes, centradas na mineração,
na exploração madeireira, expansão
pecuária, do monocultivo da soja e florestamento,
que tem aumentado drasticamente as taxas de desmatamento,
os conflitos sociais e a concentração
de renda nas áreas onde são implementadas.
Não existe política de controle dessas
atividades, comprovadamente predatórias,
inviabilizando a implementação de
modelos sustentáveis baseados nas experiências
locais. Diante disso, a Rede GTA propõe que
o governo federal adote medidas reguladoras destas
atividades predatórias, impedindo a expansão
indiscriminada e irregular dessas atividades, que
trazem sérios prejuízos ambientais
e exclusão social. 5. Empréstimos
internacionais, tomados por governos que desconsideram
processos participativos e experiências locais,
também têm gerado impactos negativos.
Constatando isso, a Rede GTA propõe a suspensão
de financiamentos a estados cujos governos promovam
o desrespeito ao meio ambiente e suas comunidades
ou incentivem a invasão de terras indígenas
e unidades de conservação.
Ações
emergenciais
Criação
imediata de força-tarefa para resolver conflitos
fundiários e investigação dos
Planos de Manejo Florestal nas regiões do
Baixo Amazonas, Sudeste, Sul e Oeste do Pará,
Norte do Mato Grosso e Rondônia. Garantia
imediata de integridade física e territorial
para o povo indígena Cinta-Larga, de modo
a impedir novo genocídio em curso. Acionar
o Painel de Inspeção do Banco Mundial
sobre a situação das unidades de conservação
de Rondônia criadas com empréstimos
da instituição. Proteção
dos conhecimentos das populações tradicionais
e indígenas, em suas áreas de existência
e em políticas adequadas de etnodesenvolvimento,
para combater a biopirataria. Homologação
imediata da terra indígena Raposa Serra do
Sol (RR) e registro cartorial da terra indígena
Uru-Eu-Wau-Wau na área litigiosa do Burareiro
(RO). Regularização de critérios
participativos para a concessão de rádios
comunitárias, como um meio efetivamente amplo
de comunicação para comunidades amazônicas.
Implantação imediata do Programa de
Desenvolvimento Socioambiental da Produção
Familiar Rural (Proambiente), para toda a Amazônia.
Imediata implementação de processo
participativo para criação das unidades
de conservação em Guarantã
do Norte (MT). Definição de política
para a pesca artesanal, incorporando a contribuição
das comunidades. Apoiar financeira e tecnicamente
as redes de produção sustentável
na área de pesquisa de produtos, mercados,
comercialização e certificação.
Imediata recuperação da Transamazônica.
Brasília,
10 de outubro de 2003.
Fonte: ISA – Instituto Socioambiental
(www.socioambiental.org.br)
Assessoria de imprensa (Cristiane Fontes)