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ENTREVISTA: NILO D’AVILA, COORDENADOR DA DEMARCAÇÃO DOS DENI

Panorama Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Setembro de 2003

Coordenador da demarcação dos Deni afirma que se todas as Terras Indígenas fossem demarcadas, 20% da Amazônia brasileira teria proteção

Desde 1999, Nilo D’Avila faz parte do time do Greenpeace que luta pela proteção da Amazônia. Há mais de quatro anos, coordena o projeto de apoio à demarcação da Terra Indígena (TI) Deni – trabalho desenvolvido em
conjunto com o Cimi (Conselho Indígena Missionário) e a Opan (Operação Amazônia Nativa). Em agosto, concluída a demarcação, os Deni realizaram uma cerimônia para comemorara a proteção de seu território.
A terra Deni compreende uma área de 1.530 milhão de hectares no sudoeste do estado do Amazonas, a cerca de 8 a 10 dias de barco de Manaus. Os Deni definem como seu habitat tradicional uma área situada entre os rios Purus e Juruá, ambos afluentes do Solimões. Vivem em oito aldeias próximas às margens dos rios Cuniuá (afluente do Purus) e Xeruã (afluente do Juruá), em uma região coberta por uma floresta densa, rica em espécies como muiratinga, copaíba, jacarandá, pau-rosa, cedor, jatobá, samaúma e virola. O Greenpeace apóia a demarcação de todas as Terras Indígenas brasileiras.
“Se todas estivessem demarcadas, cerca de 20% da Amazônia brasileira teria algum tipo de proteção legal.
No entanto, aproximadamente metade delas ainda não passou por todo o trâmite burocrático para ser reconhecida como Terra Indígena pelo Estado. Sem essa garantia de proteção, povos e culturas indígenas continuam ameaçadas”, afirma D’Avila.
O objetivo do Greenpeace na Amazônia, assim como em outras áreas de Florestas Antigas do planeta, é promover o uso ecologicamente sustentável e socialmente responsável da terra, incluindo redes de áreas protegidas. O zoneamento ecológico e econômico deve ser baseado na doação do planejamento participativo para o uso da terra. As florestas Antigas são as últimas matas do mundo que sofreram pouco ou nenhum impacto das ações humanas, e guardam dois terços das espécies de plantas e animais terrestres do planeta.

Os Deni

Família lingüistica: Arawa
População Total: 736 pessoas (Censo 2001/IBGE), distribuídos em 116 residências em oito aldeias nos rios Cuiuá e Xeruã, afluentes dos rios Purus e Juruá respectivamente. Em 1953, o povo Deni era estimado em 1.000 pessoas. Desde então, esse número sofreu uma redução de 25%.
Área a ser demarcada: 1,530 milhão de hectares.
Localização: Sudoeste do Amazonas, municípios de Tapauá e Itamarati.
Dieta: peixes e outros animais, como porco-do-mato, galinhas e patos domésticos; cultura de mandioca, batata, cará, banana e mamão; e coleta de frutas, como açaí e patuá (Palmito).
Artefatos: O artesanato não é uma atividade econômica para os Deni, mas eles fabricam colares, redes, cestos, pulseiras, anéis e esculturas em madeira, brinquedos, arcos e flechas, e outros itens para seu próprio uso ou para comércio limitado.
Economia: A extração do óleo de copaíba é sua principal atividade comercial. O “regatão” (o barqueiro) que vende sal, combustível e outros produtos importados para os Deni) para R$ 1,50 por litro de óleo de copaíba, enquanto em Manaus ele é vendido por mais de R$ 8. O óleo de copaíba é usado pelas indústrias de cosméticos, pintura e farmacêuticas.
Medicina Tradicional: Coleta de muitas espécies de plantas e uso de veneno para pescar e caçar, além do látex para aliviar dores e curar doenças. Também é comum o uso do rapé, alucinógeno suave feito de folhas de tabaco e do pó do tronco da árvore pupui.

Como o Greenpeace se envolveu com a demarcação da Terra Indígena Deni?
Em 1999, descobrimos que a WTK, madeireira da Malásia, havia adquirido terras sobrepostas ao território Deni. Por causa do envolvimento da WTK na destruição de florestas em outras partes do mundo, resolvemos investigar. Foi quando fizemos o primeiro contato com os índios Deni e contamos que parte de suas terras haviam sido vendidas para uma madeireira.
Eles ficaram assustadíssimos e pediram nossa ajuda para proteger seu território. Entramos em contato com o Cimi e a Opan para formular um projeto que capitasse os próprios Deni a reconhecer os limites tradicionais de sua terra. Durante seis meses, entre 2000 e 2001, uma equipe multidisciplinar – com antropólogo, especialista em assuntos indígenas, sociólogo e engenheiro agrônomo – trabalhou diretamente com líderes de todas as oito aldeias Deni, ensinando-os a manusear instrumentos de medição. Eles adquiriram uma idéia clara das fronteiras de sua terra e estavam prontos para assumir a demarcação de seu território.
Em setembro de 2001, iniciaram a autodemarcação, com a ajuda de um time de especialistas brasileiros e de voluntários do Greenpeace. Um mês depois, o então Ministro da Justiça, José Gregori, assinou a Portaria Demarcatória, garantindo reconhecimento constitucional dos direitos Deni sobre sua terra. Depois de mais de quatro anos de trabalho e persistência para vencer a burocracia, o caso Deni se transformou em um exemplo claro de que é possível reverter a tendência de destruição do patrimônio natural por meio do trabalho com as comunidades tradicionais e do cumprimento da legislação.

O que aconteceu com a WTK?
Em 2000, fizemos uma forte campanha junto ao mercado consumidor da WTK. Partimos para ações diretas em três países, denunciando os riscos que um projeto como o da WTK representava para os povos, indígenas da

Amazônia. O mercado inglês, principal consumidor de madeira amazônica da empresa, cancelou uma série de contratos de compra de compensados, e a WTK declarou publicamente que não iria explorar a área sobreposta ao território Deni. Até hoje, a companhia não conseguiu provar a posse legal das terras, e sua subsidiária em Manaus, a Amaplac, permanece fechada.

Quantos povos indígenas existem hoje na Amazônia?
Os dados mais recentes, de 2000, indicam que aproximadamente 350 mil índios de pelo menos 217 etnias diferentes no Brasil. Desse total, 113.391 vivem no Estado do Amazonas. No entanto, estes números não são definitivos. Segundo o ISA (Instituto Socioambiental), por exemplo, há pelo menos 53 referências a povos indígenas “isolados”, que não constam das listas oficiais porque ainda não foram contratados pela Funai.

 

Por que a demarcação é tão importante para os povos indígenas?
A demarcação de Tis é um mero reconhecimento do governo federal do que é, foi e sempre será domínio dos índios. Também é um instrumento legal para ser usado pelas populações indígenas para proteger seu território. Só na Constituição Federal de 1988, o direito de ser a permanecer indígena foi reconhecido. A carta Magna assegurou aos povos indígenas o respeito a sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e reconheceu seu direito sobre as terras que tradicionalmente ocupam.

Qual é o status atual da demarcação das Terras Indígenas (Tis) no país?
A Constituição estabeleceu 1993 como o ano-limite para a demarcação de todas as terras indígenas no Brasil. De acordo com a Funai, apenas metade das Tis brasileiras foi demarcada até 2002, e cerca de 1/5 nem começou o processo.

Como é feita a demarcação?
A demarcação oficial é um processo longo e burocrático. O primeiro passo é enviar um antropólogo para a TI, que é responsável por elaborar um relatório detalhando o uso do território pelos índios, com dados sociológicos e cartográficos. Coma ajuda de geógrafos e engenheiros, a informação sobre o uso da terra é transformada em delimitações cartográficas, que são usadas para desenhar um mapa mais detalhado do território.
O resumo do relatório é publicado no Diário Oficial da União, e um período de 90 dias, conhecido como “contraditório”, é aberto para que pessoas interessadas na questão possam recorrer da proposta e reivindicar compensações por eventuais perdas causada pela demarcação. Depois desse período, a Funai envia o relatório e documentação adicional para o Ministério da Justiça, responsável pela aprovação do projeto para a demarcação física. Uma vez aprovado, a terra estará finalmente pronta para ser demarcada.
Um processo de licitação é aberto pela Funai para escolher a companhia responsável pela demarcação física. Após sua conclusão, o Presidente da República assina um decreto criando oficialmente a Terra Indígena. O decreto registra a terra como propriedade federal com a concessão de uso para os índios.

Depois de demarcada, a terra se torna propriedade dos índios?
Não. Terras Indígenas são bens da União, reconhecidos aos índios a posse permanente e o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes. O Estatuto dos Povos Indígenas – que define as formas de uso dos produtos a serem explorados pelos povos indígenas – tramita na Câmara dos Deputados desde 1994. A proposta regulamenta a exploração dos recursos naturais existentes nas terras indígenas e aborda temas como os direitos de propriedade intelectual, proteção ao meio ambiente e acesso aos recursos genéticos. A não aprovação do Estatuto abriu espaço para complexos debates sobre os direitos indígenas, que supõem a interpretação de leis vigentes e em elaboração. As únicas exceções ao direito de ‘usufruto exclusivo” da terra indígena estão previstas na própria Constituição: o aproveitamento de recursos hídricos e a mineração por terceiros (que devem ser definidos pelo estatuto). Em ambas, as comunidades indígenas devem ser ouvidas, e deve ser assegurada sua participação nos frutos da lavra.

Fonte: Diário de Bordo - Greenpeace (www.greenpeace.org.br)
Assessoria de imprensa

 
 
 
 

 

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