Panorama
 
 
 

SEMINÁRIO SOBRE AMAZÔNIA FAZ RECOMENDAÇÕES
SOBRE PROTEÇÃO DA BIODIVERSIDADE

Panorama Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Setembro de 2003

Seminário sobre Amazônia faz recomendações sobre proteção da biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais
Entre as sugestões, inclusão da descrição do local de origem do recurso genético e, quando for o caso, da comunidade tradicional que transferiu determinado conhecimento e cópia do acordo que regulou o acesso ao recurso ou ao conhecimento entre as exigências ao solicitante de uma patente. Essa deverá ser uma das discussões da 5ª Reunião Interministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), que tem início nesta quarta-feira (10/9).

O seminário Amazônia: Ameaças e Oportunidades. Reage Brasil! foi realizado nos dias 3 e 4/9, na Câmara dos Deputados, que contou com debates sobre biopirataria, interesses e conflitos da cooperação internacional na Amazônia, atividades ilícitas e vigilância nas fronteiras e caminhos para o desenvolvimento da região.
Ao final do evento, os participantes elaboraram um documento com diversas sugestões à proteção da biodiversidade brasileira e aos conhecimentos tradicionais, entregue à Casa Civil da Presidência da República, ao Miinistério das Relações Exteriores, ao Ministério do Meio Ambiente, ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e ao Ministério de Ciência e Tecnologia - leia na íntegra abaixo.
O material solicita que seja aprovado uma legislação de acesso aos recursos genéticos e aos conhecimentos tradicionais associados que leve em consideração as normas consuetudinárias das comunidades tradicionais no que concerne ao uso e exploração desses recursos; que seja criado um banco de dados disponível à Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI) e a escritórios de marcas e patentes de todo o mundo, com denominações comuns brasileiras dadas a frutas, cultivares, bebidas e produtos alimentícios para impedir que se repitam casos como o registro da denominação popular cupuaçu por uma empresa japonesa.
Apresentar subsídios à posição brasileira, país membro da OMC, nas negociações da conferência que ocorre de 10 a 14/9, em Cancun, México, foi o principal foco do documento. Estarão em discussão neste encontro pontos relacionados à agricultura, ao meio ambiente, ao comércio, à propriedade intelectual, entre outros, que somam ao todo 21 temas relacionados à pauta da Rodada de Desenvolvimento de Doha, cujas discussões foram iniciadas em uma reunião realizada em 2001 e deverão ser negociadas até janeiro de 2005.
A questão dos conhecimentos tradicionais é tratada na OMC pelo Acordo sobre Aspectos de Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (TRIPS). Neste sentido, o texto sugere que o Brasil reivindique perante a comunidade internacional a alteração do quadro normativo vigente, para garantir a repartição justa e equitativa dos benefícios advindos da utilização do patrimônio genético e do conhecimento tradicional associado. O TRIPS não inclui entre os critérios para “matéria patenteável” a identificação da fonte do material genético, o conhecimento tradicional usado para obter esse material, a evidência de repartição justa e equitativa e de consentimento prévio informado para a exploração da patente.
O Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) produziu o Dossiê, no qual aborda a estrutura da OMC, a reunião interministerial de Cancun e os principais temas de interesse do Brasil a serem discutidos.

Recomendações do Seminário Amazônia: Ameaças e Oportunidades. Reage Brasil! sobre apropriação dos recursos da biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais associados

O Brasil é um dos países com maior diversidade biológica, uma vez que abriga, pelo menos, de 10% a 20% do número total de espécies do Planeta. Aqui ocorrem mais de 55 mil espécies vegetais, o que corresponde a 22% do total mundial. Possui, por exemplo, a maior riqueza de espécies de palmeiras (390 espécies) e de orquídeas (2.300 espécies). Diversas espécies de plantas de importância econômica mundial são originárias do Brasil. Nossa fauna também é bastante rica: aqui se encontram pelo menos 10% dos anfíbios e mamíferos e 17% das aves do mundo, e mais de 3 mil espécies de peixes de água doce, duas vezes mais que em qualquer outro país. Quanto aos insetos, as estimativas apontam para a existência em nosso território de 5 a 10 milhões de espécies, a maior parte ainda não descrita pela ciência. Talvez nunca se venha a conhecer com absoluta precisão toda a diversidade biológica brasileira encontrada nos biomas terrestres e nas águas continentais e marinhas, tal a sua extensão e complexidade. Essa diversidade biológica possui um imenso valor, seja pela sua utilização direta na alimentação e diversos outros usos econômicos, seja por meio dos benefícios proporcionados pelos ecossistemas na manutenção do clima, na preservação dos recursos hídricos e dos solos etc. Destaca-se, sobretudo, o potencial para a biotecnologia, uma das vertentes do desenvolvimento mundial nos próximos anos. Nas milhares de espécies biológicas que possuímos, encontram-se substâncias químicas com propriedades anestésicas, relaxantes musculares, antialérgicas e antiinflamatórias, e tantas outras. Toda essa riqueza, contudo, não se tem traduzido em bem-estar para o nosso povo. A biodiversidade, bem de valor inquestionável para a indústria e imprescindível para a sobrevivência do homem, não é, na prática, objeto de qualquer contraprestação econômica por parte das grandes corporações, que geram novas tecnologias e bens de comércio a partir dos conhecimentos tradicionais de comunidades locais e de recursos genéticos oriundos de países megadiversos, como o nosso. A bioprospecção e a transferência, de forma ilegal, de recursos vivos e a apropriação de conhecimentos tradicionais pela indústria dos países desenvolvidos, via direitos de propriedade intelectual, caracteriza o fenômeno da biopirataria. Embora o conceito de biopirataria seja de aplicação muito recente, sua prática vem ocorrendo há séculos. Para tentar solucionar este problema, foi assinada, durante a Cúpula da Terra, em 1992, a Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica (CDB). A CDB tem como objetivos centrais a utilização sustentável e a conservação da diversidade biológica, bem como a repartição justa e eqüitativa dos benefícios oriundos da exploração comercial ou não dos recursos biológicos e dos conhecimentos tradicionais associados a esses recursos. A CDB, contrariando os interesses de muitas nações desenvolvidas, reconhece a soberania dos Estados sobre os recursos biológicos localizados dentro de suas fronteiras. A partir de então, a diversidade biológica deixou de ser considerada patrimônio comum da humanidade e passou a ser patrimônio sujeito à soberania dos Estados. Pouco tempo depois, em 1994, durante a Rodada Uruguai do GATT (Acordo Geral de Tarifas e Comércio), foram celebrados inúmeros acordos internacionais sobre comércio, incluindo o Acordo sobre Aspectos de Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (TRIPs). Pela primeira vez na história, a propriedade intelectual foi introduzida na agenda de negociações de uma rodada do GATT, como tema de interesse comercial internacional. Os Estados Unidos, a Europa e o Japão argumentaram que a ausência de proteção da propriedade intelectual nos países em desenvolvimento era uma barreira comercial injusta, e por isso, deveria ser submetida a medidas de represália. Os EUA ainda sustentaram que as matérias protegidas sob as leis de propriedade intelectual deveriam ser definidas sem exclusões, a fim de incluir produtos e processos biotecnológicos. Se na Convenção sobre Diversidade Biológica há alguma margem para se pleitear proteção aos conhecimentos tradicionais de comunidades agrícolas, indígenas, extrativistas e quilombolas, o mesmo não pode ser dito quanto ao TRIPs. Todos os membros da Organização Mundial do Comércio devem adotar legislação de propriedade intelectual, em consonância com o disposto no TRIPs. Especificamente, todos os signatários devem: proporcionar cobertura de patentes para todos os microorganismos; e desenvolver alguma espécie de legislação de propriedade intelectual que inclua as variedades vegetais. Uma vez que o TRIPs ignora completamente as disposições da Convenção sobre Diversidade Biológica relativas a repartição de benefícios (art. 27.3(b)), pode-se sustentar que os dois acordos estão em conflito. Existem contradições muito claras em três áreas dos acordos: seus objetivos, os sistemas legais estabelecidos, e as obrigações jurídicas impostas. Basicamente, a Convenção sobre Diversidade Biológica visa a impedir a biopirataria, enquanto o TRIPs, ao permitir a concessão pura e simples de monopólios comerciais sobre elementos da biodiversidade, fomenta tal prática. O Brasil, como Estado-membro da OMC, aprovou em 1996 e em 1997, respectivamente, sua nova Lei de Propriedade Industrial (Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996), passando a proceder ao patenteamento de microorganismos geneticamente modificados, e a Lei de Cultivares (Lei nº 9.456, de 28 de abril de 1997), protegendo, por meio de certificados de melhorista, as obtenções vegetais da indústria da biotecnologia. No entanto, o órgão responsável pela avaliação e concessão de patentes no País - o Instituto Nacional de Propriedade Industrial - INPI - está completamente desaparelhado para o exercício das suas funções. No campo da regulamentação da proteção dos conhecimentos tradicionais associados e do acesso aos recursos genéticos, todavia, ainda há muito a fazer, uma vez que o assunto é tratado unicamente por Medida Provisória (MP 2.186, de 23 de agosto de 2001). Para evitar que continuem a ocorrer prejuízos à conservação e à exploração sustentável do nosso patrimônio genético e, ao mesmo tempo, para fomentar a manutenção da ciência e tecnologia de nossas comunidades tradicionais indígenas e agrícolas, que, desde tempos imemoriais, vêm curando doenças, alimentando populações e desenvolvendo tecnologias, de forma aberta, apresentamos algumas sugestões que, se plenamente adotadas, podem coibir a biopirataria do nosso patrimônio. No âmbito interno, são necessárias medidas com vistas a: - aprovação de legislação de acesso aos recursos genéticos e aos conhecimentos tradicionais associados, que leve em consideração as normas consuetudinárias das comunidades tradicionais no que concerne ao uso e exploração destes conhecimentos, reconhecendo direito e poder às comunidades sobre seus conhecimentos e terras onde vivem, mantêm e reproduzem tais conhecimentos; - alteração da legislação de proteção à propriedade industrial, de forma a exigir que o solicitante da patente aponte, no descritivo da invenção, o local de origem do recurso genético, a comunidade tradicional que transferiu determinado conhecimento que permeia a invenção, quando for o caso, bem como cópia do acordo que regulou o acesso ao recurso ou conhecimento (consentimento prévio fundamentado) e a repartição de benefícios oriundos do acesso; neste caso, não se criaria um quarto requisito para a concessão da patente (novidade, inventividade e aplicação comercial) - o que infringiria as obrigações do Acordo TRIPs -, mas o monopólio que decorre da patente apenas teria eficácia se o solicitante da patente disponibilizasse tais informações; - criação de um banco de dados, disponível à Organização Mundial da Propriedade Intelectual e aos escritórios de marcas e patentes de todo o mundo, com denominações comuns brasileiras dadas a frutas, cultivares, bebidas e produtos alimentícios, de forma a impedir que casos como o registro da denominação popular "cupuaçu" como marca comercial nos EUA, Europa e Japão se repitam; - formulação e implementação de uma política efetiva de ciência e tecnologia para a Amazônia, dotando a Região dos recursos materiais e humanos necessários para um amplo programa de avaliação e utilização sustentável da biodiversidade amazônica; em particular, instalar e operar o Centro de Biotecnologia da Amazônia; - reaparelhamento do Instituto Nacional de Propriedade Industrial - INPI; - inclusão, no PPA, de programas específicos para a Amazônia, que reflitam uma agenda articulada intersetorialmente sobre o tema. No entanto, para que os resultados esperados sejam, de fato, alcançados, é necessário alterar os acordos internacionais que regulam a propriedade intelectual e, para tanto, deve-se elaborar estratégia semelhante à traçada, com sucesso, para o caso do conflito diplomático Brasil versus EUA no campo dos medicamentos. A primeira e quiçá a melhor oportunidade ocorrerá na próxima semana, por ocasião da Quinta Reunião Ministerial da Organização Mundial do Comércio, onde se continuará a discutir a implementação da Agenda de Doha. Nessa reunião, o Brasil deve manifestar seu repúdio à forma como os direitos de patente vêm sendo utilizados para usurpar outros direitos e reivindicar perante a comunidade internacional a alteração do quadro normativo vigente, de forma a garantir a repartição justa dos benefícios advindos da utilização do patrimônio genético e do conhecimento tradicional associado a esse patrimônio.

Fonte: Instituto Sócioambiental (www.socioambiental.org.br)
Fernando Fedola Vianna

 
 
 
 

 

Universo Ambiental  
 
 
 
 
     
SEJA UM PATROCINADOR
CORPORATIVO
A Agência Ambiental Pick-upau busca parcerias corporativas para ampliar sua rede de atuação e intensificar suas propostas de desenvolvimento sustentável e atividades que promovam a conservação e a preservação dos recursos naturais do planeta.

 
 
 
 
Doe Agora
Destaques
Biblioteca
     
Doar para a Agência Ambiental Pick-upau é uma forma de somar esforços para viabilizar esses projetos de conservação da natureza. A Agência Ambiental Pick-upau é uma organização sem fins lucrativos, que depende de contribuições de pessoas físicas e jurídicas.
Conheça um pouco mais sobre a história da Agência Ambiental Pick-upau por meio da cronologia de matérias e artigos.
O Projeto Outono tem como objetivo promover a educação, a manutenção e a preservação ambiental através da leitura e do conhecimento. Conheça a Biblioteca da Agência Ambiental Pick-upau e saiba como doar.
             
       
 
 
 
 
     
TORNE-SE UM VOLUNTÁRIO
DOE SEU TEMPO
Para doar algumas horas em prol da preservação da natureza, você não precisa, necessariamente, ser um especialista, basta ser solidário e desejar colaborar com a Agência Ambiental Pick-upau e suas atividades.

 
 
 
 
Compromissos
Fale Conosco
Pesquise
     
Conheça o Programa de Compliance e a Governança Institucional da Agência Ambiental Pick-upau sobre políticas de combate à corrupção, igualdade de gênero e racial, direito das mulheres e combate ao assédio no trabalho.
Entre em contato com a Agência Ambiental Pick-upau. Tire suas dúvidas e saiba como você pode apoiar nosso trabalho.
O Portal Pick-upau disponibiliza um banco de informações ambientais com mais de 35 mil páginas de conteúdo online gratuito.
             
       
 
 
 
 
 
Ajude a Organização na conservação ambiental.