Panorama
 
 
 

EM TESE, O ANTEPROJETO DE LEI PARA A CONCESSÃO DE FLORESTAS PÚBLICAS É BOM

Panorama Ambiental
Brasília (DF) – Brasil
Agosto de 2004

20/08/2004 - Mesmo antes de chegar ao Congresso Nacional, a proposta que estabelece regras para a concessão de florestas públicas está gerando uma enorme polêmica. Elaborada pelo Ministério do Meio Ambiente para enfrentar o velho problema da exploração madeireira predatória na Amazônia, concentrada em áreas públicas, suscita dúvidas a respeito da capacidade de controle do governo.
A Amazônia responde por mais de 90% da produção de madeira nativa do país, sendo que cerca de 95% é obtida de forma predatória, segundo um relatório publicado em 2002 pelo Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). A maior parte da atividade madeireira predatória envolve a grilagem de áreas públicas, que correspondem a 75% da região.
Criado pelo governo FHC, o Plano Nacional de Florestas (PNF) previa a exploração econômica de 25 milhões de hectares de florestas públicas na Amazônia pelo setor privado e comunidades locais por meio de concessões. Não saiu do papel.
Entretanto, em maio do ano passado, um dirigente do PNF anunciou que a primeira experiência de concessão florestal seria divulgada em poucas semanas, o que causou indignação da sociedade civil, já que a proposta do governo anterior não havia sido suficientemente discutida e dava ênfase às empresas madeireiras, colocando as populações locais em desvantagem.
O Ministério do Meio Ambiente respondeu rapidamente ao mal-entendido, informando que seria formada uma Comissão Coordenadora do PNF com ampla participação do setor público, setor produtivo e sociedade civil para revisar o plano, assim como o Projeto de Lei do governo anterior sobre o assunto, aperfeiçoado.
A Comissão Coordenadora do PNF foi formada em outubro do ano passado. É composta por representantes de 11 ministérios, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), governos estaduais, comunidade científica, setor produtivo, sociedade civil, comunidades tradicionais, entre outros, para propor e avaliar medidas para o cumprimento dos princípios e diretrizes da política pública para o setor florestal.
No mesmo mês, o Ministério Público questionou planos de manejo autorizados no Pará, que responde por 40% da produção madeireira da Amazônia, com documentação duvidosa ou insuficiente a respeito da posse da terra explorada. Como resposta, o Ibama reforçou as ações de fiscalização na região, o que gerou diversas manifestações contrárias dos madeireiros, como o fechamento de estradas e cárcere privado de funcionários do Ibama, do Exército e da Policia Federal em Medicilância (PA). Como desdobramento, o governo anunciou a elaboração de um projeto de gestão e concessão de uso de florestas públicas, uma tentativa de garantir a soberania do Estado em relação a esse velho e conhecido problema.
Inicialmente, a idéia era regular as concessões florestais para permitir exploração por empresas privadas nas Florestas Nacionais - categoria de Unidade de Conservação (UC) que tem como objetivo justamente o uso múltiplo dos recursos naturais -, federais, estaduais e municipais.
A proposta foi ampliada e atualmente trata não apenas das Florestas Nacionais, mas de todas as florestas localizadas em áreas públicas, com exceção, obviamente, das UCs de proteção integral, Reservas Extrativistas, Reservas de Desenvolvimento Sustentável, Terras Indígenas (TIs) e áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade brasileira, entre as quais as destinadas para a criação de UCs.
A construção do novo anteprojeto estendeu-se de dezembro do ano passado a abril deste ano. Envolveu um processo de consulta enviado para mais 1,2 mil endereços eletrônicos, com o recebimento de 238 propostas; promoção de um seminário internacional sobre gestão de florestas públicas, com a participação de cerca de 250 participantes; e diversas reuniões com a Comissão Coordenadora do PNF e ONGs.
Em discussão na Casa Civil neste momento, a proposta foi apresentada a um público mais amplo como a “privatização” da Amazônia pelo jornal O Globo no início de agosto, reportagem que desencadeou uma enorme polêmica em torno do tema na imprensa.
Direitos das comunidades locais garantidos
Se por um lado o governo ampliou a perspectiva de concessão para outras áreas públicas florestais que não apenas as Flonas, por outro estabeleceu como princípio o “respeito aos direitos das comunidades locais, em especial às culturas tradicionais, ao acesso e aos benefícios derivados do uso e da conservação das florestas públicas”.
De acordo com o projeto, antes de definir as áreas que serão colocadas em licitação para concessão o governo precisa identificar quais são as ocupadas ou utilizadas por comunidades locais e destina-lás à criação de UCs de uso sustentável, como as Reservas Extrativistas ou de Desenvolvimento Sustentável, ou à concessão de uso por meio de projetos de assentamentos florestais ou de desenvolvimento sustentável e agroextrativistas.
Além disso, o anteprojeto prevê também a possibilidade do poder público reconhecer as posses de populações tradicionais em extensão limitada a 300 hectares por família, impedindo, portanto, as concessões dessas áreas. No entanto, não fica claro se o reconhecimento da posse será individual ou como foi recomendado pelas ONGs e movimentos sociais consultados, coletivo.
Outra ponto que visa assegurar os direitos das comunidades locais é a obrigatoriedade de consultas públicas; em dois momentos distintos. Para a aprovação do Plano Anual de Outorga Florestal (PAOF), que deverá indicar as terras com florestas passíveis de serem licitadas, e para a publicação dos editais de licitação para a concessão das áreas a serem exploradas. As comunidades também poderão participar das licitações. Para assegurar que não haja impedimentos para tanto, a participação não é onerosa, ficando o custo do edital restrito aos ganhadores do processo.
O anteprojeto aponta que o PAOF deverá considerar as políticas nacionais de ordenamento territorial, de recursos hídricos e de desenvolvimento regional e o Zoneamento Econômico Ecológico (ZEE), que, ainda que a passos lentos, vem sendo concebido e aprovado por Estados, principalmente na Amazônia, e deve se tornar um importante instrumento de gestão territorial, principalmente em matéria de controle dos desmatamentos, como destacado no Plano de Combate ao Desmatamento na Amazônia, por exemplo.
A proposta prevê ainda a necessidade de uma avaliação socioambiental prévia à inclusão de uma determinada área florestal como área passível de concessão. Trata-se de um estudo que deverá aferir se todas as condições impostas pela lei estão sendo respeitadas e caberá ao órgão ambiental emitir a anuência. Além de estar sujeito à obtenção da autorização para o plano de manejo, a exploração deverá ser periodicamente auditada por uma equipe independente.
Os recursos oriundos das concessões serão repassados a Estados, municípios e 40% destinado a um Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal que, de acordo com o anteprojeto, deverá priorizar o desenvolvimento de atividades sustentáveis de base florestal no país.

Experiências piloto

A inexistência de experiências de concessão florestal que possam constituir um paradigma positivo para a região é outro alvo de preocupações. É preciso instituir iniciativas piloto que possam ser monitoradas e aperfeiçoadas antes de ampliar a implementação do modelo em todo o país. Neste sentido, a proposta do governo estabelece, em seu artigo 79, que o primeiro PAOF deve ser realizado em caráter experimental. Além disso, em dez anos da publicação da lei só poderão estar sob regime de concessão 20% do total de florestas públicas identificadas como disponíveis para tal, excetuando-se as unidades de manejo localizadas em Florestas Nacionais.
Outro alvo de questionamento é a previsão da criação do Serviço Florestal Brasileiro, autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente que terá por missão o fomento à atividade florestal sustentável que agrega pesquisa, estudos, regulação das concessões, celebração e monitoramento dos contratos, entre outros. Embora nos pareça pertinente separar as responsabilidades de desenvolvimento florestal, pesquisa, licitação e controle de concessões florestais das ações de fiscalização, regulação e licenciamento ambiental, é preocupante a criação de novas autarquias pelo governo sem definir como ficam as atribuições dos órgãos já existentes.
Em relação às TIs, onde freqüentemente há exploração irregular, seria fundamental que o projeto incluísse mecanismos concretos para a proteção seus entornos, a exemplo das zonas de amortecimentos previstas no Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC).

Estado tem capacidade de controle?

Se por um lado muitos pesquisadores e ambientalistas acham que a concessão de áreas para o manejo florestal é uma alternativa importante para desenvolver algumas regiões da Amazônia de forma sustentável, freando tanto a exploração predatória quanto a grilagem de terras, por outro, a capacidade de controle do Estado sobre essas áreas é motivo de desconfiança.
Infelizmente, os últimos governos demonstraram que o Estado não foi eficiente em garantir algo muito mais simples: as Reservas Legais, parte de uma propriedade rural que deve obrigatoriamente ser destinada à conservação dos recursos naturais, previstas no Código Florestal. E o atual não tem demonstrado eficácia na implementação do Plano de Combate ao Desmatamento na Amazônia, lançado em março. Nenhum relatório oficial sobre o andamento do plano foi lançado até o momento, e os boatos em Brasília, infelizmente, são de que o desmatamento entre agosto de 2003 e 2004 na região foi tão alto quanto o ano anterior.
O próprio governo reconhece que uma premissa básica para o sucesso da iniciativa é a fiscalização da exploração ilegal de madeira, uma vez que a existência de madeira ilegal no mercado desestabiliza os preços e inviabiliza a exploração sustentável. Sem o controle público, a concorrência com aqueles que trabalham com madeira oriunda de desmatamento ilegal é desleal. A concorrência desleal também se estende às madeireiras que trabalham com desmatamento “legalizado”, derivado dos 20% que podem ser objeto de corte raso em propriedades privadas da Amazônia e que, portanto, têm um custo muito mais baixo de extração.
O anteprojeto de lei, ainda que mereça ajustes, é bom. Para os movimentos sociais da Amazônia, a “privatização” da floresta já existe à margem da lei, com o avanço da grilagem sobre as terras públicas, e a perspectiva de se estabelecer uma legislação que se contraponha aos estímulos já existentes para a conversão florestal e institua uma política coerente para o setor florestal na região é positiva.

Fonte: ISA - Instituto Socioambiental (www.socioambiental.org.br)
Assessoria de imprensa

 
 
 
 

 

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