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LIBERAÇÃO
DE TRANSGÊNICOS CONSOLIDA TENDÊNCIA
CONSERVADORA DO CONGRESSO E DO GOVERNO
Panorama
Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Março de 2005
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08/03/2005 Aprovação
do PL da Biossegurança e a composição
das comissões parlamentares permanentes são
exemplos do espaço aberto para grupos e políticos
conservadores a partir da eleição
de Severino Cavalcanti para presidente da Câmara.
Não apenas os ambientalistas dentro e fora
do governo, mas todo o movimento social parece ter
sofrido uma derrota no Congresso Nacional muito
maior e mais séria do que faria supor a liberação
do uso e do comércio de transgênicos
decidida, no último dia 2 de março,
com a aprovação do Projeto de Lei
(PL) da Biossegurança. A definição
da composição das comissões
parlamentares permanentes, no mesmo dia, consolidou
a inclinação conservadora do Parlamento.
Presente desde o início das alianças
firmadas pelo governo Lula, a tendência havia
ganhado fôlego ainda maior com a eleição,
algumas semanas antes, do deputado Severino Cavalcanti
(PP-PE) para a presidência da Câmara.
A aprovação do PL de Biossegurança
foi conquistada sob orientação do
governo, que acatou o poderoso lobby da bancada
ruralista e das grandes empresas transnacionais
de biotecnologia. Por outro lado, um parlamentar
acusado de corrupção e figuras políticas
associadas historicamente à luta contra a
defesa do meio ambiente, os direitos indígenas
e a reforma agrária conquistaram as presidências
em comissões temáticas estratégicas,
sobretudo na Câmara dos Deputados. Ambos os
processos podem ser associados ao que já
está sendo chamado na imprensa, fazendo referência
à ascensão de Cavalcanti, de “efeito
Severino”. A eleição do deputado pernambucano
fragilizou a posição do governo na
Câmara e abriu mais espaço para grupos
e parlamentares identificados com o conservadorismo.
As propostas defendidas pela ministra do Meio Ambiente,
Marina Silva, mais uma vez, foram desconsideradas
pelo governo em favor de outras pastas, principalmente
da Agricultura (MAPA), da Ciência e Tecnologia
(MCT) e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
(MDIC). O sucesso do grupo ministerial foi possível
depois de o Palácio do Planalto ter sinalizado,
no ano passado, que atenderia à reivindicação
de Marina de rejeitar a proposta de PL que voltara
do Senado retirando poderes do MMA. O projeto aprovado
agora transfere o controle sobre o uso e o plantio
dos transgênicos à Comissão
Técnica Nacional de Biossegurança
(CTNBio), órgão subordinado ao MCT
e que poderá, inclusive, dispensar a realização
do Estudo de Impacto Ambiental nos casos que julgar
conveniente.
Completando o retrato do conservadorismo, o deputado
Jader Barbalho (PMDB-PA), que renunciou à
presidência do Senado e ao próprio
mandato em virtude de denúncias de corrupção
em 2001, assumiu a presidência da Comissão
de Ciência e Tecnologia da Câmara. Já
o deputado Ronaldo Caiado (PFL-GO), líder
ruralista e fundador da UDR (União Democrática
Ruralista), foi eleito para presidir a Comissão
de Agricultura.
A Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável será chefiada, a partir
de agora, pelo deputado Luciano Castro (PL-RR),
enquanto que a Comissão da Amazônia,
Integração Nacional e Desenvolvimento
Regional será comandada pela deputada Maria
Helena (PPS-RR). À frente da Comissão
de Minas e Energia, ficará o deputado Nícias
Ribeiro (PSDB-PA). No Senado, a Comissão
de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor, Fiscalização
e Controle será coordenada pelo senador Leomar
Quintanilha (PMDB-TO).
Líderes
atuam para aprovar projeto
Apesar da bancada
do PT ter sido liberada na decisão sobre
o PL da Biossegurança com a alegação
de que se tratava de questão de foro íntimo,
o governo agiu deliberadamente para aprovar o projeto
e sequer apoiou os destaques propostos por deputados
do próprio PT atendendo as reivindicações
do MMA. O substitutivo aprovado no Senado, em outubro
de 2004, já fora negociado diretamente pelo
líder governista, senador Aloísio
Mercadante (PT-SP). Também os líderes
do governo e do PT, na Câmara, Professor Luizinho
(PT-SP) e Paulo Rocha (PA), defenderam abertamente
a aprovação do texto sem alterações.
“Foi uma vitória completa. Hoje nós
enlouquecemos a área conservadora e medieval
do governo”, ironizou o relator do texto, deputado
Darcísio Perondi (PMDB-RS), referindo-se
ao grupo de Marina Silva.
Apesar disso, houve uma rebelião na base
aliada. Dos 60 deputados que votaram contra a proposta,
27 eram do PT e seis do PC do B. Em relação
ao ponto mais importante do PL, a regulamentação
das atribuições da CTNBio, grande
parte dos parlamentares insistiram em apoiar a ministra
do Meio Ambiente – dos 82 deputados petistas presentes
à votação, 46 votaram contra
o projeto. Dos 6 deputados do PC do B que estavam
na sessão, cinco votaram contra.
Um dia depois, o MMA divulgou uma nota criticando
a aprovação do PL. O texto afirma
que a proposta cria “sério desequilíbrio
no processo de tomada de decisão a respeito
dos OGMs [Organismos Geneticamente Modificados],
em prejuízo das precauções
necessárias para lidar com tecnologias cujas
conseqüências nos ecossistemas brasileiros
ainda não estão devidamente identificadas”
(confira íntegra do texto, clicando aqui).
Integrantes do governo ouvidos pela imprensa desautorizaram
a nota, mas afirmaram que Marina continuaria a receber
a confiança do presidente Lula.
“É óbvio que a ministra mereça
a confiança do presidente, afinal, trata-se
de uma de suas aliadas mais fiéis, coerentes
e dignas. O que é preciso dizer é
que é o presidente que cada vez mais deixa
de merecer a confiança de grupos da sociedade
civil que contribuíram para que ele chegasse
à presidência”, avalia Adriana Ramos,
coordenadora do Programa de Política e Direito
Socioambiental (PPDS) do ISA.
Saiba quem
são os parlamentares que assumiram postos-chave
no Congresso
Severino Cavalcanti
(PP-PE), Presidência da Câmara – Tem
mandatos consecutivos há mais 40 anos, quando
iniciou sua carreira na União Democrática
Nacional (UDN). Depois militou na Aliança
Renovadora Nacional (Arena) e no seu sucessor, o
Partido Democrático Social (PDS), as duas
agremiações que deram sustentação
à Ditadura Militar instalada em 1964. De
lá para cá, trocou de partido seis
vezes, tendo integrado também o PDC, o PL
e o PFL. Cavalcanti é conhecido por suas
posições conservadoras em relação
a temas como o aborto e o homossexualismo.
Jáder Barbalho
(PMDB-PA)/presidência da Comissão de
Ciência e Tecnologia – Teria chegado à
presidência da Comissão por um acordo
feito entre a ala oposicionista e a ala governista
do PMDB. O deputado é considerado como pertencente
a esta última. Em 2001, foi obrigado a renunciar,
primeiro, da presidência do Senado, e, depois,
do próprio mandato de senador para não
ser cassado. À época, o parlamentar
foi acusado de desviar dinheiro da antiga Superintendência
do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). Um
processo ainda corre no STF sobre o caso.
Ronaldo Caiado (PFL-GO)/presidência
da Comissão de Agricultura – É médico,
professor e produtor rural. Em 1989, ganhou visibilidade
nacional quando concorreu à Presidência
da República pelo PSD. Este é seu
terceiro mandato. Ano passado, foi o relator da
Reforma Política na comissão especial
criada na Câmara. Presidente do PFL de Goiás,
combate de forma contundente as invasões
de terra e é reconhecido como uma das maiores
lideranças ruralistas do País. Foi
fundador e presidente nacional da União Democrática
Ruralista (UDR).
Luciano Castro (PL-RR)/presidência
daComissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável – Economista e administrador,
está em seu 4º mandato federal. Político
experiente, foi secretário de Planejamento
de Boa Vista (RR). Já pertenceu a cinco partidos
diferentes: antes do PL, integrou o PFL, o PPR,
o PPB e o PSDB. Castro foi aceito como “terceiro
interessado” na Ação Popular proposta
por fazendeiros de Roraima e acatada em pedido de
liminar contra a homologação em área
contínua da Terra Indígena Raposa-Serra
do Sol. A decisão judicial foi uma das primeiras
a paralisar o processo de homologação
da TI, que ainda não foi concluído.
Maria Helena (PPS-RR)/presidência
da Comissão da Amazônia, Integração
Nacional e Desenvolvimento Regional – Advogada,
está em seu primeiro mandato. Já foi
chefe de gabinete, procuradora-geral e secretária
de Trabalho da Prefeitura de Boa Vista. Foi uma
das patrocinadoras da Ação Popular
que paralisou a homologação da TI
Raposa-Serra do Sol. A deputada faz parte do grupo
político do senador
Mozarildo Cavalcanti
(PPS-RR), uma das principais lideranças antiindígenas
do Congresso. Em artigo publicado recentemente,
ela afirma que, “no Brasil, por enquanto, a política
tem sido de criação de infinitas reservas
indígenas e unidades de conservação.
Todas com o viés do imobilismo e do esvaziamento”.
Nícias Ribeiro
(PSDB-PA)/presidência da Comissão de
Minas e Energia – Está em seu quarto mandato
federal. Foi vereador de Belém e três
vezes deputado estadual. É autor de uma Proposta
de Emenda Constitucional (PEC) que delega ao Congresso
Nacional a atribuição de autorizar
a demarcação de Terras Indígenas.
Como vários outros, o projeto pretende, na
prática, dificultar a criação
de novas TIs.
Leomar Quintanilha
(PMDB-TO)/presidência da Comissão de
Meio Ambiente, Defesa do Consumidor, Fiscalização
e Controle do Senado - Bancário e fazendeiro,
está em seu segundo mandato. Ex-presidente
municipal da Arena e presidente regional do PDC,
foi secretário de Estado da Educação
e Cultura (1989-90), deputado federal (1989-90 e
1991-1995) e secretário estadual da Indústria,
Comércio e Turismo (1996). Aliado do ex-governador
Siqueira Campos, admite que sua maior responsabilidade
é buscar apoio político e financeiro
para ajudar o governo estadual do Tocantins.
Fonte: ISA – Instituto Socioambiental
(www.socioambiental.org.br)
Assessoria de imprensa (Oswaldo Braga de Souza)