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ESTUDOS AVALIAM AS AGROBACIAS
AMAZÔNICAS
Panorama
Ambiental
Brasília (DF) – Brasil
Junho de 2005
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Estudos realizados
por pesquisadores de diferentes instituições
demonstram que os rios amazônicos, embora
gigantescos em todos os sentidos, correm perigo.
Diversas ameaças rondam os incontáveis
cursos d’água tão presentes e essenciais
à vida na região. Nascentes sem matas
ciliares, represamentos para servir humanos e animais,
lavagem de utensílios domésticos ou
mesmo os utilizados na aplicação de
agrotóxicos e as quase sempre formas ambientalmente
danosas de uso da terra estão desenhando
um cenário preocupante. Novos tietês
podem estar surgindo silenciosamente em plena Amazônia.
O que os resultados começam a comprovar cientificamente,
os amazônidas mais antigos já previam.
Embora ainda haja muito a ser feito, o projeto Agrobacias
Amazônicas ou “Estudos das bacias hidrográficas
sob sistemas de produção agropecuária
convencional e conservacionista na Amazônia:
hidrologia, fluxos de nutrientes e carbono, e potencial
de contaminação por agrotóxicos”
já tem indicativos que comprovam, por exemplo,
que há igarapés, no município
de Paragominas que foram interrompidos, represados
e lutam para sobreviver, outros apresentaram, nos
últimos meses, zero de Oxigênio e há
ainda os que estão com as nascentes sob ameaça
com a retirada da mata ciliar que as protege. Uma
prática que atinge as nascentes e os cursos
d’água em toda a sua extensão, deixando-os
ainda mais desprotegidos.
A floresta é o parâmetro de avaliação.
E as diferenças do que acontece com a água
nesses dois ambientes - o que o homem já
alterou e o que ainda está preservado - já
são constatadas, com maior evidência
na absorção da água da chuva
pelo solo.
Em áreas de
floresta ela é completa e as gotas da chuva
penetram facilmente no solo. Já nas áreas
intensivamente exploradas, principalmente pela pecuária,
com a retirada da mata e pisoteio intensivo do gado,
o solo perde o poder de absorver e a água
penetra no solo com muita dificuldade.
Mas é preciso
continuar monitorando a água como vem acontecendo
nos municípios de Paragominas e Igarapé-Açu.
Em Paragominas, os estudos avaliam as bacias de
três igarapés, todos desaguando no
rio Uraim, o mais importante do município.
Os pesquisadores
realizam coletas mensais e quinzenais da água
em diferentes situações e locais.
Água das nascentes, água em áreas
de pastagem, de agricultura, tanto de modelos familiares
como empresariais e de capoeiras de diferentes idades.
A agricultura pode
ser a tradicional com derruba-e-queima da vegetação
ou áreas em que a vegetação
é cortada, triturada e deixada como cobertura
dos solos ou ainda através do sistema de
plantio direto sem uso de equipamentos do tipo arado
e grade.
Uma pesquisa abrangente,
que exige grandes investimentos, muita dedicação
e acompanhamento contínuo e a certeza que
a água, superficial ou subterrânea,
pode retratar fielmente o que está acontecendo
com determinado ecossistema. Um parâmetro
fundamental para nortear os procedimentos futuros
dos que vivem ou só exploram a Amazônia.
A avaliação
concentra-se nos efeitos da implantação
das atividades agropecuárias e sua repercussão
na ciclagem de nutrientes e de carbono e na quantidade
e qualidade dos recursos hídricos. Embora
os estudos atuais, com esta formatação
tenham apenas três anos, os próprios
pesquisadores já deixam transparecer o receio
do que encontrarão à medida que a
pesquisa evoluir. Já sabem, por exemplo,
que na época de cultivo há um significativo
aumento da concentração de nitrato
na água.
Um dado preocupante
pelas conseqüências danosas ao meio ambiente,
ao homem, que este nutriente pode causar. Concentrações
acima de 45 miligrama de nitrato por litro de água
de nitrato pode causar, por exemplo, metahemoglobinemia
e câncer gástrico.
Outra informação
igualmente relevante refere-se ao pH da água.
Quanto mais próximo do local onde há
agricultura mais alto ele é. Quanto mais
próximo das áreas de floresta mais
baixo ele se apresenta. As alterações
no pH ocasionam problemas para os microrganismos
aquáticos que são a base da cadeia
alimentar e conseqüentemente prejudicam a sobrevivência
dos peixes, os consumidores desta microbiota.
Ricardo de Oliveira
Figueiredo, pesquisador da Embrapa Amazônia
Oriental (Belem-PA) Unidade da Empresa Brasileira
de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), vinculada
ao Ministério da Agricultura, Pecuária
e Abastecimento e coordenador do “Agrobacias Amazônicas”,
explica que o trabalho pioneiro que deu origem ao
que está sendo executado, começou
há cerca de seis anos com um projeto de menor
abrangência e que estudou o impacto sobre
a água quando a área de floresta era
substituída para dar lugar ao pasto. Sistema
tradicional em Paragominas de alguns anos atrás.
Hoje a pecuária está cedendo espaço
ao plantio de grãos ou se desenvolvendo concomitantemente.
O projeto atualmente
é bem mais abrangente. Ricardo e dezenas
de outros pesquisadores, bolsistas de pesquisa do
CNPq, e estudantes de gradação, mestrado
e doutorado, ligados a instituições
como as Universidades Federais do Pará (UFPA),
Rural da Amazônia (Ufra), de São Paulo
(USP), Universidades Estaduais do Norte Fluminense
(UENF), do Estado do Pará (UEPA), Instituto
de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam),
Woods Hole Research Center (USA), Universidade da
Georgia (USA) e Universidade de Bonn (Alemanha)
avaliam as águas coletadas em 24 pontos em
Paragominas, nos igarapés do Sete, Cinqüenta-e-Quatro
e Pajeú, e 28 outros pontos em Igarapé-Açu,
na bacia do igarapé Cumaru.
Este exército
de homens e mulheres percorre de carro, a pé
ou de canoa locais de difícil acesso como
as nascentes dos rios, ainda protegidas na vegetação
fechada, e muitas vezes o que encontram são
equipamentos danificados ou mesmo roubados, comprometendo
em parte os resultados. A cada nova visita há
sempre uma constatação de que algo
mudou. Silenciosamente e às vezes drasticamente.
No ponto de coleta
número 2, do igarapé Cinqüenta-e-Quatro,
em Paragominas, a situação já
é antiga, mas nem por isso menos grave. O
curso d’água foi interrompido e em seu lugar
surgiu uma estrada. Dele restou apenas um lago barrento,
um valão, que serve de bebedouro para o gado.
A cerca de 50, 100 metros, a cena é ainda
mais impressionante.
Num esforço
pela sobrevivência, o igarapé resiste
e luta. Aos poucos um filete de água surge,
que aumenta e ressurge mais adiante. Os pesquisadores
sabem, que mesmo ressuscitando, a interferência
humana é irreversivelmente prejudicial àquele
ecossistema. Para os que vivem em Paragominas, as
transformações são evidentes
e o futuro, a prosseguir o mesmo ritmo, assusta.
É o caso de Jorge Vieira, técnico
de campo do IPAM, 36 anos, mineiro, que há
30 vive às proximidades do igarapé
54. “Não tomo mais banho nele. Está
muito poluído. Acho que vai morrer”.
Uma realidade que
o projeto Agrobacias Amazônicas quer melhor
entender e no caso de Paragominas alguns indícios
aumentam a preocupação, quando avaliam-se
os riscos de contaminação dos estoques
de água subterrânea, como lembra o
pesquisador da Embrapa que tem sede em Belém.
“Paragominas é
uma região que geologicamente não
tem água subterrânea em abundância
e reverter a contaminação a sua ainda
é tecnicamente e economicamente inviável”,
assegura Ricardo Figueiredo, com a experiência
acumulada em mais de 20 anos.
Estudar a água
sob diferentes usos da terra e como ela se apresenta
em diversos cenários foram alguns dos critérios
para a seleção dos municípios
de Igarapé-Açu e Paragominas. Eles
têm diferenças profundas e ímpares
desde a forma de ocupação até
aos tipos de solos.
Enquanto em Igarapé-Açu
a predominância é da agricultura familiar,
com a população em sua maioria nativa
do próprio município ou da Amazônia,
em Paragominas a agricultura é tecnificada,
em larga escala e empresarial. Grande parte da população
é de imigrantes, oriundos de Estados fora
da Amazônia.
Ricardo Figueiredo
também cita como um diferencial entre os
dois locais a relação de parceria.
Enquanto em Igarapé-Açu há
um envolvimento mais direto do pequeno produtor
com o projeto, em Paragominas, os grandes proprietários,
em sua maioria, sequer conhecem os pesquisadores.
“Eles apenas permitem que a água seja coletada
e não têm muita noção
do que pretendemos ao estudar os cursos d’água
que passam pelas suas fazendas”, explica o pesquisador.
Os recursos hídricos
têm sido apresentados pelas comunidades científica,
econômica e política nacional e internacional
como recurso natural estratégico para as
sociedades humanas, e precisa receber a atenção
tanto do setor acadêmico como do produtivo
e dos governos“, detalha o pesquisador. Motivos
mais do que justificáveis para que mesmo
diante de tantas adversidades eles prossigam.
Ricardo
Figueiredo finaliza e com muito otimismo diz acreditar
que os estudos podem mesmo servir como recomendações
de técnicas de manejo agrícola e às
políticas públicas. Por exemplo sobre
as que tratam da largura das faixas de matas ciliares.
“Nossos estudos podem revelar que para a Amazônia
há necessidade de uma legislação
diferenciada, específica”, especula o pesquisador.
Fonte: Embrapa (www.embrapa.gov.br)
Assessoria de imprensa (Ruth Rendeiro)