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BARRA GRANDE FECHA COMPORTAS E ESPÉCIE DE BROMÉLIA EM EXTINÇÃO PODE DESAPARECER

Panorama Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Julho de 2005

07/07/2005 - Com a Licença de Operação emitida pelo Ibama, chega ao fim a história de uma das maiores fraudes ambientais já registradas no País. A água da usina vai cobrir um dos últimos remanescentes de floresta de Araucárias existentes no Brasil. A Dyckia distachya, espécie de bromélia endêmica do vale do Rio Pelotas, também corre o risco de sumir do mapa.
Segundo informações de integrantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), a Usina Hidrelétrica de Barra Grande, no vale do Rio Pelotas, na divisa de Santa Catarina e Rio Grande do Sul, fechou suas comportas anteontem, terça-feira, dia 5 de junho, por volta das 13h30. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) concedeu a Licença de Operação (LO) ao empreendimento algumas horas antes. O reservatório da barragem vai destruir alguns dos últimos remanescentes de floresta primária de Araucárias existentes no País e pode cobrir também quatro das últimas populações da Dyckia distachya, uma espécie endêmica de bromélia (que só ocorre na região). Ambas as espécies constam da Lista Oficial de Espécies da Flora Brasileira Ameaçadas de Extinção. Animais raros igualmente ameaçados, em especial algumas aves de rapina, também vivem na região localizada entre os municípios de Anita Garibaldi (SC) e Pinhal da Serra (RS).
Um estudo realizado por pesquisadores do Departamento de Botânica da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em maio, revelou que as últimas três populações da Dyckia distachya restantes no Brasil estão situadas na área que será alagada – alguns dias depois foi encontrado mais um conjunto de plantas em uma área próxima que também ficará submersa. A outra população sobrevivente da espécie se encontra no lado argentino do Rio Uruguai, mas, segundo os cientistas, também corre sérios riscos por conta dos impactos ambientais da usina hidrelétrica de Itá, no lado brasileiro. Existe ainda uma pequena chance de serem identificadas algumas bromélias no município de São Joaquim (SC), mas elas também estão ameaçadas pela construção de uma outra hidrelétrica, a de Paiquerê. Portanto, a planta corre grave risco de desaparecer completamente – e ainda em conseqüência da permissão dada pelo governo para o enchimento do lago de Barra Grande.

A licença concedida na terça-feira tem 76 exigências que teoricamente precisam ser cumpridas sob pena de, em caso contrário, a autorização ser suspensa. “Nunca uma LO teve tantos condicionantes”, afirmou o próprio Carlos Alberto Bezerra de Miranda, presidente da empresa responsável pela obra, a Energética Barra Grande (Baesa), ao site de notícias “O ECO”. Entre as exigências estão o resgate “concomitantemente e imediatamente ao enchimento do reservatório” das flores ameaçadas e o corte das árvores restantes que deverão ficar submersas “no período de enchimento”.

Além disso, a Baesa também deverá adotar uma série de medidas sociais na região como o asfaltamento de estradas, o reassentamento de famílias retiradas da área, a disponibilização de crédito para os pequenos agricultores e comerciantes, investimentos nos serviços de saúde, educação e assistência social nos municípios afetados, entre outros pontos. Uma nota publicada na página da Baesa na Internet afirma que “as ações de compensação ambiental definidas para Barra Grande são as maiores já estabelecidas para um empreendimento do setor elétrico no País”. A empresa diz que está gastando R$ 180 milhões nessas medidas.

Política do fato consumado

O grande número de condicionantes indica que o próprio Ibama reconhece o grande impacto do enchimento do reservatório de Barra Grande sobre os ecossistemas locais. O problema é que, caso a Baesa não cumpra as determinações, o lago já estará cheio e a maior parte dos danos será irreversível. O próprio resgate das bromélias pode ficar comprometido: as flores vivem na beira do rio e no mesmo dia em que as comportas foram fechadas, já no fim da tarde, a água estava a cerca de três metros de seu nível normal, segundo informações do MAB. “De novo, o que estamos vendo é a aplicação da chamada política do fato consumado”, critica Miriam Prochnow, coordenadora-geral da Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA) e presidente da Associação de Preservação do Meio Ambiente do Vale do Rio Itajaí (Apremavi), de Santa Catarina.

Míriam avalia que o caso pode trazer implicações para o Brasil, que deverá sediar, no início de 2006, a Conferência das Partes (COP) VIII sobre a Convenção da Diversidade Biológica (CDB). “Seria muito complicado o governo ter de anunciar nesse fórum a extinção de uma espécie”, alerta. A COP discute, de dois em dois anos, em que pé estão as diversas iniciativas para proteger a biodiversidade em todo mundo.

A coordenadora da RMA achou estranho o fato da LO de Barra Grande ter sido expedida dez dias depois da ministra das Minas e Energia, Dilma Roussef, ter sido conduzida ao cargo de chefe da Casa Civil da Presidência da República. Míriam reclama ainda que, desde o início do ano, está tentando marcar audiências com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e com o presidente do Ibama, Marcus Barros, para discutir o assunto, mas ainda não obteve resposta. A ambientalista informa que a RMA e a Federação das Entidades Ecologistas Catarinenses (FEEC), autoras da primeira ação movida contra a usina, já entraram com um pedido de liminar para tentar paralisar o enchimento da barragem.

A maior fraude ambiental dos últimos anos

O fechamento das comportas da usina de Barra Grande é o último capítulo do maior escândalo ambiental ocorrido no País nos últimos anos. Por conta do caso, a Baesa travou uma intensa batalha judicial com a RMA e a FEEC. A construção da usina foi autorizada com base num Estudo de Impacto Ambiental (EIA-Rima) fraudulento, que omitiu a existência de mais de 4 mil hectares de Mata Atlântica íntegra ou em avançado processo de recuperação, bioma que praticamente não existe mais no País (saiba mais). A Baesa e o próprio governo chegaram a admitir a fraude. No início de abril, o Ibama anunciou a aplicação de uma multa de R$ 10 milhões à Engevix, firma responsável pela elaboração do EIA-Rima.

Mesmo sabendo da fraude e da possibilidade de destruição definitiva de áreas extremamente importantes para a conservação, o governo federal e o Ministério Público Federal (MPF) assinaram com a Baesa, em setembro de 2004, um Termo de Compromisso para, mediante algumas “medidas compensatórias”, autorizar o início do desmatamento da área do reservatório, fase preliminar ao enchimento da represa. Entre outros pontos, a empresa ficou obrigada a criar um banco de sementes de araucárias e de outras árvores raras que seriam derrubadas. Comprometeu-se também a comprar uma área de tamanho equivalente a que será desmatada e inundada para destinar à conservação. Todas condições estabelecidas com a empresa para que a LO pudesse ser emitida.

“Hoje é um dia negro para o Estado de Direito no Brasil. O Ibama, que tem a missão legal de proteger a fauna e a flora, assinou a sentença de morte de uma espécie nativa, validou um processo de licenciamento absolutamente fraudulento e o Poder Judiciário finge que não vê nada disso, pois há mais de dois meses vem adiando o julgamento dos pedidos de suspensão do licenciamento”, lamenta o advogado do ISA Raul Silva Telles do Valle, um dos responsáveis pela ação movida pela RMA e pela FEEC. Ele afirma que os estudos apresentados ao Ibama e ao MMA demonstram que não adianta coletar a bromélia e replantá-la em local diferente do seu habitat original, pois isso já foi feito na construção de outras hidrelétricas da mesma região e ficou comprovado que as plantas deixam de se reproduzir. “Vamos denunciar isso internacionalmente durante a reunião da CDB e o governo brasileiro terá de explicar ao mundo como pode ter autorizado a implantação de um empreendimento desse tipo.”

O diretor de Licenciamento e Qualidade Ambiental do Ibama, Luiz Felippe Kunz Jr., garante que a Dyckia distachya não corre risco de desaparecer por causa da represa e contesta a opinião de que a flor não pode ser replantada. “Estamos seguindo todas as determinações listadas no próprio estudo dos pesquisadores da UFSC. Pretendemos resgatar todos os indivíduos (de bromélias) e inseri-los novamente na beira do lago, na mesma distância em relação à água em que eles estavam originalmente. Existem experiências na região que comprovam que a espécie pode se reproduzir de novo”, assegura. Kuns também diz que ainda há tempo de fazer o resgate das plantas porque muitas delas estão em escarpas rochosas que alcançam até 90 metros de altura e a água do reservatório ainda deve demorar a chegar a este ponto.

A Apremavi está realizando uma campanha em protesto à decisão do Ibama de conceder a LO de Barra Grande. A intenção é lotar as caixas de e-mails do presidente Luís Inácio Lula da Silva, da ministra Marina Silva e da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Roussef.

Fonte: ISA – Instituto Socioambiental (www.socioambiental.org.br)
Assessoria de imprensa (Oswaldo Braga de Souza)

 
 
 
 

 

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