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ALÉM DE CELEBRAÇÃO,
KUARUP É UM ACONTECIMENTO POLÍTICO
Panorama
Ambiental
Alto Xingu (MT) – Brasil
Agosto de 2005
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Além de homenagear
os mortos ilustres do Xingu, o Kuarup também
tem tradicionalmente o papel político de
aproximar comunidades. Com o crescente contato com
os brancos, a cerimônia agora também
se torna espaço para contato com autoridades
brasileiras.
Entre os convidados
do Kuarup que terminou hoje na aldeia Ipatse, dos
Kuikuro, estiveram o presidente da Fundação
Nacional do Índio, Mércio Pereira
Gomes, e o prefeito Edson Harold Wegner, de Gaúcha
do Norte (MT) – um dos municípios vizinhos
ao Parque Indígena do Xingu (a 70 quilômetros
de Ipatse). O ministro Gilberto Gil, da Cultura,
e o governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, também
haviam sido convidados para o evento.
"Kuarup é
um evento ritual e político. E isso hoje
inclui também relações políticas
com a sociedade nacional", explica o antropólogo
Carlos Fausto, do Museu Nacional da Universidade
Federal do Rio de Janeiro. Ele trabalha há
cinco anos com os Kuikuro num projeto de preservação
da memória ritual tradicional.
Fausto diz que as
cidades vizinhas ao Xingu têm uma dívida
com os índios. "Algumas delas vivem
em grande parte com os recursos que os índios
levam até lá, e eles esperam um retorno
na forma de educação, saúde
e, fundamentalmente, com a preservação
das nascentes do rio Xingu, que estão sendo
destruídas", diz ele.
O antropólogo
conta que a preservação das matas
nas margens dos afluentes do Xingu, que estão
todos fora do parque, é hoje uma das principais
preocupações dos índios. Nos
últimos anos, a expansão da soja nos
municípios vizinhos, às vezes à
custa das matas ciliares, tem favorecido o assoreamento
dos rios. As mudanças nas águas, que
estão se tornando mais turvas e arrastam
lixo para dentro do parque, também fazem
os índios desconfiar de poluição,
principalmente por agrotóxicos.
Fausto lembra que
a presença das autoridades das cidades vizinhas
nas festas do Xingu não dá garantia
para solução desses problemas. "Todas
as relações têm dois lados.
Não precisamos ser pessimistas, mas também
não podemos ser ingênuos sobre todas
as dificuldades que nós mesmos temos com
os nossos políticos, que nem sempre nos representam
bem", diz. "Bobagem achar que há
oposição entre a preservação
das terras indígenas e as atividades econômicas
dos brancos. É apenas preciso haver alguma
regulação pelo Estado, senão,
não só o Xingu, mas a Amazônia
toda vai ficar inabitável, não só
para eles como também para nós."
O Parque Indígena
do Xingu foi criado em 1961 e tem hoje 2.642.003
hectares. A parte sul do parque é conhecida
como Alto Xingu e é habitada por 14 diferentes
etnias, com línguas distintas, mas traços
culturais comuns e um sistema ritual, simbólico
e econômico que se mantém pelo menos
desde o século XIX.
A conformação
das aldeias, a alimentação, as cerimônias
e festas (como o Kuarup e mais de uma dezena de
outras) e a mitologia são alguns traços
que constituem a identidade dos xinguanos. Na construção
dessa "convivência pacífica",
como explica Fausto, o Kuarup sempre teve papel
importante. "É um momento de criação
e consolidação da paz xinguana."
Fonte: Radiobras – Agência
Brasil (www.radiobras.gov.br)
Spensy Pimentel