14/10/2005
- "O biodiesel não é mais um combustível
puramente experimental no Brasil. Podemos dizer que
estamos hoje na fase inicial de comercialização.
Mas temos ainda muito a avançar", afirma
Silvio Crestana, diretor-presidente da Empresa Brasileira
de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), vinculada
ao Ministério da Agricultura, Pecuária
e Abastecimento. Ele explica que a atual estrutura
nacional de produção de biodiesel pode
ser caracterizada ainda como incipiente e fortemente
baseada em experiências com plantas-piloto,
com volume de produção bastante reduzido.
Segundo a Associação
Nacional de Petróleo (ANP) o país conta,
até o momento, com apenas 12 plantas produtoras,
das quais cinco já estão autorizadas
a produzir comercialmente e sete estão em processo
de autorização. O potencial de produção
atual é estimado em 176 milhões de litros
anuais.
Esse nível de produção
é um dos maiores desafios para o cumprimento
das metas estabelecidas no âmbito do Programa
Nacional de Produção e Uso do Biodiesel,
que necessitará de aproximadamente 1000 milhões
de litros em sua fase inicial. Ou seja, a capacidade
produtiva atual supre somente 17% da demanda, considerando
a mistura de 2% de biodiesel ao diesel nacional.
O Plano Nacional de Agroenergia
estabelece uma série de diretrizes e ações
para a estruturação do programa de produção
e uso de biodiesel no Brasil. A primeira é
a de que, por se tratar de um país tropical,
com dimensões continentais, o desafio colocado
é o do aproveitamento das potencialidades regionais,
seja das culturas já tradicionais, como a soja,
o amendoim, o girassol, a mamona e o dendê,
seja das novas alternativas, como o pinhão
manso, o nabo forrageiro, o pequi, o buriti, a macaúba
e uma grande variedade de oleaginosas a serem exploradas.
A Embrapa, no entanto, é
cautelosa quanto à potencialidade de novas
alternativas. Embora algumas plantas nativas apresentem
bons resultados em laboratórios (como o pequi,
o buriti e a macaúba), sua produção
é extrativista e não há plantios
comerciais que permitam avaliar com precisão
as suas potencialidades.
Já entre as culturas tradicionais,
merecem destaque a soja (cujo óleo representa
90% da produção brasileira de óleos
vegetais), o dendê, o coco, o girassol (pelo
rendimento do óleo) e a mamona (pela resistência
à seca).
Na Região Norte, a opção
seria incentivar o cultivo da palma africana e o dendê
e a produção descentralizada de biodiesel
para abastecimento direto das comunidades isoladas,
que produziriam a matéria-prima e efetuariam
a transformação (craqueamento).
A Amazônia concentra também
uma grande variedade de espécies nativas, inclusive
palmáceas, que poderão também
contribuir para a redução da dependência
em relação ao diesel a partir da organização
produtiva das comunidades locais, seja em regime de
extrativismo simples ou de exploração
agroflorestal. Além disso, a Região
dispõe de uma área, já desmatada,
superior a cinco milhões de hectares, com aptidão
para o dendê ou a palma.
No Nordeste, devido à conotação
social dada ao programa, atualmente o foco de produção
está centrado na mamona, cuja produção
supera 27 milhões de litros por ano, o que
permite a mistura de 2% em apenas um quarto do diesel
consumido na própria região. Mas a pesquisa
agropecuária poderá alavancar essa produção
nos próximos anos.
Lavouras implantadas com a tecnologia
recomendada pela Embrapa já alcançam
até três toneladas por hectare. O zoneamento
agrícola mapeou mais de 600 mil hectares de
terras aptas ao cultivo da mamona na região,
o que pode representar uma alternativa para mais de
100 mil famílias de agricultores. Mas ainda
são incipientes as pesquisas de novas variedades
e de tecnologias de manejo (principalmente de colheitadeiras).
O cenário previsto no Plano
elaborado pela Embrapa prevê que caso os produtores
nordestinos não sejam preparados para enfrentar
um ambiente competitivo, com um pacote tecnológico
e capital intensivo, poderão não suportar
a concorrência da produção nas
novas áreas. Outras opções para
a região são o babaçu e a própria
soja, cultivada no Oeste Baiano e no sul do Piauí
e do Maranhão.
No Centro-Sul, embora a soja tenha
potencial para oferecer todo o óleo necessário
para até mesmo a mistura dos 5% com o óleo
diesel, ela sofre restrições de natureza
econômica, sem falar que ali os benefícios
fiscais são menores.
Do ponto de vista das alternativas
para o biodiesel, a região também apresenta
grande potencial para o amendoim, o girassol e a própria
mamona (com experiências de sucesso no Mato
Grosso), sem falar de que dispõe ainda de uma
grande extensão de terras agricultáveis
ainda livres, com maior regularidade climática.
Empregos no campo
O Plano também mostra que
o biodiesel será um importante instrumento
de geração de empregos e de renda no
campo. Estudos desenvolvidos pelos ministérios
do Desenvolvimento Agrário, da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento, da Integração
Nacional e das Cidades mostram que para cada 1% de
participação da agricultura familiar
no mercado de biodiesel do país seria possível
gerar cerca de 45 mil empregos no campo - admitindo
que para cada emprego no campo são gerados
três nas cidades, seriam criados 180 mil empregos.
No Semi-Árido, a renda anual
líquida de uma família a partir do cultivo
de cinco hectares com mamona e uma produção
média de 700 e 1,2 mil quilos por hectare pode
variar entre R$ 2,5 e R$ 3,5 mil. Sem falar que a
área poderá ser consorciada com outras
culturas, como feijão e o milho.
As projeções
da Embrapa de produção de biodiesel
para os próximos trinta anos são promissoras.
O Brasil poderá produzir,
apenas para o mercado interno, um volume aproximado
de 50 GL (Gigalitros). Nos primeiros anos, evidentemente,
o mercado interno absorverá a totalidade da
produção, mas até 2035 a produção
de biodiesel será equivalente para os mercados
internos e externos.
O parque de usinas produtoras vai
ser composto de pequenas, médias e grandes
unidades. As pequenas, voltadas ao atendimento da
demanda localizada, enquanto que as médias
e grandes atenderão o mercado atacadista e
a exportação.
Nesta data a média de produtividade
poderá chegar a cinco toneladas por hectares,
em oposição aos 600 quilos por hectare
atuais. "A evolução ocorrerá
inicialmente por meio de melhoria nos sistemas de
produção, aumento de produtividade e
de teor de óleo das oleaginosas atuais",
explica o diretor-presidente da Embrapa.
"Mas isso se tivermos um dramático
investimento em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação,
capaz de promover um adensamento energético
das espécies oleaginosas", ressalta Crestana.
Ele argumenta também que, atendida essa premissa
de aumento da densidade energética, diminuirá
a pressão relativa por incorporação
de novas áreas. |