21/10/2005 - Na região
de Tefé, o caos está instalado.
Muitas comunidades estão isoladas e
a perda da produção é
total por falta de escoamento e armazenagem.
Existem municípios isolados e no escuro,
pois a termoelétricas não têm
mais diesel. As comunidades ribeirinhas estão
a quilômetros da beira do rio, as doenças
se alastram, há indícios de
dengue na Cidade de Tefé, no interior
a malária impera.
Na verdade, a seca demonstrou, para além
do leito do Rio Solimões – Amazonas,
a incompetência das esferas públicas.
Ela deixa visível que não existe
sensibilidade pública para o caos vivenciado
pelos ribeirinhos e indígenas. Em Tefé,
pela vaidade entre prefeito e governador,
não há uma cooperação
técnica para atender o interior. O
corpo de bombeiros não consegue ter
um mapa da região de Tefé atualizado
e não visualiza a cooperação
institucional com Exercito e Capitania dos
Portos.
As ações públicas e os
discursos ensaiados não passam de mera
justificativa. A ausência de um plano
estratégico de desenvolvimento sustentável
e a seca servem para justificar a ineficiência
do Estado e colocam na mídia que um
pouco de feijão e uma dipirona podem
salvar a miséria há séculos
instalada no interior.
A dor maior é ver um trabalho de décadas
quase perdido. A preservação
de lagos e mananciais locais está comprometida.
Os inúmeros peixes não têm
mais espaço para viver, e as próprias
comunidades não têm mais força
para proteger seu trabalho e arranjar água
suficiente para evitar as perdas incalculáveis.
Não dá para falar de organização
social, de fortalecimento institucional, dá
para falar da luta de ribeirinhos, indígenas,
extrativistas, agricultores e garantir a vida,
pelo menos a humana. Cabe a nós aliados
e solidários primar pela luta social,
escrever e dizer alguma coisa, registrar para
poder dizer a todos como estamos vivendo e
como estamos sofrendo.
Quase todas as atividades de formação
junto às comunidades foram canceladas.
Estão acontecendo com muita dificuldade
as visitas entre comunidades e de algumas
instituições da Igreja Católica.
Há também uma intensa presença
de pessoas nas barrancas dos rios e praias
para filmar e documentar a dor e ao mesmo
tempo registrar a beleza da Amazônia,
mesmo ela seca.
De minha parte, sempre ouvi minha avó,
hoje com 99 anos, falar da seca de 1948, e
de 1953, sendo esta última falada por
especialista como a maior do século
XX. Eu acompanhei de perto a de 1998 e a cheia
de 1999. Hoje, não consigo deixar de
admirar o Rio Solimões e o Lago de
Tefé com tanta beleza que ficava no
fundo do rio, mas ao mesmo tempo a calamidade
instalada nas barracas do Rio. Temos ainda
pelo menos dois meses pela frente de seca
e de instabilidade da água.
A conversa que ronda por Tefé e na
beirada do rio é que uma grande seca
sempre é acompanhada de uma grande
cheia, como de 98/99. Se de fato o conhecimento
tradicional estiver correto, estaremos assistindo
a perdas incalculáveis dos recursos
naturais do Rio Solimões – Amazonas,
assim como dos recursos humanos locais, forçando
perdas na organização social,
agroextrativista, etc. De fato hoje se aguarda
a chuva, a cheia do rio, mas que ela venha
com um conta gotas, dando condições
de recuperação das atuais perdas
e dando condições para os governantes
esquecerem suas brigas pessoais, saírem
dos gabinetes e começarem a executar
políticas públicas, evitando
as ações emergenciais.