28/10/2005
- De alguma forma, deve-se aproveitar a próxima
Conferência das Partes da Convenção
do Clima, a se realizar em novembro, em Montreal,
para que se inicie um processo de negociação
desde já de um novo regime para combater
o aquecimento global a partir de 2012, quando
termina a primeira fase do Protocolo de Kyoto,
que garanta, entre outros itens, a continuidade
do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo - MDL.
José Jorge |
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José
Jorge
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Esta foi uma proposta
enfatizada pelo professor José Goldemberg,
secretário de Estado do Meio Ambiente,
e recebida com entusiasmo pelos participantes
do seminário sobre o Mercado de Carbono
promovido pelo Fórum Paulista de Mudanças
Climáticas Globais e de Biodiversidade,
nos dias 26 e 27, em São Paulo.
Além de Goldemberg,
diversos dos maiores especialistas do assunto
estiveram também presentes ao evento,
como Ken Newcombe, gerente de Fundos do Prototype
Carbon Fund e do Banco Mundial, José
Domingos Gonzales Miguez, do Ministério
de Ciência e Tecnologia, Roberto Schaeffer
e Bráulio Pickman, membros do Painel
de Metodologia da Junta Executiva do MDL,
Manoel Felix Cintra Neto, presidente da Bolsa
de Mercadorias e Futuro - BM&F, o ex-ministro
do Meio Ambiente, José Carlos Carvalho,
e Luiz Gylvan Meira Filho, do Instituto de
Estudos Avançados - IEA, da USP, além
do secretário-executivo do Fórum
Paulista de Mudanças Climáticas
Globais e de Biodiversidade, Fábio
Feldmann.
Novo horizonte
O secretário estadual
do Meio Ambiente, que também esteve
representando o governador Geraldo Alckmin
no encontro, disse que o MDL deveria ter seu
horizonte estendido para além de 2012,
sugerindo o ano de 2015 e até mesmo
2020, e a meta de redução das
emissões de gases de efeito estufa
deveria ser aumentada, assim como países
grandes emissores mas que ficaram desobrigados
de cumprir metas de redução,
como o Brasil, China e Índia, deveriam,
voluntariamente, se propor metas - o Protocolo
de Kyoto estabeleceu que os países
industrializados devem reduzir, até
2012, suas emissões em aproximadamente
5% abaixo das emissões de 11000.
Ele lembrou que sendo obrigados
a reduzir suas emissões, os países
industrializados aceitaram a criação
de mecanismos de compensação
de reduções, sendo que, entre
outras alternativas, poderiam comprar esses
“certificados de carbono” de outros países
não obrigados, como o Brasil, o que
também acaba por funcionar como um
aporte de recursos daqueles países
para estes, para custear as medidas de redução.
“O problema é que as obrigações
resultantes do Protocolo de Kyoto acabam em
2012 e os investidores precisam de garantias
de que o MDL vai continuar a existir no futuro”,
explicou.
Por seu lado, o ex-ministro
José Carlos Carvalho recordou que embora
o Brasil não figurasse entre os grandes
emissores na época em que o Protocolo
de Kyoto foi firmado, atualmente ele se encontra
entre os seis maiores emissores do planeta,
principalmente em conseqüência
do desmatamento na Amazônia. Ele reforçou
a posição de que o país
deve, voluntariamente, estabelecer metas de
redução, até para se
qualificar para negociar em 2012.
“Caso não façamos
isto, com que autoridade política vamos
participar das negociações?”,
indagou. O ex-ministro ainda enfatizou a necessidade
de desburocratização do processo
de aprovação dos projetos de
MDL: “Temos que superar essas dificuldades
que acabam por inviabilizar o verdadeiro objetivo,
que é a redução de emissões”.
O especialista do Banco
Mundial, Ken Newcombe, concordou que o mundo
necessita efetivamente do MDL, visando a redução
das emissões dos gases de efeito estufa
e afirmou que “os brasileiros têm que
exigir moralmente a continuidade do mercado
de carbono para além de 2012, até
em função das incertezas reinantes”.
Além disso, ele estimulou o país
a fazer uso de um “MDL unilateral”, com apoio
das instituições financeiras
brasileiras, dizendo-se convicto de que “alguém
irá comprar futuramente essas reduções”.
O especialista do IEA, Gylvan
Meira Filho, informou que há tecnologias
disponíveis para diminuir as mudanças
climáticas e estabilizar as concentrações
dos gases, “com custo tolerável, desde
que sejam mantidos os mecanismos de compensação,
como o MDL”. Ele afirmou que há consenso
atualmente em relação aos mecanismos
de compensação, mas que é
necessário e urgente o aprimoramento
desses mecanismos, esclarecendo que a maioria
dos projetos são relativamente pequenos,
que os prazos relativamente curtos não
favorecem a oferta de grandes projetos e que
projetos de longo prazo são essenciais
para a manutenção das emissões.
“Há urgência no tratamento do
problema, que é cada vez maior. Sem
isso, o custo será também cada
vez mais alto”, alertou.
O presidente do BM&F
destacou a importância do seminário
promovido pelo Fórum Paulista de Mudanças
Climáticas Globais e de Biodiversidade,
para o fomento do mercado de carbono no país.
Ele lembrou que há cerca de um mês
foi lançado na Bolsa do Rio de Janeiro
o banco de crédito de carbono, que
pode ser totalmente acessado via internet.
Engajamento dos
“stakeholders”
O secretário-executivo
do Fórum Paulista, Fábio Feldmann,
explicou que um dos principais objetivos do
órgão é a criação
de câmaras temáticas, para o
acompanhamento e debate das questões
mais específicas, como é o caso
do Mercado de Carbono, cuja câmara foi
criada com apoio do BM&F e vem acompanhando
o mercado e os principais projetos MDL. Ele
colocou como desafios institucionais para
o Brasil, nessa questão, a redução
dos custos de transição, a diminuição
dos riscos, a melhor utilização
da cooperação internacional
e o engajamento dos “stakeholders”.
O representante do Ministério
de Ciência e Tecnologia, José
Domingos Gonzales Miguez, que também
é da Coordenação Geral
de Mudanças Climáticas do Ministério,
informou que o Brasil tem 84 projetos de MDL,
sendo o segundo no mundo em quantidade de
projetos apresentados em validação,
que, por sua vez, totalizam uma redução
de emissão de 132 milhões de
toneladas de CO2, o que o coloca em primeiro
lugar no planeta, seguido da Índia,
com 115 milhões de toneladas de CO2,
provenientes de 97 projetos.
Ele lembrou que foi o Brasil
que apresentou a proposta de um Fundo de Desenvolvimento
Limpo, em 1997, e que, mais tarde, foi modificado
para Mecanismo, e que também foi o
primeiro país a estabelecer uma autoridade
nacional para oficializar os pedidos de créditos
de carbono junto ao Conselho Executivo do
MDL, da ONU, além de ter criado a primeira
metodologia de projeto a ser aprovada pelo
mesmo conselho e o primeiro projeto registrado.
Roberto Schaeffer e Bráulio
Pickman, expondo sobre o tema da Adicionalidade,
colocaram o tema no centro das discussões
do encontro. Conforme expuseram, a Adicionalidade
é um critério de aprovação
de projeto de MDL, “crucial, pois responsável
pela preservação da integridade
ambiental do mecanismo”. A Adicionalidade
implica a equivalência rigorosa das
reduções de emissões
certificadas às reduções
obrigatórias que deveriam ser obtidas
domesticamente pelos países Partes
do Anexo 1 (obrigados à redução).
O problema é que,
conforme lembraram, há diferentes entendimentos
sobre o conceito da Adicionalidade, assim
como tem sido constatada uma generalizada
falta de informação sobre o
assunto, demandando uma série de reclamações
e queixas muitas vezes improcedentes.
Em função
disso, Schaeffer também ressaltou a
importância do encontro, reunindo vários
especialistas e interessados no tema, classificando-o
como “um grande avanço para se nivelar
as informações existentes”.