26/10/2005 - Ás
5h30 de hoje, quarta-feira, dia 26 de outubro,
o governo deflagrou a Operação
Ouro Verde contra uma rede de falsificação
e comercialização de Autorizações
para Transporte de Produto Florestal (ATPFs),
o documento expedido pelo Ibama e por alguns
governos estaduais para legalizar o comércio
de madeira em todo País.
A ação conjunta
entre Polícia Federal (PF), Ministério
Público Federal (MPF) e Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
(Ibama) prendeu, até as 18h de hoje,
43 pessoas, entre falsificadores, comerciantes,
empresários e intermediários
nos estados de Mato Grosso, Rondônia,
Tocantins, Maranhão, Rio Grande do
Norte, Goiás e, principalmente, no
Pará. Também estão detidos
dois funcionários da Secretaria da
Fazenda paraense. Entre ontem e hoje, 780
ATPFs irregulares foram apreendidas.
Os responsáveis pelo
esquema vendiam e distribuíam autorizações
compradas, falsificadas ou adulteradas não
só em cidades da Amazônia, mas
também do Nordeste, de Goías
e até do Sul do País. Os valores
cobrados pelas ATPFs variavam entre R$ 1,2
mil e R$ 1,8 mil. Até o fim do dia,
foram cumpridos 78 mandados de busca e apreensão.
Participaram do trabalho 400 agentes da PF,
27 analistas ambientais do Ibama e dois procuradores
federais. O governo está publicando
uma portaria para suspender, por até
30 dias, o fornecimento de novas ATPFs para
empresas e pessoas consumidoras de matéria-prima
florestal no Pará, Rondônia e
Maranhão.
A operação
de hoje é resultado de outras duas
operações sigilosas de inteligência
apelidadas de Belém I (realizada de
maio a outubro de 2003) e Belém II
(iniciada em setembro de 2004). As investigações,
realizadas inclusive por meio de escuta telefônica,
apontaram a existência de um novo esquema
criminoso no comércio de madeira, diferente
do que era conhecido até então
pela polícia.
Foram descobertas rotas
de distribuição e um tipo de
falsificação, pelo menos na
estética das cédulas, com um
alto padrão de qualidade, dificilmente
identificável mesmo por peritos. A
fraude foi descoberta por causa de um pequeno
e inusitado descuido dos falsificadores: alguns
documentos tinham erros ortográficos
– a palavra “mogno” foi escrita com acento,
por exemplo. Uma gráfica em Goiânia
chamada Cometa imprimia os documentos falsos.
Na empresa, a PF prendeu seis funcionários
e apreendeu 20 fotolitos, chapas gravadas
já prontas para imprimir e aproximadamente
500 ATPFs falsificadas.
Durante as Operações
Belém I e II, foram apreendidas 724
ATPFs irregulares e identificadas 129 empresas
fantasmas. Já haviam sido presas 26
pessoas, entre donos de madeireiras e despachantes,
e dois servidores do Ibama no Pará
foram demitidos, sendo um deles procurador
federal. O órgão instalou 33
sindicâncias e 15 processos administrativos
contra outros funcionários também
lotados no Pará. Além disso,
em setembro passado, o Ibama descobriu que
onze siderúrgicas no Pará e
no Maranhão vinham consumindo carvão
ilegal nos últimos cinco anos. As empresas
foram autuadas em mais de R$ 509 milhões.
Resposta
“Sei que uma pergunta que
sempre cala fundo é por que uma investigação
pode, às vezes, demorar até
20 meses. O tempo da investigação
é o tempo da investigação.
O importante é que essas quadrilhas
estão sendo desmontadas de forma eficiente.
Estamos atingindo a sua vértebra. Isso
nunca aconteceu”, afirmou a ministra do Meio
Ambiente, Marina Silva, durante a entrevista
coletiva em que foi anunciada a operaçaõ,
na manhã desta quarta-feira, em Brasília.
A ministra avaliou que a sofisticação
da falsificação das ATPFs é
uma resposta dos criminosos à série
de operações realizadas pelo
governo Lula no combate ao desmatamento e
ao comércio ilegal de madeira. “Estamos
fechando as torneiras da ilegalidade”, sentenciou.
Marina disse que a Operação
Ouro Verde também serve como resposta
para aqueles que cobraram ações
do governo em outros locais da Amazônia
depois das Operações Curupira
I e II, realizadas recentemente no Mato Grosso,
quando 148 pessoas foram presas, sendo 49
funcionários do Ibama, com grande repercussão
na imprensa nacional e internacional. “Esta
nova operação faz parte de um
conjunto de medidas estruturantes e contínuas”,
insistiu a ministra, citando, entre elas,
a implantação de bases operativas
de fiscalização em toda a Amazônia,
a criação do Deter [Sistema
de Detecção do Desmatamento
em Tempo Real], medidas de regularização
fundiária e legalização
do manejo florestal. Marina Silva voltou a
cobrar a aprovação pelo Senado
do Projeto de Lei de Florestas Públicas
(saiba mais). “Se não conseguirmos
aprovar o PL, não teremos oferta de
madeira legalizada na Amazônia”.
Durante a entrevista, foi
apresentado um breve resumo das outras quatro
grandes operações conjuntas
realizadas pelo atual governo contra o desmatamento:
“Setembro Negro”, em Rondônia, em setembro
de 2003; “Faroeste”, no Pará, em dezembro
de 2004; “Curupira I”, no Mato Grosso, em
junho último; e “Curupira II”, também
no Mato Grosso, em agosto deste ano. Segundo
o documento entregue aos jornalistas, desde
o início de 2003, foram apreendidos
mais de 250 mil metros cúbicos de madeira
ilegal na Amazônia e emitidos autos
de infração no valor de R$ 800
milhões por crimes ambientais na região.
Até setembro deste ano, já teriam
sido apreendidos 100 mil metros cúbicos
de madeira, o dobro da quantidade registrada
em 2004. Além disso, 186 pessoas foram
presas naquelas operações, sendo
63 servidores públicos e 123 empresários
madeireiros, despachantes e contadores.
Todos os representantes
da área ambiental do governo que falaram
aos repórteres insistiram em dizer
que o nível de ilegalidade e informalidade
do setor madeireiro na Amazônia diminuiu
significativamente nos últimos três
anos. Os técnicos do MMA e do Ibama
admitiram, no entanto, que não dispõem
de dados exatos sobre valores e quantidades
de madeira em circulação legal
e ilegalmente e que as estimativas sobre o
assunto têm de ser consideradas com
muita cautela. A coletiva de imprensa também
contou com a participação do
secretário-executivo do Ministério
da Justiça, Luiz Paulo Barreto, do
diretor-geral da PF, Paulo Lacerda, do secretário
de Biodiversidade e Floresta do MMA, João
Paulo Capobianco, e do diretor de Florestas
do Ibama, Antônio Carlos Hummel.
“A única certeza
que eu tenho é que a ilegalidade já
diminuiu e vai diminuir mais significativamente
ainda. Com certeza, a retirada de circulação
dessas ATPFs fraudadas restringe o comércio
ilegal de madeira. Agora, colocar isso em
termos de percentual, neste momento, seria
complicado e difícil”, explicou Hummel.
Ele assegurou que o aperto na fiscalização
e a suspensão ou cancelamento, desde
2003, de mais de mil planos de manejo florestal
em toda a Amazônia acabou por fechar
as portas para o comércio ilegal de
madeira. “Quando mostramos para a sociedade
que instrumentos ilegais serão punidos,
a gente cria lições que são
aprendidas”.
É difícil
fazer um levantamento sobre a atividade madeireira
porque, pelo menos até agora, é
praticamente impossível saber quanto
de madeira é comercializado ilegalmente.
O governo tenta trabalhar a partir de dados
secundários, como os índices
de desmatamento, o número de planos
de manejo em funcionamento, o consumo anual
de madeira em todo o Brasil e a quantidade
de madeira ilegal apreendida pelo Ibama. Em
2000, por exemplo, a Amazônia teria
retirado de suas florestas 28 milhões
de metros cúbicos de madeira, sendo
que 20% foram legalmente autorizados. Em 2003,
a região teria comercializado 24 milhões
de metros cúbicos, dos quais 50% seriam
legalizados, segundo o MMA. Além disso,
desde o início do governo Lula teria
ocorrido uma queda de 65% na emissão
de novas ATPFs.
O problema é que
mesmo no setor legalizado ocorrem crimes –
e é difícil identificá-los.
A falsificação das ATPFs, muitas
vezes, ocorre justamente para encobrir atos
ilegais de empresas que seguem a maior parte
das regras. Algumas empresas costumam usar
ATPFs de um determinado carregamento de madeira
para “esquentar” outro, por exemplo.