25/10/2005 - Comunidade
quilombola de Ivaporunduva, no Vale do Ribeira,
ganha telecentro para fortalecer a capacitação
e a educação de jovens e adultos,
acompanhar a execução de benefícios
e direitos e ofececer espaço de leitura
e lazer. A idéia é abrir o acesso
aos computadores para outros quilombos da
região.
Mateus Ribeiro da Silva
tem 7 anos e está vidrado com os computadores
instalados perto de sua casa. Ele e sua amiga
Talia Pedroso de Moraes, 8 anos, passam as
tardes rondando a sala onde as máquinas
estão ligadas. “Já usei umas
dez vezes”, conta ela. “Eu gosto de escrever
estórias de bruxa e de jogar”, diz
ele. Os meninos moram no quilombo de Ivaporunduva,
às margens do rio Ribeira de Iguape,
no interior de São Paulo. No começo
de outubro, Ivaporunduva foi contemplado com
a instalação do primeiro telecentro
em uma comunidade quilombola do Vale do Ribeira.
O quilombo foi plugado por
meio de uma parceria entre o Banco do Brasil,
o Instituto Socioambiental, a Associação
Quilombo de Ivaporunduva e o governo federal,
por meio do programa Governo Eletrônico
Serviço de Atendimento ao Cidadão
(Gesac), do Ministério das Comunicações,
que visa promover a inclusão digital
no País. Enquanto o BB entrou com dez
computadores e o governo com a antena que
permite conexão via satélite,
o ISA prestou a assessoria para o funcionamento
do centro e treinamento dos moradores do quilombo.
Todos os computadores estão equipados
com software livre.
A antena que permite a conexão
via satélite é fundamental para
o telecentro porque a comunidade não
tem linha telefônica. Isso provoca dias
de pane, quando todos os computadores perdem
acesso à internet, principalmente em
dias nublados ou com chuva constante. Mas,
para quem não tem telefone e agora
está conectado à rede mundial
de computadores, a novidade não deixa
de empolgar - principalmente os mais novos.
“Já tem criança fazendo trabalho
da escola buscando informações
na internet”, diz Alexandro Marinho, coordenador
da associação local.
Alexandro diz que a rede
também poderá potencializar
o desenvolvimento dos projetos de alternativas
econômicas de Ivaporunduva, como a produção
e comercialização da banana
orgânica, do artesanato em palha de
bananeira e mesmo do turismo. “Em breve poderemos
criar uma página sobre os quilombos
do Vale do Ribeira”, vislumbra. O quilombola
diz que o telecentro também irá
fortalecer a capacitação e a
educação de jovens e adultos.
Estudar as palavras
Olavo Pedro da Silva Filho,
24 anos, afirma que a internet é antes
de tudo “conhecimento”. “Como a gente fica
meio isolado aqui no bairro, recupero na rede
reportagens que passaram na televisão
e depois envio para meus amigos”. Olavo diz
que ele e seus vizinhos estão consumindo
todo tipo de informação, cada
um a partir de seu gosto próprio. “Tem
aquele que fica procurando os gols da rodada,
o outro não sai da sala de bate-papo
e ainda tem o que passa horas pesquisando
coisas da nossa história”. Leandro
Veiga, de 15 anos, por exemplo, tem aproveitado
o tempo para navegar na internet. “Leio sobre
esportes, que gosto muito, mas acho que o
melhor de tudo é que agora temos como
estudar as palavras”.
Alexandro e Olavo foram
dois dos três jovens quilombolas que
passaram por um treinamento para dominar as
ferramentas básicas do pacote do software
livre. Têm agora a responsabilidade
de passar esse conhecimento adiante, possibilitando
o acesso de todos ao computador e à
internet. “Já temos 74 pessoas inscritas
na lista de treinamento”, diz Alexandro. “Nossa
idéia é incentivar inclusive
que outros quilombos da região acessem
os computadores”.
Alguns adultos estão
entre os inscritos para o treinamento. Se
interessam em conhecer e aprender a mexer
na novidade, principalmente no programa de
correio eletrônico. “Quero saber se
posso conferir e atualizar meus documentos
por aí”, diz a artesã Marina
Forquim, 44 anos. Sua colega Maria da Guia,
uma das lideranças da comunidade, quer
aprender a usar as máquinas para checar
em que pé estão os processos
de aposentadoria das mulheres mais velhas
da comunidade e os auxílios-maternidade
daquelas que estão grávidas.
“Vai ser ótimo acompanhar nosso direitos
sem ter que ir sempre para a cidade”, diz
ela.
Os principais
usuários até agora, porém,
são as crianças e jovens entre
10 e 25 anos. Enquanto elas se acotovelam
diante das telas dos computadores, o campinho
de futebol do quilombo - antes o único
espaço de lazer da comunidade - vai
se acostumando a ter, no novo telecentro,
um concorrente pelo título de lugar
mais disputado de Ivaporunduva. Um bem-vindo
concorrente.