09/11/2005 - A quarta reportagem
da série São Gabriel da Cachoeira
planeja seu futuro revela que a participação
da população no debate sobre
o Plano Diretor do município aumenta
as chances de uma lei eficiente no combate
à especulação imobiliária
e em favor dos interesses coletivos
Além do comprometimento
dos gestores, um instrumento fundamental para
a aplicação eficiente do Plano
Diretor nos municípios brasileiros
é a existência de um controle
social fortalecido. É o que pensa Francisco
Comaru, urbanista do Instituto Pólis
que participou do encontro em São Gabriel
sobre o assunto no começo de outubro.
“Por isso que é importante a participação
e a apropriação da população
em todo o processo de elaboração
do plano”.
Comaru explica que o crescimento
urbano das cidades brasileiras sempre foi
pautado por uma distância enorme entre
seu planejamento e sua gestão. “Esta
última tem sido ditada menos pelo interesse
público e mais pelo marketing, pelo
clientelismo, pela pressão de interesses
econômicos que encontra a sua maior
expressão na especulação
imobiliária”. É por isso que,
segundo Comaru, o Plano Diretor deve ser fruto
de um processo participativo, para a população
poder atuar no sistema municipal de planejamento
e gestão por meio de conselhos municipais
e de fundos para áreas como habitação,
saneamento, transporte. “Assim é possível
garantir rubricas no orçamento e verbas
mínimas para estas ações”.
O combate à especulação
imobiliária e a promoção
da regularização fundiária
são dois pontos centrais no raio de
ação do Plano Diretor. Para
isso a lei pode criar no município,
seja na cidade, seja nos distritos, as chamadas
Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis).
O conjunto de Zeis forma o zoneamento urbano
do município, onde é previsto
que tipo uso e de ocupação podem
ser feitos em cada parte do território.
Mas a produção simplista do
Plano Diretor não garante o ordenamento
territorial a partir de uma perspectiva de
crescimento sustentável ou do interesse
da maioria. “É preciso que a aplicação
da lei seja fiscalizada”, adverte Comaru.
Segundo o especialista,
as Zeis servem para garantir que as propriedades
- ou seja, os imóveis – atendam, além
dos interesses de seus donos, o interesse
da sociedade, principalmente das camadas sociais
mais pobres, por meio da “função
social da propriedade”. Comaru diz que a idéia
por trás desde conceito é fixar
a população de renda mais baixa
em certas áreas da cidade, e não
estimular sua expulsão para as periferias.
“Ao construir um centro comercial em um terreno
baldio na cidade, por exemplo, o proprietário
seria obrigado a construir habitações
populares em área equivalente à
50% daquela utilizada na construção
das lojas”.
Aterrissando em
São Gabriel
Transpondo a teoria e a
prática dos planos diretores existentes
no Brasil para São Gabriel da Cachoeira,
os consultores do Pólis citam a delimitação
do perímetro urbano da sede municipal
como passo fundamental. “Ao fazer isso, o
município vai prever uma zona de expansão
e priorizar o crescimento para dentro da cidade,
onde tem muita área vazia ou sub-utilizada”,
afirma Nelson Saule Jr., do Pólis.
Assim a população que chega
na cidade poderia ocupar bairros mais centrais.
Nas comunidades e áreas
rurais do município, onde vivem mais
de 21 mil indígenas, o Plano Diretor
pode definir um modelo de distritalização,
que promova uma descentralização
de planejamento e da administração.
“Em uma área gigantesca como a de São
Gabriel, quem administra desde a sede não
tem condição de prever ou atender
todas as demandas e problemas, inclusive dos
outros pequenos núcleos, como Iauaretê
e Cucui”, afirma Francisco Comaru.
De acordo com levantamento
feito em 2003 pela Foirn e pelo Distrito Sanitário
Especial Indígena do Rio Negro, vinculado
à Fundação Nacional de
Saúde, o distrito de Iauaretê
tem aproximadamente 5.200 habitantes e Cucuí
cerca de 3.200. Taracuá (com 2.900
pessoas), Pari-Cachoeira (3.3000) e Assunção
do Içana (5.200) são os demais
distritos de São Gabriel. "O plano
pode estabelecer uma divisão no município
levando em conta a legislação
já existente, os Parque Nacionais e
os tipos de etnias diferentes nos territórios.
Com toda essa diversidade mapeada, uma divisão
distrital vai viabilizar a administração
de todo o território".