08/12/2005 - Intervenção
da ministra do Meio Ambiente do Brasil, Marina
Silva, durante o segmento de Alto Nível
da 11ª Conferência das Partes da
Convenção sobre Mudanças
do Clima das Nações Unidas,
em Montreal, no Canadá
Senhor Presidente
Desejo, inicialmente, felicitá-lo
por sua designação para presidir
os trabalhos desta mesa e reiterar o compromisso
do Brasil com o fortalecimento das instâncias
multilaterais para enfrentar o desafio da
mudança do clima. Felicito, também,
o Governo Canadense pelo esforço dispendido
para assegurar o sucesso desta reunião.
Trata-se de momento de crucial importância
para o regime internacional de mudanças
climáticas. Há um ano, encontravamo-nos
em Buenos Aires (Argentina) com a perspectiva
otimista da entrada em vigor do Protocolo
de Quioto. Realizamos agora a 1ª Reunião
das Partes do Protocolo, e é fundamental
que a mensagem que saia daqui para o mundo
seja de compromisso de todas as partes, do
Norte e do Sul. As evidências de que
as ações antrópicas têm
afetado o equilíbrio do planeta não
nos deixam muita margem para negociações
lentas e pouco efetivas.
Tampouco podemos nos dar ao luxo de aguardar
por novas catástrofes naturais, que
cada vez mais atingem de maneira igual países
ricos e pobres, mas sempre sacrificando de
maneira mais perversa as populações
mais pobres desses países.
No contexto das negociações
internacionais, preocupa-me a forma como alguns
países têm conseguido retardar
ou dificultar negociações com
base em seus interesses imediatos, de ordem
puramente econômica. A entrada em vigor
do Protocolo de Quioto foi um momento importante
no regime internacional de mudança
climática, mas não podemos deixar
de reconhecer o tempo que se passou até
que esse instrumento se tornasse realidade
e as conseqüências decorrentes
desse atraso.
A população do Planeta espera
de nós mais do que novos papéis.
É hora de provarmos, não a nós
mesmos, mas às sociedades que aqui
representamos, que estamos mais comprometidos
do que os resultados de nossas ações
até agora demonstraram.
O Brasil, ao lado dos países em desenvolvimento,
tem sido um permanente defensor do princípio
das responsabilidades comuns mas diferenciadas.
Trata-se de princípio consagrado na
maior parte dos acordos internacionais ambientais
e meu país, ao tempo em que o reafirma,
quer também dizer ao mundo que responsabilidades
diferenciadas não significam ausência
de responsabilidades. Por isso o Brasil tem
feito sua parte.
Durante a reunião de Buenos Aires,
o Brasil apresentou ao mundo sua Comunicação
Nacional. Na oportunidade, num trabalho de
altíssima qualidade e transparência,
apresentamos não apenas nosso inventário
de emissões, mas, também, as
ações que o nosso governo vinha
tomando para reduzi-las, especialmente no
que diz respeito à expressiva parcela
de 75% decorrentes do desmatamento na Amazônia.
É, portanto, com grande satisfação
que compareço aqui para anunciar que,
pela primeira vez, desde 1997, verifica-se
redução nas taxas de desmatamento
da Amazônia. Os dados de 2005, divulgados
no Brasil há dois dias, apontam uma
acentuada redução de 31% nessas
taxas.
É importante notar que se verificou
queda nas taxas de desmatamento em todas os
estados amazônicos, mas essa queda foi
particularmente forte nas áreas onde
houve maior intervenção do Governo
Federal por meio do Plano de Ação
para Prevenção e Controle do
Desmatamento na Amazonia, o mesmo plano que
apresentamos em Buenos Aires.
A queda na taxa de desmatamento do Brasil
é mostra inegável do compromisso
brasileiro com a redução das
emissões brasileiras. As ações
do Plano de Controle do Desmatamento não
constituem esforço desprezível.
Pelo contrário, pela variedade de atores
que afeta, pela grande quantidade de interesses
que contraia, o plano transformou-se num delicado
exercício de internalização
da variável ambiental em outros setores
do Governo.
Pelo seu alcance, complexidade e pelo número
de setores que envolve, o Plano exigiu coordenação
além da esfera ambiental. Ele é
coordenado no mais alto nível governamental,
pela Casa Civil, e acompanhado diretamente
pelo Presidente da República. Não
é um esforço da área
ambiental. É um esforço de Governo.
Estou falando do Brasil, mas vários
outros países em desenvolvimento têm,
igualmente, feito esforços no sentido
de compatibilizar suas legítimas aspirações
de desenvolvimento econômico com a conservação
do meio ambiente. Não há razões
para que países dotados de condições
econômicas e sociais altamente favorecidas
hesitem em assumir seus compromissos no âmbito
do Protocolo de Quioto sob a argumentação
de que países em desenvolvimento não
têm responsabilidades com o regime do
clima.
É fundamental que essa Conferência
reconheça os esforços dos países
em desenvolvimento e reconheça, também,
que a contribuição histórica
desses países para o estado atual do
clima do planeta é baixa. Essa é
a razão pela qual o Brasil não
aceita a idéia de metas e prazos compulsórios.
Temos defendido a noção de incentivos
positivos aos países em desenvolvimento
para que, levando em conta suas responsabilidades
diferenciadas, seus objetivos e circunstâncias
específicas, possam adotar políticas
e medidas e formular e implementar programas
nacionais para mitigar a mudança do
clima.
É com essa convicção
que saúdo os encaminhamentos dados
à proposta submetida por Papua Nova
Guiné e Costa Rica nesta Conferência
no sentido de que se possam avaliar as perspectivas
de adoção de incentivos positivos
para os países em desenvolvimento que
comprovarem seus esforços de conservação
das florestas. O valor das emissões
de gases de efeito estufa decorrentes do desmatamento
já é, hoje, significativo o
suficiente para que nos debrucemos sobre esse
problema e incluamos mecanismos que apóiem
esforços no sentido de sua contenção.
Para o Brasil, a despeito dos avanços
já alcançados, precisamos agora
fazer com que esses resultados sejam permanentes.
Isso implica, por parte da comunidade internacional,
o reconhecimento de que a conservação
das florestas tropicais é importante
para o equilíbrio climático
do planeta. Por isso, em adição
aos esforços que os países em
desenvolvimento já têm promovido,
é necessário que se avaliem
mecanismos pelos quais esses países
possam ser incentivados à adoção
de medidas nesse sentido.
Estou convencida de que esforços voluntários
para reduzir o desmatamento constituem uma
situação onde todos são
vencedores. Para o Planeta, de maneira geral,
assegura-se significativa redução
das emissões globais de gases de efeito
estufa. Para os países em desenvolvimento,
asseguram-se alternativas de desenvolvimento
que valorizem a floresta em pé, maximizando
os benefícios da exploração
sustentável dessas áreas e promovendo
a correta distribuição dos benefícios
econômicos, com transparência
e controle social.
Contudo, Senhor Presidente, os esforços
dos países em desenvolvimento para
a proteção de seus ecossistemas
podem ser anulados pela ausência de
comprometimento com as decisões que
tomamos no passado no âmbito desta Convenção.
Por isso, ao fim de minha fala, quero também
reiterar o apoio e o comprometimento do Brasil
com o Protocolo de Quioto, esse importante
instrumento internacional, objeto de tão
longas e complexas negociações
e que, agora em vigor, teve suas regras de
procedimento finalmente adotadas.
O Brasil, autor da idéia do MDL, ainda
em 1997, responsável pelo maior número
de projetos de MDL aprovados até o
momento pelo Executive Board, reitera a importância
de que esta Conferência lance, conforme
esperado, o processo de negociações
para o segundo período de compromissos
do Protocolo.
O que temos feito é, ainda, insuficiente.
A complexidade e a gravidade do problema das
mudanças climáticas requerem
respostas e ações ainda mais
fortes. O momento atual requer a superação
de antigos impasses e a construção
de políticas equilibradas que enfoquem
a questão do regime internacional de
mudança climática sob o prisma
dos impactos que já vivemos e daqueles
de mais longo prazo. Qualquer ação
contrária ou, pior, inação,
será a mensagem que daremos ao mundo
de que, afinal, o problema não merece
preocupações de nossa parte.
Muito obrigada.