13/12/2005 - Temas polêmicos
já conhecidos dos ambientalistas e
que ocuparam o noticiário em 2005,
como a transposição do rio São
Francisco, o controle sobre produtos transgênicos
e o Projeto de Lei (PL) 62/05, de gestão
de florestas públicas, são temas
de debates durante o evento, que teve início
sábado (10/12) e termina hoje, 13/12.
Também pode ser votada uma recomendação
para que a Conferência se transforme
na instância máxima de deliberação
do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama).
Mais de duas mil pessoas
estão participando da II Conferência
Nacional do Meio Ambiente (CNMA), que começou
no último sábado e termina nesta
terça-feira, dia 13 de dezembro, em
Brasília. O evento reúne mais
de 1,5 mil delegados representantes de organizações
não-governamentais, movimentos sociais,
comunidade científica, empresários,
sindicatos, populações tradicionais,
governos federal, estaduais e municipais de
todo o País. A II CNMA tem como tema
central “política ambiental integrada
e uso sustentável dos recursos naturais”
- a primeira CNMA aconteceu em novembro de
2003. A Conferência aprova diretrizes
que devem ser consideradas na formulação
e implementação da política
nacional do meio ambiente.
Temas polêmicos já
conhecidos dos ambientalistas e que ocuparam
o noticiário em 2005, como a transposição
do rio São Francisco, o controle sobre
produtos transgênicos e o Projeto de
Lei (PL) 62/05, de gestão de florestas
públicas, devem acalorar os debates
durante o evento. Também pode ser votada
uma recomendação para que a
Conferência torne-se a instância
máxima de deliberação
do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama),
papel hoje ocupado pelo Conselho Nacional
do Meio Ambiente (Conama), colegiado com 108
integrantes, entre representantes do governo,
de organizações ambientalistas
e entidades empresariais. A proposta é
do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos
Sociais para Meio Ambiente e Desenvolvimento
(FBOMS) e conta com o apoio do Ministério
do Meio Ambiente (MMA).
Na abertura do evento, na
tarde de sábado, a ministra do Meio
Ambiente, Marina Silva, fez questão
de comentar os assuntos que deverão
provocar controvérsias durante as discussões.
Marina afirmou que a aprovação
da Lei de Biossegurança, neste ano,
foi uma “derrota” não apenas do MMA,
mas também do País. Ela voltou
a repetir que, no caso do projeto de transposição
do rio São Francisco, coube ao ministério
que chefia apenas fazer o licenciamento da
obra, que está sendo contestado judicialmente.
MMA lista as vitórias
obtidas
A realização
da II CNMA vinha sendo alvo de questionamentos
porque algumas das propostas feitas durante
a primeira Conferência não foram
levadas em conta pelo governo. Em 2003, foram
aprovadas recomendações contrárias
à transposição do São
Francisco e à liberação
dos transgênicos, autorizada depois
pela Lei de Biossegurança. Algumas
organizações ambientais chegaram
a propor o boicote ao evento. Segundo o MMA,
mais de 70% das diretrizes encaminhadas à
administração federal pela I
CNMA já estão sendo implementadas.
Marina Silva citou o Plano
BR-163 Sustentável, o novo modelo do
setor elétrico e a queda nos índices
de desmatamento como vitórias de sua
pasta. “Esses exemplos comprovam que é
possível desenvolver uma política
ambiental integrada que seja adotada por todos
os setores do governo”, afirmou. A ministra
disse que, antes do governo Lula, a questão
do desmatamento nem chegava perto do Palácio
do Planalto e que, agora, como reflexo dessa
política integrada, o Plano de Ação
para Prevenção e Controle do
Desmatamento na Amazônia está
sendo coordenado pela Casa Civil.
Coube ao vice-presidente
da República e ministro da Defesa,
José Alencar, responder às críticas
que vieram a público, na semana passada,
por ocasião do anúncio da queda
nos índices de desmatamento de 31%
para o período de 2004-2005. Alguns
políticos e ambientalistas avaliaram
que, mais do que resultado das ações
do governo, o número seria fruto de
fatores temporários e circunstanciais,
como a queda na área plantada de soja.
Alencar leu comunicado assinado pelo Presidente
Lula, que repetia que a queda nos índices
de desmate deve-se a medidas “estruturantes”
aplicadas pelo governo e comparou o número
à suposta melhoria de outros indicadores
promovida pelo atual governo, como o decréscimo
na pobreza e na desigualdade de renda.
Também na cerimônia
de abertura do evento, Marina Silva assinou
a portaria ministerial que cria o conselho
gestor da Reserva de Biosfera do Pantanal.
Foi assinado ainda o convênio entre
a agência alemã KFW e o governo
brasileiro pelo qual serão aplicados
R$ 40 milhões em dois grandes corredores
ecológicos no País: o primeiro
partindo da cidade de Manaus (AM) até
a fronteira com a Colômbia e um segundo
localizado entre o Espírito Santo e
o sul da Bahia.
Diversidade de atores marca
evento
As polêmicas e a variedade
de posições existentes na Conferência
refletem a tremenda diversidade dos segmentos
que participam do evento. De um mesmo Grupo
de Trabalho (GT), principal espaço
de discussão do encontro, participam
desde delegados quilombolas, ribeirinhos,
indígenas e agricultores familiares
até técnicos da Confederação
Nacional da Indústria (CNI), defensores
do agronegócio, pesquisadores e integrantes
de ONGs. Além de setores tradicionalmente
identificados com o ambientalismo, grupos
menos conhecidos ou usualmente vinculados
a outros tipos de reivindicações
também marcam presença na Conferência,
como instituições que atuam
contra maus tratos a animais domésticos
e defensores dos direitos de portadores de
necessidades especiais. O desafio da Conferência
é justamente tentar construir consensos
mínimos a partir dos interesses dos
setores que dela participam.
"Pretendemos lutar
pela garantia da repartição
de benefícios para as populações
tradicionais, pelo uso de seus conhecimentos
e recursos, pela aprovação do
PL de gestão de florestas e pela criação
de um modelo diferenciado para a gestão
das bacias hidrográficas da Amazônia
que garantam a participação
das comunidades ribeirinhas”, explica Adilson
Vieira, secretário-geral do Grupo de
Trabalho Amazônico (GTA). Ele discorda
das críticas feitas à primeira
Conferência e acredita que o fórum
é um espaço fundamental como
instrumento de democracia participativa. “Nunca
pensei que todas as orientações
aprovadas na primeira Conferência seriam
implementadas pelo governo".
"Estamos apostando
em propostas para agilizar, modernizar e capacitar
o Sisnama”, afirma Patrícia Pozzon,
delegada da CNI. Ela qualifica de “moroso,
cartorial e burocrático” o processo
de licenciamento ambiental e avalia que grande
parte das decisões e normas aprovadas
pelo Conama não tem respaldo legal
e técnico. A solução
para o problema, segunda Patricía,
seria uma reforma dos órgãos
e instâncias do Sisnama, sobretudo do
Conama. “Pretendemos apresentar [uma proposta]
para revisão do Conama, para que ele
tenha uma composição mais paritária
e uma proposta para revisão do processo
de licenciamento, para que ela seja mais descentralizado,
mais objetivo e mais fácil de ser cumprido”.
A representante da CNI adianta que a idéia
é diminuir o número de conselheiros
do Conama e aumentar o número de representantes
do setor produtivo no Colegiado, além
de permitir, em alguns casos, a dispensa de
algumas das licenças previstas pela
legislação.
“Uma de nossas principais
preocupações diz respeito à
necessidade de criação de políticas
diferenciadas de meio ambiente para os territórios
indígenas e quilombolas, já
que eles são comprovadamente responsáveis
pela proteção de grande parte
de nossa biodiversidade”, informa a advogada
Fernanda Kaigang, representante dos povos
indígenas na comissão organizadora
da Conferência e delegada do Distrito
Federal. Ela avalia que, hoje, existem apenas
“tentativas” de implementar políticas
ambientais que levem em consideração
as particularidades regionais e culturais
dos povos indígenas. Fernanda avaliza
a crítica de que algumas das propostas
aprovadas na I CNMA não foram levadas
em conta pelo governo. Considera ainda que
o governo precisa garantir maior presença
indígena na Conferência com apoio
financeiro e logístico. Nbesta conferência
são 40 delegados representantes de
povos indígenas e tradicionais.
Discussões no GTs
No domingo, primeiro dia
oficial dos trabalhos, os delegados aprovaram
o regimento interno do evento e iniciaram
os debates sobre alguns temas específicos,
como política nacional de resíduos
sólidos, legislação para
pneus, plano nacional de recursos hìdricos,
PL da gestão de florestas públicas,
desmatamento e semi-áridos. Também
foram iniciadas as discussões nos cinco
GTs: Biodiversidade e Florestas; Recursos
Hídricos; Qualidade Ambiental nos Assentamentos
Humanos; Instrumentos de Desenvolvimento Sustentável;
de Fortalecimento do Sisnama e Controle Social.
Os GTs discutem e votam alterações
ao texto-base da Conferência, que deve
ser finalizado hoje, 13/12. Ontem, 12/12,
continuaram os debates nos GTs.
A II CNMA foi precedida
por 27 conferências regionais em todo
o País, que contaram com a participação
de mais de 86 mil pessoas. O processo que
culminou com a realização da
I CNMA mobilizou 65 mil pessoas. A eleição
de delegados para a Conferência respeita
a proporcionalidade estabelecida pelo regimento
interno do evento e que prevê 50% de
delegados de movimentos sociais e ONGs, 30%
do setor empresarial e 20% do governo.