14/12/2005 - O estudo Guarapiranga
2005 - Diagnóstico Socioambiental Participativo,
produzido pelo Instituto Socioambiental e
apresentado na última terça-feira,
12 de dezembro, atualiza a grave situação
de um dos mais importantes mananciais da Região
Metropolitana de São Paulo. Apresenta
também a real dimensão de processos
crescentes de desmatamento, ocupação
e urbanização que podem comprometer
o abastecimento de água de quase 4
milhões de pessoas.
A ausência de saneamento,
o crescimento urbano e de atividades humanas
comprometem mais da metade da Bacia Hidrográfica
da Guarapiranga, o segundo manancial mais
importante da Região Metropolitana
de São Paulo (RMSP). Esta é
a principal conclusão do estudo Guarapiranga
2005 - Diagnóstico Socioambiental Participativo,
produzido pelo Instituto Socioambiental e
apresentado na última terça-feira,
12 de dezembro, em São Paulo.
A bacia da Guarapiranga
ocupa uma área de 63.911 hectares e
produz 14 mil litros de água por segundo,
sendo responsável pelo abastecimento
de 3,7 milhões de pessoas residentes
na região sudoeste da Grande São
Paulo. Apenas a bacia da Billings produz mais
água para a metrópole. Com base
em dados e imagens de satélite coletados
em 2003, e checagens de campo realizadas este
ano, o estudo do ISA apresenta uma caracterização
geral da Guarapiranga, a dinâmica de
ocupação e uso do solo ocorrida
na região entre 1989 e 2003, as principais
ameaças para sua sustentabilidade -
em especial para a produção
de água – além de perspectivas
e recomendações para a melhoria
das políticas públicas direcionadas
aos mananciais da RMSP.
O diagnóstico chama
a atenção para os riscos que
a degradação em curso representa
para a capacidade de abastecimento público
da população da maior metrópole
brasileira. Revela que a bacia da Guarapiranga
vem sendo desmatada, alterada, ocupada e urbanizada
em ritmo crescente e sem planejamento ou controle
algum. Os dados do ISA demonstram, por exemplo,
que a população residente na
bacia aumentou em 210 mil pessoas no período
de 1991 a 2000 (um aumento de quase 40%) e
que quase 20% da região já está
totalmente urbanizada.
O relatório do ISA
sustenta também que a tendência
de ocupação atual da região
segue um modelo diferente do verificado nos
anos noventa. Em vez de grandes loteamentos
clandestinos abertos e logo urbanizados, o
que se vê hoje ao redor da represa é
o desmatamento de áreas para usos diversos,
o surgimento gradual de núcleos de
moradia e o adensamento progressivo destes
núcleos. O estudo mostra que 42% do
território sofre algum tipo de intervenção
humana, como a abertura de pastagens, lavouras,
minerações e movimentações
de terra. São estas intervenções
que dão origem aos núcleos habitacionais
que se adensam – muitas vezes em locais proibidos
ou perigosos, como encostas ou perto de corpos
d' água.
A situação
é tão grave que nem as áreas
de preservação estão
sendo poupadas: o levantamento mostra que
cerca de 37% das Áreas de Proteção
Permanente (APPs) inseridas na bacia foram
invadidas ou ocupadas. A vegetação
nativa, por sua vez, fundamental para produção
de água com qualidade, foi reduzida
a pouco mais de um terço da área
da bacia. Apesar de sua importância
e da enorme pressão humana, apenas
1,2% da área total da Guarapiranga
é composta por Unidades de Conservação
de proteção integral. Isso faz
com que quase a totalidade das áreas
cobertas por Mata Atlântica na região
esteja desprotegida, uma vez que as ações
de fiscalização e controle têm
se mostrado insuficientes. Tanto é
assim que este ano foram identificadas áreas
de carvoria na região, conforme notícia
publicada pelo ISA no começo de maio.
A diminuição
da mata, a intensa ocupação
humana e a superexploração da
represa para abastecimento estão contribuindo
para a redução de sua área.
Se há 15 anos 4,3% da área total
da bacia era ocupada por corpos d' água,
hoje este número não passa de
3,5%, o que significa que o espaço
ocupado pela água vem diminuindo progressivamente:
em 30 anos a represa encolheu em 20%.
De acordo com dados do IBGE
compilados no diagnóstico, cerca de
776 mil pessoas viviam dentro da bacia da
Guarapiranga em 2003. Hoje pode ser mais de
800 mil. Mais da metade dessa população
(53.9%) não tem rede de esgoto instalada
em suas residências. E as redes existentes,
por falta de investimentos, continuam despejando
o esgoto na represa. Deste modo, a grande
concentração de poluentes presente
na represa tem origem nos esgotos domésticos
e na poluição difusa gerada
na bacia, proveniente das atividades antrópicas
(agricultura, solo exposto, mineração,
pastagem) e dos resíduos urbanos e
rurais. Tudo isso compromete a qualidade da
água nos pontos de captação
medidos no estudo onde, em tese, a qualidade
deveria ser melhor do que em outros pontos
da represa.
O estudo, apresentado nas
dependências do Senac (Serviço
Nacional do Comércio) Santo Amaro,
aponta ainda para o agravamento deste quadro
com a construção do trecho sul
do Rodoanel. Isto porque os impactos da obra
– como o assoreamento de nascentes e o desmatamento
- serão potencializados pela péssima
situação já existente
na região. Finalmente, o estudo do
ISA apresenta um conjunto de recomendações
relacionadas à ocupação
urbana, ampliação de parques,
recuperação de áreas
de preservação, propostas que
serão detalhadas em seminário
a ser realizado pelo ISA em 2006, ano em que
a Guarapiranga completa seu primeiro centenário.
Programa Guarapiranga:
muito dinheiro, pouco resultado
Durante a década
de 11000, foi desenvolvido pelo governo do
estado de São Paulo a maior intervenção
já ocorrida em área de manancial:
o Programa de Recuperação Ambiental
da Guarapiranga, com investimentos superiores
a US$ 300 milhões financiados pelo
Banco Mundial (BIRD). O programa tinha como
objetivo geral assegurar a qualidade da água
do manancial para o abastecimento da Região
Metropolitana de São Paulo por meio
de dois objetivos específicos: desenvolver
a capacitação técnica,
financeira e institucional para a gestão
da bacia e melhorar a qualidade de vida de
seus habitantes, otimizando e expandindo a
infra-estrutura urbana e de saneamento, além
de executar medidas de recuperação
e proteção ambiental, como intervenções
em áreas degradadas e implantação
de parques.
A despeito dos investimentos
realizados, entretanto, apenas metade dos
domicílios da bacia da Guarapiranga
conta com algum sistema de coleta de esgoto.
E a maioria deste esgoto continua sendo despejada
na represa, já que não há
redes para transportá-lo até
as estações de tratamento. Os
parques criados no âmbito do Programa
Guarapiranga, por sua vez, aumentaram em apenas
450 hectares as áreas protegidas na
bacia. Mesmo assim, apenas 1,2% (770 hectares)
da área da bacia encontra-se protegida
por Unidade de Conservação de
proteção integral, o Parque
Estadual da Serra do Mar, enquanto ainda existem
mais de 23.500 hectares cobertos por Mata
Atlântica (39% da bacia) em seus diferentes
estágios de regeneração
insuficientemente protegidos.