Fernando Falcão
Gerente executivo substituto do Ibama no Rio
Grande do Sul
(15/12/05) - Para o gerente
executivo substituto do Ibama no Rio Grande
do Sul, Fernando Falcão, o serviço
de inteligência do Ibama (Geica) é
fundamental para modernizar a fiscalização
do órgão. Falcão, que
responde pela setor de Fiscalização,
coordenou, em conjunto com a Polícia
Ambiental da Brigada Militar (PM gaúcha)
e a Polícia Federal, a Operação
Trinca-Ferro, que culminou ontem com a prisão
em cinco estados de nove traficantes internacionais
de animais silvestres e a apreensão
de cerca de 2 mil pássaros, aves, saguis
e tartarugas.
A Operação
Trinca-Ferro chegou ao fim?
Não. Após
dois anos de investigação, nós
conseguimos um volume de informações
que nos permitiram montar um banco de dados
que certamente nos dará condições
de mapear e cercar a prática do crime
em extensão maior. Nesse sentido, a
Trinca-Ferro nos deu mais do que o resultado
objetivos, que foi a prisão dos traficantes
e a apreensão dos animais. Neste momento,
emitiremos os laudos de identificação
dos animais apreendidos. Faremos a perícia
das anilhas (pequena argola do Ibama colocada
na patinha dos pássaros), pois descobrimos
vários casos de duplicidade delas.
Além disso, autuaremos as pessoas presas,
ou seja, aplicaremos as multas. Como a Lei
de Crimes Ambientais prevê multa de
R$ 500 por pássaro apreendido e mais
R$ 5 mil por espécie em extinção
apreendida, estimamos que as multas cheguem,
no conjunto, a R$ 1,1 milhão. Vamos
cobrá-las. Se não pagarem, serão
inscritos na Dívida Ativa da União.
No âmbito penal, os inquéritos
seguirão correndo na Polícia
Federal, e é muito provável
que resultem em novas prisões. Vamos
solicitar também, à Presidência
do Ibama, o cancelamento dos registros dos
envolvidos (presos) como criadores autorizados
de animais silvestres. Vamos sugerir que todo
criador autuado pelo Ibama tenha a sua licença
automaticamente cancelada. Isso evitará
o que vem ocorrendo hoje: apesar de, nos últimos
anos, termos autuado e multado a maioria das
pessoas que agora foram presas, elas continuavam
agindo ilegalmente a partir de seus criadouros
autorizados.
Como surgiu a investigação?
A partir do Grupo Especial
de Investigação de Crimes Ambientais
(Geica/Ibama). O Geica é um serviço
de inteligência fundamental ao trabalho
do Ibama. A atuação no varejo
está ultrapassada. Estamos nos modernizando
para fazer frente ao modo de ação
dos infratores. O Ibama começa a agir
como serviço de inteligência
ambiental. Foi a partir daí que tudo
começou. Um fiscal nosso participou
de treinamentos em investigação
e pôs em prática o que aprendeu.
Eles se infiltrou entre os infratores e foi
descobrindo o tráfico. A importância
do Geica é tal que queremos implantar
um núcleo na gerência do RS.
Já recebemos de Brasília para
o setor computadores, máquinas fotográficas,
telefones celulares etc..Dois outros fiscais
serão treinados. Estamos desenvolvendo
um programa de computador para organizar um
banco de dados e poder fazer o cruzamento
de dados. Isso facilitará muito o nosso
trabalho e também, quando for o caso,
de parceiros como a Polícia Ambiental
da Brigada Militar, o Ministério Público
e a Polícia Federal. Vale dizer, nesse
sentido, que temos tido todo o apoio institucional
da Coordenação Geral de Fiscalização
(CGFIS) e da Diretoria de Proteção
Ambiental do Ibama (Dipro).
Como foi o trabalho de parceria
do Ibama com a Polícia Federal e a
Polícia Ambiental da Brigada Militar?
Já vínhamos
trabalhando com a Polícia Ambiental
da Brigada Militar, principalmente em ações
de rotina. Mas esta é a primeira vez
(Operação Trinca-Ferro) que
trabalhamos com eles numa ação
de investigação. O mesmo ocorreu
com a Polícia Federal. A colaboração
foi total e recíproca, como aliás
havia ocorrido, em parte, na Operação
Caa-ete, que desbaratou quadrilha de contrabando,
falsificação e produção
ilegal de agrotóxicos. A Trinca-Ferro,
contudo, foi a primeira vez em que ocorreu
uma parceria institucional do ponto de vista
do compartilhamento de informações.
O encadeamento das informação
foi a chave do sucesso da operação,
assim como a percepção pelas
gerências do Ibama em todos os estados
da dimensão do quadro. Foi decisivo
também o apoio recebido do diretor
de Proteção Ambiental do Ibama),
Flávio Montiel, do diretor geral de
Fiscalização, Arty Fleck, e
do diretor do Geica, José Carlos Araújo
Lopes. Às vezes o Ibama é criticado
por apreender animais domésticos, separando-os
de seus “donos”.
Como o senhor vê essas
críticas?
As pessoas e alguns jornalistas
às vezes não entendem quando
o Ibama apreende algum animal silvestre sem
registro. Aqui no RS sofremos recentemente
um bombardeio de críticas pela apreensão
da macaca Brigite. A abordagem sentimental
não é o melhor caminho, pois,
para que um animal desses chegue ao comprador
final, nove morreram no caminho, debaixo de
maus tratos. A mera compra do animal alimenta
o tráfico. Ele acaba contribuindo para
o tráfico. É preciso analisar
a questão com equilíbrio. O
importante é que as pessoas não
adquiram o animal silvestre proibido, pois
assim, iniciado o processo, tudo fica mais
difícil para todos. Hoje, por conta
do interesse do receptador e da riqueza de
sua biodiversidade (o Brasil possui a metade
das aves do mundo), o Brasil entrou na rota
do tráfico internacional de espécies
animais e também vegetais. Por outro
lado, como País de maior biodiversidade
do mundo, nós temos a responsabilidade
de preservar o meio ambiente para as futuras
gerações. Temos de dar o exemplo.
Nesse caminho, o trabalho do Ibama deve cada
vez mais se qualificar e se modernizar para
enfrentar os problemas, em conjunto com outros
órgãos da administração
pública. Vale dizer que os governos
de países como Estados Unidos e da
União Européia, destinatários
preferenciais da biodiversidade traficada
do Brasil, deveriam assumir sua cota de responsabilidade,
em nome da preservação do meio
ambiente global.
Quais os animais mais procurados?
Araras, papagaio e tucano,
macacos, tartatuga, jabuti, entre outros.
Os criadouros comerciais
autorizados não acabam se tornando
um incentivo ao tráfico de animais?
Quando o Ibama os autorizou,
o objetivo era justamente o oposto. Aliviando
a pressão, pretendíamos reduzir
a ocorrência do delito. Acontece que
estamos percebendo que há pessoas que
usam esses criadouros para “esquentar” bichos.
Vamos analisar se vale a pena continuar com
esta autorização. Talvez se
possa pensar em “chipar” os bichos, cobrando
a conta, claro, dos criadores. Não
podemos esquecer que a grande maioria dos
animais não pode ser devolvida à
natureza, é um processo caro para o
Poder Público, um dinheiro que poderia
ser utilizado de maneira mais proveitosa.
Nós esperamos que operações
como a Trinca-Ferro sejam sobretudo esclarecedoras
e educativas. Precisamos e contamos com a
participação da sociedade. Pedimos
que as pessoas nos comuniquem quando tiverem
informações. O desmatamento,
por exemplo, tem reflexos graves da fauna.
A destruição natural é
o primeiro fator de perda de biodiversidade.
As aves, por exemplo, morrem ou migram. Mas
nem sempre migrar é uma opção.
Ave de campo, como por exemplo a perdiz, só
faz ninho nesse ambiente.