30/01/2006
- Um dos principais os impactos ambientais
que a obra de duplicação de
rodovia BR-101 Sul está causando é
a alteração do ambiente onde
vivem as comunidades remanescentes do Quilombo
de Morro Alto, no município de Maquine
(RS). Segundo a antropóloga Cíntia
Beatriz Muller, da Universidade Federal do
Rio Grande do Sul (UFRGS), são 230
famílias que reivindicam uma área
de aproximadamente 4.630 hectares.
A pesquisadora explica que
os quilombolas de Morro Alto são provenientes
de um antigo quilombo formado por velhos libertos
pela Lei dos Sexagenários (1885), foragidos,
escravos em trânsito entre senzalas,
e africanos livres desembarcados ilegalmente
no litoral. Há uma especificidade de
que uma ex-senhora de escravos da região,
chamada Rosa Osório Marques, doou em
testamento um legado de terras para alguns
de seus ex-escravos.
Morro Alto também
é famoso desde 1872 por seu "Maçambique",
congada que se realiza anualmente no dia 13
de maio, quando Nossa Senhora do Rosário
visita São Benedito na localidade de
Aguapés, e em outubro, na cidade de
Osório (RS). Atualmente, grande parte
dos dançantes e demais componentes
do grupo vivem em Osório, mas os ex-maçambiques
de Morro Alto, seguidamente, rememoram sua
impressões das festas de antigamente.
A comunidade negra de Morro
Alto e seus vários núcleos estão
localizados ao longo da BR-101 que, atualmente,
está sendo duplicada. De acordo com
informações registradas pelo
Observatório Quilombola (www.koinonia.org.br),
em audiência pública realizada
no Ministério Público Federal,
em julho de 2005, foi oficializado compromisso
por parte do Departamento Nacional de Infra-Estrutura
de Transportes (Dnit) de suspender o pagamento
das indenizações no trecho Osório,
Maquiné, na área que se encontra
sob análise por parte do Incra/RS,
para a titulação do quilombo
de Morro Alto.
Nessa mesma audiência,
o Incra se comprometeu a elaborar o levantamento
da cadeia dominial para apurar quem são
os verdadeiros donos das terras, uma vez que
há controvérsias entre os quilombolas
e pequenos agricultores que reivindicam para
si a propriedade. Na ocasião, o representante
da Secretaria Especial de Promoção
Politicas de Igualdade Racial (Seppir), Ivan
Brás, afirmou que "é de
interesse do governo federal tanto a manutenção
dos quilombolas em sua área quanto
à duplicação da BR-101".
Enquanto o caso não se resolve na justiça,
o procurador-geral do Dnit, Júlio Cezar
Pereira, afirmou que o dinheiro das indenizações
será depositado em juízo.
Na mesma audiência,
provocada pelos quilombolas e pelo Ministério
Público do Estado do Rio Grande do
Sul, o presidente da Associação
Comunitária Rosa Osório Marques,
Wilson Marques da Rosa, denunciou "o
uso indiscriminado dos recursos naturais da
comunidade nas obras de duplicação
da BR-101". A construção
do complexo de túneis de Morro Alto,
que encurtará o traçado da estrada
em 11 quilômetros, "abre um rombo
imenso, indescritível, em área
quilombola, que também é uma
área de reserva da biosfera que possui
os últimos resquícios nativos
de Mata Atlântica no estado do Rio Grande
do Sul", afirmou o líder quilombola.
Para a coordenadora-geral
de Meio Ambiente do Departamento Nacional
de Infra Estrutura de Transportes (Dnit),
Ângela Parente, a alternativa para amenizar
o impacto foi a construção do
túnel de Maquiné, em Morro Alto.
"Provavelmente essa também será
a solução para transpormos o
Morro do Algodão, em Santa Catarina,
ocupado por uma aldeia indígena Guarani",
concluiu.
Inaugurada em 1968, a rodovia,
que atravessa 27 municípios no trecho
entre Florianópolis (SC) e Osório
(RS), na época se constituiu na principal
via de comunicação para os habitantes
ribeirinhos. Agora a estrada precisa crescer,
dobrar de largura, para dar passagem a oito
mil caminhões, centenas de ônibus
e 20 mil carros de passeio que diariamente
trafegam rumo ao norte ou ao sul, não
mais só da região ou do estado,
mas do continente, se constituindo em um dos
principais canais para a integração
dos países da América do Sul.