15/02/2006 - Foi aprovado nesta quarta no Senado,
o Projeto de Lei nº 285/99, que dispõe
sobre a proteção da vegetação
nativa do Bioma Mata Atlântica. O projeto
demorou 14 anos para ser aprovado, sofreu mais
de 80 emendas e enfrentou forte oposição
da bancada ruralista. “Eu pessoalmente nem sei
como comemorar depois de 14 anos esperando”,
conta Miriam Prochnow, Coordenadora Geral da
Rede.
Apresentado em outubro
de 1992, o texto define e regulamenta
os critérios de uso e proteção
do bioma, reduzido atualmente a 7,3%
de sua vegetação original,
além de estabelecer uma série
de incentivos econômicos à
produção sustentável.
Cria também incentivos financeiros
para restauração dos ecossistemas,
estimula doações de iniciativa
privada para projetos de conservação,
regulamenta o artigo da Constituição
que define a Mata Atlântica como
Patrimônio Nacional, delimita
o seu domínio, proíbe
o desmatamento de florestas primárias
e cria regras para exploração
econômica. A aprovação
dessa lei deve garantir a proteção
e recuperação dos poucos
remanescentes da Mata Atlântica,
que é o bioma mais ameaçado
do país e o segundo mais ameaçado
do mundo. Miriam Prochnow ressalta,
entretanto, que a luta continua, pois
o projeto volta para a Câmara
por conta das emendas aprovadas.Depois
disso começa a luta para cobrar
que a lei seja cumprida: “A luta deste
PL se confunde com a história
da RMA. É a nossa vitória,
o que não significa que não
teremos outras lutas pela frente. Agora
vamos lutar para que os avanços
do texto sejam aplicados o quanto antes”. |
Histórico
da luta:
Outubro de 1992:
o deputado federal Fabio Feldmann (SP) apresenta
à Câmara dos Deputados o PL nº
3.285, que trata da utilização
e da proteção da Mata Atlântica,
com apenas 12 artigos.
Fevereiro de 1993:
é encaminhada à Comissão
de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias
(CDCMAM), única comissão de
mérito indicada para se pronunciar
sobre o assunto. A deputado Rita Camata (ES)
indicada relatora da Comissão. Porém,
a matéria fica sem ser apreciada até
o fim da legislatura 1991- 1994, quando é
arquivada.
Fevereiro de 1995:
reeleito deputado por São Paulo, Fabio
Feldmann solicita o desarquivamento do PL
nº 3.285/92, que passa a ser o texto
principal sobre o tema no âmbito da
Câmara dos Deputados.
Fevereiro de 1995:
a fim de restringir o alcance do Decreto nº
1000/93 – então o mais eficaz instrumento
legal de proteção à Mata
Atlântica -, o deputado Hugo Biehl (SC)
apresenta o PL nº 69/95, por meio do
qual limita a abrangência da Mata Atlântica
ao domínio da floresta ombrófila
densa e às formações
pioneiras com influência marinha (restingas)
e com influência fluviomarinha. O PL
nº 69/95 é anexado ao PL nº
3.285/92.
Março de
1995: o texto é encaminhado
à Comissão de Defesa do Consumidor,
Meio Ambiente e Minorias (CDCMAM) e tem como
relator o deputado Wilson Branco.
Junho de 1995:
apresentado o PL nº 635/95, de autoria
do deputado Rivaldo Macari (SC), que exclui
dos limites da Mata Atlântica as florestas
ombrófilas mistas, ou florestas de
araucária, uma das mais ameaçadas
no país. É também anexado
ao PL nº 3.285/92.
Agosto de 1995:
a CDCMAM aprova a proposta de seu relator,
deputado Wilson Branco, com o acréscimo
de nove emendas ao PL original. São
rejeitadas integralmente as teses contidas
nos PLs nº 69/95 e nº 635/95, dos
deputados Hugo Biehl e Rivaldo Macari. Coordenada
pelos deputados Fabio Feldmann e Sarney Filho
(MA), presidente da comissão, a aprovação
suscita reação furiosa de madeireiros
e ruralistas.
Setembro de 1995:
inconformado com a aprovação
do PL na CDCMAM, os deputados Paulo Bornhausen
(SC) e José Carlos Aleluia conseguem
que o PL seja enviado à Comissão
de Minas e Energia (CME), impedindo que a
matéria seguisse para a Comissão
de Constituição, Justiça
e Redação (CCJR). Em sua justificativa,
Bornhausen, que assume a relatoria do PL na
CME, afirma que o texto aprovado na CDCMAM
afeta a geração e o consumo
de energia, uma vez que restringe a produção
de lenha.
Outubro de 1997:
no dia 22, a CME aprova o substitutivo ao
PL nº 3.285/92, de autoria do deputado
Paulo Bornhausen. Os deputados Luciano Zica
(SP) e Octávio Elísio (MG) apresentam
voto em separado, alegando que o substitutivo
“subverte os propósitos do PL 3285/92,
vale dizer, ao invés de proteger a
Mata Atlântica, vai permitir a destruição
dos exíguos remanescentes dessa floresta”.
No mesmo dia, o deputado Luciano Zica apresenta
recurso à presidência da Câmara
dos Deputados, solicitando a rejeição
do substitutivo, sob a justificativa de ter
havido desrespeito ao Regimento Interno da
casa, já que a Comissão abordou
questões que não eram de sua
competência. A armação
é denunciada também em plenário
pelos deputados Zica e Octávio Elísio.
Na mesma sessão, o relator do substitutivo,
Paulo Bornhausen, reconhece o equívoco
do procedimento por ele conduzido na Comissão.
Novembro de 1997:
o presidente da Câmara, Michel Temer
decide em favor do recurso apresentando pelo
deputado Luciano Zica, sob o argumento de
que a Comissão de Minas e Energia “extrapolou
os limites regimentais de sua competência”
ao aprovar o substitutivo do deputado Paulo
Bornhausen. A matéria é devolvida
à CME, com a orientação
de que seu parecer seja reformulado.
Dezembro de 1997:
um acordo entre líderes partidários
resulta em uma proposta que é enviada
para votação no plenário
da Câmara dos Deputados em regime de
urgência. Porém, diante do temor
de ambientalistas quanto aos possíveis
efeitos de algumas das mudanças promovidas
no âmbito dessa negociação,
a proposta é retirada da pauta.
Junho de 1998:
o deputado Odelmo Leão, da bancada
ruralista, solicita a inclusão da Comissão
de Agricultura e Política Rural entre
as comissões habilitadas a apreciar
a matéria; seu pedido é negado.
Fevereiro de 1999:
com o fim da legislatura 1995-98, o PL nº
3.285/92 é arquivado. Fabio Feldmann
não se reelege e o deputado Jaques
Wagner (BA) apresenta um novo texto sobre
o tema, tomando como base a proposta negociada
no final de 1997, que recebe o nº 285/99.
No mesmo mês, porém, uma nova
interpretação do Regimento Interno
da Casa permite o desarquivamento do PL nº
3.285/92, a fim de restabelecer a tramitação
de um dos projetos a ele anexados.
Junho de 1999:
os ruralistas solicitam, pela segunda vez,
a inclusão da Comissão de Agricultura
e Política Rural entre aquelas habilitadas
a emitir parecer sobre o PL nº 285/99.
A solicitação, que tinha como
objetivo alterar pontos que contrariavam os
interesses do setor rural, especialmente os
limites do domínio da Mata Atlântica,
é negada mais uma vez.
Agosto de 1999:
a Comissão de Minas e Energia (CME)
decide pela “incompetência para se pronunciar
sobre o PL nº 3.285/92”.
Dezembro de 1999:
após meses de debate e de pressão
da sociedade civil, a Comissão de Defesa
do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias aprova
o substitutivo do deputado paranaense Luciano
Pizzatto ao PL nº 285/99, do deputado
Jaques Wagner. O texto aprovado, com 66 artigos,
tenta superar o conflito em torno da configuração
geográfica da Mata Atlântica
adotando o conceito de “Ecossistemas Atlânticos”,
sob o qual mantém a descrição
contida no texto original. O substitutivo
aparece dividido em seis títulos, um
dos quais (Título IV) defende que o
Poder Público “estimulará, com
incentivos econômicos, a proteção
e o uso sustentável dos Ecossistemas
Atlânticos”, o que suscitará
um novo front de oposição ao
projeto.
Abril de 2000:
o substitutivo ao PL nº 285/99 é
anexado ao PL nº 3.285/92, que reassume
seu estatuto de texto principal. Com isso,
a proposta do então deputado Fabio
Feldmann passa a ter três PLs anexados
– além do substitutivo, os PLs nº
69 e nº 635.
Maio de 2001:
o relator da matéria na Comissão
de Constituição, Justiça
e Redação (CCJ), Fernando Coruja
(SC), assina parecer no qual considera o PL
nº 3.285/92 “inconstitucional” por “invadir
a seara normativa do Presidente da República
ao atribuir uma série de competências
a órgãos e entidades integrantes
da estrutura do Poder Executivo”. Porém,
decide pela “constitucionalidade, juridicidade
e boa técnica” do substitutivo ao PL
nº 285/99, ao qual propõe modificações
por meio de subemenda substitutiva, e dos
PLs nº 69 e nº 635. Curiosamente,
as mudanças do relator ao PL nº
285 apresentam problemas de redação,
que interferem no mérito da proposta.
Maio de 2002:
A CCJ aprova proposta do deputado Inaldo Leitão
que dá nova redação ao
parecer pelo deputado Fernando Coruja, corrigindo
os problemas anteriormente identificados.
Junho de 2002:
um novo acordo de lideranças permite
levar os PLs à votação
no plenário da Câmara. Porém,
um requerimento da bancada ruralista acaba
por retirá-lo da pauta. Na ocasião,
circulam informações de que
a área econômica do governo também
tinha restrições ao capítulo
que trata dos incentivos econômicos
para a proteção da Mata Atlântica,
que desrespeitaria a Lei de Responsabilidade
Fiscal.
Fevereiro de 2003:
o PL nº 285/99 é, mais uma vez,
incluído na pauta de votação
do plenário da Câmara dos Deputados.
Porém, resulta em nova retirada do
texto da pauta, já que o governo recém-empossado
ainda não havia apreciado a matéria.
Março 2003:
um acordo entre a liderança do PT na
Câmara, o Ministério do Meio
Ambiente e o Ministério da Fazenda
resulta em parecer favorável, por parte
do governo federal, à aprovação
do PL da Mata Atlântica. O texto aguarda
nova oportunidade para ser incluído
na pauta de votação da Casa.
Dezembro de 2003:
Finalmente o projeto é aprovado na
Câmara dos Deputados.
Fevereiro de 2006:
O projeto é aprovado no Senado
Federal, com emendas, o que significa que
deve voltar para a Câmara.