27/03/2006 Senhoras e Senhores,
Gostaria de iniciar esta
minha fala com alguns agradecimentos.
Desde os primeiros contatos que tive com o
Governo do Estado e com a Prefeitura da Cidade,
pude perceber o grau de profissionalismo e
qualidade com que poderíamos contar
para esta reunião. Mais do que isso,
encontrei carinho, respeito e dedicação
em cada cidadão desta cidade que já
virou destaque em todo o mundo por suas avançadas
propostas de desenvolvimento urbano e ambiental.
Ao Governador Roberto Requião e ao
Prefeito Carlos Alberto Richa, meu carinho
e meu profundo agradecimento.
Agradeço também ao Ministério
das Relações Exteriores, aqui
representado pelo meu amigo Celso Amorim,
que se engajou de maneira firme e determinada,
com uma grande equipe, a fim de permitir uma
reunião de alta qualidade em todos
os aspectos.
Finalmente, agradeço à toda
a equipe do Ministério do Meio Ambiente,
particularmente à Secretaria de Biodiversidade
e Florestas, à Assessoria para Assuntos
Internacionais e à Secretaria Executiva
que, com compromisso e dedicação,
possibilitaram a realização
desta Conferência no Brasil.
Senhoras e Senhores,
É com grande senso de responsabilidade
que o Brasil sedia a 8a Reunião da
Conferência das Partes da Convenção
sobre Diversidade Biológica.
Para o Brasil, sediar a COP-8 é uma
conseqüência natural do tratamento
que temos dado à questão ambiental
em nosso País e da forma com que temos
procurado incluir esse tema nas nossas relações
bilaterais, regionais e multilaterais.
Temos a convicção de que nossas
políticas internas, por mais sérias
e efetivas que sejam, precisam encontrar amparo
em um amplo entendimento multilateral que
reflita o que queremos para o nosso planeta.
Este segmento da Conferência é
um grande desafio para todos nós. Esse
desafio deve ir além de contribuir
para as negociações que se encontram
ora em curso. Inclui, também, encontrar
o elo entre o que discutimos aqui e o que
acontece nas salas de negociação.
Não é por outra razão
que vários de nossos países
têm sinalizado ao Secretariado da Convenção
que o segmento de alto nível deve ser
mais bem integrado na agenda da Reunião
da Conferencia das Partes.
Senhores e Senhoras,
Alegra-me saber que eu e o Secretário
Executivo da Convenção, Sr.
Ahmed Djoghlaf, partilhamos com a mesma intensidade
das preocupações com o déficit
de implementação dos acordos
multilaterais ambientais. Em poucos meses
à frente desse desafiante cargo, o
Secretário Ahmed tem dado mostras de
um entusiasmo incansável em busca das
soluções para os impasses e
desafios que vivemos para a implementação
da Convenção.
Suas idéias, sugestões, propostas
e sonhos são, para mim, a garantia
do apoio que o Governo Brasileiro poderá
receber do Secretariado durante nosso período
de exercício na Presidência da
Conferência das Partes.
É preciso que nos debrucemos com honestidade
na busca das razões desse déficit
e que avancemos na discussão dos meios
e formas para implementar a grande quantidade
de decisões já tomadas por nossos
países.
Por um lado, existem inegáveis dificuldades,
enfrentadas pela maior parte dos países
em desenvolvimento, para cumprir com suas
obrigações.
Nunca é demais lembrar os compromissos
internacionais - previstos na própria
Convenção e fundamentados pelos
Princípios da Cúpula do Rio.
Destaco, em particular, aqueles que condicionam
o cumprimento das obrigações
pelos países em desenvolvimento à
efetiva implementação, por parte
dos países desenvolvidos, de seus compromissos
no tocante à provisão de recursos
financeiros e transferência de tecnologia.
Por outro lado, para todos os países,
desenvolvidos ou em desenvolvimento, são
necessárias determinação
e vontade política para traduzir em
ações as decisões assumidas
no âmbito desta Convenção.
Tenho certeza de que não faltam determinação
e vontade política aos meus colegas,
meus pares, Ministros do Meio Ambiente.
Há falta de recursos, sim, mas há,
também, razões de ordem interna
e choques de interesses com expressivos setores
da sociedade.
Lamentavelmente, para alguns, há ainda
uma falsa dicotomia entre conservação
ambiental e desenvolvimento econômico.
Por essa razão, procurei, de maneira
insistente, incluir a transversalidade na
construção de políticas
públicas de governo, de forma a superar
o histórico isolamento do setor ambiental
em relação ao centro do planejamento
e das decisões de Estado.
Sei que internalizar a política ambiental
nas ações de todos os agentes
de governo é uma tarefa difícil,
de longo prazo, mas que exige um ponto de
partida forte e determinado. Podemos hoje
dizer que estamos construindo uma política
ambiental transversal no Estado Brasileiro.
O governo do Presidente Lula constitui uma
importante inflexão na forma de se
fazer política em nosso País:
o compromisso de incorporar a variável
ambiental no coração do processo
de tomada de decisões do setor público.
Esse é o caminho. É inadmissível
abrir mão dele ou sequer pensar em
relaxar na sua construção simplesmente
porque existem dificuldades.
Na esfera internacional, também, não
há outro caminho que não o da
transversalidade.
Não é por outra razão
que, enquanto nos reunimos, aqui, Ministros
do Meio Ambiente, as delegações
de muitos de nossos países estão
compostas por representantes de setores governamentais
tão distintos como agricultura, ciência
e tecnologia, saúde, educação,
planejamento, economia, entre outros.
Temos, ainda, também aqui representados,
diversos setores não-governamentais,
igualmente influentes nas decisões
que se tomam nesta Conferência.
No meu País e, imagino, em vários
outros aqui representados, as posições
de governo para esta Conferência demandaram
uma ampla articulação para que
se pudesse conciliar todos os interesses.É
fundamental, portanto, que nós, Ministros,
possamos também avançar nesse
processo.
Por essa razão, decidi ousar um pouco
no formato desse segmento ministerial.
No processo preparatório para esta
COP, fiz diversos contatos, inclusive com
alguns de vocês aqui presentes, e percebi
um aparente consenso em torno da necessidade
de um enfoque inovador para o segmento de
alto nível.
Procurei traduzir minha idéia de transversalidade
nos temas e nos convites que fiz para este
segmento.
Ao invés de concentrar-me no tema da
biodiversidade strictu sensu, propus diálogos
interativos, cada um tratando das interfaces
entre a biodiversidade e um tema chave:
- alimentação e agricultura;
- desenvolvimento e erradicação
da pobreza; e,
- comércio.
Além desses, propus também o
tema de acesso e repartição
de benefícios, transversal por natureza.
Sei que é mais simples tratar de temas
da nossa própria governança.
Mas sei, também, o quão importante
é, para nós, Ministros do Meio
Ambiente, falarmos sobre temas em relação
aos quais temos relevante acúmulo de
conhecimentos e efetiva capacidade de influenciar.
Durante o início da luta ambientalista
em todo o mundo, nós, os ambientalistas,
tínhamos que pedir aos demais setores
que fizessem algo pelo meio ambiente.
Passados todos esses anos de formulação,
institucionalização e implementação
da agenda ambiental em todo o mundo, nós,
os ambientalistas, acumulamos conhecimentos
que nos qualificam, agora, a tomar o caminho
inverso, ou seja, oferecermos aos demais setores
aquilo que o setor ambiental pode fazer pelo
desenvolvimento.
Por isso, convidei, também, para discutir
os vários temas que propus, Ministros
e autoridades de setores bastante diversos.
Teremos durante esses três dias, um
conjunto bastante expressivo de palestrantes,
painelistas e debatedores cujo espectro de
atuação vai muito além
da área ambiental.
Gostaria de deter-me, em particular, sobre
organizações que tratam de temas
comuns e complementares aos discutidos nesta
Conferência, com enfoques diversos,
e que me dão a honra de comparecer
a esta reunião.
Refiro-me à UNCTAD, na figura de seu
Secretário-Geral, e à Organização
Mundial do Comércio e à Organização
Mundial de Propriedade Intelectual, nas figuras
de seus vice-diretores-gerais.
Para mim, essas presenças são
demonstrações dos esforços
globais que precisamos fazer em todas as instâncias
no sentido de assegurar que a implementação
dos objetivos desta Convenção
não seja tratada de maneira menos importante
do que a implementação de outros
regimes e compromissos internacionais.
Senhoras e Senhores,
A Cúpula de Joanesburgo endossou, em
2002, a decisão desta Conferência
de atingir, até 2010, uma redução
significativa das taxas atuais de perda da
biodiversidade, no nível global, regional
e nacional.
Para o Brasil, reafirmar essa meta de 2010
é mais do que cumprir um compromisso
internacional: significa, também, a
reafirmação de um compromisso
ético e moral com a nossa gente e com
os nossos recursos naturais.
Dados os preocupantes indicadores atuais de
perda crescente da biodiversidade, conclamo
a todos aqui reunidos para que olhemos com
urgência e relevância para os
quatro anos que nos restam até 2010.
Os baixos índices de implementação
dos dispositivos da Convenção
mostram a necessidade urgente de que esses
compromissos possam ser harmonizados e integrados
com a implementação de outros
regimes, instrumentos e acordos adotados pela
comunidade global e com outras políticas
setoriais no nível nacional.
Essas não são questões
novas. Há muito está em curso
o debate sobre como harmonizar a implementação
dos acordos ambientais multilaterais com o
regime de comércio global, com o cumprimento
das Metas de Desenvolvimento do Milênio
ou com a questão da segurança
alimentar.
No nível nacional, muitos países
estão trabalhando no sentido de conciliar
a implementação dos dispositivos
desta Convenção com a promoção
de políticas para o crescimento econômico
e para a produção agrícola
que contribuam para a erradicação
da pobreza, segurança alimentar e justiça
social.
Senhoras e Senhores,
Um exemplo claro do que estamos falando foram
as negociações, há duas
semanas atrás, durante a Reunião
das Partes do Protocolo de Cartagena sobre
Biossegurança, a MOP-3.
Apesar de se tratar de um Protocolo de gênese
ambiental, as extremas dificuldades para obtenção
de consenso expuseram a forma como as questões
ambientais afetam e são afetadas por
outros setores.
As delegações de todos os países
eram compostas de uma grande diversidade de
setores governamentais e não-governamentais,
cada um com suas legítimas aspirações
e com a expectativa de se verem reconhecidos
nas decisões finais daquela reunião.
Em meu País, a posição
de Governo requereu o envolvimento pessoal
do Presidente da República.
Quero aqui deixar registrado, em público,
meu reconhecimento pela sua coragem e sabedoria
ao lidar com um tema tão complexo e
que envolve posições tão
distintas dentro do Governo. Sua decisão,
que buscou contemplar todos os setores interessados,
representou uma significativa contribuição
à Reunião, com resultados que
indicam indubitável mensagem política
de renovação do comprometimento
das Partes com a integridade do Protocolo.
Da mesma maneira que o Protocolo
de Cartagena sobre Biossegurança, há
um tema comum a todos nós, e a várias
das organizações e setores aqui
representados, que também reflete,
de forma emblemática, a necessidade
de tratamento transversal dos temas ambientais.
Refiro-me às negociações
em torno de um regime internacional de repartição
de benefícios resultantes do acesso
aos recursos genéticos e aos conhecimentos
tradicionais associados.
Embora entendamos a cautela com que alguns
países e setores tratam esse tema,
é fundamental que a comunidade internacional
possa avançar na direção
do 3o objetivo da Convenção
- a repartição justa e eqüitativa
dos benefícios derivados do uso dos
recursos genéticos - o único
em relação ao qual, 12 anos
após a entrada em vigor da Convenção,
os resultados até o momento são
inexpressivos.
Para o Brasil, a existência
desse regime mostra-se matéria relevante
e urgente.
Senhoras e Senhores,
A formulação de modelos de desenvolvimento
que sejam sustentáveis é tarefa
de grande complexidade e vai bem além
dos poderes outorgados a nós Ministros
de Meio Ambiente. Requer vontade e decisão
política do Governo mas, também,
requer que todos os setores da sociedade se
vejam reconhecidos em seus valores e expectativas.
Espero que esta Reunião possa ser produtiva
e inspirada pelo grande espírito de
comprometimento que permeou a Cúpula
do Rio, em 1992. Espero, também, que
ela possa significar o início de um
maior processo de integração
entre setores distintos, de maior participação
de ministros de outras áreas, de forma
que tenhamos um segmento de alto nível
que vá além das questões
ambientais.
Somente assim poderemos fortalecer o elo entre
nós, Ministros, e as nossas delegações,
essas sim, já há mais tempo
compostas por toda essa diversidade que desejamos
alcançar.
Agradeço a todos os meus colegas e
representantes de alto nível a presença
nesta reunião e formulo votos de uma
reunião comprometida, engajada e construtiva.
Que o espírito dessa reunião
incorpore o sentido das sábias palavras
do poeta amazônico Thiago de Melo, que
disse: talvez nem seja preciso um novo caminho,
bastando tão somente uma nova maneira
de caminhar.
Que essa nossa reunião possa dar os
primeiros passos rumo a essa nova maneira
de caminhar na direção da implementação
da CDB.
Muito obrigada!