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NOVAS INSTÂNCIAS PARA (IN) DECISÃO: ABS E A RETÓRICA DA CONTRADIÇÃO

Panorama Ambiental
São Paulo (SP) – Brasil
Março de 2006

28/03/2006 - Leal às suas práticas, a COP institui grupos informais e grupos de especialistas na tentativa de avançar nas negociações relativas aos temas do Regime Internacional de Acesso e Repartição de Benefícios. Embora tais grupos suscitem a idéia de progresso, o andamento das negociações pouco avançou nas questões de conteúdo.

Seguindo uma prática usual de criar instâncias para gerar comissões que subsidiarão posições oficiais, o grupo de trabalho que discute o artigo 15, referente ao acesso e repartição de benefícios (ABS, na sigla em inglês) da biodiversidade, criou três grupos de discussão para fomentar as negociações no âmbito da construção de um Regime Internacional de Acesso e Repartição de Benefícios.

Nas discussões travadas no item referente ao regime, surgiram propostas para a criação de órgãos e grupos informais de discussão. A Noruega propôs a criação de um órgão intergovernamental de negociação, com secretaria-executiva e presidentes próprios, participação de povos indígenas e comunidades locais, e com uma agenda de trabalho voltada à conclusão das negociações do regime até a próxima conferência (COP 9), em 2008. A criação ainda não foi formalizada pela COP.

Grupos informais

Dois grupos informais também foram criados para dirimir divergências quanto a aspectos pontuais, relativos aos itens da agenda do artigo 15, em discussão. Os países que divergem se encontrarão e formularão uma posição consensuada sobre os itens em discórdia.

Um grupo informal foi estabelecido com objetivo de apresentar uma proposta para estruturar a participação de povos indígenas e comunidades locais nas negociações do Regime Internacional de Acesso e Repartição de Benefícios. As divergências se referem a forma da participação, isto é, se as populações tradicionais devem participar como membros das delegações oficiais ou como povos tradicionais sem identificação nacional. O grupo deverá propôr os mecanismos que garantirão tal participação.

Grupo de especialistas

Um grupo de especialistas também foi criado para discutir o certificado de origem/fonte/procedência legal. Um elemento central do Regime Internacional de Acesso e Repartição de Benefícios, o certificado funcionará como um atestado de que um determinado recurso ou conhecimento tradicional associado foi acessado em acordo com as legislações do país provedor dos recursos genéticos, funcionando assim como um passaporte do acesso, garantindo que obrigações como o consentimento prévio e informado, os termos de referências de comum acordo e um contrato de repartição de benefícios foram devidamente celebrados.

O grupo tem mandato para fornecer subsídios técnicos para as partes, mas não poderá negociar o trecho do texto referente ao certificado. Sugeriu-se que as propostas, sob consideração do referido grupo, incluam uma descrição dos objetivos e dos fundamentos do certificado; as características, avaliações qualitativas e quantitativas e a relação do certificado com os outros fóruns que discutem temas conexos. O Fórum Indígena Global para a Biodiversidade exigiu a inclusão de especialistas indígenas nas discussões do grupo.

Contradições

Apesar da impressão de que se está trabalhando para avançar nas negociações, nada de concreto foi discutido até agora. Nem sequer o documento resultante da reunião do grupo de trabalho do ABS, com mandato para negociar o regime (proposto pelo Grupo Africano e endossado pelo grupo dos países megadiversos), reunido em Granada, foi reconhecido pela COP como o texto de referência para a negociação. Muitas são as divergências e as falsas sensações de progresso. A criação de grupos suscita o entendimento de que os passos estão sendo dados. No entanto, negociação sobre a letra do regime, seus conteúdos, elementos e natureza, não ocorre. Pelo contrario, até propostas para se negociar o Regime a partir de 2008, na COP 9, já foram feitas.

Os dias vão passando, as oportunidades se esgotando e nem mesmo a certeza da continuidade do Grupo de Trabalho negociador do regime está clara, visto que o fundo que financia as reuniões da CDB anuncia o corte de verbas para os próximos anos, fortalecendo as posições de que, sem dinheiro, não há como realizar reuniões de grupos de trabalho.
É incrível a contradição entre os discursos e as práticas empregadas pelas delegações. Se por um lado, os discursos manifestam consternação quanto à disponibilidade de recursos (dólares) financeiros para viabilizar futuras reuniões de negociação, por outro, destaca-se uma inerte letargia de algumas delegações em aproveitar esta oportunidade para negociar, traduzido em argumentos de que as delegações não estão aptas a negociar, pois não estão preparadas, acham prematuro, não trouxeram seus especialistas ou não discutiram os conteúdos do regime.

A impressionante incoerência gerada reforça a idéia de que as reuniões e conferências são promovidas para retardar os avanços na implementação da CDB. Como podem as delegações perder semelhante oportunidade para discutir um regime, quando estas se deparam com sombrios avisos de cortes de recursos? A urgência em se implementar a CDB parece perder sentido frente a essas constatações. As oportunidades são perdidas e há novas impossibilitadas, os negociadores não estão prontos e as próximas reuniões não estão garantidas. Impressiona a contradição, pois os esforços para garantir novas reuniões são constantemente barrados pelo discurso da falta de recursos, mas, quando estas são realizadas, as retóricas são as da prematuridade, ausência de subsídios técnicos e especialistas para negociar. O círculo vicioso da omissão não se negocia porque não há subsídios financeiros para realizar novas negociações e não há negociações porque não há subsídios técnicos para fazê-lo.

Fica a sensação de que os únicos avanços são os do aumento de instâncias de indecisão e o amadurecimento da prematuridade das negociações. Enquanto isso, o dinheiro (motor da CDB e preocupação-mor das delegações) e o tempo (imprescindível para se reverter a perda de biodiversidade e o uso indevido de conhecimentos tradicionais) se esvaem em meio a discursos da necessidade de se implementar uma convenção onde as delegações não são maduras o suficiente para negociar.
Entenda o significado

:: Populações tradicionais - povos ou grupos que, vivendo em áreas periféricas à nossa sociedade, em situação de relativo isolamento face ao mundo ocidental, construíram formas de se relacionar entre si e com os seres e coisas da natureza muito diferentes das formas vigentes na nossa sociedade. Entre eles, estão: quilombolas, ribeirinhos, extrativistas, caiçaras, raizeiros, sertanejos, geraizeiros, comunidades de "fundos de pasto" e "faxinais" (leia mais sobre o assunto, clicando aqui).

:: Conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade - Incluem conhecimentos, inovações e práticas relativos às propriedades e características da diversidade biológica. Por exemplo: informações sobre o poder curativo de raízes e extratos vegetais.

:: Recurso genético - É todo o material de origem vegetal ou animal que contenha a informação genética (DNA) responsável pela produção das substâncias e tecidos essenciais ao organismo (hormônios, proteínas, órgãos etc).

:: Repartição dos benefícios oriundos da biodiversidade - É a compensação financeira ou de outra natureza que devem receber os povos tradicionais pelas pesquisas feitas a partir de seus recursos naturais ou conhecimentos.

:: Consentimento prévio informado - É a autorização preliminar dada por uma comunidade a uma pesquisa ou estudo realizado em seu território, com seus conhecimentos ou recursos biológicos.

:: Sistema de propriedade intelectual - Confere direitos de propriedade a descrições e estudos sobre processos que visam a obtenção de invenções, as quais, por sua vez, apresentem uma inovação e permitam o uso comercial. Em todo o mundo, existem organizações e escritórios responsáveis por conceder esses direitos, que podem ser patentes, marcas, registros e copyrights, entre outros. No Brasil, o Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (Inpi) tem a competência de conceder e registrar tais direitos.

 
 

Fonte: ISA – Instituto Socioambiental (www.isa.org.br)
Assessoria de imprensa (Henry Novion)

 
 
 
 
 
 

 

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